Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
3301/17.5T8LSB.S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: CHAMBEL MOURISCO
Descritores: CESSAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO
DESPEDIMENTO COLETIVO
SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO
ACORDO DE PRÉ-REFORMA
Data do Acordão: 01/11/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Área Temática:
DIREITO DO TRABALHO – CONTRATO DE TRABALHO / VICISSITUDES CONTRATUAIS / TRANSMISSÃO DA EMPRESA OU ESTABELECIMENTO / CASOS ESPECIAIS / CEDÊNCIA OCASIONAL / NOÇÃO / INCUMPRIMENTO DO CONTRATO / PODER DISCIPLINAR / SANÇÕES DISCIPLINARES.
DIREITO CIVIL – RELAÇÕES JURÍDICAS / FACTOS JURÍDICOS / NEGÓCIO JURÍDICO / DECLARAÇÃO NEGOCIAL / INTERPRETAÇÃO E INTEGRAÇÃO.
Doutrina:
-Júlio Manuel Vieira Gomes, Direito do Trabalho, Volume I, Relações Individuais de Trabalho, Coimbra Editora, p. 868;
-Maria do Rosário Palma Ramalho, Tratado de Direito do Trabalho, Parte II - Situações Laborais Individuais, 6.ª Edição, Almedina, p. 703.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DO TRABALHO (CT): - ARTIGOS 319.º, 322.º, N.º 2 E 366.º, N.º 1.
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGO 236.º.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGO 59.º.
CÓDIGO DOS REGIMES CONTRIBUTIVOS DO SISTEMA PREVIDENCIAL DE SEGURANÇA SOCIAL, APROVADO PELA LEI N.º 110/2009, DE 16/9: - ARTIGOS 3.º-A, 19.º E 24.º.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

-DE 12-10-2017, PROCESSO N.º 24623/16.7T8LSB.S1.
Sumário :

1. A suspensão do contrato de trabalho pode resultar de um acordo entre trabalhador e empregador mediante um acordo de pré-reforma, que está sujeito a forma escrita e deve conter os elementos exigidos pelos artigos 319.º e seguintes do Código do Trabalho.

2. O despedimento coletivo que tenha abrangido o trabalhador na situação de pré-reforma tem a virtualidade de fazer cessar o contrato de trabalho e também a situação de pré-reforma.

3. A indemnização devida ao trabalhador pela cessação do contrato de trabalho por despedimento coletivo, que necessariamente fez cessar a pré-reforma, é calculada nos termos do art.º 322.º n.º 2 do Código do Trabalho, correspondendo ao montante das prestações de pré-reforma até à idade legal de reforma por velhice, e não a compensação prevista no n.º 1, do art.º 366.º, do mesmo diploma legal.

Decisão Texto Integral:

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:



                                                           I

Relatório:                                                 

1. AA intentou a presente ação declarativa de condenação, sob a forma do Processo Comum, contra BB, S.A., pedindo que se declare a validade do acordo de pré-reforma celebrado entre as partes e que, em consequência, seja a ré condenada a pagar-lhe a quantia de € 549.501,35, a título de compensação pela cessação do contrato de trabalho, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde 7 de fevereiro de 2017, até efetivo e integral pagamento.

