Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
18331/16.6T8LSB.L1.S1
Nº Convencional: 7ª SECÇÃO
Relator: SOUSA LAMEIRA
Descritores: INTERMEDIAÇÃO FINANCEIRA
DEVER DE INFORMAÇÃO
INCUMPRIMENTO
DANOS PATRIMONIAIS
CÁLCULO DA INDEMNIZAÇÃO
OBRIGAÇÃO
DEPÓSITO A PRAZO
BANCO
TEORIA DA CAUSALIDADE ADEQUADA
NEXO DE CAUSALIDADE
PRESUNÇÕES JUDICIAIS
PODERES DA RELAÇÃO
PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
MATÉRIA DE FACTO
TAXA DE JURO
EMPRESA COMERCIAL
JUROS LEGAIS
DETERMINAÇÃO DO VALOR
LIQUIDAÇÃO EM EXECUÇÃO DE SENTENÇA
Data do Acordão: 06/05/2018
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Referência de Publicação:
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA PARCIALMENTE A REVISTA
Área Temática:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL – PROCESSO DE DECLARAÇÃO / SENTENÇA / ELABORAÇÃO DA SENTENÇA /RECURSOS / JULGAMENTO DO RECURSO.
DIREITO CIVIL – RELAÇÕES JURÍDICAS / FACTOS JURÍDICOS / PROVAS / PRESUNÇÕES.
DIREITO COMERCIAL – CONTRATOS ESPECIAIS.
Doutrina:
-Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol. I, página 654.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 607.º, N.º 4 E 662.º.
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 349.º E 351.º.
CÓDIGO COMERCIAL (CCOM): - ARTIGO 102.º.
Jurisprudência Nacional:

ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


- DE 29-09-2016, IN WWW.DGSI.PT;
- DE 02-11-2017;
- DE 05-12-2017.
Sumário :
I - A formulação de presunções judiciais com recurso aos factos provados insere-se nos poderes da Relação no domínio da matéria de facto (art. 607., n.º 4 e art. 662.º, ambos do CPC e arts. 349.º e 351.º, ambos do CC), sendo que, não se mostrando violado qualquer preceito legal imperativo e não sendo o raciocínio a elas subjacente manifestamente ilógico, nada há a censurar.

II - Tendo a Relação tido como demonstrado que o autor não teria subscrito as obrigações se lhe tivesse sido dito, pelos funcionários do recorrente, que corria o risco de perder, no todo ou em parte, o seu dinheiro em caso de insolvência da emitente, é de considerar verificado um nexo causal (e não meramente naturalístico) entre aquele facto e os prejuízos sofridos pelo primeiro.

III - No contexto do incumprimento do dever de informação associado à actividade de intermediação financeira, o dano daí adveniente deve traduzir-se na diferença entre a situação em que o lesado se acha e aquela em que estaria se tal dever tivesse sido cumprido.

IV - Apurando-se que o autor investiu em obrigações convencido que estava a investir num depósito a prazo, o dano directo por ele sofrido corresponde aos montantes investidos, acrescido de juros de mora à taxa legal (por não se verificar o pressuposto a que alude o art. 102.º do CCom) a contar das datas em que os mesmos dever-lhe-iam ter sido reembolsados (como sucederia se, efectivamente, tivesse sido contratado esse depósito); a essa importância devem ser deduzidos o valor das obrigações da emitente (apesar da insolvência desta) e o valor dos juros remuneratórios que foram por esta pagos, assim se limitando a medida da responsabilidade do recorrente ao prejuízo efectivamente sofrido pelo recorrido.

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça





I – RELATÓRIO

  

l. AA instaurou acção declarativa comum contra Banco BB, S.A., actualmente designado Banco CC, S.A., alegando, em resumo, que:

É … reformado e foi titular de uma conta de depósito à ordem no banco R., agência de …, na qual movimentava grande parte das suas poupanças.

Em 2004, dois trabalhadores daquela agência apresentaram-lhe um produto como não tendo risco, dado que o capital investido era garantido e não havia possibilidade de perda, que era uma modalidade de aplicação de poupanças que o R. estava a praticar e promover, com condições mais vantajosas que os correntes depósitos a prazo habituais e que o retorno do capital estaria garantido pelo R.

Simplificando, na prática, disseram ao A. que era um produto em tudo semelhante a um autêntico depósito a prazo.

O A. é pessoa conservadora e cautelosa na aplicação que faz das suas poupanças, nunca fazendo aplicações que possam pôr em risco o seu dinheiro e nunca havia feito outros depósitos e aplicações de poupanças que não se enquadrassem no tradicional depósito à ordem ou a prazo.

Sempre confiou no R. e nos seus trabalhadores daquela agência estando convicto de que se tratava de um produto do tipo depósito a prazo do próprio Banco R. e com capital garantido e que não envolvia risco, no ano de 2004 destinou a quantia de 150.000 € à subscrição daquele produto e posteriormente mais 250.000 €.

Subscreveu assim obrigações DD Rendimento Mais 2004 e obrigações DD 2006 convencido de que possuía um produto de poupança do Banco R. e sem desconfiar que corria o risco de perder o capital investido.

Em 10/11/2008 resgatou 150.000 C de parte dos depósitos aplicados.

Ficando titular de 2 obrigações DD RM2 - DD 2006 no valor total de 100.000 € e de 3 obrigações DD Rendimento Mais 2004 no valor total de 150.000 €, que estão depositadas no R. e das quais não foi reembolsado, recusando-se o R. a restituir a quantia que lhe foi confiada.

O A. não celebrou qualquer negócio com a DD, S.A., actualmente EE, SGPS, S.A..

O R. omitiu informação fundamental relativa às características dos títulos DD, violando os deveres boa-fé, informação, lealdade e respeito consciencioso dos interesses confiados.

Com a privação do valor em causa o A. tem sofrido psiquicamente, passando a recorrer a medicamentos para acalmar a sua ansiedade

A informação que o R. sempre passou ao A. e que DD ou Banco BB era, no fundo, a mesma entidade, na medida em que tudo pertencia ao Banco R.

A responsabilidade do R. e da DD, S.A., actualmente EE, SGPS, S.A. é solidária.

Conclui pedindo que seja o réu condenado a pagar-lhe:

a) a título de danos patrimoniais a quantia de 250.000 e, correspondente ao valor do capital depositado no réu e adstrito às obrigações em causa;

b) juros de mora referentes ao valor de capital depositado no réu e adstrito às obrigações de 2004 vencidos desde 19/10/2014 (dia seguinte à data fixada para reembolso) e não pagos e que à data de 15/0//2016 se computam em 18.366,79 € bem como os juros vincendos, calculados à taxa supletiva para as operações comerciais, até efectivo e integral pagamento;

c) juros de mora referentes ao valor de capital depositado no réu e adstrito às obrigações de 2006 vencidos desde 09/05/2016 (dia seguinte à data fixada para reembolso) e não pagos e que à data de 15/07/2016 se computam em 1.272,87 € bem como os juros vincendos, calculados à taxa supletiva para as operações comerciais, até efectivo e integral pagamento;

d) juros remuneratórios à taxa acordada de 4,5% não pagos - respeitantes às obrigações de 2006 - aquando da última renovação a 5 de Novembro de 2015 e que na data de 15/07/2016 perfazem 3.119,18 €;

e) a título de danos não patrimoniais a quantia de 2.000 € acrescida dos juros que se vencerem até efectivo e integral pagamento, à taxa legal dos juros civis de 4%.


2. O R. contestou, alegando resumidamente, que:

O alegado direito do A. já prescreveu pelo decurso do prazo de 2 anos a contar do conhecimento da conclusão da operação de subscrição das obrigações DD.

As obrigações DD foram emitidas pela DD, SGPS, SA, sociedade titular de 100% do capital do R. até à altura em que foi nacionalizada.

O produto dado à subscrição era seguro mas não garantido, como nenhuma aplicação financeira é.

A informação prestada ao A. foi verdadeira e suficiente.

O A. sabia que não tinha um depósito a prazo ou algo parecido e deu ordem para vender obrigações DDRM no valor de 150.000 e, o que demonstra conhecer que não tinha contratado um depósito a prazo ou algo semelhante.

Conclui pedindo a improcedência da acção.


3. Elaborou-se despacho saneador no qual se relegou para final o conhecimento da excepção de prescrição. Definiu-se o objecto do litígio e enunciaram-se os temas de prova.

Observado o legal formalismo, realizou-se a audiência final - em que o A. respondeu à excepção de prescrição ao abrigo do disposto no art. 3° n° 4 do CPC -.

A final foi proferida sentença que julgou a acção improcedente, absolvendo o R. do pedido.


4. Inconformado o Autor AA interpôs recurso de revista, para o Tribunal da Relação de …, que, por Acórdão de 16 de Novembro de 2017, decidiu julgar parcialmente procedente a apelação e alterando a sentença recorrida decidiu:

«a) condenar o apelado a pagar ao apelante a quantia de 250.000 €, a título de indemnização por danos patrimoniais correspondente ao valor investido na subscrição das obrigações, acrescida dos juros de mora contados, respectivamente, desde o dia seguinte à data de vencimento das obrigações subscritas em 2004 e desde o dia seguinte à data de vencimento das obrigações subscritas em 2006, à taxa supletiva para as operações comerciais, até efectivo pagamento;

b) condenar o apelado a pagar ao apelante a quantia de 2.000 € a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa legal, que está fixada em 4%, vencidos desde a data da citação e vincendos até integral pagamento;

c) absolver o apelado do mais que era pedido».


3. O réu Banco BB, S.A., actualmente designado Banco CC, S.A. interpôs Recurso de Revista para o Supremo Tribunal de Justiça e, tendo alegado, formulou as seguintes conclusões:

1) A reapreciação da decisão sobre a matéria de facto não se deve reconduzir a um novo julgamento, mas à apreciação da coerência da decisão recorrida, sob pena de se formar um novo julgamento ab initio, com desconsideração da imediação e proximidade à produção de prova oferecida.

2) Independentemente da natureza da responsabilidade civil em causa na situação dos autos - pré-contratual ou contratual -, sempre será obrigatória a demonstração, sem prejuízo dos eventuais regimes especiais de inversão do ónus da prova que sejam aplicáveis, dos pressupostos gerais da responsabilidade civil:

a.      Facto (ou omissão)

b.      Ilicitude

c.      Culpa

d.      Causalidade

e.      Dano

3) Não se demonstra provado qualquer facto que permita sustentar um qualquer nexo de causalidade entre o Facto ilícito e o Dano,

4) Concretamente não está provado que o Autor não investiria em Obrigações DD acaso tivesse tido acesso a informação exaustiva e detalhada sobre o produto em causa,

5) E vale esta afirmação independentemente de estar provado ter o Autor feito o seu investimento pela confiança que depositava na palavra do seu gestor bancário, uma vez que esta manter-se-ia intocada com maior ou menor grau de informação.

6) O Tribunal a quo verificando a falta de um tal facto veio a invocar expressamente uma presunção judicial de que o A. não teria subscrito o mesmo produto financeiro acaso tivesse perfeito e exaustivo conhecimento das suas reais características.

7) A presunção judicial, nos termos do disposto no art.º 349, corresponde a uma ilação "que a lei ou o julgador fira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido".

8) A presunção judicial implica: (i) um facto conhecido, estabelecido no processo, (ii) um juízo de normalidade ou razoabilidade sindicável, (iii) a afirmação de um facto desconhecido com base na sequência dos pressupostos anteriores.

9) A decisão recorrida, aludindo, aliás, repetidamente, à razoabilidade do seu raciocínio, faz decorrer dos factos provados que "o apelante não teria aplicado as suas poupanças nas obrigações DD se conhecesse as suas verdadeiras características." Bem como que "não é plausível que (o A.) tivesse tomado a decisão de subscrever estas obrigações se lhe tivesse sido dito, pelos funcionários do apelante, que corria o risco de perder todo ou parte do seu dinheiro no caso de insolvência da sociedade emitente dessas obrigações".

10) A decisão recorrida, todavia, não identifica qual o facto concreto que lhe serve para deduzir ou inferir a dita presunção, não podendo, salva melhor opinião limitar-se a remeter para "toda a factualidade provada", sob pena de insindicabilidade ou incompreensão da decisão proferida.

11) Ficamos também sem perceber qual o raciocínio de razoabilidade que o Tribunal se socorreu para concluir que "não é plausível que (o A.) tivesse tomado a decisão de subscrever estas obrigações se lhe tivesse sido dito, pelos funcionários do apelante, que corria o risco de perder todo ou parte do seu dinheiro no caso de insolvência da sociedade emitente dessas obrigações".

12) Um tal raciocínio vai muito para além do mero perfil de investidor do Autor, obrigando mais a que se determinasse qual o nível de risco em causa, a probabilidade, ab initio, de incumprimento ou de insolvência da entidade emitente. E essencialmente obrigaria a que se determinasse de forma clara a diferença de risco entre a subscrição destas obrigações e de outros produtos bancários ou financeiros ditos conservadores - por exemplo de um Depósito a Prazo (porque também estes têm sempre um risco inerente)!

13) Não basta que esteja demonstrado o incumprimento actual do reembolso das obrigações, mas antes era essencial que o nível de risco destas obrigações, aquando da sua emissão, era substancialmente maior que o de qualquer aplicação conservadora.

14) Faltando estes passos da dita lógica dedutiva do Tribunal, não pode sobreviver a dita presunção, por lhe faltar exactamente a razoabilidade da sua ilação!

15) A presunção assim aplicada é nula, o que se invoca nos termos do disposto no art.s 195º n.º 1, parte final.

Por outro lado, ainda que assim se não entenda,

16) A presunção é um meio probatório, no sentido de ser um meio de afirmação de determinado facto, a par dos restantes meios probatórios, mas apenas um meio de ponderação a fim de determinar um facto como provado ou não provado. Aliás, por isso mesmo está regulado como uma secção do capítulo do Código civil dedicado às provas.

17) A presunção destina-se assim a fundamentar a decisão de considerar um facto como provado.

18) E esse facto deverá constar do elenco dos factos provados, caso que aqui se não vislumbra.

19) Não se vislumbra da decisão recorrida qual o facto, de entre os factos provados, e alterados ou aditados pela Apelação, que corresponda à presunção judicial operada.

20) E isto simplesmente porque, salva melhor opinião, o Tribunal a quo, não aditou qualquer facto no sentido de sustentar a verificação do tão almejado nexo de causalidade.

21) O Tribunal a quo limitou-se a usar a presunção judicial não como meio probatório, mas como verdadeiro instrumento de declaração de preenchimento de um conceito estritamente jurídico - o nexo de causalidade.

22) O recurso à presunção não é apto a, sem mais e deforma directa, suprir a falta de nexo de causalidade. Acaso o Tribunal recorrido entendesse, sempre poderia ter aditado factos presumidos (desde que não essenciais, porque não alegados) para com base neles vir ao considerar preenchido o dito nexo - não o tendo feito, não pode é presumir o mesmo preenchimento apenas por via da dita presunção judicial!   Em suma,

23) Não há qualquer facto provado, nem a decisão recorrida o identifica, que sustente qualquer tipo de causalidade entre o facto ilícito e o dano, sendo que o respectivo ónus de prova cabia ao Autor!

24) 0 Tribunal recorrido violou, por errónea interpretação ou aplicação, o disposto nos artºs 349º, 351º, 563º e 798º do Código Civil.

25) O art.º 806º do Código Civil prevê expressamente que a indemnização por mora, no caso particular das obrigações pecuniárias, corresponde ao pagamento de juros.

26) Por outro lado, o art.º 1029 do Código Comercial, prevê-se já, no seu § 39, que os juros moratórios de que sejam titulares empresas comerciais são fixados por portaria conjunta dos Ministérios das Finanças e da Justiça. É esta a taxa de juros moratórios comercial, ou aquilo que o douto acórdão recorrido chama de taxa aplicável às operações comerciais.

27) Da disposição citada resulta de forma cristalina que a taxa de juro prevista naquele parágrafo apenas é aplicável nos casos em que a empresa comercial seja credora.

28) No caso concreto, e nos estritos termos da condenação do Banco-Réu, é este devedor.

29) Ademais, não resultam do processo quaisquer circunstâncias que nos permitam afirmar da comercialidade do Autor...

30) Em suma, não há fundamento para a aplicação da referida taxa de juros moratórios comerciais, tendo a decisão proferida violado o disposto no art.º 1029 do Código Comercial e 559 nº 1 do Código Civil.

Conclui pedindo a procedência do presente recurso, e em consequência, que seja revogada a decisão recorrida absolvendo-se o Réu do pedido.


4. O Recorrido AA apresentou contra-alegações tendo formulado as seguintes conclusões:

1. Em síntese, o recorrente alega que a utilização de uma presunção judicial para fundamentar uma conclusão de facto foi aplicada fora dos pressupostos legais, porquanto, o Tribunal a quo não indica qual o facto, ou factos, certos em que se baseia para firmar a conclusão factual de que "não é plausível que (o A.) tivesse tomado a decisão de subscrever estas obrigações se lhe tivesse sido dito, pelos funcionários do apelante, que corria o risco de perder todo ou parte do seu dinheiro no caso de insolvência da sociedade emitente dessas obrigações."

2. Em jeito de argumentação subsidiária, vem a recorrente defender que, não está provada aquela mesma conclusão factual, nem por via da utilização de uma presunção judicial - alegadamente ilegal - nem por outra via qualquer, concluindo pela impossibilidade de se operar a subsunção do nexo de causalidade, elemento fundamental, para concluir pela existência de qualquer tipo de responsabilidade.

3. A argumentação gizada cai pela mera análise da factualidade provada e não provada.

4. Atenta a factualidade o Tribunal decidiu bem, com ou sem utilização de uma presunção judicial que, em nosso entender, nem seria necessária, atendendo à resposta clara, objectiva e sem margem para dúvidas que a factualidade revela per se.

5. Os trabalhadores do recorrente sabendo que o recorrido era pessoa conservadora na aplicação das suas poupanças - facto provado em 4 -apresentaram o produto como sendo "de capital garantido" - facto 7 alterado - e não informaram que eram obrigações subordinadas - facto 8 - nem entregaram a ficha técnica das obrigações - factos provados de 14 a 20.

6. Venderam um produto em cujo respectivo respectivo prospecto comercial era visível, manifesto, o logótipo do Banco BB e utilizando argumentos de venda que lhe eram indicados pelas chefias como sendo produto de capital garantido -facto provado 9 - explicando que o produto era equivalente a um depósito a prazo e que o Banco BB ou DD era, na prática, a mesma entidade, não havia diferenças - facto provado 10.

7. Os trabalhadores do recorrente, a cobro da confiança depositada em si e no banco, omitiram informação fundamental relativa às características do produto em venda e induziram mesmo em erro, gerando confundibilidade -actuando de acordo com as indicações que eram fornecidas aos trabalhadores do banco pela sua hierarquia - facto provado 10, na identidade da entidade emissora do mesmo - tal como sucedeu no caso julgado recentemente: vd. Ac.TR …, de 12.09.2017, tendo como relator o Desembargador Moreira do Carmo, in www. Dgsi.pt

8. Bastaria a verificação da omissão de um elemento que não pode deixar de ter importância extrema porque, necessariamente, alteraria ou poderia alterar a decisão do recorrente: a de que se tratava de obrigações subordinadas, ou seja, de que, afinal, também por essa razão, o produto nunca seria de capital garantido no vencimento.

9. Nem a informação adjectiva do tipo de produto, nem a explicação substantiva do que seriam obrigações subordinadas!

10. Ao dar-se como provado o facto 7 - do que se recorreu e ainda se critica - e como não provado o facto 6 dos factos não provados, teremos que concluir que o produto terá sido apresentado ao recorrido como produto DD - e ainda assim sempre sendo esta detentora a 100% do banco (o que emana das indicações hierárquicas - facto provado 10) -, não está dado como provado - como era ónus do recorrente - a data a partir de quando é que o recorrido soube que havia subscrito obrigações DD e não do Banco BB, ou se alguma vez o soube!

11. O recorrido desconhecia que o recorrente estava a alienar produtos financeiros doutrem e, como tal, actuava como intermediário. Para este, tudo era Banco BB!

12. O recorrido limitou-se apenas a assinar o que os trabalhadores do recorrente -da sua inteira confiança - preencheram e lhe deram a assinar - factos provados 12 a 18.

13. Ao contrário do que o recorrente afirma, o Tribunal a quo nunca teve dúvidas sobre a conclusão factual a que chega e o seu raciocínio e ponderação está plasmado no acórdão recorrido na parte em que se lê: "Mas decorre desses depoimentos que era assegurado aos clientes que era um produto seguro como se de um depósito a prazo de tratasse, sem risco de perda de capitai que era vendido como como se de um depósito a prazo se tratasse, e resulta do depoimento da testemunha FF que foi por estar convencido, dada a confiança que depositava nos funcionários da apelante da agência de …, de que se tratava de um produto com boa rentabilidade e sem risco de perda de capital, que investiu o seu dinheiro nesse produto."

14. Razão pela qual foi aditado o facto 20-a)!

15. Mas também é a razão pela qual inexiste qualquer nulidade, já que não é a presunção judicial que leva o tribunal a quo a fixar um facto desconhecido com base num conhecido. Antes sim, foi a prova testemunhal que levou ao aditamento do facto 20-a.

16. O recorrente põe em causa que o acórdão sob escrutínio não contém factos que permitam operar a subsunção do nexo de causalidade. Mas os factos estão lá, sobretudo, no facto aditado como 20-a!

17. Não é a utilização de qualquer presunção jurídica que levou à fixação daquele ponto da matéria de facto, mas sim os depoimentos das testemunhas, com especial incidência no depoimento de FF, que de forma inequívoca e clara atestaram que o investimento no produto vendido por banda do recorrido só o foi porque confiava no banco, nos seus funcionários, e na informação que lhe foi prestada!

18. Funcionários esses com instruções, do recorrente, para vender uma obrigação subordinada de uma pessoa jurídica diferente do Banco, equiparando-a a um depósito a prazo do próprio Banco, sem risco e com garantia de pagamento do capital!

19. O recorrido só subscreveu porque lhe foi dada informação, propositadamente errónea, por trabalhadores da recorrente, instruídos para tal, em ordem a vender produtos de alto risco a clientes ultraconservadores.

20. E se só investiu o dinheiro naquele produto pelas circunstâncias descritas, é por demais evidente, que de outra forma, leia-se, com a informação correcta e séria, não o faria!

21. Tudo o que foi aduzido pelo recorrido e que está também plasmado no acórdão sob escrutínio, não está provado por recurso a qualquer presunção jurídica!

22. A factualidade provada é pois, per se, suficiente para que a decisão do Tribunal a quo não mereça qualquer reparo porque atentos os factos provados e não provados, a conclusão só pode ser uma: o recorrido foi pelo recorrente convencido, induzido e conduzido a comprar produtos financeiros de alto risco e com inferior ou inexistente segurança de garantia de reembolso, sem o saber, o que lhe gerou um dano, sendo que, se não tivesse sido iludido nunca teria comprado os ditos produtos atentas as suas características de investidor conservador reconhecidas nos autos.

23. Tal conclusão gera a obrigação indemnizatória pela qual o recorrente veio, e bem, condenado.

Conclui pedindo que se julgue improcedente o recurso.


5. O Tribunal da Relação de …, a fls. 35, admitiu o recurso.

Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.


II – FUNDAMENTAÇÃO


Após reapreciação da matéria de facto, em 2ª instância, foram dados como provados os seguintes factos:

1 - O A. foi titular de uma conta de depósito à ordem com o n° 1...1, no banco R., agência de ….

2 - Era na indicada conta que o A. movimentava grande parte das suas poupanças.

3 - O A. é ... e ... reformado.

4 - O A. era pessoa conservadora na aplicação que fazia das suas poupanças.

5 - O A. depositava confiança no banco R. e nos seus trabalhadores da agência de ….

6 - Entre os meses de Setembro e Outubro de 2004, o A. foi contactado por dois trabalhadores da agência de … do banco R., que o informaram acerca de um produto financeiro que consideravam muito vantajoso para remunerar as poupanças depositadas no banco R.

7 - Apresentaram o produto como produto da DD, que detinha a 100% o Banco, assegurando-lhe ser uma aplicação com o prazo de 10 anos, sem risco de perda do capital, com a mesma segurança de um depósito a prazo, sendo garantido o reembolso do capital no vencimento, com taxa atractiva e liquidez por endosso, (alterado pela Relação).

8 - Não informaram que eram obrigações subordinadas.

9 - No próprio prospecto comercial interno, com o visível e destacado logótipo do Banco BB, atinente à colocação do produto financeiro, é apontado como argumentário a utilizar para convencimento dos clientes que se trata de aplicação com "capital garantido", com "elevadas taxas de remuneração" e, contra a eventual objecção do potencial cliente de que se trataria de um prazo de investimento demasiado longo, sugere a argumentação de "garantia de elevadas taxas de remuneração por um longo prazo"; "pagamento de juros periódico"; "taxa indexada, garantido sempre condições acima do mercado, facilitando a sua venda".

10 - O então director coordenador, num mail dirigido aos funcionários do banco com um apelo à venda aos clientes de obrigações da DD, escreveu: "relembro que a DD Valor é a maior accionista da DD SGPS (31 por cento), que por sua vez detém 100 por cento do Banco BB, ou seja, na prática estamos a "vender" o equivalente a um depósito a prazo, com uma excelente taxa ... quando o cliente efectua um depósito a prazo no Banco BB está a comprar "risco" Banco BB ... não vejo diferenças".

11 - O A. aceitou o investimento que lhe era apontado e destinou a quantia de € 150.000,00 à subscrição do produto que lhe era aconselhado.

12 - Os trabalhadores da agência do banco R. procederam às formalidades julgadas por estes necessárias à concretização da aplicação.

13 - O A. subscreveu o boletim de subscrição das obrigações "DD Rendimento Mais 2004".

14 - Não foi entregue ao A. a ficha técnica dessas obrigações.

15 - O contexto e o período temporal que então se atravessava era o da inexistência de suspeitas de solvabilidade dos operadores bancários e de um clima de estabilidade e sem a turbulência que surgiu com a verificação da crise financeira.

16 - Era um momento propício e incentivador do investimento em produtos financeiros com taxas remuneratórias muito aliciantes.

17 - Em 2006, o A., confiando no que lhe diziam e tendo já a experiência de cumprimento do pagamento atempado dos juros semestrais advindos da aplicação de 2004, aceitou aplicar mais dinheiro das suas poupanças de trabalho e reforma.

18 - Os trabalhadores da agência de … do banco R. preencheram um documento - que assinaram na parte reservada ao banco - onde consta a declaração pré-escrita e formatada "pretendo subscrever 5 obrigações com o valor nominal de € 50.000,00 cada uma", no "montante total de 250.000,00".

19 - O A. subscreveu o boletim de subscrição das obrigações "DD 2006".

20 - Não foi entregue ao A. a ficha técnica dessas obrigações.

20 - a) Foi por ter ficado convencido, dada a confiança que depositava nos funcionários do apelante da agência de …, de que se tratava de um produto com as características descritas no ponto 7, que o A. subscreveu as referidas obrigações, (aditado pela Relação).

20 - b) No boletim de subscrição das obrigações DD 2006 assinado pelo Autor constam, além do mais, os seguintes dizeres:

"Ordeno (ordenamos), que a conta acima indicada seja debitada para pagamento da operação resultante da ordem de subscrição constante do presente documento, na respectiva data de liquidação financeira - 8 de Maio de 2006. A presente ordem de débito é emitida também no interesse do Banco BB, SA", (doc. de fls. 70), (aditado pela Relação).

20- c) No boletim de subscrição das obrigações DD Rendimento Mais 2004 e no boletim de subscrição das obrigações DD2006 assinados pelo A., constam, além do mais, os seguintes dizeres:

«Natureza da emissão

Emissão até 1.000 obrigações subordinadas, ao portador e sob a forma escritural, com o valor nominal de 50.000,00 cada uma, (...)», (docs. de fls. 70 e de fls. 93), (aditado pela Relação).

21 - O A., tendo necessitado de disponibilizar capital, resgatou, a 10 de Novembro de 2008, o valor de € 150.000,00 de parte das obrigações DD 2006.

22 - O reembolso devido pela aplicação feita em 2004, no valor de €150.000,00, esperado a 25 de Outubro de 2014, não foi feito.

23 - O pagamento do juro remuneratório devido pela aplicação feita em 2006, esperado a 10 de Novembro de 2015, não foi feito.

24 - O não pagamento do reembolso das aplicações DD 2004 e DD 2006 e dos juros desta última aplicação, nas respectivas datas de vencimento, causou e causa ao A. um angustiante receio de não reaver ou não saber quando irá reaver o seu dinheiro.

25 - O A. perdeu a confiança nas instituições bancárias.

26 - O A. passou a tomar anti-depressivos e comprimidos para dormir.

26 - a) Por sentença proferida 29/ 06/ 2016 foi decretada a insolvência da EE, SGPS, S.A., anteriormente denominada DD, S.A.» (doc. de fls. 80), (aditado pela Relação).


E vem dado como não provado:

1 - Os funcionários da agência de … do banco R. disseram ao A. que o retorno do capital investido estava garantido pelo banco R. e que era um depósito a 10 anos, podendo ser resgatado antecipadamente, bastando para tal um aviso prévio de 3 a 4 dias.

2 - As orientações e comunicações internas existentes no banco R. e que este transmitia aos seus comerciais nos respectivos balcões consistiam em assegurar que o banco R. cobriria sempre a solvabilidade dos produtos, que o próprio banco garantia a satisfação do capital e dos juros.

3 - O A. nunca havia feito outras aplicações de poupanças que não se enquadrassem no tradicional depósito à ordem ou a prazo.

4 - O A. estava convencido que se tratava de um produto do tipo depósito a prazo.

5 - A privação do valor aplicado impede o A. de acudir à satisfação de algumas necessidades ou mesmo de satisfazer determinados desejos de consumo e inibe-o de participar em projectos de investimento, o que constitui motivo de revolta e de sofrimento moral.

6 - Desde a data da subscrição que o A. soube que havia subscrito obrigações DD.

 

III – DA SUBSUNÇÃO – APRECIAÇÃO


Verificados que estão os pressupostos de actuação deste tribunal, corridos os vistos, cumpre decidir.


A) O objecto do recurso é definido pelas conclusões da alegação do Recorrente, artigo 635 do Código de Processo Civil.

Lendo as alegações de recurso bem como as conclusões formuladas pelo Recorrente as questões concretas de que cumpre conhecer são apenas as seguintes:


1ª- Não há nexo de causalidade entre o facto ilícito e o dano, pois que não está provado que o Autor não investiria em Obrigações DD acaso tivesse tido acesso a informação exaustiva e detalhada sobre o produto em causa, sendo esta presunção nula?

2ª- Não há qualquer fundamento para a aplicação da taxa de juros moratórios comerciais?

 

B) Vejamos a 1ª- questão: Não há nexo de causalidade entre o facto ilícito e o dano, pois que não está provado que o Autor não investiria em Obrigações DD acaso tivesse tido acesso a informação exaustiva e detalhada sobre o produto em causa, sendo esta presunção nula?


1 - O Recorrente começa por manifestar a sua indignação quanto à factualidade que foi dada como provada.

Porém, como bem refere nas suas alegações, não pode desconhecer quais são os poderes de cognição do Supremo Tribunal de Justiça nesta matéria.

O Tribunal da Relação alterou a matéria de facto que vinha dada como provada pela 1.ª instância e fê-lo no uso dos seus poderes, não se vislumbrando que tenha feito um uso errado desses mesmos poderes.

A Relação analisou a prova testemunhal e documental e entendeu que a factualidade provada devia ser alterada (corrigida).

Era corrente afirmar-se que a Relação não alterava a matéria de facto não fazendo uso dos poderes de que dispunha, agora que a Relação, ao contrário do que sucedia, altera a matéria de facto afirma-se, frequentemente, que despreza a imediação e se abstrai por completo da decisão proferida na primeira instância.

Ora, no caso concreto como se disse, e cada situação apresenta uma singularidade própria, a Relação não exorbitou dos seus poderes de cognição da matéria de facto.

O Recorrente pode exprimir a sua «surpresa e revolta», como afirma nas suas alegações, porém os factos que foram dados como provados não podem ser alterados.

 

2 - O Recorrente entende que foram violados diversos preceitos legais, mais concretamente o disposto nos artigos 349, 351, 563 e 798 todos do CC.

a) O Direito

O artigo 349.º do Código Civil dá-nos a noção de «presunções», afirmando que «Presunções são as ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido».

E, nos termos do artigo 351.º do mesmo diploma legal, relativo às «Presunções judiciais» as «presunções judiciais só são admitidas nos casos e termos em que é admitida a prova testemunhal».

No que ao nexo de causalidade concerne, estatui o artigo 563.º do Código Civil que «a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão».

Por último, dispõe o artigo 798.º do Código Civil, relativo à Responsabilidade do devedor, que «O devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor».

b) A presunção

O recorrente insurge-se contra a posição assumida pelo Tribunal da Relação afirmando que, face à insuficiência da matéria de facto, veio o Tribunal a «invocar uma presunção judicial de que o A. não teria subscrito o mesmo produto financeiro acaso tivesse perfeito e exaustivo conhecimento das suas reais características».

Ora, como bem observa o Recorrente o Tribunal pode socorrer-se de presunções judiciais.

E pode fazê-lo, aceitamos, nos termos indicados pelo Recorrente «a presunção judicial implica: (i) um facto conhecido, estabelecido no processo, (ii) um juízo de normalidade ou razoabilidade sindicável, (iii) a afirmação de um facto desconhecido com base na sequência dos pressupostos anteriores».

O Acórdão afirma que «o apelante não teria aplicado as suas poupanças nas obrigações DD se conhecesse as suas verdadeiras características» e que «não é plausível que (o A.) tivesse tomado a decisão de subscrever estas obrigações se lhe tivesse sido dito, pelos funcionários do apelante, que corria o risco de perder todo ou parte do seu dinheiro no caso de insolvência da sociedade emitente dessas obrigações».

Estas afirmações nenhuma censura nos merecem ao contrário do que pretende o recorrente.

Estamos perante uma leitura dos factos provados, é certo com recurso a ilações, mas que estão dentro dos poderes da Relação (artigos 662 e 607 n.º 4, ambos do CPC e 349 e 351 supra citados), sendo que esta matéria não é sindicável pelo Supremo (artigo 662 n.º 4 e 674 n.º 3, ambos do CPC).

Como se afirma no Ac. do STJ de 05.12.2017 «Não estando em causa a violação de lei substantiva, nem, no limite, a manifesta ilogicidade do juízo presuntivo (ASTJ de 29.9.2016, in www.dgsi.pt), nada há a censurar».

Podemos deste modo afirmar, seguindo de perto o Ac. STJ de 2.11.2017 que «nos termos do artigo 674.º, n.º 3, do CPC, o erro na apreciação das provas não é sindicável perante o tribunal de revista, salvo nas hipóteses ali ressalvadas, nelas se incluindo, segundo jurisprudência corrente neste Supremo, ainda que não de todo pacífica, a sindicância das presunções judiciais quando se verifica através delas ofensa de disposição legal ou manifesta ilogicidade.

Não compete pois ao tribunal de revista sindicar o erro na livre apreciação das provas, salvo quando, nos termos do citado normativo, a utilização desse critério de valoração ofenda uma disposição legal expressa que exija espécie de prova diferente para a existência do facto ou que fixe a força probatória de determinado meio de prova, ou ainda quando aquela apreciação ostente juízo de presunção judicial revelador de manifesta ilogicidade».

