Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
9242/06.4TBOER.L1.S1
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: ÁLVARO RODRIGUES
Descritores: CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO
CONTRATO INTUITU PERSONAE
CESSAÇÃO DO CONTRATO
JUSTA CAUSA
Data do Acordão: 01/16/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL - DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / CONTRATOS EM ESPECIAL.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - PROCESSO / INSTÂNCIA - PROCESSO DE DECLARAÇÃO / RECURSOS.
Doutrina:
- J. Baptista Machado, Pressupostos da Resolução por Incumprimento, in Estudos em homenagem ao Prof. Doutor J. J. Teixeira Ribeiro, 2º, pp. 359, 361.
- M. Januário da Costa Gomes, «Em Tema de Revogação do Mandato Civil» apud Menezes Leitão, op. cit., p. 474.
- Menezes Leitão, Direito das Obrigações, vol. III, 3ª edição, pp. 472, 474.
- Pedro Romano Martinez, Da Cessação do Contrato, Almedina, 2ª Edição, pp. 461, 465.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 1170.º, N.º1, 1172.º.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 265.º, N.º1 IN FINE, 704.º, N.º2, 712.º, N.º6, 729.º, N.º1, 732.º-A, 732.º-B, 754.º, N.º2.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DESTE SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 13-11-2008, EM WWW.DGSI.PT
-DE 29-06-2010, Pº 476/99P1.S1, IN WWW.DGSI.PT .
Sumário :

I- «No domínio do Direito das Obrigações, o conceito de justa causa, como escreveu o Prof. Baptista Machado, «é um conceito indeterminado cuja aplicação exige necessariamente uma aplicação valorativa  do caso concreto. Será uma «justa causa»  ou um «fundamento importante» qualquer circunstância, facto ou situação em face da qual, e segundo a boa fé, não seja exigível a uma das partes a continuação da relação contratual; todo o facto capaz de fazer perigar o fim do contrato ou de dificultar a obtenção desse fim, qualquer conduta que possa fazer desaparecer pressupostos, pessoais ou reais, essenciais ao desenvolvimento do dever de correcção e lealdade ( ou ao dever de fidelidade na relação associativa). A «justa causa» representará, em regra uma violação dos deveres contratuais (e, portanto, um incumprimento): será aquela violação contratual que dificulta, torna insuportável ou inexigível para a parte não inadimplente a continuação da relação contratual».

II - O contrato de prestação de serviços, como o dos presentes autos, é o que a doutrina designa por contrato intuitu personae, vale dizer, contrato celebrado em razão da pessoa do contraente, que influi decisivamente para tal celebração. É em função das características pessoais e profissionais do prestador do serviço que o mesmo é contratado pela empresa para despenhar actividades de considerável complexidade técnica e de correspondente responsabilidade.

III- É patente a existência de vários pontos de afinidade entre o contrato de trabalho e o contrato de prestação de serviços de carácter técnico, não só pelo facto de ambos serem celebrados intuitu personae, como também porque ambos têm como objecto a prestação de determinadas actividades (trabalhos ou serviços) gerando-se uma relação de confiança pessoal entre os sujeitos contratuais, imprescindível à manutenção do vínculo e comportando deveres acessórios de conduta, designadamente de respeito ou correcção e de lealdade, cuja violação é susceptível de inquinar a relação existente, a ponto de se tornar inexigível a manutenção do vínculo estabelecido.

IV- Ninguém duvidará de que um técnico qualificado que presta serviços a uma empresa, ao dirigir-se por escrito a um dirigente da mesma proferindo afirmações como as que constam da presente decisão, coloca gravemente em causa a confiança que a dita empresa nele deposita e atenta, de forma objectiva e altamente censurável, contra a consideração e o respeito que é devido aos dirigentes da empresa a que presta serviço, tornando, com tal conduta ilícita e culposa, imediatamente inexigível a continuação do vínculo  contratual.

Decisão Texto Integral:

Acordam no SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

RELATÓRIO

AA intentou a presente acção declarativa com processo ordinário contra BB - Cash & Carry Portugal, SA, alegando, em resumo útil, o seguinte:

Em 1989 o A recebeu um convite para assinar um primeiro contrato com a R. mediante o qual assumia, na sua qualidade de técnico, a responsabilidade pela exploração das instalações eléctricas ali identificadas, com observância da legislação e normas de segurança aplicáveis, sendo que no caso de o proprietário pretender modificar ou ampliar as instalações eléctricas o técnico devia dar por escrito o competente parecer sem o que não podia ser responsabilizado pela não observância dos respectivos regulamentos.

Este contrato visava a actividade do A. junto das primeiras instalações da R., na Estrada da Circunvalação, em Lisboa.

Um 2º contrato idêntico foi celebrado para a loja da R. em Palmela, assim como os contratos relativos às lojas de Matosinhos, Gaia, Albufeira, Coimbra e Braga. Mais tarde foram integradas as lojas de Cascais e Faro.

Em 1 de Maio de 2003 foi outorgado o 10° e último contrato de prestação de serviços, desta feita para a loja de Leiria a última a ser aberta.

Os contratos seguiram de perto os estatutos do técnico responsável pela exploração.

O A. sempre se pautou pelo rigoroso cumprimento das normas regulamentares e dos princípios deontológicos a que está obrigado.

Sendo solicitado ao A. que avaliasse o projecto de electricidade referente à remodelação da loja de Matosinhos, ele apontou vários erros, incongruências e irregularidades. Apesar de ter sido dito ao A. que seria chamado para acompanhar a obra, outra entidade foi contratada e, ao inspeccionar a obra antes da vistoria do Ministério da Economia (Direcção Regional da Energia do Norte), encontrou irregularidades que colocou por escrito.

O A. passou a ser, então, face à R., alguém a afastar; a R. passou a adoptar uma atitude de desrespeito pelo serviço desenvolvido pelo A., desrespeitando leis e regulamentos.

Quando o A. fez saber que não poderia dar cobertura aos constantes atropelos à lei, tendo que denunciar a situação ao Ministério da Economia atenta a circunstância de a R. não cumprir o determinado pelo A. e, ainda, face à certeza, por parte da R., que o A. não seria testemunha no processo que terceira pessoa instaurara contra a R., esta denunciou os contratos de Leiria, Alfragide, Cascais e Faro, com efeitos a 1 de Maio de 2006.

Na sequência de carta que foi remetida pelo A. à R. foram dados por resolvidos por esta todos os contratos que mantinha com o A.

Pediu o A. a condenação da R. no pagamento da quantia de € 396.105, 60 a título de indemnização prevista contratualmente para o incumprimento das determinações técnicas do A. nos termos das cláusulas 11ª e 12ª, dos contratos de prestação de serviços; bem como no pagamento da quantia de € 24.006,00, a título de indemnização correspondente aos valores em falta até ao termo de cada um dos contratos pelo incumprimento; e ainda no pagamento da quantia de € 5.456,00 a título de indemnização prevista legalmente no art° 1172° do C.C..

Ou, caso assim se não entenda e em alternativa, ser a R. condenada:

– a proceder ao pagamento da quantia de € 32. 736,00 a título de indemnização prevista contratualmente para o incumprimento das determinações técnicas do A. nos termos das cláusulas 11ª e 12ª dos contratos de prestação de serviço;

– a proceder ao pagamento da quantia de € 24.006,00, a título de indemnização legalmente prevista no art° 1172° do CC e cláusula 10ª do CPS que importa os valores em falta até ao termo de cada um dos contratos, pelo incumprimento

– a proceder ao pagamento da quantia de € 5.456,00, a título de indemnização prevista legalmente no art° 1172° do C.C. pelo incumprimento do prazo de aviso prévio em falta.

– de qualquer modo, ser a R. condenada na sanção compulsória de € 500,00 por cada dia de atraso no pagamento da indemnização que vier a ser fixada e em juros desde a data do incumprimento.

Na sua contestação, a R. apresentou uma diversa versão dos factos ocorridos, invocou a revogação com justa causa dos contratos celebrados e concluiu pela improcedência da acção.

O processo prosseguiu e, na sua sequência, o A. requereu a junção aos autos pela R. de vários documentos, o que foi indeferido pelo despacho proferido a fls. 604-605.

Do despacho de indeferimento, interpôs o Autor recurso de Agravo para a Relação de Lisboa.

Após a tramitação, com observância das legais formalidades, foi efectuado o julgamento da acção e proferida sentença que, julgando a acção improcedente, absolveu a Ré do pedido.

Inconformado, o Autor apelou, sem sucesso, para a mesma Relação, que, pelo seu Acórdão de 11 de Abril de 2013, negou provimento ao Agravo e julgou improcedente a Apelação, confirmando o despacho e sentença recorridos.

Ainda inconformado, o Autor veio interpor recurso de Revista para este  Supremo Tribunal de Justiça, rematando a sua minuta recursória com as seguintes:

         CONCLUSÕES

1-        Vem o douto Acórdão de que se recorre decidir sobre três questões levadas á sua apreciação: Recurso de agravo – Junção de documentos requerida; Recurso de Apelação –alteração da decisão de facto; Recurso de Apelação - inexistência de revogação com justa causa.

2-        No tocante ao recurso de agravo a Relação de Lisboa considerou que o juiz decide sem conhecimento da natureza e conteúdo dos documentos pela pertinência da respectiva junção, no dizer do Acórdão," trata-se de controlar a pretensa idoneidade do documento através dos elementos, fornecidos"...

3-        O art° 529° refere no seu n° 2,-" Se os factos que a parte pretende provar tiverem interesse para a decisão da causa, será ordenada a notificação".

4-        O mencionado normativo permite e admite uma avaliação dos factos, a provar e não dos documentos ajuntar, porquanto estes são desconhecidos do julgador.

5-        Considera o Recorrente não estar em causa qualquer controlo da idoneidade do documento, e tanto assim é que o próprio acórdão de que se recorre acaba por se debruçar sobre os factos ainda que para o pretenso controlo do documento.

6-        De referir ainda e no tocante á fundamentação do acórdão sobre o recurso de agravo, que o contrato de trabalho do Arq. CC permitiria avaliar das funções para as quais foi contratado permitindo saber se abarcavam as efectivamente desempenhadas.

7-        O contrato de DD permitiria saber se o mesmo podia pedir pareceres e avaliar da natureza dos mesmos e respectiva interpretação.

8-        O balanço anual da Ré com custos diferenciados por loja permite saber e avaliar dos respectivos consumos sendo um documento oficial não manipulável.

9-        No tocante aos contratos com o EE e a FF, sempre se dirá que, esta última não sendo referida expressamente está nas obras de remodelação e alterações, tendo ligação directa com a substituição do A/Recorrente, finalmente e no que se refere ao facto do art° 30 ter resultado provado não invalida que a referida junção tivesse a pretendida "idoneidade".

10-      O vertido no art° 529 n° 2 do CPC é claro e a recusa ou indeferimento apenas seria possível se os factos que o Recorrente pretendia provar com os documentos em causa não tivessem interesse para a decisão.

11-      O recurso deveria obter provimento e ser alterado o despacho recorrido. A falta dos documentos em causa condicionou a possibilidade de controlo dos depoimentos com evidente influência na decisão final.

           

DA APELAÇÃO

12-      Versando o recurso interposto junto da Relação sobre matéria de facto e de direito cabia ao Recorrente dar cumprimento ao vertido no art. 685° - B do C.P.C, o que contrariamente ao doutamente afirmado no acórdão sobre recurso, fez.

13-      Na nova apreciação sobre a matéria de facto deveriam ter resultado provados os factos 5º, 6º, 7°, 8º, 12°, 15°, 38°, 39° a 42° e bem assim os factos 43° a 49°,

14-      E bem assim, não provados os artºs. 57°, 59° a 63°, 73° a 83°, conforme depoimentos das testemunhas indicadas e que parcialmente se transcreveram, sendo que sempre se fez referencia ao depoimento gravado com indicação dos concretos pontos de facto que considerou incorrectamente julgados, os concretos meios probatórios, constantes do processo ou da gravação.

15-      O Recorrente respeitou o vertido no art° 685-B n° 1 a) e b), sendo que nos termos do n° 2 do mesmo normativo apenas estava obrigado a fazer a " identificação precisa e separada dos depoimentos, nos termos do artº 522-C n° 2, ou seja, esclarecer o início e termo de cada depoimento por referência á respectiva gravação. O que ocorreu.

16-      Há um claro desrespeito pelo vertido no art° 712 do CPC que impõe o princípio da reapreciação da prova nas condições previstas no seu n° 1 a), o que se verificava.

17-      Estando em causa um clamoroso erro de julgamento e de apreciação e posterior reapreciação da prova.

18-      A matéria provada e respectiva fundamentação em 1ª instância, por outro lado, deveriam ter conduzido a procedência da acção quanto ao seu pedido principal conforme de direito.

19-      Refere a douta sentença do tribunal a quo terem resultado provados e não provados os seguintes factos, que a Relação manteve: Facto 1º - Provado. Facto 2º - Provado. Facto 3º -Provado. Facto 4º - Provado. Facto 5º - Provado apenas e com o esclarecimento que a Ré contactou o A informando-o que não seria este a proceder às alterações."

20-      No tocante ao facto 5 não se lê dos depoimentos transcritos ou mesmo da douta fundamentação da matéria de facto em que medida poderia a Mmª. Juíza do Tribunal "a quo" determinar ter resultado provado que, " a R informou" o A./Recorrente que " não seria este" a proceder as alterações.

21-      Não há em todo o depoimento testemunhal uma única testemunha que tenha dito que o A./Recorrente não iria proceder às alterações.

22-      Não poderia o recorrente ter indicado um qualquer ponto da gravação ou depoimento testemunhal específico se tal depoimento não ocorreu.

23-      As alterações projectadas não eram da competência do A. (execução das mesmas) nem nunca foram por este, reclamadas.

24-      O douto acórdão mantém a confusão entre alterações que pressupõe execução da obra e supervisão e fiscalização a cargo do técnico de exploração, o recorrente.

25-      O afirmado pelo Recorrente no art° 29 da PI é distinto do vertido no facto provado e facto quesitado.

26-      Afirmar que o A/Recorrente foi informado que seria o Arq. CC a proceder às alterações, não é o mesmo que dar como provado que a R informou o A/Recorrente que não seria o próprio a proceder às alterações.

27-      Termos em que a resposta poderia ser provado ou não provado, nunca a resposta dada, que não estava na base instrutória nem foi alegada.

28-      No tocante ao vertido no facto 6º verificamos que efectivamente quer a testemunha GG, quer a testemunha DD são claras em frisar que a reunião de 04/06/2004 ocorreu sem a presença do Arquitecto CC responsável pela expansão a pedido de DD que era o responsável pela manutenção de todas as lojas BB e que o A/Recorrente foi chamado por o Arq. não estar presente, na verdade as testemunhas esclarecem que o arquitecto nunca mais pediu pareceres e manteve-o afastado de todas as obras.

29-      O Recorrente permitiu-se ainda transcrever na sua quase totalidade os depoimentos das testemunhas ainda que indicasse as gravações.

30-      Do depoimento de GG inserto na gravação com duração desde 10:04:47 às 10:58:51 e prestado no dia 28.03.2011: O que é claramente visível no depoimento do Eng.º GG e nomeadamente na fundamentação da matéria de facto ao dar como provado que, o A. "esteve presente na reunião de Junho com o Arquitecto CC quando na realidade a testemunha interrogada pela mandatária do Apelante disse claramente que não e novamente interrogada pela Mmª. Juíza disse novamente que não.

31-      Há aqui um claro erro de julgamento e de apreciação da prova produzida violando os art° 685-B n°2 do CPC.

32-      No restante depoimento do Engº GG, que de resto foi transcrito, verificamos que pese embora a insistência da magistrada de 1ª instancia a testemunha mantém o afirmado perigo de segurança.

33-      No período anterior a 2004, com outros Directores Gerais e Directores de Operação, o A/Recorrente acompanhou as obras quer de instalações eléctricas, quer de segurança contra incêndios, pois ambos os projectos eram da autoria da firma do qual ele era sócio, neste processo, só veio reivindicar o aspecto de ter sido afastado das suas funções de técnico responsável pela exploração de instalações eléctricas. Era nessa qualidade, que a R. deveria ter solicitado a sua presença na obra, acompanhando a execução da mesma, e a própria Fiscalização.

34-      O Estatuto de Técnico Responsável refere que a entidade exploradora, neste caso a R, deve manter o técnico informado de todos os detalhes, pois é essa a entidade que faz a ponte com as entidades públicas, Direcção Geral de Energia e EDP (Distribuidor de electricidade).

35-      A questão a colocar nesta sede será a de saber se a R/Recorrida poderia fazer obras de remodelação e ampliação sem ter um técnico responsável pela exploração eléctrica. Se atendermos ao diploma legal que rege as instalações eléctricas verificamos que tal não era possível.

36-      No tocante ao facto 7º -" Provado apenas que numa reunião que teve lugar no dia 7/06/04 o A apresentou por parte da BB os pedidos de esclarecimentos constantes na acta de fls. 322 e ss."

37 -     O douto acórdão de que se recorre esqueceu completamente a indicação das duas testemunhas que corroboraram a parte não provada do quesito.

38-      O vertido no facto 7º reduzido a um "pedido de esclarecimento" é na realidade um relatório sobre o levantamento das " irregularidades e violações regulamentares colocando em perigo as pessoas e instalações", (doc. n° 12 junto com a PI)

39-      " Pára-raios" - situação tão discutida no decurso das várias secções de julgamento vem referido no doc. 12 de 07.06.2004.

40-      São alertados os riscos de segurança quer de pessoas (pára-raios), quer dos materiais e equipamentos cuja má execução poderá levar a problemas de segurança (redes de frio) quer aos quadros que não respeitam as exigências técnicas, etc...

41-      Face uma vez mais aos depoimentos das testemunhas DD (inserto na gravação com duração desde 11:05:29 às 11:40:15 e prestado no dia 28.03.2011), GG e de resto todas as testemunhas ouvidas sobre esta matéria o facto 7º deveria ter sido dado como provado.

42-      No tocante ao facto 8º -" Provado apenas que o A referiu discordar da Instalação de um PST - Posto de seccionamento e transformação."

43-      O A/Apelante não discordou apenas da instalação, fundamentou não só com os elevados custos mas ainda com a clara desnecessidade, confirmada pela Metro Alemã a casa mãe, de resto em cumprimento do diploma legal que rege a sua actividade, dum investimento daquela grandeza. Verificou-se e provou-se não se tratar de uma exigência da EDP.

44-      No tocante ao facto 12° - resultou claramente provado pelo depoimento da Eng ª HH - "A Alimentação à loja é aérea, em derivação de um linha existente, pelo que não há hipótese de utilizar o PST?"

45-      Em relação ao vertido nos factos 12° a 29° longe de esclarecer o Tribunal "a quo" e mais tarde a Relação sobre a violação constante e sucessiva de regras de boa técnica, de normas regulamentares e do perigo do projecto inicial no que toca a segurança de pessoas e bens, levou a que se concluísse pela total irrelevância de tais factos e desse como provado que todas essas "irregularidades" e violações técnicas de má projecção e execução fossem consideradas regularizadas, nomeadamente quanto ao motivo do afastamento do A/Recorrente

46-      O Ac. da Relação mantém como provado que o A/Recorrente não foi chamado a acompanhar os trabalhos, porém tal facto é mais uma vez julgado inócuo esquecendo que todos os trabalhos de ampliação, remodelação, teriam que obter o parecer prévio do A e mais do que isso assegurado o cumprimento das regras de boa técnica e normas regulamentares pelo visionamento, acompanhamento e pedido de aprovação por aquele que era o técnico responsável pela exploração.

47-      A Mmª Juíza dá ainda como provado e bem que o A. é substituído (de facto não formalmente) pelo EE.

48-      Como bem referem as testemunhas, todas elas, as funções são distintas, o A. é o técnico responsável pela exploração eléctrica e a EE desempenha as funções de empresa responsável pelo controlo de qualidade, mas na realidade o depoimento do "responsável pela qualidade efectiva" do EE é esclarecedor.

49-      A testemunha II representava a empresa fiscalizadora em obra que controlava a empresa projectista e o empreiteiro executante e o depoente tinha a seu cargo, precisamente o controlo e fiscalização da parte eléctrica. Este testemunho foi todo ele transcrito.

50 -     Relativamente ao vertido no facto 38 cujo resultado foi não provado outra deveria ter sido a decisão do tribunal "a quo", na verdade os relatórios de Outubro 11 e 12 de 2004 e Novembro de 2004, com especial enfoque para as betoneiras que continuam com os problemas iniciais, ("bomba principal 2") com o sistema electrónico avariado, a rede de tubagem de água, sistema dos sprinklers não estava em carga, "situação de grande risco pára-raios que não foi colocado, quadros eléctricos, perigo de curto-circuito, armadura do grill perigo de incêndio, etc., etc., etc.".

51-      Situações confirmadas pelos diversos testemunhos DD e Eng° GG entre outros (doe. 13 e 14 junto com a PI, documentos não contestados pela R, veja-se por confrontação com o doc. n° 15 - Relatório de Junho de 2005).

52-      O relatório de Dezembro de 2005 acompanhado (vistoria) pela Engº JJ denuncia que, um ano depois pouco foi feito. Realce para a nota final. Um ano depois a situação do grill Novorest continua por resolver, com risco de incêndio.

53-      Análise do A "situação bastante grave que urge resolver".

54-      Quer dos relatórios que não foram contestados pela R quer do testemunho dos vários depoentes, resulta provado o vertido o facto 38, efectivamente a R./Recorrida não teve em conta as determinações do A./Recorrente que ainda era o seu técnico responsável pela exploração eléctrica.

55-      O Acórdão da Relação deixa o A/recorrente estupefacto quando considera que os documentos juntos e não impugnados pela R/Recorrida por serem do próprio, não têm por si só o alcance provatório pretendido. Primeiro porque se trata de cópias de Relatórios entregues á R. que passam a ser propriedade desta que esta nunca disse que não recebeu e bem pelo contrário confirmou a recepção. Documentos não impugnados.

56-      A referencia a " por si só" parece esquecer que o Apelante transcreveu os dois depoimentos das testemunhas que corroboraram o referido nos ditos documentos e finalmente não parece ao A/Recorrente devermos estar em presença de documentos com força provatória plena, devem bastar para prova os simples documentos particulares não impugnados.

57-      Os testemunhos deixaram perceber, todos eles que após a saída do A/Recorrente a R/Recorrida foi fazer as correcções, isto sim, na maioria dos casos.

58-      O Ac. de que se recorre refere ainda que no tocante aos factos descritos a 39 até 42 o A/Recorrente não cumpriu o determinado pelo art° 690-A do CPC alínea b) ao não enunciar os concretos meios probatórios, constantes do processo ou da gravação.

59-      Não só fez referência como transcreveu o depoimento de JJ e DD, assim se compreendendo a referência ao "período temporal". Referencia que se prende directamente com o depoimento de JJ que acaba por afirmar colocando os tempos verbais no presente (2009) que as "sugestões" do Engº /A/Recorrente, entretanto foram cumpridas.

60-      Em termos documentais os relatórios estão lá "fls. 90 e ss" comprovando, porque não impugnados as deficiências dessas lojas.

61-      O vertido no art. 48 e 49 deveria ser dado como provado e a atestá-lo estão os testemunhos da Eng.ª HH, inserto na gravação com duração desde 10:01:08 às 11:04:07 e prestado no dia 25.02.2011, e LL inserto na gravação com duração desde 11:04:45 às 11:25:49 e prestado no dia 25.02.2011:

62-      Em todo o depoimento do Dr. LL verificamos que a 1ª instância ao adoptar a postura parcial que denotou em todas as suas intervenções esqueceu que a testemunha, quando referiu que saiu há seis anos, fê-lo por reporte á data do julgamento. A testemunha deixou as funções de director de Operações mas continuou na BB como Director de Ia Linha, logo o ouvir dizer, não foi ao porteiro mas a quem tomava as decisões, era naturalmente junto do Board.

63-      No tocante ao art. 49° tal quesito resulta provado pelo depoimento escrito do próprio Director de Operações MM conforme carta rogatória.

64-      Basta atender às declarações desta testemunha Arq. CC — Gravação do dia 01.04.2011 inserto aos 11:52:48 a 13:03:38 Para verificarmos da incompetência de ambos e desconhecimento da matéria. De realçar que esta testemunha, o responsável pela expansão, logo pela contratação de todas as empresas envolvidas, da confiança máxima do director de operações MM, nem sequer foi tido em consideração quanto á douta fundamentação da sentença em Ia instancia, e também não poderia, dado que denotou não saber que problemas surgiram em obra, nem sequer fazia ideia das responsabilidades atribuídas ao Técnico Responsável pela Exploração Eléctrica.

65-      O depoente - MM - responsável máximo declara não ter competência nem responsabilidade nas soluções técnicas (adoptadas ou não adoptadas), por outro lado, também não sabe quem contrata, porquanto o seu Engº altamente qualificado é apenas licenciado em Arquitectura e demonstrou claramente em tribunal nada perceber sobre a matéria.

66-      Por outro lado a fundamentação para a substituição do A/Recorrente pelo EE residiu, na óptica do responsável máximo, que claramente refere nada saber sobre aspectos técnicos, nó facto o EE "era mais de confiança e mais adequado para a dimensão das obras que eram grandes..." e ainda por causa "...dos horários do pessoal".

67-      Em Janeiro de 2006 a R./Recorrida já tinha decidido "acabar com o contrato" do A./Recorrente.

68-      "A cessação dos acordos teve como causa o facto de AA ter denunciado as alterações regulamentares e sem prévio conhecimento e sem supervisão de AA?     

A cessação dos acordos teve como causa o facto de AA ter denunciado as alterações efectuadas sem cumprir os termos regulamentares e sem prévio conhecimento e supervisão de AA?

A cessação do contrato teve razões muito objectivas, como referi à pouco. A cessação do contrato, com AA, cumpriu os requisitos legais, dentro do prazo normal e fizemos a notificação deste assunto de uma forma muito clara a AA.

Portanto, não foi a denúncia de AA que despoletou a cessação, é isso?

Exactamente".

69-      O vertido no art. 57° da Base Instrutória deveria resultar como não provado face aos documentos existentes e ainda face a prova produzida que denota claramente que a casa mãe rejeitou linearmente este desperdício de energia que inclusive vai contra as obrigações do Técnico de Exploração que deve procurar as soluções menos onerosas.

70-      O vertido no art. 59° não resultou provado quer face aos documentos quer em relação a toda a prova testemunhal produzida. O mesmo se diga quanto ao vertido no art. 60°.

71-      O vertido no art. 61 e 63 carece de prova quanto ao momento em que foram corrigidas as irregularidades ou deficiente projecto/execução. Até ao momento da saída do A./Apelante nada foi feito, nem provado nesse sentido.

72-      Quanto ao vertido no art. 62° nenhuma prova foi realizada nesse sentido, quer testemunhal ou outra e resulta numa verdadeira falsidade.

73-      No que se refere ao vertido nos art° 51 a 63 da base instrutória refere o douto acórdão da Relação que apenas no que se refere ao art° 62 tem o Recorrente razão porquanto o vertido nos restantes artigos da base instrutória refere o douto Acórdão que o Recorrente "não sustenta nos mínimos exigíveis as razões da sua discordância...não tendo sido indicados com a necessária precisão...(vd. fls. 45).

74-      O Recorrente indicou que toda a prova produzida aponta em sentido inverso ao provado, o que é o mesmo que dizer que nenhuma prova foi feita no sentido do afirmado. Ou seja, de forma diferente disse o mesmo que o referido quanto ao art° 62, sendo que também quanto a estes não há qualquer referência ao alegado pela Recorrida, nem o Acórdão o refere.

75-      Atendendo a que o vertido nos artº supra, da base instrutória, cumpriam á Recorrida provar, também o douto acórdão não estava dispensado de fundamentar em que medida a Recorrida o fez, quais os depoimentos e documentos que o atestam.

76-      O vertido no art. 73° enquanto matéria dada como provada não tem qualquer cabimento basta atendermos as declarações de MM para sabermos que o mesmo não lia quaEEuer relatórios o que confrontado com as declarações da testemunha LL (vd. depoimento de LL inserto na gravação com duração desde 11:04:45 às 11:25:49 e prestado no dia 25.02.2011) enquanto Director de Operações atesta do diferente tratamento dado aos relatórios.

77-      Também não resultou provado o vertido no art. 75° conforme depoimento da testemunha DD, HH e GG entre outros.

78-      Apesar de diferente fundamentação o acórdão de que se recorre dá razão ao recorrente e dá como não provado o vertido no artigo 73 da base instrutória.

79-      Consequentemente resulta não provado que o A/Recorrente nunca tenha chamado á atenção do Arq. CC.

80-      É falso o vertido no art. 76° conforme depoimento unânime em todas as testemunhas o vertido nos relatórios era para cumprir de imediato e os seus relatórios apesar de não fixarem a data em dia/hora ou mês. Referem com notória evidencia a natureza "urgente" ou "grave" das situações relatadas, (vd. Depoimento de JJ gravação de 28.03.11 inserto a 15:47:41 a 16:11:27 e ainda OO inserto na gravação com duração desde 14:44:46 às 15:13:20 e prestado no dia 28.03.2011).

81-      O vertido no art. 78 a 83 contraria toda a prova produzida no seu todo e mostra a forma parcial e tendenciosa como foi conduzido todo o julgamento.

82-      Quer as testemunhas, quer os documentos atestam que as remodelações foram efectuadas sem supervisão do A/Recorrente e a própria R/Recorrida que laconicamente refere que o A..." haveria de deparar-se com as alterações realizadas nas sua inspecções como veio a suceder, (art. 80°).

83-      O depoimento de NN inserto na gravação com duração desde 12:08:00 às 12:44:57 e prestado no dia 29.04.2011 e totalmente transcrito traduz perfeitamente a actuação da R/Recorrida. Esta testemunha actual técnico responsável pela exploração confessa que desempenhou essas funções na R/Recorrida sem ter habilitações para o efeito e que hoje, as tem. Que os Relatórios anuais do técnico responsável pela exploração eléctrica eram depois enviados para o Ministério da Economia e que as deficiências aí apontadas eram fiscalizadas por esta entidade. Dai que tenhamos testemunhos e documentos que comprovam que, por exemplo a BB de Matosinhos, não tem licença de instalação eléctrica. Ainda não tinha á data do julgamento. Que a vistoria foi feita, logo que o A/Recorrente enviou os referidos relatórios para o Ministério da Economia.

