Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
| Processo: |
| ||
| Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
| Relator: | SALVADOR DA COSTA | ||
| Descritores: | NOTIFICAÇÃO POSTAL PRESUNÇÃO ILISÃO REJEIÇÃO DE RECURSO DESPACHO DE MERO EXPEDIENTE RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA CASO JULGADO CONSTITUCIONALIDADE | ||
| Nº do Documento: | SJ20071011030247 | ||
| Data do Acordão: | 10/11/2007 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | REVISTA | ||
| Decisão: | NEGADA | ||
| Sumário : | 1. O incidente de prova do contrário do que resulta da base da presunção a que se reporta o nº 6 do artigo 254º do Código de Processo Civil não justifica a prática de algum acto processual fora de prazo, antes visando apurar diverso momento do início de contagem de um prazo para a sua prática, para se concluir que o foi no prazo para o efeito legalmente previsto. 2. É ao notificando que incumbe a iniciativa e a demonstração em juízo, com vista à determinação do início do prazo para a prática do acto processual por ele pretendido, que a notificação do acto ocorreu em data posterior à presumida por razões que lhe não sejam imputáveis. 3. O despacho do relator por via do qual, sob reclamação do recorrente, revogou o seu despacho anterior de não admissão do recurso de revista com fundamento na sua extemporaneidade e o admitiu, não é de mero expediente. 4. Do referido despacho não cabia recurso, mas reclamação para a conferência e, porque a mesma ocorreu tempestivamente por iniciativa da recorrida, ele não transitou em julgado. 5. A decisão da Relação que, substituindo o despacho do relator, se pronuncia no sentido da não admissibilidade do recurso por extemporaneidade, não infringe os artigos 12º, nº 1, 16º ou 20º, nºs. 1, primeira parte, 4 e 5, da Constituição. | ||
| Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I AA instaurou, no dia 13 de Março de 2000, contra a Construtora BB, SA, acção declarativa de condenação com processo ordinário, pedindo a sua condenação a pagar-lhe 35 0000 00$ e juros, com fundamento na omissão de pagamento dos seus honorários de advogado relativamente ao seu serviço contratado e prestado na providência cautelar por ela intentada contra a Cooperativa CC que correu termos por apenso à acção com processo ordinário nº 1916/98. A ré, em contestação, afirmou, por um lado, que o procedimento de arresto começou em Agosto de 1998 e que as relações profissionais estabelecidas entre ela e o autor se regem desde 1 de Outubro de 1997 por contrato entre ambos celebrado. E, por outro, que segundo esse contrato, ele receberia 120 000$ mensais, e que, quanto ao arresto, receberia 1 000 000$ no termo do processo, acrescentando que em Dezembro de 1998 lhe adiantou 1 050 000$ e serem os honorários peticionados desproporcionados. O autor replicou no sentido de o contrato vigorar somente a partir de Janeiro de 1999 e ser nulo por contrariar o disposto no artigo 66º do Estatuto da Ordem dos Advogados e que os recibos que emitiu e juntou respeitam à quantia de 120 000$ mensais e a provisões efectuadas. A ré treplicou, sustentando que o contrato não é nulo e, se o fosse, a pretensão do autor traduzir-se-ia em venire contra factum proprium, e, realizado o julgamento, foi proferida sentença, no dia 11 de Novembro de 2005, por via da qual a ré foi condenada a pagar ao autor dez mil euros e juros de mora desde a citação, à taxa anual de 7% até à entrada em vigor da Portaria nº 291/2003, de 8 de Abril, e, desde então, à taxa anual de 4%. Apelou o autor, e a Relação, por acórdão proferido no dia 2 de Novembro de 2006, negou provimento ao recurso, e o primeiro interpôs dele recurso de revista, mas o relator não o admitiu, com fundamento na sua extemporaneidade, o recorrente reclamou do referido despacho, sob o fundamento de haver ilidido a presunção de notificação do acórdão no terceiro dia útil posterior ao do registo, ao que a recorrida se opôs. O relator, por despacho proferido no dia 26 de Fevereiro de 2007, julgou a reclamação do recorrente pertinente, admitiu o recurso de revista, e a recorrida requereu, no dia 13 de Março de 2007, que a conferência se pronunciasse sobre a questão. A Relação, por acórdão proferido no dia 19 de Abril de 2007, declarou a inadmissibilidade do referido recurso, o recorrente reclamou dele, expressando que se não fosse julgada procedente a sua reclamação, que se considerasse interposto recurso de agravo daquele acórdão. O relator da Relação, depois de expressar não poder alterar-se o acórdão reclamado, admitiu o aludido recurso de agravo, e o recorrente nele formulou, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - a decisão do relator