No caso dos autos é manifesto e evidente que não se mostra violado qualquer preceito legal imperativo nem o raciocínio seguido pelo Tribunal se mostra manifestamente ilógico.

Deste modo, ao contrário do que pretende o Recorrente, não se vislumbra qualquer motivo ou razão par se considerar nula (artigo 195 n.º 1 do CPC) a presunção retirada pela Relação.

c) O Nexo de causalidade

Dispõe o artigo 563º do Código Civil que “a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”.

Consagra a nossa lei a teoria da «causalidade adequada» ou seja, para que um facto seja causa adequada de um determinado evento, «não é de modo nenhum necessário que o facto, só por si, sem a colaboração de outros, tenha produzido o dano», sendo essencial que o «facto seja condição do dano, mas nada obsta a que, como vulgarmente sucede, ele seja apenas uma das condições desse dano», Cfr. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol. I, página 654.

Ora, das regras da experiência comum podemos facilmente retirar, como retirou a Relação, a conclusão (a presunção) de que o Autor não teria tomado a decisão de subscrever «as obrigações se lhe tivesse sido dito, pelos funcionários do apelante, que corria o risco de perder todo ou parte do seu dinheiro no caso de insolvência da sociedade emitente dessas obrigações».

Deste modo, ao contrário do defendido pelo Recorrente, está provado não só o «nexo naturalístico» como também se pode e deve concluir pela verificação do nexo causal entre aquele facto e os prejuízos sofridos pelo Autor.

Ocorre, pois, o nexo de causalidade exigível para a responsabilização do Recorrente pelos danos sofridos pelo Autor.

d) A Responsabilidade do Recorrente

Nas suas alegações e nas suas conclusões o Recorrente apenas invoca que não há factos provados dos quais se possa sustentar qualquer tipo de causalidade entre o facto ilícito e o dano, ou seja que não existe nexo de causalidade entre a conduta do Recorrente (dos seus funcionários) e os danos sofridos pelo Autor.

Como já se deixou dito os factos provados permitem concluir com suficiente clareza que o Autor não teria investido nas obrigações da SLN se tivesse conhecimento (se estivesse devidamente informado) das suas verdadeiras características.

Resulta da factualidade provada que o Autor subscreveu as obrigações porque os funcionários do recorrente lhe «Apresentaram o produto como produto da DD, que detinha a 100% o Banco, assegurando-lhe ser uma aplicação com o prazo de 10 anos, sem risco de perda do capital, com a mesma segurança de um depósito a prazo, sendo garantido o reembolso do capital no vencimento, com taxa atractiva e liquidez por endosso» e porque «Foi por ter ficado convencido, dada a confiança que depositava nos funcionários do apelante da agência de …, de que se tratava de um produto com as características descritas no ponto 7, que o A. subscreveu as referidas obrigações».

Não podemos esquecer a conduta dos funcionários do Recorrente expressa no ponto 10 dos factos provados «O então director coordenador, num mail dirigido aos funcionários do banco com um apelo à venda aos clientes de obrigações da DD, escreveu: "relembro que a DD Valor é a maior accionista da DD SGPS (31 por cento), que por sua vez detém 100 por cento do Banco BB, ou seja, na prática estamos a "vender" o equivalente a um depósito a prazo, com uma excelente taxa ... quando o cliente efectua um depósito a prazo no Banco BB está a comprar "risco" Banco BB ... não vejo diferenças».

Entendemos que se mostram verificados todos os pressupostos necessários – concretamente verifica-se a existência do «nexo de causalidade entre o facto ilícito e o dano» - para se concluir pela responsabilidade do recorrente.


Saliente-se que o recorrente não coloca em causa a qualificação jurídica operada pela Relação, que igualmente aceitamos, sendo então claro que estamos no âmbito da actividade de intermediação financeira (e de um contrato de intermediação) exercida pelo Recorrente, que o Recorrente (através dos seus funcionários) violou os deveres de informação a que estava vinculado, estando obrigado a indemnizar o Autor pelos prejuízos sofridos.

Poder-se-á questionar qual o montante dos danos sofridos pelo Autor, pois que nos termos do supra citado artigo 563º do Código Civil a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão (o Recorrente, desde logo questiona o montante dos juros).

Dever-se-á ter em consideração o estatuído nos artigos 562, 566, 564, 798 todos do Código Civil.

Provou-se que o Autor investiu certas quantias em obrigações convencido que estava a subscrever um produto equivalente a depósitos a prazo.

O dano do autor deve resultar ou deve traduzir-se na diferença entre a situação que o autor ficou e a situação em que o autor estaria se o dever de informação tivesse sido cumprido.

Desde logo, o Autor tem direito ao valor investido (150.000,00 + 100.000,00) acrescido de juros moratórios à taxa legal contados a partir das datas em que os montantes investidos nas obrigações deveriam ter sido reembolsados (19.10.2014 para as obrigações subscritas em 2004 e 09.05.2016, para as obrigações subscritas em 2006).

Isto é o que sucede com qualquer depósito a prazo (o Banco devolve o capital mais os juros remuneratórios que se foram vencendo)

O autor teve um dano directo derivado de ter aplicado aquelas quantias e de não as ter recuperado nas datas em que as mesmas lhe deveriam ter sido disponibilizadas.

No caso concreto o Autor viu o capital que investiu em 2004 ser remunerado (facto provado n.º 17) mas desconhecemos a que taxa.

Também é inequívoco que o autor é titular das obrigações que adquiriu sendo certo que as mesmas têm valor (apesar da insolvência da DD).

Desconhecemos o valor que as obrigações adquiridas pelo autor ainda podem representar.

Ora, na indemnização devida ao autor deve ser descontado não só o valor que as obrigações ainda representam mas também o valor dos juros remuneratórios que recebeu e que excedam o valor dos juros que teria recebido se o capital estivesse aplicado num depósito a prazo.

Todavia, nos autos não há elementos que nos permitam, com segurança, efectuar tais operações contabilísticas, não é possível determinar o concreto prejuízo ou dano do autor.