84 -     Não cabia á BB/R decidir o que fazer por se tratar de um acto de gestão cabia ao técnico determinar o que fazer e como fazer por se tratar de um problema de segurança.

85-      A testemunha deixa também claro que em termos de ampliações e remodelações de acordo com a lei que regula as instalações eléctricas a R/Recorrida tem obrigatoriamente que solicitar o parecer prévio do Engenheiro responsável. O que não foi feito e resultou de todos os depoimentos.

86-      De notar que em relação à fundamentação da testemunha DD até o facto de não haver licenciamento das lojas é desvalorizado, como se a falta de licenciamento pela entidade Direcção Geral de Energia Eléctrica não fosse um dado que lhe permitisse aferir da gravidade das "incorrecções".

87-      Contraditória a fundamentação da Mmª. Juíza de 1ª instância mantém-se na decisão da Relação que faz tábua rasa ao denunciado pelo Apelante/Recorrente.

88-      Se atendermos à testemunha NN podemos depreender do seu longo depoimento quais as suas capacidades técnicas e, porque motivo o seu depoimento é importante. Trata-se do actual técnico responsável pela exploração eléctrica. Até 2006 ainda não tinha habilitações e passou pelas várias empresas substituiu o A./Recorrente e reconhece que as obras não estão licenciadas e as deficiências não foram todas colmatadas.

89-      Parece ao A./Recorrente que quer os documentos apresentados quer a prova testemunhal produzida contrariam frontalmente a fundamentação apresentada, bem como a matéria dada como provada.

90-      Da matéria de direito e em cumprimento do vertido no art. 685°-A do C.P.C, sempre se dirá que várias foram as normas violadas conforme melhor se descriminará para além da incorrecta e errónea aplicação de outras.

91-      Consequentemente e face á prova produzida e aos depoimentos transcritos, bem como aos documentos juntos, não carecia a Relação de outros elementos, sendo os mesmos suficientes para garantir o cumprimento do vertido no art° 690 do CPC que em momento algum foi violado e permitindo-lhe a alteração da matéria de facto nos termos solicitados, muito para além dos alterados artºs. 62 e 75 da base instrutória.

92-      É maioritariamente afirmado pela jurisprudência que :"(…) Ora, como se sabe, os depoimentos das testemunhas podem aproveitar-se para fundamentar respostas a quesitos para cuja a prova não foram indicadas, uma vez que a convicção do julgador se forma a partir de todos os elementos da prova produzida, de onde quer que eles venham, pois o Tribunal deve tomar em consideração todas as provas, tenham ou não emanado de quem devia produzi-las - artigo 515° do CPC."

93-      "A garantia do duplo grau de jurisdição, consagrada na área do processo civil, incidindo sobre pontos determinados da matéria de facto que o recorrente teve o ónus de claramente apontar, pressupõe a reapreciação da prova pela Relação, que coincide, em amplitude, com a da Ia instância. Pelo que, impugnada que seja a decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto, cumpridos que sejam os ónus legalmente impostos sobre o recorrente (art. 690.°-A do CPC), tem a Relação, tendo em conta o conteúdo das alegações deste e do recorrido, que reponderar a prova produzida, constante da gravação (ou da sua transcrição), reapreciando-a. Formando ela própria a sua convicção quanto à decisão a proferir sobre tal matéria de facto. Sem se cingir à eventual conformidade da fundamentação das respostas dadas à matéria de facto controvertida."

94-      "Se é certo que este STJ não pode sindicar a decisão que a Relação venha a tomar em sede de reapreciação da matéria de facto, não havendo recurso da mesma (art. 712.°, n° 6 do CPC), deve, no entanto, censurar o mau uso que aquele Tribunal venha eventualmente a fazer dos poderes que tal preceito (art. 712.°) lhe confere a propósito, decidindo se os exerceu dentro dos limites e finalidades legais."

95-      Conforme resulta da douta fundamentação do acórdão em crise e nos termos do art. 1154º e 1156º do CC, o contrato de prestação de serviços segue as regras do mandato se, refere o art. 1170 do CC, " não carecer de adaptações relacionadas com o vínculo contratual em concreto".

96-      Tal referencia tem inclusive apelo por parte da Relação ao Acórdão do STJ de 11-12-2003, o que nos leva a atender e olhar em primeira linha ao especificamente vertido no diploma que regula as especificidades do técnico de exploração eléctrica e ainda ao contrato(s) escrito(s) outorgados pelo Recorrente.

97-      Conforme preâmbulo do Decreto Regulamentar 31/83 Diploma violado o legislador entendeu: Julgar "prioritário contemplar o caso da responsabilidade técnica pelas instalações de serviço particular. De facto, as entidades prioritárias ou exploradoras destas não estão vocacionadas para os assuntos do âmbito da electricidade, razão pela qual se torna necessária a intervenção de técnicos devidamente habilitados..."

98-      É precisamente a inexistência dos técnicos habilitados que leva a que apenas em 2006 a R. denuncie os contratos com o A., veja-se a entrada de NN nas funções do A./Recorrente em 2006.

99-      Repare-se no vertido no art. 4 do Diploma: "...só podem ser técnicos responsáveis pelo projecto de Instalações Eléctricas os Engenheiros Electrotécnicos e os Engenheiros Técnicos da Especialidade de Electrotecnia."

100-    O mesmo Diploma distingue claramente nos seus art. 4º e 5º e 6°, - o Técnico Responsável pelo Projecto, o Técnico Responsável pela Execução e o Técnico Responsável pela Exploração, (vd. art. 6º n.º 1)

101-    Qualquer modificação da Instalação Eléctrica existente tem que passar pelo técnico responsável pela exploração /art. 13° n° 7, 14º nº 10, art. 17°)

102-    A R. teria que "cumprir todas as indicações dadas pelo técnico responsável no que respeito a aspectos relacionados com as disposições regulamentares de segurança e com as regras da boa técnica..." especialmente quando se trate de eliminar quaisquer deficiências que atentem ou possa vir a atentar contra a segurança das pessoas e coisas." (vd. art. 24°).

103-    Atente-se ao vertido no art. 28° do Diploma em causa. Em "qualquer alteração" "que interfira ou possa interferir " com a rede de distribuição (EDP), designadamente aumentos de potência compete ao técnico responsável pela exploração, " dar conhecimento prévio ao respectivo distribuidor".

104-    Normas, todas elas violadas pela R./Apelada.

105-    O art. 38° do mesmo Diploma esclarece da relevância das divergências do A./Recorrente e das consequências que a ele lei atribui.

106-    Efectivamente, aí se lê que "na eventualidade de desacordo" (entre A. e R.) não caberia à R/Recorrida decidir mas, refere o mesmo artigo e diploma que nos casos dos artºs. 13° n° 7, art. 14° n° 2, art. 17°, art. 24° n° 1 e n° 2 e art. 28°, a divergência será resolvida após ser ouvida a FISCALIZAÇÃO DO GOVERNO.

107-    Consequentemente, a violação do Contrato de Prestação de Serviços é claro na sua clª 11ª em causa estarão as violações de regras técnicas e normas regulamentares.

108-    Em relação á tão falada loja de Matosinhos o pedido para a licença de Utilização é de Fevereiro de 2011. Ou seja em 2011 a loja ainda não está licenciada o que se traduz em violação das normas e regras de segurança.

109-    No respeito do Código Deontológico que o rege refere o ponto 3.1 (documento entregue pela R. e anexo ao diploma que rege os termos de Instalações Eléctricas): "O técnico responsável deve nas suas relações profissionais usar de inteira lealdade procurando dar aos problemas as melhores soluções técnicas e económicas sem lesar os legítimos interesses dos intervenientes."

110-    Nessa óptica refere o Decreto Regulamentar n° 31/83 de 18 de Abril no seu preâmbulo: "Remonta aos princípios do século da primeira referência à responsabilidade técnica por instalações eléctricas..." Os desenhos e peças escritas devem ser elaboradas e assinadas por um Engenheiro devidamente habilitado, que deve juntar ao projecto..., no qual declare responsabilizar-se pelo exercício dos trabalhos e pela exploração das instalações. "

111-    "... Na elaboração do presente Estatuto participaram as organizações mais representativas e procurou-se que não fosse apenas um repositório de obrigações e sanções para os técnicos responsáveis mas também lhes facultasse os meios legais para fazerem valer os seus pareceres e pontos de vista a favor da qualidade e segurança das instalações eléctricas, com o apoio, como é óbvio, da Direcção Geral de Energia..."

 

112-    O não licenciamento implica necessariamente um mau projecto ou/e uma má execução e/ou uma má supervisão do técnico responsável pela exploração eléctrica.

113-    Este, o Diploma Legal, violado incessantemente pela R./Recorrida.

114-  Refere o mesmo Diploma e art. 16° n° 1, no tocante ao referido prazo:

" Quando as deficiências colidam notoriamente com a segurança de pessoas e coisas, devem ser rapidamente eliminadas."

115-    Diz o Diploma quanto as características (mais ou menos graves) das irregularidades cabia ao Técnico aferi-las e não a R.

116-    No Diploma em questão verificamos que (Secção III) os artºs. 15°, 16°, 17°, 18°, 19°, 20°, 21° e 22° são todos eles, respeitantes as responsabilidades do Técnico da Exploração Eléctrica. Normas, todas elas violadas pela R.

117-    As ampliações e/ou alterações das instalações eléctricas carecem do parecer. Parecer que não foi pedido, art. 17° - norma violada.

118-    O Técnico Responsável pela Exploração Eléctrica é quem esclarece o Governo ou a EDP nos aspectos técnicos e de segurança - não foi chamado - norma violada - artºs. 19º e 21 °.

119-    O Técnico Responsável deverá dar formação em segurança ao pessoal afecto a execução e exploração da instalação eléctrica - Como? se não sabe que alterações foram implementadas –artº. 20°.

120-    O Técnico Responsável pela Exploração deve providenciar para que exista no recinto ou loja o "respectivo projecto devidamente actualizado" - art. 22°.

- Como se não sabe se existe? (vd. depoimento de OO)

121-    Refere o art. 24° n° 2:" A entidade exploradora da exploração eléctrica não deverá efectuar quaisquer modificações, mesmo não estruturais, sem prévio conhecimento e acordo do técnico responsável pela Exploração no que respeita aos aspectos regulamentares de segurança e boas regras da técnica".

122-    Refere o n° 3 do art. 24° - " A entidade exploradora da instalação efectiva deverá permitir que a mesma seja visitada inspeccionada e ensaiada pelo Técnico Responsável..."

123-    No tocante às relações inter-partes diz o art.28° sob a epígrafe " Alterações das Instalações": "sempre que qualquer alteração de instalações eléctricas interfira ou possa interferir com a rede de distribuição, designadamente aumentos de potência e montagem de centrais eléctricas COMPETE AO TÉCNICO RESPONSÁVEL PELA EXPLORAÇÃO, como representante da entidade exploradora e COM O SEU ACORDO, dar conhecimento prévio ao respectivo distribuidor. O que não foi pedido violando-se também esta norma.

124-    Refere o art. 38° do Diploma em crise que na eventualidade de desacordo entre a entidade exploradora da instalação eléctrica (a aqui R./Recorrida) e o técnica responsável, nomeadamente nos casos do art. 17°, art. 24° n° 1 e n° 2 a artº 8° deve SER OUVIDA A FISCALIZAÇÃO DO GOVERNO.

125-    O que fez a R./Recorrida? Pôr termo ao contrato com o A./Recorrente. O que fez a Relação? Confirmou a decisão, fazendo tábua rasa da violação dos diplomas indicados e estabelecendo uma justa causa que foi negada pelo respectivo injuriado, que claramente afirmou ser outro o motivo do afastamento do A/Recorrente.

126-    Estas as normas violadas, para além das irregularidades, deficiências apontadas aos relatórios que atestam por sua vez destas mesmas violações.

127-    O Diploma não faz qualquer distinção entre os diversos estabelecimentos da R./Recorrida. Ela é uma única entidade e tem um único técnico o A. /Recorrente pelo que e também no que respeita a nova sede seja ela contígua ou não o A./Recorrido teria que ser chamado.

128-    A clª 10 do contrato do A. deve ser interpretada como fixando o prazo de aviso prévio de 60 dias para a denúncia, que só poderá ocorrer no seu termo.

129-    A clª 11 deve ser interpretada numa subdivisão" de motivos ou premissas: Motivo da denúncia:

a) não aceitação e por isso o não cumprimento das determinações do técnico.

Motivo de não cumprimento:

b)Não observância das normas regulamentares e regras de técnica.

Motivo agravante:

c)Não observância das normas que ponham em causa a segurança das pessoas.     

130-    Basta a verificação da clª 11, que entende o A./Recorrente ter provado, e esta se basta com o não cumprimento dos relatórios que juntou.

131-    A R. alegou mas não provou qualquer justa causa de resolução. Justa causa que de resto não foi invocada enquanto excepção ou pedido reconvencional.

132-    A presunção de culpa que recai sobre o réu na responsabilidade contratual, aqui A/Recorrente (art. 799.°, n° 1 do CC), não dispensa os autores, aqui r/Recorrida, tal como também sucede na responsabilidade aquiliana, quer da prova do dano, quer da prova do nexo causal entre o facto (acto ou omissão do réu, no exercício do mandato) e o dano.

133-    Mesmo que assim se não entenda não existiu a mínima prova de qualquer justa causa que foi afastada pelas declarações claras de MM e o Arq. CC.

134-    O A/Recorrente escreveu a carta descreveu o director da R. como incompetente, é verdade e está provado, tal motivou a cessação das suas funções? Não, dito pelo próprio. O afastamento do A/Recorrente estava decidido desde pelo menos Janeiro e as primeiras 4 cartas confirmam que o motivo é outro. Apenas por má-fé a R/Recorrida se serve da carta do A/Recorrente para revogar de imediatos todos os contratos.

135-    A clª 12 do contrato é uma mera presunção que actua sempre que a R. acusada de não proceder às determinações de Técnico (e foi-o através dos relatórios juntos e não impugnado pela R.) o não fizer.

136-    A resolução, a revogação e a denúncia são figuras que representam uma excepção ao princípio da irretractabilidade da relação contratual (art. 406° n° 1 do C.C) baseada em fundamentos supervenientes.

137-    A figura da revogação não corresponde à resolução do contrato, sendo inaplicável o disposto no art. 433° do C.C que equiparava todos os seus efeitos a resolução à nulidade ou anulabilidade do negócio jurídico.

138-    A revogação limita-se a fazer cessar o mandato com eficácia ex nunc, aproximando-se neste aspecto, da denúncia e por isso são inatacáveis os actos já praticados pelo mandatário, ou seja, pelo prestador de serviços.

139-    Nos termos do art. 1172° al. c) do C.C o mandante que revogar o mandato oneroso deve indemnizar o mandatário do prejuízo sofrido se o mandato tiver sido conferido para determinado assunto. Conforme Pires de Lima e Antunes Varela trata-se de responsabilidade fundada na prática de actos lícitos, apenas sendo afastada a responsabilidade pela existência de justa causa.

140-    Quando o mandato oneroso tiver sido conferido por certo tempo ou para um determinado assunto, o prejuízo da revogação calcular-se-á em função da compensação que o mandato deveria proporcionar, normalmente, ao mandatário, deste modo se procurando fixar o seu lucro cessante.

141-    Considera o A./Recorrente em face das disposições legais aplicáveis que deve proceder o seu pedido principal e desde logo porquanto não se torna sequer necessária a invocada presunção de não cumprimento das disposições legais e regulamentares. Efectivamente as violações foram-no inúmeras e sucessivamente reiteradas. O que de resto se basta com os factos provados.

142-    A R./Recorrida deve ser condenada a pagar ao A./Recorrente a indemnização, decorrente do previsto na cláusula 11º do contrato de prestação de serviço outorgado.

143-    Em relação aos contratos denunciados por carta de 20.02.2006 esses pese embora os efeitos se repercutissem a Maio de 2006, os mesmos cessaram com a carta denúncia encontrando-se em dívida o pagamento do prazo de aviso prévio. Indemnização a pagar ao A./Recorrente e pedida.

144-    A estes quatro contratos não é possível fazer actuar a carta de Março de 2006.

145-    A denúncia operou não se tendo verificado quanto a estes contratos a invocada, ainda que não existente, justa causa. A denúncia foi de facto ilícita porque sem motivo.

146-    Sem cuidar de momento de avaliar se a respectiva missiva consubstancia ou não justa causa, sempre se dirá que resultou provado á saciedade que, pese embora o motivo indicado na carta de 2006 resolvendo os restantes seis contratos, na verdade esse não foi o motivo da R./Recorrida para a revogação ou resolução contratual invocada.

147-    Entende o A./Recorrente que o que se torna importante provar não é se determinado facto é possível de conduzir a resolução do contrato mas antes sim, se esse facto foi o motivador da resolução invocada.

148-    Em boa verdade o que ocorreu foi o contrário a R./Recorrida determinou a sua vontade no sentido de por cobro (denunciar), todos os contratos com a A./Recorrente pelo menos em Janeiro de 2006 e em Março viria a usar a carta do A. para invocar uma suposta justa causa. Conforme artigo 1156° do C.C. o contrato de prestação de serviços do A./Apelante rege-se em tudo o que não foi especificamente previsto, em termos de clausulado negociado e/ou juridicamente vinculativo e de normas especiais pelas regras do contrato.

149-    A justa causa terá que ser provada e provada com factos que demonstrassem claramente um comportamento culposo do A./Recorrente, que pela sua gravidade e consequências, torne inexigível a R./Recorrida manter com este um vínculo contratual.

150-    Prescrevendo o art. 563.°, sob a epígrafe de "nexo de causalidade", que "A obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão".

151-    Mesmo a considerar que o réu possa ter infringido alguns dos seus deveres na sua relação com o cliente - o que nem sequer se pode dar de barato - com a consequente censura do seu comportamento, que não terá sempre adequado à defesa dos interesses dos autores, não se apurou, não obstante a presunção da sua conduta culposa, se- a mesma foi causa adequada dos alegados danos. Prova essa que incumbia á R/Recorrida (art. 342.°, n° 1).

152-    No que à revogação unilateral do contrato concerne é aplicável o art. 1172° do Código Civil, que prevê o direito a indemnização da outra parte, preenchidos que estejam algum ou alguns dos seus pressupostos.

153-    Com a revogação do contrato, ocorre prejuízo para o contratado, que se traduz na perda de retribuição a que tinha direito, devendo a indemnização colocá-lo na situação patrimonial que teria se o contrato de prestação de serviço não tivesse sido revogado.

154-    Mantém-se da parte da R/Recorrida a obrigação de indemnizar pela violação do interesse contratual negativo.

155-    A conduta do A./Recorrente não se integra no vertido no art. 1170° n° 2 do C.C., nem a sua conduta constitui fundamento da justa causa alegada na douta sentença.

156-    Inexistindo justa causa a revogação ilícita dos contratos do A./Recorrente em Março de 2006 obriga a R./Recorrida a indemnizar o primeiro conforme peticionado.

Foram apresentadas contra-alegações pela Recorrida, começando a mesma por invocar a inadmissibilidade do recurso de agravo e, de seguida, tece várias considerações no sentido da improcedência do recurso de Revista, pugnando pela manutenção do acórdão recorrido.

         Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, pois nada obsta ao conhecimento do objecto do presente recurso, sendo que este é delimitado pelas conclusões da alegação do Recorrente, nos termos, essencialmente, do artº 684º, nº 3 do CPC, como, de resto, constitui doutrina e jurisprudência firme deste Tribunal.

FUNDAMENTOS

         Da 1ª Instância, vinha dada como provada a seguinte factualidade:

A.  Por escrito particular datado de 1/12/89, o A., enquanto técnico responsável pela
exploração de instalações eléctricas, e a R., à data denominada "BB - Auto Serviço Grossista, Lda.", com instalações na Estrada da Circunvalação, em Lisboa,
celebraram um 1.° acordo que denominaram de "Contrato de Prestação de Serviços".

B.    ...e R. acordaram que o A. "na sua qualidade de técnico, assume a
responsabilidade pela exploração das instalações eléctricas acima identificadas, com
observância da legislação e normas de segurança aplicáveis" (cláusula do referido 1.°
acordo).

