Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
274/08.9JASTB.L1.S1
Nº Convencional: 3ª SECÇÃO
Relator: PIRES DA GRAÇA
Descritores: COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
VÍCIOS DO ARTº 410.º DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
CONHECIMENTO OFICIOSO
NULIDADE INSANÁVEL
ACORDÃO DA RELAÇÃO
ATENUAÇÃO ESPECIAL DA PENA
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
FUNDAMENTAÇÃO
Nº do Documento: SJ
Data do Acordão: 01/13/2010
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROVIDO
Sumário : I - Sendo o STJ, por regra, um tribunal de revista, só conhece dos vícios aludidos no art. 410.º, n.º 2, do CPP, de forma oficiosa, por sua própria iniciativa, quando tais vícios se perfilem, que não a requerimento dos sujeitos processuais. Mesmo nos recursos das decisões finais do tribunal colectivo, o Supremo só conhece dos vícios do art. 410.º, n.º 2, por sua própria iniciativa, e nunca a pedido do recorrente, que, para o efeito, sempre terá de se dirigir à Relação.
II - Esta solução está em sintonia com a filosofia do processo penal emergente da reforma de 1998 que, significativamente, alterou a redacção da al. d) do art. 432.º do CPP, fazendo-lhe acrescer a expressão antes inexistente “visando exclusivamente o reexame da matéria de direito”, filosofia que, bem vistas as coisas, visa limitar o acesso ao Supremo Tribunal, sob pena do sistema vigente comprometer irremediavelmente a dignidade deste como tribunal de revista que é. Com tal inovação, o legislador claramente pretendeu dar acolhimento a óbvias razões de operacionalidade judiciária, nomeadamente, restabelecendo mais equidade na distribuição de serviço entre os tribunais superiores e garantir o desejável duplo grau de jurisdição em matéria de facto.
III - O recurso pode ter como fundamento, mesmo que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito, a inobservância do requisito cominado sob pena de nulidade que não deva considerar-se sanada – art. 410.º, n.º 3, do CPP.
IV - O acórdão da Relação não apreciou o depoimento de uma das testemunhas, elemento de prova produzido, e invocado pelo recorrente na impugnação da matéria de facto, não efectuando assim o exame crítico imposto pelo art. 374.º, n.º 2, do CPP, quanto a essa prova.
V - Houve, por isso, omissão de pronúncia na valoração de uma prova indicada como fundamento de recurso, o que constitui nulidade nos termos do art. 379.º, n.º 1, als. a) e c), do CPP. Na verdade, o art. 379.º do CPP determina que é nula a sentença quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento (n.º 1, al. c)). As questões impostas à apreciação do julgador são as suscitadas pelos sujeitos processuais, ou as de conhecimento oficioso.
VI - Acresce que o acórdão da Relação não aduziu fundamentação específica sobre os pressupostos de viabilidade ou não da aplicação da atenuação especial da pena, limitando-se a remeter da seguinte forma, para a decisão da 1.ª instância: “Neste segmento, importa recordar que a decisão recorrida, ao referir a medida da pena contempla expressamente as aludidas circunstâncias conferindo-lhes o devido relevo. Não se vê assim, que se deva hiper valorizar comportamentos que em nada descaracterizam o desvalor da acção e já foram tidos em conta na pena aplicada. Conclui-se, assim, pela correcção da pena aplicada pois observa o disposto nos arts. 71.º, 72.º e 73.º do Código Penal”. É evidente a omissão de falta de fundamentação e pronúncia sobre a questão posta, o que constitui nulidade nos termos do art. 379.º, n.º 1, al. c), do CPP.
VII - A omissão de pronúncia significa, na essência, ausência de posição ou de decisão do tribunal em caso ou sobre matérias em que a lei imponha que o juiz tome posição expressa sobre questões que lhe sejam submetidas: as questões que o juiz deve apreciar são todas aquelas que os sujeitos processuais interessados submetem à apreciação do tribunal (art. 660.º, n.º 2, do CPC), e as que sejam de conhecimento oficioso, isto é, de que o tribunal deva conhecer independentemente de alegação e do conteúdo concreto da questão controvertida, quer digam respeito à relação material, quer à relação processual.
VIII - As nulidades referidas, mesmo não alegadas, são oficiosamente cognoscíveis em recurso, visto que as nulidades de sentença enumeradas no art. 379.º, n.º 1, do CPP, têm regime próprio e diferenciado do regime geral das nulidades dos restantes actos processuais, estabelecendo-se no n.º 2 do mesmo artigo que as nulidades da sentença devem ser arguidas ou conhecidas em recurso.
Decisão Texto Integral: