Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
12131/18.6T8LSB.L1.S1
Nº Convencional: 7.ª SECÇÃO (CÍVEL)
Relator: MARIA DO ROSÁRIO MORGADO
Descritores: NULIDADE DE ACÓRDÃO
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
QUESTÃO RELEVANTE
OBJETO DO RECURSO
Data do Acordão: 12/10/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: INDEFERIDA A RECLAMAÇÃO
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO
Sumário : I – A nulidade por omissão de pronúncia, representando a sanção legal para a violação do estatuído naquele nº 2, do artigo 608.º, do CPC, apenas se verifica quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre as «questões» pelas partes submetidas ao seu escrutínio, ou de que deva conhecer oficiosamente, como tais se considerando as pretensões formuladas por aquelas, mas não os argumentos invocados, nem a mera qualificação jurídica oferecida pelos litigantes.
Decisão Texto Integral:

Acordam em conferência no Supremo Tribunal de Justiça



1. Julgado o recurso de revista, a recorrida, Banco BIC Português, SA, veio, ao abrigo do disposto nos arts. 615º, nº1, al. d) e 616º, ambos do CPC, arguir a nulidade do acórdão por omissão de pronúncia, bem como pedir a sua reforma.

2. A parte contrária respondeu, pronunciando-se no sentido do indeferimento do requerido.

Cumpre apreciar.

3. Da nulidade por omissão de pronúncia

É tendo em consideração o disposto no artigo 608º, nº 2 do CPC, que se terá de aferir da nulidade prevista na alínea d), do n.º 1, do art. 615º, do CPC.

Preceitua o art. 608º, nº2, do CPC que o Juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, não podendo ocupar-se senão de questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.

Por conseguinte, a nulidade em causa, representado a sanção legal para a violação do estatuído naquele nº 2, do artigo 608.º, do CPC, apenas se verifica quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre as «questões» pelas partes submetidas ao seu escrutínio, ou de que deva conhecer oficiosamente, como tais se considerando as pretensões formuladas por aquelas, mas não, como é pacífico, os argumentos invocados, nem a mera qualificação jurídica oferecida pelos litigantes. Essencial é que o tribunal se contenha no âmbito do objeto do recurso, delimitado pelas conclusões (cf. arts. 608.º, n.º2, 635.º, nº4 e 639º, do CPC).

No caso em apreço, as questões de direito a discutir no âmbito da revista consistiam (unicamente) em saber se:

a) – No âmbito da reapreciação da decisão de facto, a Relação usou deficientemente os poderes que lhe são conferidos, violando as correspondentes normas adjetivas;

b) – A recorrente se encontra vinculada pela cessão de créditos;

c) – A recorrente renunciou à invocação da exceção de não cumprimento do contrato.

Ora, como bem evidencia o teor do acórdão sob reclamação, todas estas questões foram apreciadas e fundamentadas à luz dos normativos que se consideraram aplicáveis, concluindo-se não haver fundamento para considerar que, no caso dos autos, a ré tinha renunciado à invocação de meios de defesa legalmente admissíveis contra o credor originário, nomeadamente a exceção do não cumprimento do contrato.

Não obstante, em manifesta divergência com o assim decidido, a recorrida veio imputar ao acórdão a nulidade por omissão de pronúncia, alegando que o acórdão não ponderou devidamente a alteração introduzida pela Relação na matéria de facto, concretamente o aditamento do ponto E).

A este respeito, importa recordar que as nulidades de sentença previstas no art. 615º, do CPC sancionam vícios formais, de procedimento, e não patologias que eventualmente possam ocorrer no plano do mérito da causa.

De todo o modo, cabe referir que o julgamento jurídico da causa teve em consideração todos os factos dados como provados, no seu conjunto, como não poderia deixar de ser.

Por outro lado, como já dissemos, o dever de pronúncia a que o Juiz está adstrito, não abrange todos os razões e contra-argumentos, de facto ou de direito, invocados pelas partes, em defesa das suas teses.

Nesta conformidade, a arguição de nulidade do acórdão carece de fundamento, não sendo, como sabemos, o mecanismo processual adequado para as partes manifestarem a sua discordância quanto ao decidido, a fim de, por esta via, reverter o sentido decisório a seu favor.

Improcede, portanto, a nulidade invocada.


4. Veio ainda a recorrida pedir a reforma do acórdão, nos termos do art. 616º, nº2, al. a), do CPC, por alegadamente ter havido «erro na determinação da norma aplicável».

Mais uma vez sem razão.

Na verdade, o acórdão reclamado, convocando os pertinentes elementos doutrinários e o sentido da jurisprudência proferida, em casos similares, enunciou a lei que considerou aplicável, designadamente as regras interpretativas plasmadas nos artigos 236º, 237º e 238º, do CC, em termos que não permitem suscitar qualquer dúvida.

É, assim, patente, não se estar perante lapso, muito menos manifesto ou grosseiro, quando se decidiu em determinado sentido e, assim sendo, há que concluir pela total falta de fundamento para o pedido de reforma (cf. art. 616º, nº2, al.a), do CPC).

Repete-se que este mecanismo não se destina a demonstrar a existência de error in judicando, como parece decorrer de toda a argumentação apresentada pela recorrida.


Por conseguinte, não pode deixar de improceder o pedido de reforma do acórdão.

5. Nestes termos, acorda-se em indeferir o pedido de reforma, bem como a arguição de nulidade.

Custas a cargo da reclamante, fixando-se em 3 Ucs. a taxa de justiça.


Lisboa, 10.12.2020


Relatora: Maria do Rosário Correia de Oliveira Morgado

1º Adjunto: Oliveira Abreu

2º Adjunto: Ilídio Sacarrão Martins

Nos termos e para os efeitos do disposto no art. 15º-A, do Decreto-Lei nº 20/2020, atesto que, não obstante a falta de assinatura, os Senhores Juízes Conselheiros Adjuntos deram o correspondente voto de conformidade.