C.   ...e R. acordaram ainda que "No caso do proprietário pretender modificar ou
ampliar as instalações eléctricas, o técnico deve dar, por escrito, o competente
parecer, sem o que, alias não poderá ser responsabilizado pela não observância dos
respectivos regulamentos" (cláusula 6° do referido 1.0 acordo).


D.  ...e R. acordaram que "O presente contrato é celebrado pelo prazo de um ano,
prorrogado automaticamente por igual período se, com a antecedência de sessenta dias do seu termo, o mesmo não for denunciado por qualquer das partes em carta registada com aviso de recepção..." (cláusula 10
a do referido 1.° acordo).

E.  Acordaram também que "Sempre que a denúncia, por iniciativa do proprietário,
tiver por motivo a não aceitação e, por isso, o não cumprimento de determinações do
técnico no que concerne a observância das normas regulamentares e regras da
técnica, principalmente as que visam a segurança de pessoas, a rescisão do contrato
implica para a entidade a obrigação de pagar, a título de indemnização uma
importância igual ao valor da duração do contrato, com o mínimo correspondente a
um ano" (cláusula 11
a do referido 1. ° acordo).

F.         Mais acordaram que "Presume-se que a denúncia do contrato é feita pelo motivo
apontado na cláusula anterior, sempre que o proprietário avisado pelo técnico para
proceder às beneficiações impostas, o não fizer, sem qualquer justificação, dentro do
prazo que tenha sido fixado, podendo, neste caso, o facto ser comunicado pelo
técnico à Direcção Geral de Energia." (cláusula 12ª do referido 1. ° acordo).

G.        Por escrito particular datado de 1/2/90, A. e R. celebraram um 2º acordo, com
um clausulado igual ao anterior, para a loja da R. que abriu em Palmela, sita na
Quinta da Marquesa, em Cabanas, Palmela.

H. Por escrito particular datado de 1/8/90, A. e R. celebraram um 3. ° acordo, com um clausulado igual aos anteriores, para a loja da R. que abriu em Matosinhos, sita no Lugar de Arroteia, Leça do Balio, S. Mamede Infesta, em Matosinhos.

I. Por escrito particular datado de 1/11/90, A. e R. celebraram um 4. ° acordo, com um clausulado igual aos anteriores, para a Loja de Gaia, sita a Rua Senhor de Matosinhos, Santa Marinha, em Vila Nova de Gaia.

J. Por escrito particular datado de 1/4/92, A. e R. celebraram um 5º acordo, com um clausulado igual aos anteriores, para a Loja 5, sita em Vale Verde, Tavagueira, Guia, em Albufeira.

K. Por escrito particular datado de 1/3/93, A. e R. celebraram um 6º acordo, com um clausulado igual aos anteriores, para a Loja 6, sita em Casal Velha, Vale das Flores, lote n° 1, Santo António dos Olivais, em Coimbra.

L. Por escrito particular datado de 1/11/95, A. e R. celebraram um 7. ° acordo, com um clausulado igual aos anteriores, para a Loja de Braga, sita no Lugar de Arcela, Vale de Lamares, em Braga.

M. Por escrito particular datado de 1/5/03, A. e R. celebraram o 10° acordo, com um clausulado igual aos anteriores, para a Loja de Leiria, Loja 10, (também "E..."), sita na Estrada Nacional n°1, Rua do Outeiro, Cova das Faias, em Leiria.

N. Em 24/2/06, foram enviadas ao A. quatro cartas pondo termo aos acordos de Leiria, Alfragide, Cascais e Faro, com efeitos a partir de 1/5/06.

O. Em 27 de Fevereiro de 2006, o A. enviou a R. uma carta, dizendo que "...tem sido levadas a cabo obras de alterações profundas nas instalações eléctricas em quase todas  as  lojas  BB,  sem  que  ao  signatário  desta  (técnico  responsável  de exploração), tenha sido dado conhecimento das mesmas, e como a lei faz entender, essa é a obrigação da entidade exploradora de instalações eléctricas."

P. Na referida carta, o A. acrescentou que: "Estas situações nunca antes tinham acontecido e só se vieram a verificar com o Director de Operações e Vendas actual.

Como o desconhecimento da lei não interessa a ninguém, aceito que o tenha feito apenas por imbecilidade, incompetência e má fé, o que repudio veementemente, por considerar infame, vazio de dignidade profissional a todos os níveis e, mais grave ainda, desconsiderante para mim, como um profissional de engenharia electrotécnica e como "pessoa."

Q. Na sequência da carta enviada pelo A., a R. em 27/2/06, a R. respondeu através de carta, datada de 6/3/06, em que declarou cessados todos os acordos celebrados com o A., com efeitos na data da recepção da carta.

R. Em 1/11/00 e em 1/3/01, A. e R. celebraram oralmente um 8. ° e 9. ° acordos idênticos aos referidos na matéria de facto assente, para as Lojas de Cascais e Faro, Lojas 8 e 9 (denominadas internamente por "E...").

S. Ao abrigo dos 10 referidos acordos, o A desenvolveu a sua actividade de "técnico responsável" pela exploração de todas as instalações eléctricas das lojas BB e restaurantes N..., pertencentes à R..     

T. A R. tinha sete lojas clássicas, sete restaurantes, três lojas "E..." e quatro lojas "O... Centre", sendo que estas últimas foram alienadas em 1999 ao grupo "S...".

U. Em 2004, após ter sido contactado para ocorrer a uma avaria na Loja de Alfragide, o A. recebeu um novo telefonema comunicando-lhe que não desse cumprimento a esse pedido, porquanto a R. pretendia a deslocação de outra pessoa.

V. Antes da remodelação da Loja de Matosinhos ter início, a R. contactou o A. informando-o de que não será este a proceder as alterações.

W. Numa reunião que teve lugar no dia 7/06/2004 o A. apresentou por parte da BB os pedidos de esclarecimento constantes da acta de fls. 322 e ss.

X. O A referiu discordar da instalação de um PST- Posto de seccionamento e transformação.

Y. A R. informou que a instalação de um PST era uma exigência do distribuidor.

Z. O PST previsto no projecto é constituído por 3 transformadores de 800 kV do tipo

seco, para funcionamento em paralelo, num total de 2400 Kv.

AA.     O A. alertou para o facto de a Loja de Alfragide, maior que a de Matosinhos, a
qual tem uma rede frigorífica de grande dimensão e acumula os escritórios centrais e
a Direcção no mesmo edifício, em consumo de ponta, nunca ter excedido os 1314
kW(1413kV).

AB.     Antes da remodelação a loja de Matosinhos estava equipada com dois
transformadores de 630 KVA e o consumo de ponta não ultrapassou os 878 KW.

AC.     Foi feita a opção por transformadores tipo seco.

AD.     O A. referiu que, atendendo ao facto do PST ser no exterior do edifício, deveria
ser de manter a solução tradicional de transformadores a óleo do tipo hermético,
com inerente redução de custos, solução que não foi adoptada.

AE.     O A. fez reparos ao projectado quanto a iluminação, as marcas, aos quadros
eléctricos, aos sistemas informáticos, as portas automáticas e aos
termoacumuladores.

        

A única alteração efectuada pelo Tribunal da Relação a este acervo factual, em decorrência da impugnação da matéria de facto pelo Recorrente, foi a de dar como não provados os factos correspondentes aos artigos 62 e 75 da base instrutória.

         Não obstante as longuíssimas e – com o devido respeito – prolixas alegações [condensadas em 156 conclusões (antes do convite para a sintetização das mesmas, eram 216)],  não são várias nem complexas as questões decidendas, pelo que, em breves palavras, iremos decidir do que estiver no âmbito dos poderes cognitivos e censórios deste Supremo Tribunal de Justiça.

         Aliás, como bem refere o Recorrente no início da suas alegações para o presente recurso, são três as questões decididas pela Relação:

        

a) Recurso de Agravo – junção de documentos requerida

b) Recurso de Apelação – alteração da decisão de facto

c) Recuso de Apelação – inexistência de revogação com justa causa.

        

A) Da inadmissibilidade do recurso de agravo

        

         Sob a epígrafe «A – Recurso de Agravo», o Recorrente dedica uma secção das referidas alegações a impugnar o decidido pelo Tribunal da Relação em sede de um recurso de agravo de um despacho que foi proferido pela Exmª Juíza da 1ª Instância que indeferiu o pedido formulado pelo A/Recorrente para que fosse ordenada à Ré/Recorrida a junção de documentos.

         Depois de ouvir a Ré, garantindo destarte o contraditório, o tribunal da 1ª Instância indeferiu tal pedido com fundamento em que tais documentos seriam irrelevantes para a discussão e decisão do presente pleito.

         Interposto recurso de Agravo de tal despacho, o Tribunal da Relação negou provimento ao mesmo e confirmou a decisão recorrida, pretendendo o Autor nova reapreciação do mesmo em sede da presente Revista.

         A parte contrária, nas suas doutas contra-alegações, pronuncia-se contra a admissão de tal recurso.

Ouvido o Recorrente sobre a posição da sua contraparte, o mesmo persiste no propósito de submeter aquela decisão da Relação à apreciação do Supremo, pugnando pela admissibilidade do recurso..

Importa indagar da recorribilidade de tal matéria para este Supremo Tribunal.

 Não pode o Recorrente olvidar, dado que está devidamente patrocinado, que, nos termos do artº 754º/2 do CPC, na versão aplicável ao presente processo, que é de 2006, não é admissível recurso de agravo do acórdão da Relação sobre decisão da 1ª Instância, «salvo se estiver em oposição com outro, proferido no domínio da mesma legislação pelo Supremo Tribunal da Justiça ou por qualquer Relação, e não houver sido fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça, nos termos dos artigos 732º-A e 732º-B, jurisprudência com ele conforme».

Assim, ainda que pretendesse recorrer da alegada violação da lei processual,  em sede de Revista, apenas o poderia fazer se invocasse oposição do acórdão recorrido com outro proferido no domínio da mesma legislação pelo Supremo Tribunal da Justiça ou por qualquer Relação, e não houvesse sido fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça, nos termos dos artigos 732º-A e 732º-B, jurisprudência com ele conforme.

Na verdade, além da violação da lei substantiva, o recorrente pode alegar, no recurso de Revista, violação da lei do processo, quando desta for admissível recurso, nos termos do nº 2 do artº 754º, de modo a interpor-se do mesmo acórdão um único recurso ( sublinhado e destaque nosso).