  Alegou, em síntese, que: (i) no dia 1 de julho de 2004, foi admitido ao serviço do “CC –…” para, sob a sua autoridade e direção, desempenhar as funções de Diretor Coordenador do Departamento de Aprovisionamentos e Instalações; (ii) em agosto de 2012, regressou de Angola para Portugal, tendo sido integrado no CC a fim de exercer as funções de Diretor de Área de Manutenção e Logística da AGI – Área de Gestão Imobiliária, tendo, assim, o CC, assumido todos os direitos e obrigações da relação de trabalho que existiu entre o autor e o CC; (iii) no dia 3 de agosto de 2014, o Conselho de Administração do Banco de Portugal deliberou a constituição da ré e determinou que todos os trabalhadores e prestadores de serviços do CC seriam transferidos para a ora ré que, assim, passou a ser a entidade empregadora do autor; (iv) nasceu em 16 de abril de 1958; (v) no dia 14 de novembro de 2014, a ré propôs-lhe a celebração de um acordo de pré-reforma com vista à suspensão do contrato de trabalho, proposta essa aceite e na sequência da qual as partes viriam a celebrar, por escrito, um acordo de pré-reforma com efeitos a partir de 1 de dezembro de 2014; (vi) por força desse acordo, passou a auferir da ré, apenas, a prestação de pré‑reforma no valor de € 4.875,00, paga catorze vezes por ano; (vii) até à entrada em vigor do acordo de pré-reforma, auferia da ré uma retribuição base mensal de € 2.462,28, acrescida de remuneração complementar, no valor mensal de € 4.037,72, dispondo, ainda, de seguro de saúde, serviço de assistência médico-social (SAMS), tendo, ainda, direito à utilização de um veículo de serviço cujo valor do leasing ascendia a € 550,00 mensais; (viii) no dia 20 de Junho de 2016, a ré comunicou-lhe a decisão de proceder ao seu despedimento no âmbito de procedimento de despedimento coletivo, sendo que, no dia 7 de setembro de 2016, o seu contrato cessou e cessou, também, a situação de pré-reforma em que se encontrava; (ix) a ré apenas propôs o pagamento de uma compensação no valor de € 65.709,95, calculada nos termos do disposto no art.º 366.º, do Código do Trabalho; (x) contudo, a ré deveria ter colocado à sua disposição e pago a compensação calculada nos termos do disposto no art.º 322.º, n.º 2, do Código do Trabalho; (xi) por a ré se recusar a proceder ao pagamento da compensação calculada por apelo ao disposto no art.º 322.º, n.º 2, do Código do Trabalho, solicitou-lhe que não procedesse ao pagamento de qualquer valor a título de compensação, o que foi aceite e cumprido pela ré.

2. A ré contestou, alegando, em síntese, que: (i) o autor apenas iniciou a sua relação laboral com a ré em 1 de setembro de 2012, mantendo-se ao seu serviço até 18 de novembro de 2014, data em que as partes acordaram em suspender a relação de trabalho a partir de 1 de dezembro de 2014, passando o autor a auferir, a partir dessa data, a quantia mensal de € 4.875,00; (ii) por força do mencionado acordo, a prestação laboral do autor esteve suspensa até 7 de setembro de 2016, data em que o vínculo havido entre as partes cessou com fundamento no despedimento coletivo; (iii) o acordo celebrado entre as partes não configura qualquer acordo de pré-reforma, mas sim um acordo atípico de suspensão do contrato de trabalho; (iv) na verdade, o autor manteve-se a receber salário, sendo que as taxas contributivas a que a sua retribuição estava sujeita mantiveram-se exatamente iguais às existentes em momento anterior à celebração do acordo de suspensão do contrato de trabalho, impondo-se concluir que, atenta a ausência de comunicação e/ou articulação com a Segurança Social, não se encontra preenchido um dos requisitos, senão constitutivo, pelo menos caracterizador, da existência de uma verdadeira situação de pré-reforma; (iv) não obstante a designação que as partes atribuíram ao acordo celebrado, o mesmo contém elementos que, do ponto de vista interpretativo, impedem a sua caracterização como um acordo de pré-reforma, o que é espelhado pelo considerando D), do acordo, pela sua cláusula 1.ª, e pela sua cláusula 7.ª, n.º 3; (v) o regime da cessação do contrato de trabalho assume natureza imperativa, daí que no processo de interpretação do disposto no art.º 322.º, do Código de Trabalho, os trabalhadores em regime de pré-reforma apenas tenham direito a receber a compensação aí prevista caso a mesma seja inferior ao valor que resultaria do disposto no art.º 366.º, do Código do Trabalho; (vi) o cálculo da compensação pela cessação do contrato de trabalho, tal como defendida pelo autor, consubstancia uma clara violação do princípio da igualdade, daí que o disposto no art.º 322.º, n.º 2, na interpretação que lhe confere o autor, está ferido de inconstitucionalidade material, por violação do disposto no art.º 13.º, da Constituição da República Portuguesa; (vii) a compensação colocada à disposição do autor foi a correta; (viii) a ré apenas não procedeu ao seu pagamento ao autor por sua expressa solicitação, não lhe sendo, por conseguinte, devidos juros de mora sobre o valor global que, agora, peticiona.

            Conclui pela improcedência da ação, devendo, por conseguinte, ser absolvida dos pedidos.

            3. Foi proferido despacho saneador/sentença que julgou a ação procedente e, em consequência, condenou a ré no pagamento ao autor da quantia de € 540.556,25, a título de indemnização pela cessação do contrato de trabalho em virtude do despedimento coletivo em que foi incluído, calculada nos termos do art.º 322.º, n.º 2 e 3, do Código do Trabalho, isto é, o valor das prestações de pré-reforma até à idade legal de reforma por velhice, quantia à qual acrescem juros de mora, à taxa legal, desde 7 de setembro de 2016 até integral pagamento.

 4. Inconformada com esta decisão, a ré interpôs recurso de revista diretamente para o Supremo Tribunal de Justiça, nos termos do art.º 678.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.

 5. O recurso foi admitido pelo relator, por se encontrarem preenchidos os requisitos previstos no art.º 678.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.

 6. A ré/recorrente formulou as seguintes conclusões:

 A. O presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo Juízo do Trabalho de Lisboa, o qual condenou o R., ora Recorrente, no pagamento ao A., aqui Recorrido, do montante de € 540.556,25, a título de indemnização compensatória pela cessação do contrato de trabalho em virtude de despedimento coletivo, acrescido de juros de mora à taxa legal desde a data da cessação do contrato de trabalho e até efetivo e integral pagamento.

O Recorrente não se pode conformar com essa decisão, por considerar que o quantum indemnizatório que o mesmo se disponibilizou para pagar ao A. por ocasião da cessação do contrato de trabalho, no âmbito de processo de despedimento coletivo, nos termos do disposto no art.º 366.º do Código do Trabalho, se encontra corretamente calculado.

Por se verificarem, cumulativamente, os requisitos estabelecidos no art.º 678.º do CPC, aplicável ex vi art.º art. 87.º do CPT, designadamente (i) o valor da causa apresenta-se superior à alçada da Relação, (ii) o valor da sucumbência apresenta-se superior a metade da alçada da Relação, (iii) o Recorrente, nas suas alegações e presentes conclusões, apenas suscitou e suscitará questões de Direito e (iv) o Recorrente não impugna qualquer decisão interlocutória, requer-se que o presente recurso seja autuado como Revista, subindo per saltum diretamente ao Supremo Tribunal de Justiça.

Aliás, no caso sub judice sempre estaríamos perante uma questão cuja apreciação por esse Venerando Tribunal, pela sua relevância jurídica, seria claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, nos termos estabelecidos para o recurso de revista excecional.

B. Resulta assente nos presentes autos que o contrato de trabalho celebrado entre Recorrente e Recorrido, que se encontrava suspenso, cessou no dia 7 de setembro de 2016, no âmbito de um despedimento coletivo, no qual o Recorrido foi integrado, discutindo-se tão-somente nesta ação o alcance do acordo celebrado entre as partes em 18 de novembro de 2014, designadamente se o mesmo reveste a natureza de acordo de pré-reforma ou de suspensão atípica, bem como a forma de cálculo da compensação devida ao Recorrido pela cessação do contrato de trabalho no âmbito de um despedimento coletivo.

C. Ora, no que tange à natureza do acordo celebrado entre as partes, entende a decisão recorrida que o mesmo se reconduz a um efetivo acordo de pré-reforma – entendimento com o qual o Recorrente não se conforma, desde logo porque o nomen juris e a denominação dada às minutas trocadas entre as partes previamente à celebração do Acordo/ Contrato sub judice não tem a relevância que lhe foi atribuída na sentença recorrida para efeitos de qualificação da categoria, tipo e/ou espécie do negócio efetivamente celebrado e, consequentemente, para identificação do regime jurídico concretamente aplicável.

D. Ademais, contrariamente ao referido na sentença recorrida, a cláusula 1.ª do Acordo não se afigura inócua para a decisão a proferir nos autos, na medida em que, sendo irrelevante a antiguidade do trabalhador para a produção de efeitos do instituto da pré reforma, a introdução, no referido convénio, de uma cláusula que salvaguarda a antiguidade do A. para efeitos de “rescisão contratual” evidencia que a verdadeira intenção das partes era tão-somente suspender o contrato de trabalho do mesmo, e não passá-lo para uma verdadeira situação de pré-reforma.

Tal referência, contrariamente ao que considera a decisão recorrida, não traduz a ideia de o acordo em crise nos autos poder vir a cessar a posteriori mediante a celebração de um acordo de revogação do contrato de trabalho, antes se afigurando mais verosímil que o A. tenha procurado salvaguardar a hipótese de a relação laboral vir a cessar através de uma modalidade que lhe conferisse direito a compensação/indemnização, caso em que, por força dessa previsão contratual, a mesma deveria ser calculada tendo em conta uma antiguidade superior (5/7/2004) à que o mesmo efetivamente detinha no R. (no qual foi admitido a 16/8/2012).

O facto de terem convencionado que a antiguidade do A. seria superior à real evidencia que, as partes estavam conscientes que, em caso de “rescisão contratual”, a compensação devida ao trabalhador seria a prevista para a respetiva forma de cessação da relação laboral, pois se a indemnização devida ao A. devesse, pura e simplesmente, ser calculada de acordo com o disposto no art.º 322.º do Cód. do Trabalho, a parte não teria sentido qualquer necessidade de inserir, no acordo de pré-reforma, uma cláusula de salvaguarda da antiguidade.

E. Mas ainda que tais elementos - claramente descaracterizadores de um acordo de pré-reforma - não devessem ser tidos em conta, o que apenas se admite à cautela e sem conceder, no caso do instituto da pré-reforma a vontade dos sujeitos contratuais não é suficiente para a criação da figura, na medida em que à mesma subjazem propósitos de equidade e interesses de ordem pública, que pressupõe uma articulação com a Segurança Social.

Importa, desde logo, assinalar que, nos termos do disposto no art.º 85.º do Código dos Regimes Contributivos, encontram-se excluídos do regime da pré-reforma os trabalhadores cujo âmbito de proteção não integre as eventualidades de invalidez, velhice e morte.

No caso dos trabalhadores bancários, pese embora a sua integração parcial no regime geral da Segurança Social no ano de 2011, estabelece-se no próprio diploma que procedeu a esta integração (Decreto-Lei n.º 1-A/2011, de 3 de Janeiro) que os trabalhadores bancários passam a estar protegidos pelo regime geral apenas nas seguintes eventualidades (a) maternidade, paternidade e adoção; (b) velhice; (c) desemprego e (d) doenças profissionais, aí se excluindo a proteção destes trabalhadores nas eventualidades de invalidez e de morte.

Ora, não se encontrando as referidas eventualidades (invalidez, velhice e morte) cumulativamente integradas no âmbito de proteção da Segurança Social, na medida em que apenas a velhice passou a estar protegida pelo regime geral da Segurança Social, estarão os trabalhadores bancários excluídos do regime da pré-reforma, nos termos do disposto no citado art.º 85.º do Código dos Regimes Contributivos.

Ademais, convirá salientar que, o A. foi trabalhador bancário no período compreendido entre 1/9/2012 e 7/9/2016, e, que apesar de abrangido pelo ACT do sector bancário, esteve sempre sujeito ao regime de descontos da Segurança Social.

F. In casu, e conforme decorre do art.º 15.º do elenco dos factos provados, o Acordo denominado por “Pré-Reforma” celebrado entre o A. e o R. não foi submetido nem comunicado à Segurança Social, tendo o A. continuado a auferir salário, sendo que as taxas contributivas a que a mencionada retribuição estava sujeita mantiveram-se exatamente iguais às existentes em momento anterior à celebração do acordo de suspensão contrato de trabalho.

Assim, e ainda que a vontade das partes na celebração do acordo tenha sido passar o A. a uma verdadeira situação de pré-reforma, o que se refuta, a situação de suspensão de contrato de trabalho acordada entre A. e R, ao não ter sido articulada com a Segurança Social, não pode ser qualificada como um acordo de pré-reforma, porquanto a automacidade subjacente à transição da pré-reforma para a reforma, sem necessidade de qualquer ato voluntário por parte do trabalhador, só tem sentido se o mesmo se encontrar devidamente inscrito na Segurança Social como pré-reformado, o que visa evitar que o trabalhador, caso tenha atingido a idade legal de reforma, possa “manusear” o pedido de reforma, continuando a onerar o empregador com o pagamento de uma prestação que, aparecendo recortada a partir da última retribuição nos casos de suspensão do contrato de trabalho, implique uma bonificação da pensão a receber.

Por essa razão, o n.º 2 do art.º 84.º do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social (CRCSPSS) prevê a aplicação do Regime Previdencial da Pré-Reforma (Subsecção V) aos trabalhadores que tenham celebrado acordo de pré-reforma até ao momento em que completem a idade normal de acesso à pensão por velhice, acrescida do respetivo fator de sustentabilidade, salvo se até essa data ocorrer a extinção do acordo de pré-reforma.

G. Carece de fundamento a tese constante da sentença proferida no proc. n.º 24623/16.7T8LSB, a que a decisão recorrida aderiu in totum, de que as normas do regime da Segurança Social não relevarão para a qualificação jurídica do acordo dos autos, na medida em que a pré-reforma consubstancia um mecanismo público que, emergindo da vontade dos sujeitos, tem requisitos injuntivos para a sua validação, não podendo o Tribunal efetuar um corte epistemológico entre o Direito Laboral (de natureza privada) e o Direito de Segurança Social (de natureza previdencial), os quais coexistem historicamente, de forma umbilical.

A lógica da pré-reforma é exatamente a mesma que se encontra subjacente ao enquadramento da reforma: a análise previdencial dos pressupostos legalmente exigidos e, caso os mesmos se verifiquem, a prática de ato administrativo que atribui ao trabalhador o estatuto de reformado, o que apenas não acontecerá por ato voluntário do trabalhador nos casos em que este já se encontre pré-reformado, caso em que a desnecessidade de apresentação de qualquer requerimento do trabalhador se compreende pela circunstância de a Segurança Social já ter intervindo administrativamente no enquadramento da pré-reforma, analisando os pressupostos subjacentes à sua atribuição.

Não pode, pois, proceder o entendimento defendido na decisão recorrida de que será irrelevante para a qualificação jurídica do acordo celebrado entre as partes a circunstância de o mesmo não ter sido submetido nem comunicado à Segurança Social e/ou o facto de as taxas contributivas sobre a prestação mensal se terem mantido exatamente iguais às existentes em momento anterior à celebração do acordo.

H. A ausência de enquadramento de Segurança Social, enquanto pressuposto constitutivo do acordo, não permite qualificar a situação dos autos como uma pré-reforma, sendo, por isso, como defendido pelo Recorrente - e reforçado pelos pareceres juntos aos autos - uma suspensão atípica da relação laboral figura que tem vindo a ser reconhecida e aceite pela jurisprudência dos tribunais superiores (confira-se a título meramente exemplificativo o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 24 de outubro de 2007, disponível em www.dgsi.pt) e, bem assim, pela doutrina, aqui se remetendo novamente para os pareceres juntos aos autos.

I. Termos em que, ao considerar que o Acordo / Contrato celebrado entre Autor e Réu e plasmado no escrito particular denominado «Acordo de Pré-Reforma» só pode ser qualificado como um acordo de suspensão do contrato de trabalho na modalidade / forma típica de pré-reforma previsto nos art.ºs 318.º e seguintes do Cód. do Trabalho, mal andou a decisão recorrida, porquanto deveria a mesma ter considerado, isso sim, que o negócio jurídico celebrado entre as partes revestiu a natureza de uma suspensão atípica do contrato de trabalho.

Ao fazer essa interpretação, o Tribunal a quo interpretou e aplicou erroneamente o disposto no art.º 318.º e seguintes do Cód. do Trabalho.

J. Na sequência, considera a decisão recorrida que o efeito jurídico decorrente da celebração entre as partes de um acordo de pré-reforma - qualificação que se refuta - seria o pagamento ao Recorrido pelo Recorrente de uma compensação calculada de acordo com uma interpretação literal do disposto no art.º 322.º, n.º 2 do Cód. do Trabalho, em virtude da cessação do contrato de trabalho, entendimento este que também se refuta.

Com efeito, ainda que estivéssemos perante um verdadeiro e efetivo acordo de pré-reforma, o que apenas se admite à cautela e sem conceder, a compensação a pagar ao Recorrido sempre seria calculada nos termos do art.º 366.º do Cód. do Trabalho, já que a relação laboral cessa por efeito e em virtude de um despedimento coletivo.

Contrariamente ao entendimento preconizado pela sentença, não poderá o art.º 322.º, n.º 2, do Cód. do Trabalho, ser interpretado de forma singela e literal, devendo, isso sim, ser interpretado de forma sistemática e tendo presente a imperatividade do regime da cessação do contrato de trabalho, de acordo com o preceituado no art.º 339.º, n.º 1, do mesmo diploma legal.

K. Apesar de reconhecer a imperatividade do regime de cessação do contrato de trabalho plasmado no Cód. do Trabalho, considera, contudo, a decisão recorrida que esta imperatividade consente uma exceção ou um desvio, na medida em que, segundo o Tribunal a quo, se prevê, no próprio art.º 339.º, n.º 1, in fine, do Código do Trabalho, que o regime da cessação obrigatório poderá ser afastado por outra disposição legal; mais considerando o Tribunal que o art.º 322.º, n.º 2, do Cód. do Trabalho, poderá, enquanto disposição legal, consubstanciar uma exceção à mencionada imperatividade do regime da cessação do contrato de trabalho.

Não pode, todavia, o Recorrente conformar-se com esse entendimento simplista, na medida em que, desde logo, a sustentação formal em que a sentença se ancora não se revela apta a afastar a imperatividade do regime da cessação do contrato de trabalho e, em consequência, o critério indemnizatório previsto no art.º 366.º do Cód. do Trabalho.

O art.º 339.º, n.º 1, do Cód. do Trabalho, apenas estipula que, determinadas matérias da cessação do contrato de trabalho poderão ser reguladas por IRCT ou mesmo por contrato de trabalho, mas apenas se outras disposições legais o autorizarem, isto é, consente que poderão haver matérias convénio-dispositivas se a lei o previr.

Aliás, esse conteúdo convénio-dispositivo de algumas matérias da cessação está concretizado nos números 2 e 3 do art.º 339.º do Código do Trabalho, onde, por exemplo, se consente que os critérios indemnizatórios possam ser regulados por instrumento de regulamentação coletiva, dentro dos limites do Código.

O mencionado preceito legal (art.º 339.º, n.º 1, do Cód. do Trabalho) vem consentir a derrogação da imperatividade do regime da cessação do contrato de trabalho apenas quando outra disposição legal permitir que um instrumento de regulamentação coletiva de trabalho ou um contrato de trabalho possam estabelecer um regime distinto, ainda que balizado pelo próprio Código, sem que seja a própria disposição legal, enquanto tal, a estabelecer um regime pretensamente distinto.

L. Ademais, o artigo 322.º, n.º 2, do Cód. do Trabalho, não só não é uma norma convénio-dispositiva para os efeitos previstos no art.º 339.º, n.º 1, in fine - não se trata de norma que permita que por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho ou por contrato de trabalho se aumente o valor da indemnização em caso de cessação de contrato de trabalho - como não poderá a Lei permitir que, em razão da força e do poder negocial dos sujeitos contratuais, se estabeleça através de um simples acordo, que provoque a suspensão do contrato de trabalho, uma solução indemnizatória que antecipadamente ultrapassa o critério da antiguidade.

A vingar o entendimento plasmado na decisão recorrida estar-se-ia a esvaziar de conteúdo a imperatividade do regime da cessação do contrato de trabalho, imperatividade esta determinada por razões de coerência sistemática e cuja última ratio será proteger os trabalhadores do desequilíbrio económico existente entre as partes, assegurando simultaneamente o direito dos trabalhadores à compensação, por um lado, e a salvaguarda da competitividade das empresas, por outro lado.

Se assim não se entendesse, estaria o legislador a estabelecer um regime totalmente desconexo com a imperatividade que o próprio legislador quis atribuir ao sistema.

Esta conclusão resulta, inclusivamente, dos pareceres juntos aos autos, para os quais se remetem V. Exas., consentindo-se, porém, neste particular salientar a citação do parecer do Senhor Prof. Romano Martinez, no qual se refere que:

“(…) a compensação decorrente do despedimento coletivo consta do art.º 366.º, salientando que o legislador bloqueou genericamente a intervenção da autonomia individual e coletiva em matéria de cessação (art.º 339.º, n.º 1), admitindo, no entanto, algumas exceções (por exemplo, artigo 339.º, n.º  2 e 3, onde se inclui a compensação)”.

M. De modo a que o art.º 322.º, n.º 2, do Cód. do Trabalho, não consubstancie uma exceção intolerável ao regime imperativo do cálculo da compensação decorrente da cessação de contrato de trabalho, impõe-se que o mesmo seja conjugado com o art.º 366.º do mesmo diploma legal, no sentido em que, numa situação de cessação de contrato de trabalho e, consequentemente, de acordo de pré-reforma, o trabalhador em causa, à semelhança dos demais, terá sempre direito a receber a compensação legalmente prevista para a respetiva forma de cessação, in casu, o despedimento coletivo, exceto se esse valor resultar superior ao valor das prestações de pré-reforma que o trabalhador teria a receber até à idade da reforma - caso em que o total das prestações de pré-reforma consubstanciaria um limite indemnizatório máximo.