Não sabemos nem o valor que as obrigações podem ainda alcançar nem quais os juros remuneratórios que o autor auferiu e que não auferiria se tivesse aplicado o capital num depósito a prazo.

O processo não tem elementos que nos permitam determinar o valor da indemnização, pelo que se impõe apenas condenar o Banco Réu a pagar ao Autor a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença, tendo em consideração os critérios supra referidos (artigo 609 n.º 2 do Código de Processo Civil).

Assim, entendemos que apesar de ser inequívoca a responsabilidade do Recorrente verificando-se todos os pressupostos da obrigação de indemnizar, (o facto, a ilicitude, o nexo de imputação do facto ao agente, o dano e o nexo de causalidade entre este e o facto), a condenação – nos termos em que foi efectuada pela Relação – não se pode manter, pois que o Banco/recorrente apenas é responsável pelo dano efectivamente causado ao Autor, dano esse que neste momento não é possível determinar (pois que se o autor tem direito ao valor investido (150.000,00 + 100.000,00) acrescido de juros moratórios à taxa legal contados a partir das datas em que os montantes investidos nas obrigações deveriam ter sido reembolsados (19.10.2014 para as obrigações subscritas em 2004 e 09.05.2016, para as obrigações subscritas em 2006) a este valor deve se descontado não só o valor que as obrigações ainda representam mas também o valor dos juros remuneratórios que recebeu e que excedam o valor dos juros que teria recebido se o capital estivesse aplicado num depósito a prazo).

Impõe-se, deste modo a procedência parcial desta questão arguida pelo Recorrente

 

2ª- Resolvida a primeira questão vejamos a segunda: Não há qualquer fundamento para a aplicação da taxa de juros moratórios comerciais?

Consta do Acórdão recorrido – a fls. 37 – que para além do capital são devidos juros de mora contados …«à taxa supletiva para as operações comerciais».

O Recorrente insurge-se contra esta decisão.

E com razão o faz.

Efectivamente, se o artigo 806 do Código Civil prevê expressamente que a indemnização por mora, no caso particular das obrigações pecuniárias, corresponde ao pagamento de juros já o art. 1029 do Código Comercial, prevê-se já, no seu § 3º, que os juros moratórios de que sejam titulares empresas comerciais são fixados por portaria conjunta dos Ministérios das Finanças e da Justiça.

Significa isto que os juros de mora comerciais apenas se aplicam nos casos em que a empresa comercial seja credora.

Nada nos autos aponta para que o Autor seja um «comerciante», uma empresa comercial, pelo que não há fundamento para a aplicação da referida taxa de juros moratórios comerciais.

Os juros de mora devidos são os juros civis fixados nos termos do n.º 1 do artigo 559.º do Código Civil que dispõe «os juros legais e os estipulados sem determinação de taxa ou quantitativo são os fixados em portaria conjunta dos Ministros da Justiça e das Finanças e do Plano».

Impõe-se, assim a procedência desta questão e, consequentemente a procedência parcial da presente Revista.

Em suma, entendemos que se impõe a procedência parcial das alegações da recorrente, pelo que se concede a procedência parcial da presente Revista.


III – DECISÃO

Pelo exposto, decide-se conceder parcialmente a revista e, em consequência revoga-se o Acórdão recorrido, e decide-se condenar o Banco/recorrente a pagar ao Autor a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença (a qual deverá ter em consideração que se o autor tem direito ao valor investido (150.000,00 + 100.000,00) acrescido de juros moratórios à taxa legal contados a partir das datas em que os montantes investidos nas obrigações deveriam ter sido reembolsados (19.10.2014 para as obrigações subscritas em 2004 e 09.05.2016, para as obrigações subscritas em 2006) a este valor deve se descontado não só o valor que as obrigações ainda representam mas também o valor dos juros remuneratórios que recebeu e que excedam o valor dos juros que teria recebido se o capital estivesse aplicado num depósito a prazo).

Custas pelo Recorrente e recorrido na proporção de vencidos.  


Lisboa, 5 de Maio de 2018


José Sousa Lameira (Relator)

Hélder Almeida

Maria dos Prazeres Pizarro Beleza (com Voto de Vencida) *


*


1. Vencida. Teria anulado o acórdão recorrido para que eliminasse a contradição que me parece existir entre a presunção que lhe permitiu dar como verificado o nexo de causalidade entre o acto ilícito e os danos, e ainda para que ampliasse a matéria de facto, concretizando factos sobre os quais fosse possível construir essa presunção, ou outra de sinal contrário (por exemplo, concretizando o perfil do autor, em vez de dar como assente que era conservador, conclusiva e não justificadamente).
2. Em muito breve síntese: sendo o acto ilícito o incumprimento do dever de informação, o dano indemnizável só pode ser, segundo a teoria da causalidade adequada, o que resultou desse incumprimento, incluindo-o numa cadeia factual que, naturalística e juridicamente, o tenha causado.
3. O acórdão entendeu que o Supremo Tribunal de Justiça não pode censurar presunções judiciais, extraídas pela Relação no âmbito dos seus poderes de fixação da matéria de facto; jurisprudência que subscrevo. O que não é o mesmo que verificar se essas presunções se apoiam em matéria de facto provada no processo, ou contrariam factos havidos como não provados em 1ª instância, o que se tem entendido não ser admissível.
No caso, penso que dos factos provados e não provados não resulta essa base: desde logo, porque me parece ser contraditório aditar aos factos provados o ponto 20-a) “Foi por ter ficado convencido (…) de que se tratava de um produto com as características descritas no ponto 7.”, ou seja, “uma aplicação com o prazo de 10 anos, sem risco de perda de capital, com a mesma segurança de um depósito a prazo, sendo garantido o capital no vencimento, com taxa atractiva e liquidez por endosso”– e manter nos factos não provados o respectivo ponto 4: “O A. estava convencido de que se tratava de um produto do tipo depósito a prazo”.
Para além disso, faltam factos concretos que permitam estabelecer o nexo com os prejuízos alegados, e que necessariamente passam pelas consequências concretamente decorrentes da declaração de insolvência da..., SA.
Maria dos Prazeres Pizarro Beleza