É o que se designa pelo princípio da unidade ou de absorção, em que o recurso de revista, arrasta para a sua órbita o conhecimento da violação de normas jurídicas adjectivas, próprio do recurso de agravo.

Subordina, a lei, como se vê, a admissibilidade da impugnação da violação das normas processuais em recurso de revista, à condição excepcional imposta pelo artº 754º, nº 2 do CPC.

 

Nem de outra forma poderia ser, pois, se assim não fosse, estaria aberta a possibilidade de, quando houvesse recurso de revista, verificar-se o aproveitamento da oportunidade, para a impugnação de decisões sobre matéria processual que estaria vedada em sede de recurso autónomo de agravo para o STJ.

Trata-se, portanto, de uma exigência em nome da harmonia do sistema jurídico-processual civil, na área dos recursos.

Neste mesmo sentido, foi, aliás, proferido o Acórdão deste Supremo Tribunal de 13-11-2008, assim sumariado na parte que interessa:

«Expressa a lei que, sendo o recurso de revista o próprio, pode o recorrente alegar, além da violação da lei substantiva, a violação da lei de processo, quando desta for admitido recurso, nos termos do n° 2 do artigo 754° ao Código de Processo Civil, de modo a interpor do mesmo acórdão um mesmo recurso (artigo 722°, n." l, do Código de Processo Civil).

Trata-se do princípio designado da unidade ou absorção, em que o recurso de revista, em razão do seu objecto essencial relativo à violação de normas jurídicas substantivas, arrasta para a sua órbita o conhecimento da violação de normas jurídicas adjectivas, próprio do recurso de agravo.

Todavia, para o efeito, exige a lei, como condição do conhecimento da violação de normas jurídicas processuais, que a decisão da Relação sobre essa matéria seja impugnável nos termos do n° 2 do artigo 754° do Código de Processo Civil.

A este propósito, estabelece a lei, por um lado. ser admissível recurso de agravo para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão da Relação de que seja admissível recurso, salvo nos casos em que couber revista ou apelação (artigo 754", n" l, do Código de Processo Civil).

E, por outro, não ser admissível recurso de agravo do acórdão da Relação sobre decisão da 1a instância, salvo se estiver em oposição com outro, proferido no domínio da mesma legislação pelo Supremo Tribunal de Justiça ou por qualquer Relação, e não houver sido fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça, nos termos dos artigos 732°-A e 732°-B, jurisprudência com ele conforme (artigo 754°, n° 2, do Código de Processo Civil» (Relator, Cons. Salvador da Costa)[1].

Mais recentemente, o Ac. STJ de 29-06-2010 ( Relator, Sebastião Póvoas) assim sumariado na parte que ora interessa:

«Embora como segmento de revista, não é admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça a parte decisória que, se apreciada autonomamente, integraria um agravo em 2ª Instância, sem que se perfilem as excepções dos n°s 2, "in fine" e n° 3 do artigo 754.° do Código de Processo Civil, como acontece no recurso do despacho da lª Instância, confirmado pela Relação, que condena a parte como litigante de má fé»[2]

O Recorrente alega, quando ouvido sobre a inadmissibilidade parcial da Revista invocada pela Recorrida, nos termos e para os efeitos do artº 704º, nº 2 do CPC, que «é jurisprudência assente que a violação das regras de repartição do  ónus da prova constitui fundamento do recurso de Revista», citando um aresto deste Supremo Tribunal, em abono da admissibilidade do recurso interposto, no STJ, da decisão da 2ª Instância que julgou o Agravo.

Nada mais exacto e correcto, pois a violação das regras do ónus de prova constitui violação do direito probatório material e não formal, pelo que tal direito, regulado no Código Civil, é direito substantivo e, portanto, a sua violação constitui fundamento do recurso de Revista.

Simplesmente, no caso da decisão da 1ª Instância que rejeitou a pretendida junção de documentos, e que foi confirmada pela Relação, não se está perante qualquer «violação das regras do ónus da prova», mas sim, perante um caso em que ambos os Tribunais julgadores da matéria de facto (despacho da 1ªInstância que foi confirmado pela Relação) consideraram tais documentos como impertinentes (do latim non pertinere, no seu particípio presente non pertinens), isto é, desadequados ou estranhos à boa decisão da causa e daí que, a Mmª Julgadora, no exercício dos seus poderes de gestão processual, que lhe são conferidos pelo nº 1 do artº 265º in fine do CPC que impõe ao Juiz o dever de recusar o que for impertinente ou meramente dilatório, tenha prolatado o sobredito despacho.

Tal despacho nada tem a ver, portanto, com uma pretensa violação das regras do ónus de prova e, por isso, a decisão da Relação que lhe concedeu o seu aplauso, não pode ser sindicada pelo Supremo Tribunal, nos termos do artº 754º, nº 2 do CPC.

Em face do exposto, dado que não se verifica a condição da excepção à regra da inadmissibilidade de recurso a que se reporta o nº 2 do artº 754º do Código de Processo Civil, não pode este Supremo Tribunal conhecer da parte da decisão recorrida que concerne à matéria impugnatória atinente ao agravo e a que correspondem as conclusões a 11ª da douta alegação.

B) Da alteração da matéria de facto pelo Tribunal da Relação

No que concerne à impugnação do decidido pela Relação quanto à alteração da matéria de facto, desde logo importa salientar que o Supremo Tribunal de Justiça não pode, por tal exorbitar da sua competência, sindicar o julgamento da matéria de facto efectuado pelas Instâncias, que julgam de facto e de direito, enquanto o Supremo Tribunal – que não constitui uma 3ª Instância – julga apenas da matéria de direito, por isso sendo e  se configurando como tribunal de revista.

         Desta forma, o Tribunal da Relação é a entidade jurisdicional soberana na apreciação e decisão sobre a matéria de facto, como Tribunal de 2ª Instância que é, cabendo apenas ao STJ aplicar definitivamente o regime jurídico que julgue adequado aos factos materiais provados pelo Tribunal recorrido (artº 729º, n°1 do CPC).

Assim a alteração da decisão de facto pelo Tribunal da Relação que, como tribunal da 2ª Instância, é a entidade soberana e, por isso, derradeira para tal apreciação ( fora dos apertados limites legais em que o STJ pode conhecer a título excepcional de tal julgamento) não pode ser sindicada por este Tribunal, como, aliás, expressamente dispõe a lei no nº 6 do artº 712º do CPC(versão anterior ao Novo Código de Processo Civil aprovado pela Lei nº 41/2013) onde se estatui:

«Das decisões da Relação previstas nos números anteriores não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça».

Não se aprecia, consequentemente, a questão concernente à alteração da matéria de facto.

C) Da invocada inexistência de justa causa para a cessação do vínculo contratual entre o Autor/ Recorrente e Ré/Recorrida.

Esta questão é a fulcral do presente recurso, e consiste em saber se a cessação dos vínculos contratuais que existiam entre o Autor/Recorrente e a Ré/ Recorrida foi operada com justa causa.

Para tanto, comecemos por recordar uma relevante passagem da decisão recorrida que, depois de considerar que in casu os vários contratos celebrados entre ambas as partes foram contratos de prestação de serviço atípicos, e que a esta figura contratual é aplicável o regime do mandato, em particular no que concerne à cessação do vínculo, citou uma importante passagem do manual de Menezes Leitão que convirá hic et nunc relembrar: 

«Sucede, porém, que para além de estabelecer um regime específico para a caducidade do mandato, o legislador instituiu um direito de livre revogação unilateral do mesmo por qualquer das partes, vindo, assim, essa livre revogação de certa forma a absorver - ou a tornar desnecessária - a aplicação ao mandato das causas de extinção dos contratos»[3]. No que concerne à revogação unilateral do mandato estabelece o n° 1 do art. 1170, com carácter injuntivo, essa faculdade, a qual, apesar de legalmente permitida e incondicionada pode dar origem à obrigação de indemnizar a outra parte, no condicionalismo apontado no art. 1172 do CC -designadamente, se a revogação provier do mandante e disser respeito a mandato oneroso, conferido por certo tempo ou para certo assunto, ou o mandante o revogue sem a antecedência conveniente. Nesse caso, o mandatário conta receber a remuneração estipulada em função do tempo acordado ou da natureza.

Sucede, todavia, que se alguma parte tiver justa causa para a revogação do mandato deixa de se justificar a atribuição de qualquer indemnização. A «invocação de uma justa causa para a revogação pode ter o efeito de exonerar o revogante da obrigação de indemnização a que, de outra forma, estivesse adstrito por força do disposto no art. 1172o.» Sendo que a «eventual exclusão da obrigação de indemnização a que houvesse lugar não está dependente da invocação da justa causa aquando da revogação; tanto pode ser invocada na declaração revogatória, como pode ser oposta posteriormente à contraparte quando esta pretenda obter indemnização com base em qualquer das alíneas do art. 1172o».[4]

No caso em apreço, assente que os contratos celebrados foram contratos atípicos de prestação de serviços, – qualificação que não sofreu oposição das partes – o que importa indagar é a forma como cessaram tais contratos e se tal cessação gera o dever de indemnizar o demandante, ora Recorrente, constituindo «justa causa» para a rescisão ou revogação do contrato.

Para tanto, importa ter presente em que consiste, afinal o, tão frequentemente referido, conceito de justa causa em direito civil.