acerca da tempestividade ou extemporaneidade de um requerimento de interposição de recurso é de mero expediente, susceptível de recurso de agravo e não de julgamento pela conferência; - o acórdão é nulo porque, decidindo em contrário, desrespeitou o disposto nos artigos 668º, nº 1, alínea d), parte final, 669º, nº 3, 672º e 700º, nº 3, do Código de Processo Civil; - por não ter havido recurso de agravo do referido despacho de mero expediente, transitou em julgado o despacho que admitiu o recurso de revista; - a decisão de submeter à conferência a segunda reclamação da recorrida depois do decurso do prazo concedido a recorrente para alegar viola o princípio do alcance do caso julgado e os artigos 673º, parte final, 675º, 677º, 700º, nº 4 e 707º, nº 2, do Código de Processo Civil; - a decisão recorrida viola os prazos que a lei estabelece para actuação de todos os intervenientes processuais, contra, designadamente, o preceituado nos artigos 2º e 160º do Código de Processo Civil; - ela viola também princípios básicos da segurança jurídico-judicial e os artigos 12º, nº 1, 16º e 20º, nº 1, 1ª parte, e 4 e 5, da Constituição, e ao pretender impedir a superior apreciação do caso, acabaria por transformar-se, contra o esperado de um Estado de direito, numa decisão em causa própria; - deverá ser reconhecido ao recorrente o direito de apreciação e julgamento do recurso de revista. Respondeu a recorrida em síntese de conclusão: - a parte que se considere prejudicada por despacho do relator que não seja de mero expediente pode requerer que sobre a matéria recaia acórdão; - a decisão que admite o recurso, fixe a sua espécie ou determine o efeito que lhe compete não vincula o tribunal superior, e o despacho do relator é modificável pela conferência por sua iniciativa, dos adjuntos ou das partes; - o despacho do relator que rectificou o despacho anterior e deliberou admitir o recurso de revista não é de mero expediente, porque decidiu a questão concreta de admissibilidade ou não de um recurso em função da sua tempestividade; - não há violação do princípio do caso julgado, porque a reclamação para a conferência é o único meio de impugnação dos despachos do relator; - a interposição de recurso, o pedido de esclarecimento ou a arguição de nulidade do despacho do relator não deve ser atendida, por inadequada, sendo insusceptível de evitar o respectivo trânsito em julgado. II É a seguinte a dinâmica processual que releva na decisão do recurso: 1. Foi remetido para o correio sob registo, no dia 6 de Novembro de 2006, dirigido ao endereço do escritório do mandatário judicial do recorrente, instrumento de notificação por carta do acórdão da Relação proferido no dia 2 de Novembro de 2006. 2. No dia 7 de Novembro de 2006 os serviços dos correios diligenciaram, mas não conseguiram a entrega da carta mencionada sob 1 ao mandatário do recorrente, regressou à estação de depósito no dia imediato e só foi conseguida a sua entrega àquele no dia 15 daquele mês. 3. O recorrente remeteu o instrumento de interposição do recurso de revista do mencionado acórdão por carta registada no correio no dia 24 de Novembro de 2006, o relator da Relação, por despacho proferido no dia 7 de Dezembro de 2006, declarou não o receber sob o fundamento de o prazo de interposição haver terminado no dia 20 daquele mês. 4. O recorrente reclamou, no dia 20 de Dezembro de 2006, sob o fundamento de apenas ter recebido a carta de notificação no dia 15 de Novembro de 2006, concluindo estar ilidida a presunção e ser o recurso tempestivo, ao que a recorrida se opôs na resposta que apresentou no dia 9 de Fevereiro de 2007. 5. O relator da Relação, por despacho proferido no dia 26 de Fevereiro de 2007, sob o argumento de a carta ter sido entregue ao recorrente no dia 15 de Novembro de 2006, de estar ilidida a presunção de notificação e dever ser considerada feita nessa data, declarou rectificar o despacho anterior e julgar tempestiva a admissão do recurso. 6. A recorrida requereu, no dia 13 de Março de 2007, a pronúncia da conferência sobre a tempestividade ou não da interposição daquele recurso, e o recorrente apresentou no dia 12 de Abril 2007, o instrumento de alegações relativas ao recurso de revista, que não foi mandado desentranhar. 7. A Relação, por acórdão proferido no dia 19 de Abril de 2007, sob o argumento de o recorrente não ter diligenciado pela ilisão da presunção da data da notificação aquando da interposição do recurso, declarou a inadmissibilidade do recurso por ser intempestivo. 8. O recorrente reclamou, no dia 8 de Maio de 2007, do mencionado acórdão, mas o relator da Relação, por despacho proferido no dia 31 daquele mês, declarou não poder ser reapreciada pela Relação a decisão contida no acórdão, por dela ser admissível recurso. III A questão essencial decidenda é a de saber da legalidade ou não do acórdão da Relação que declarou a inadmissibilidade do recurso de revista do seu anterior acórdão por intempestividade. A resposta à referida questão processual pressupõe a análise da seguinte problemática: - ilidiu ou não o recorrente a presunção de notificação do acórdão da Relação no terceiro dia posterior à data do registo da carta no correio? - transitou ou não em julgado o despacho do relator da Relação que admitiu o recurso de revista? - está ou não o acórdão recorrido afectado de nulidade por excesso de pronúncia? - implica a interpretação da lei pela Relação algum vício de inconstitucionalidade? - síntese da solução para o caso espécie decorrente da dinâmica processual envolvente e da lei Vejamos, de per se, cada uma das referidas subquestões. 1. Comecemos pela subquestão de saber se o recorrente ilidiu ou não a presunção de notificação do acórdão da Relação no terceiro dia posterior à data do seu registo no correio. O meio processual específico de que o recorrente dispunha para reagir contra a não admissão do recurso era a reclamação para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça no prazo de dez dias contado da notificação do despacho de não admissão (artigo 688º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil). Todavia, o recorrente assim não procedeu, optando pela reclamação do despacho do relator, em que teve êxito, porque o relator, revogando o seu despacho anterior, admitiu o recurso. A notificação postal presume-se feita no terceiro dia posterior ao do registo, ou no primeiro dia útil seguinte a esse, caso o não seja (artigo 254º, nº 3, do Código de Processo Civil). Com vista à consideração de notificação presumida, a lei estabelece a dilação de três dias sobre a data do registo da carta, tempo durante a qual considera com suficiente margem de segurança um eventual atraso nos serviços do correio. Exige, porém, que a notificação ocorra num dia útil, o terceiro posterior ao do registo ou o primeiro dia útil seguinte, em termos de o epílogo do prazo, para efeito de presunção da notificação coincidir com um dia normal de distribuição domiciliária de correspondência. A lei considerou normal, por isso presumiu, até prova em contrário, que a notificação se efectua no terceiro dia posterior ao do registo no correio, ou seja, provado o facto base da presunção, a expedição da carta sob registo no correio dirigida a determinada pessoa, fica assente o facto desconhecido de a carta lhe ter sido entregue no terceiro dia útil posterior ao do registo ou no primeiro dia útil seguinte (artigos 349º e 350º do Código Civil). A prova do contrário visa demonstrar que a carta de notificação não foi entregue ao notificando ou o foi em dia posterior à presumida por razões que lhe não sejam imputáveis (artigo 254º, nº 6, do Código de Processo Civil). Com o referido incidente de prova do contrário do que resulta da base da presunção, não se justifica a prática de algum acto fora de prazo, mas apura-se diverso momento de início de contagem de um prazo para a prática de determinado acto processual, para se concluir que o foi no prazo para o efeito legalmente previsto. É ao notificando que incumbe demonstrar em juízo, com vista à determinação do início do prazo para a prática do acto processual por ele pretendido, que a notificação ocorreu em data posterior à presumida por razões que lhe não sejam imputáveis. Alegou o recorrente que só detectou a extemporaneidade do requerimento do recurso quando foi notificado da sua não admissão. Todavia, podia conhecer da data de notificação do acórdão resultante da presunção na altura da entrega que lhe foi feita da carta registada, no dia 15 de Novembro de 2006. Assim, podia o recorrente conhecer, com a entrega da carta registada em causa no dia 15 de Novembro de 2006, a data da sua expedição postal, mas não deduziu o incidente de ilisão da presunção de notificação do acórdão no dia 9 do mesmo mês por razões ao mesmo não imputáveis. Em consequência, a Relação cumpriu a lei ao considerar que o recorrente apresentou o instrumento de interposição do recurso para além do prazo de dez dias de que dispunha para o efeito, contado desde a data da notificação presumida. 2. Atentemos agora sobre se transitou ou não em julgado o despacho do relator da Relação que admitiu o recurso de revista. Entendeu o recorrente em sentido afirmativo sob o argumento de que se trata de despacho de mero expediente, susceptível de recurso não interposto pela recorrida. Os despachos de mero expediente são os que se destinam a prover ao andamento do processo, sem interferir no conflito de interesses entre as partes (artigo 156º, nº 4, primeira parte, do Código de Processo Civil). Ora, os referidos despachos de mero expediente não admitem recurso (artigo 679º do Código de Processo Civil). Em quadro de controvérsia entre o recorrente a recorrida sobre a admissibilidade ou não do recurso de revista em função do respeito ou não pelo primeiro do respectivo prazo, o relator da Relação decidiu a questão no sentido afirmativo. Não se trata, pois, de um despacho destinado a regular, de harmonia com a lei, os termos do processo, certo que interferiu no conflito de interesses entre as partes, pelo que não é de mero expediente, e, consequentemente, queda inaplicável o disposto no nº 2 do artigo 160º do Código de Processo Civil. Por não se traduzir em despacho de mero expediente, podia a recorrida dele interpor recurso se a lei realmente o admitisse (artigo 679º do Código de Processo Civil). Mas não é esse o caso. Com efeito, salvo o disposto no artigo 688º do Código de Processo Civil, quando a parte se considerar prejudicada por qualquer despacho do relator, que não seja de mero expediente, pode requerer que sobre a matéria recaia um acórdão, situação em que o relator, ouvida a parte contrária, deve submeter o caso à conferência (artigo 700º, n.º 3, do Código de Processo Civil). A ressalva concernente ao disposto no artigo 688º do Código de Processo Civil, conforme resulta do n.º 1 deste artigo, reporta-se à reclamação para o presidente do tribunal que deveria conhecer do recurso dos despachos de não admissão ou de retenção de recursos, que no caso espécie não está em causa. Perante este quadro legal, a conclusão é no sentido de que, na espécie, o único meio processual de impugnação do despacho proferido pelo relator da Relação era o requerimento de prolação de acórdão pela conferência sobre a questão da admissibilidade ou não do recurso de revista. E foi isso que ocorreu no caso vertente, pelo que não tem fundamento legal a alegação do recorrente de que transitou em julgado o referido despacho do relator da Relação, certo que a recorrida requereu tempestivamente que sobre a matéria objecto do despacho do relator em causa fosse proferido acórdão pela conferência, o qual foi proferido em sentido diverso da decisão do relator. Consequentemente, não há violação do caso julgado formal, ou seja, não ocorre a ofensa do disposto nos artigos 672º, 673º, 675º ou 677º do Código de Processo Civil, que o recorrente invocou. 3. Vejamos agora se o acórdão recorrido está ou não afectado de nulidade por excesso de pronúncia. Expressa a lei que o acórdão da Relação é nulo quando conheça de questões de que não podia tomar conhecimento (artigos 668º, nº 1, alínea d), e 716º, nº 1, do Código de Processo Civil). O juiz não pode, porém, ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras (artigo 660º, nº 2, 2ª parte, do Código de Processo Civil). Importa, porém, ter em linha de conta que uma coisa são os argumentos ou as razões de facto e ou de direito, e outra, essencialmente diversa, as questões de facto ou de direito. As questões a que se reporta a alínea d) do nº 1 do artigo 668º do Código de Processo Civil são os pontos de facto e ou de direito relevantes no quadro do litígio. Julgada procedente a nulidade decorrente de omissão de pronúncia pela Relação, se for caso disso, impõe-se a baixa do processo a fim de aquele Tribunal operar a reforma do acórdão (artigo 731º, nº 2, do Código de Processo Civil). No caso de se julgar procedente a nulidade decorrente de excesso de pronúncia, este Tribunal deve supri-la, declarando em que sentido a decisão deve considerar-se modificada e conhecer dos outros fundamentos do recurso (artigo 731º, nº 2, do Código de Processo Civil). Ora, sucede que a Relação, ao conhecer, sob requerimento da recorrida, da matéria que foi objecto do despacho revogatório do relator, não excedeu o objecto de que podia conhecer, pelo que não há vício de limites nem a nulidade invocada pelo recorrente. Ademais, não é aplicável, na espécie, o disposto no nº 3 do artigo 669º nem o que se prescreve no nº 2 do artigo 707º, ambos do Código de Processo Civil. 4. Atentemos agora sobre se a interpretação da lei pela Relação no acórdão recorrido implica ou não algum vício de inconstitucionalidade. Os tribunais, nas causas que lhes são submetidas a julgamento, não podem aplicar normas que infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consignados (artigo 204º da Constituição). Afirmou o recorrente que o acórdão recorrido viola princípios básicos da segurança jurídico-judicial e as normas dos artigos 12º, nº 1, 16º e 20º, nº 1, primeira parte e nºs 4 e 5 da Constituição. O artigo 12º, nº 1, da Constituição, sob a epígrafe princípio da universalidade, expressa que todos os cidadãos gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres nela consignados. O artigo 16º da Constituição, sob a epígrafe âmbito e sentido dos direitos fundamentais, expressa, por um lado, no seu nº 1, que os direitos fundamentais nela consignados não excluem quaisquer outros constantes das leis e das regras aplicáveis de direito internacional. E, por outro, no seu nº 2, que os preceitos constitucionais e legais relativos aos direitos fundamentais devem ser interpretados e integrados de harmonia com a Declaração Universal dos Direitos do Homem. Finalmente, sob a epígrafe acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva, o artigo 20º, nº 1, primeira parte, da Constituição estabelece ser a todos assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos. Os seus nºs 4 e 5 expressam, por seu turno, por um lado, todos terem direito a que a causa em que intervenham seja objecto de decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo. E, por outro, que para defesa dos direitos, liberdades e garantias pessoais, a lei assegura aos cidadãos procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade, de modo a obter tutela efectiva em tempo útil contra ameaças ou violações. Tendo em conta as referidas normas constitucionais e as normas ordinárias que a Relação aplicou no confronto com a dinâmica processual que ocorreu desde a prolação do acórdão proferido no recurso de apelação, a conclusão é no sentido de que o acórdão recorrido não afectou o mencionado princípio da universalidade, não excluiu algum direito fundamental nem negou o acesso ao direito e aos tribunais para defesa de direitos ou interesses. Acresce que não houve violação do princípio do processo equitativo nem do princípio da protecção da confiança dos cidadãos e da comunidade na ordem jurídica e na actuação do Estado, ou seja, não afectou o mínimo de certeza e de segurança no direito das pessoas e nas expectativas que a elas são juridicamente criadas que decorrem do artigo 2º da Constituição. Apresentado o requerimento de interposição do recurso de revista para além do prazo contado desde a data da presumida notificação, não ilidida esta presunção, a solução decorrente da lei de processo, inspirada pela ideia de processo equitativo, não podia deixar de ser a de não admissão daquele recurso, que foi decidido tempestivamente por quem de direito e pelo modo processualmente adequado. Gerado o litígio sobre a admissibilidade ou não do recurso, a circunstância de o instrumento de alegação apresentado pelo recorrente no recurso de revista não ser mandado desentranhar é insusceptível de lhe gerar legítima expectativa de apreciação superior do seu objecto à margem do que resultar do julgamento daquele litígio. Acresce que, ao invés do que o recorrente alegou, na situação em causa, face ao resultado processual do mencionado litígio, se não figura como decisão em causa própria. 5. Vejamos finalmente a síntese da solução para o caso decorrente da dinâmica processual envolvente e da lei. O recorrente não ilidiu a presunção de notificação do acórdão da Relação proferido no recurso de apelação no terceiro dia posterior à data do registo da carta no correio, ou seja, no dia 9 de Novembro de 2006. Quando no dia 24 de Novembro de 2006 apresentou o instrumento de interposição do recurso de revista, depois do decurso do decêndio legalmente previsto para o efeito, já extinto estava por caducidade, na espécie, o seu direito de recorrer. O meio processual de que o recorrente dispunha para impugnar o despacho do relator da Relação de não recebimento do recurso de revista era a reclamação para o presidente do Supremo Tribunal de Justiça. O despacho do relator da Relação revogatório do seu despacho anterior de não admissão do recurso e de admissão deste não é de mero expediente, mas dele não cabia recurso, mas reclamação para a conferência. Como a recorrida requereu atempadamente que sobre tal despacho recaísse acórdão da conferência, certo é que ele não transitou em julgado. O acórdão recorrido não está afectado de nulidade por excesso de pronúncia ou vício de limites e a interpretação das normas ordinárias que aplicou não suscita algum vício de inconstitucionalidade. Improcede, por isso, o recurso. Vencido, é o recorrente responsável pelo pagamento das custas respectivas (artigo 446º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil). IV Pelo exposto, nega-se provimento ao recurso e condena-se o recorrente no pagamento das custas respectivas. Lisboa, 11 de Outubro de 2007. Salvador da Costa (relator) Ferreira de Sousa Armindo Luis |