O Ilustre e saudoso Professor, João Baptista Machado, a quem tanto deve a ciência jurídica  portuguesa e que nos deixou quando tinha ainda muito para dar, assim escreveu no seu excelente estudo intitulado «Pressupostos da Resolução por Incumprimento», escrito no livro de homenagem ao saudoso Prof. de Coimbra, Doutor Teixeira Ribeiro:

 «O conceito de justa causa é um conceito indeterminado cuja aplicação exige necessariamente uma aplicação valorativa  do caso concreto. Será uma «justa causa»  ou um «fundamento importante» qualquer circunstância, facto ou situação em face da qual, e segundo a boa fé, não seja exigível a uma das partes a continuação da relação contratual; todo o facto capaz de fazer perigar o fim do contrato ou de dificultar a obtenção desse fim, qualquer conduta que possa fazer desaparecer pressupostos, pessoais ou reais, essenciais ao desenvolvimento do dever de correcção e lealdade ( ou ao dever de fidelidade na relação associativa). A «justa causa» representará, em regra uma violação dos deveres contratuais (e, portanto, um incumprimento): será aquela violação contratual que dificulta, torna insuportável ou inexigível para a parte não inadimplente a continuação da relação contratual».[5]                                                                                                                  

Noutro local do mesmo estudo, Baptista Machado assim reflectiu:

«Pode dizer-se, em síntese, que nos contratos de que decorre uma relação particularmente estreita de confiança mutua e de leal colaboração, tais como o contrato de sociedade, o contrato de trabalho ou certos contratos especiais de prestação de serviços (p. ex., de assistência técnica, de reestruturação da contabilidade de uma empresa, de prestações profissionais como as do médico e do advogado), todo o comportamento que afecte gravemente essa relação põe em perigo o próprio fim do contrato,: abala o fundamento deste, e pode justificar, por isso, a resolução»[6]

Esta preciosa lição do Prof. Baptista Machado revela quão necessária é, para a manutenção da relação profissional em qualquer local onde ela tenha lugar, mas, particularmente, em empresas ou outros centros de actividades de relevo económico e social, a preocupação pela salvaguarda de um clima de respeito e de consideração, essencial à confiança e lealdade que tem de existir entre os contraentes.

No caso sub judicio, deparamos precisamente com o contrário, isto é, com uma violação do dever de correcção/respeito por banda do ora Autor/Recorrente, como se colhe, com toda a nitidez, da conduta do ora Autor e Recorrente bem retratada na seguinte passagem do Acórdão recorrido (fls. 55 da referida peça processual):

«Em 27-2-2006 o A. enviou a R. uma carta, dizendo que "...tem sido levadas a cabo obras de alterações profundas nas instalações eléctricas em quase todas as lojas BB, sem que ao signatário desta (técnico responsável de exploração), tenha sido dado conhecimento das mesmas, e como a lei faz entender, essa é a obrigação da entidade exploradora de instalações eléctricas." Acrescentando que: "Estas situações nunca antes tinham acontecido e só se vieram a verificar com o Director de Operações e Vendas actual. Como o desconhecimento da lei não interessa a ninguém, aceito que o tenha feito apenas por imbecilidade, incompetência e má fé, o que repudio veementemente, por considerar infame, vazio de dignidade profissional a todos os níveis e, mais grave ainda, desconsiderante para mim, como um profissional de engenharia electrotécnica e como "pessoa." (sublinhado e destaque nossos).

Na sequência desta carta enviada pelo A. a R. respondeu através de carta, datada de 6-3-06, em que declarou cessados todos os acordos celebrados com o A., com efeitos na data da recepção da carta.

Nesta ocasião, em Março de 2003, vigoravam ainda todos os contratos que A. e R. haviam celebrado, mesmo aqueles que a R. quisera fazer cessar anteriormente, uma vez que expressamente constava das cartas de denúncia que ela operaria em 1-5-2006. Até lá, quer no que concerne ao contrato referente à loja de Leiria, quer no que concerne aos contratos referentes às lojas de Alfragide, Faro e Cascais os vínculos entre as partes manter-se-iam, continuando ambas a ser sujeitos dos mesmos direitos e obrigações (  ).

Porém, com a sua carta de 6-3-2006 a R. pôs fim a todos os contratos que vigoravam, inclusive os que acabámos de referir, com efeitos imediatos, visto tratar-se de uma declaração receptícia (efeitos a operar na data da recepção da carta).

Todos os contratos -10- celebrados entre o A. e a R. cessaram por via desta declaração da R.

            Mais adiante (fls. 56), o Tribunal da Relação doutamente considerou:

«No caso dos autos, atento o disposto no art. 1156 do CC, deveremos equacionar a ocorrência de justa causa para a cessação dos contratos de prestação de serviços celebrados.

Na carta enviada pela R. ao A. aquela faz constar:

«...não podemos aceitar que V. Exª. se refira ao Director de Operações e Vendas desta empresa nos termos em que o faz na referida carta, cujo teor consideramos inadmissível e repudiamos por não aceitável em qualquer relação, quer de âmbito profissional quer pessoal.

Desta forma, porque estão comprometidas as condições necessárias para a manutenção de uma normal relação, entre V. Exª e esta empresa, não nos resta outra alternativa senão proceder, por este meio, à resolução de todos os contratos...»

Desta declaração da R. extrai-se com clareza que ela quis pôr fim às relações contratuais que mantinha com o A., apontando como motivo justificativo para tal os termos em que o A. se referira ao Director de Operações e Vendas cujo teor considera inadmissível e repudia por não aceitável em qualquer relação, quer de âmbito profissional quer pessoal ( 6). Recorda-se que, referindo-se àquele Director o A. escrevera, na carta que endereçara ao Presidente da R.: «Como o desconhecimento da lei não interessa a ninguém, aceito que o tenha feito apenas por imbecilidade, incompetência e má fé, o que repudio veementemente, por considerar infame, vazio de dignidade profissional a todos os níveis e, mais grave ainda, desconsiderante para mim, como um profissional de engenharia electrotécnica e como "pessoa"».

Temos, pois, que o A. dirigindo-se ao Presidente da R., formulou sobre o Director de Operações e Vendas juízos ofensivos da sua honra e consideração. Tais circunstâncias inquinariam necessariamente a relação do A. com o referido Director de Operações e Vendas prejudicando o ambiente em que as relações de serviço se desenrolavam. Aliás, manter-se o A. a prestar serviço à R. significaria a desautorização e a permissão do desrespeito àquele Director»

Neste contexto, afigura-se que face ao teor da carta que o A. endereçou ao Presidente da R. era inexigível a manutenção das relações contratuais existentes entre esta e o A».

O elucidativo quadro factual traçado pela Relação sobre a realidade ocorrida no presente caso, não concede espaço para dúvidas sobre a existência de justa causa para a cessação imediata do conjunto das relações contratuais que haviam sido celebrados.

O contrato de prestação de serviços, como o dos presentes autos, é o que a doutrina designa por contrato intuitu personae, vale dizer, contrato celebrado em razão da pessoa do contraente, que influi decisivamente para tal celebração.

É em função das características pessoais e profissionais do prestador do serviço que o mesmo é contratado pela empresa para despenhar actividades de considerável complexidade técnica e de correspondente responsabilidade.

Como escreveu o Prof. Pedro Romano Martinez na sua magnífica monografia intitulada Da Cessação do Contrato, «a justa causa não é um conceito específico do direito de trabalho, pois serve de fundamento para a resolução de vários contratos de execução continuada»[7], acrescentando, mais adiante, que «em qualquer dos casos, a justa causa baseia-se no incumprimento culposo ou em causas de força maior»[8].

Porém, o mesmo conceituado Civilista, referindo-se às relações de trabalho subordinado, acentua, ainda, que «perante o comportamento culposo do trabalhador, impõe-se uma ponderação de interesses; é necessário que, objectivamente, não seja razoável exigir-se do empregador a subsistência da relação contratual. Em particular, estará em causa a quebra da relação de confiança motivada pelo comportamento culposo».[9]

É patente a existência de vários pontos de afinidade entre o contrato de trabalho e o contrato de prestação de serviços de carácter técnico, não só pelo facto de ambos serem celebrados intuitu personae, como também porque ambos têm como objecto a prestação de determinadas actividades (trabalhos ou serviços) gerando-se uma relação de confiança pessoal entre os sujeitos contratuais, imprescindível à manutenção do vínculo e comportando deveres acessórios de conduta, designadamente de respeito ou correcção e de lealdade, cuja violação é susceptível de inquinar a relação existente, a ponto de se tornar inexigível a manutenção do vínculo estabelecido.

Ninguém duvidará de que um técnico que presta serviços a uma empresa, designadamente um técnico responsável pela exploração eléctrica, ao dirigir-se por escrito a um dirigente da mesma (in casu, ao Director de Operações e Vendas) proferindo afirmações como «como o desconhecimento da lei não interessa a ninguém, aceito que o tenha feito apenas por imbecilidade, incompetência e má fé, o que repudio veementemente, por considerar infame, vazio de dignidade profissional a todos os níveis e, mais grave ainda, desconsiderante para mim, como um profissional de engenharia electrotécnica e como pessoa.», coloca gravemente em causa a confiança que a dita empresa nele deposita e atenta, de forma objectiva e altamente censurável, contra a consideração e o respeito que é devido aos dirigentes da empresa a que presta serviço, tornando, com tal conduta ilícita e culposa, imediatamente inexigível a continuação do vínculo contratual.

Por isso, bem andou a Relação, ao concluir o seu douto acórdão, «que o A. dirigindo-se ao Presidente da R., formulou sobre o Director de Operações e Vendas juízos ofensivos da sua honra e consideração. Tais circunstâncias inquinariam necessariamente a relação do A. com o referido Director de Operações e Vendas prejudicando o ambiente em que as relações de serviço se desenrolavam. Aliás, manter-se o A. a prestar serviço à R. significaria a desautorização e a permissão do desrespeito àquele Director».

Sem necessidade de outras considerações, mostra-se verificada, por tudo quanto exposto ficou, justa causa para a cessação imediata dos contratos celebrados, o que conduz à improcedência do presente recurso.

DECISÃO 

Face a tudo quanto exposto fica, acordam os Juízes deste Supremo Tribunal de Justiça em se negar a Revista.

Custas pelo Recorrente, neste Supremo Tribunal, como nas Instâncias, por força da sua sucumbência.

Processado e revisto pelo Relator.

Lisboa e Supremo Tribunal de Justiça, 16 de Janeiro de 2013

Álvaro Rodrigues (Relator)

Fernando Bento

João Trindade

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[1] Disponível em www.dgsi.pt
[2] Pº 476/99P1.S1 in www.dgsi.pt.
[3] Menezes Leitão, Direito das Obrigações, vol III, 3ª edição, pg. 472
[4] M. Januário da Costa Gomes, «Em Tema de Revogação do Mandato Civil» apud M. Leitão, op. cit., pg 474.
[5] J. Baptista Machado, Pressupostos da Resolução por Incumprimento, in Estudos em homenagem ao Prof. Doutor J. J. Teixeira Ribeiro, 2º- 361.
[6] Op.cit, pg. 359.
[7] Pedro Romano Martinez, Da Cessação do Contrato, Almedina, 2ª Edição, pg. 461.
[8] Ibidem.
[9] Idem, pg. 465.