Ou, nas palavras do Senhor Prof. Pedro Romano Martinez, no parecer que se encontra junto aos autos, o art.º 322.º, n.º 2 do Cód. do Trabalho, consubstancia um duplo limite ao montante das compensações de trabalhadores em situações de pré-reforma abrangidos por um despedimento coletivo.

E compreende-se que assim seja, pois a tese sufragada na sentença recorrida colide gritantemente com o princípio da igualdade e, bem assim, com o princípio “para trabalho igual, salário igual”.

Impondo-se concluir pela necessidade de fazer uma interpretação sistemática do referido preceito, de forma a não permitir assimetrias de tratamento entre os trabalhadores que têm o infortúnio de se ver integrados num procedimento de despedimento coletivo.

Apenas a interpretação sufragada pelo R. e ora Recorrente permite enquadrar e dar sentido ao disposto no art.º 383.º, al. c), do Código do Trabalho, que a decisão a quo ignora.

N. Entende, todavia, a decisão recorrida dever um trabalhador pré-reformado beneficiar de especial proteção face ao trabalhador no ativo em caso de despedimento coletivo, tanto mais que o primeiro, para o Tribunal a quo, atenta a sua alegada situação de inatividade e maior proximidade da reforma, terá uma maior dificuldade em reingressar o mercado de trabalho – entendimento que veemente se rejeita.

Na verdade, a dificuldade que um trabalhador com mais de 55 anos de idade pode encontrar no reingresso no mercado de trabalho não decorre da existência de uma situação de pré-reforma ou de um contrato de trabalho em plena execução, na medida em que, tanta dificuldade em regressar ao mercado terá um trabalhador pré-reformado, com idade superior a 55 anos, cujo contrato cesse por via de um despedimento coletivo, como um trabalhador no ativo, com idade superior a 55 anos, e cujo contrato cesse no âmbito do mesmo procedimento de despedimento coletivo. Existindo alguma diferença, será no preciso sentido inverso: um trabalhador objeto de um despedimento coletivo estará em melhor condição de regressar ao mercado de trabalho se estiver numa situação de pré-reforma (a possibilidade do regresso pode, até, nem se colocar, caso tenha estabelecido, entretanto, um outro vínculo laboral) do que se estiver em plena execução do vínculo laboral que vai ser extinto.

A construção da sentença recorrida, que deverá ser revogada, assenta na (errada) presunção de que os trabalhadores em situação de pré-reforma se encontram numa situação de inatividade.

No entanto, o próprio art.º 321.º, n.º 1, do Cód. do Trabalho, estabelece a possibilidade de trabalhador em situação de pré-reforma poder desenvolver outra atividade remunerada, pelo que sempre seria o trabalhador em situação de pré-reforma (e não o trabalhador no ativo) aquele que estaria em melhores condições para lograr obter novo vínculo laboral atenta a sua disponibilidade e autorização para o efeito dada pelo seu empregador originário empregador.

Pelo que, contrariamente ao que consta da sentença, inexistirá, in casu, qualquer situação de desproteção do trabalhador pré-reformado ou necessidade de o privilegiar face aos restantes trabalhadores.

O. Ademais, a compensação a pagar a um trabalhador em situação de pré-reforma no âmbito de um despedimento coletivo não visa compensar uma eventual situação de inatividade, mas sim remir a relação laboral, o que apenas pode ser feito de acordo com o critério da antiguidade, o que parece ser ignorado pela decisão em crise.

A tese da sentença recorrida, a proceder, o que apenas se admite à cautela e sem conceder, sempre redundaria numa flagrante violação do princípio da igualdade, na medida em que habilitará um trabalhador, admitido ao serviço com 55 anos de idade, celebrar um acordo de pré-reforma e receber de imediato uma contrapartida durante mais de uma década (até à idade legal da reforma), mesmo que, entretanto, se visse abrangido por um despedimento coletivo.

Aliás, a falta de lógica subjacente à solução constante da decisão recorrida é evidenciável pelo seguinte resultado: o trabalhador pugnaria incessantemente pela cessação lícita do seu contrato de trabalho, porquanto teria direito a um montante compensatório integral e imediatamente garantido e simultaneamente a possibilidade de se libertar do cumprimento dos deveres, maxime o de lealdade, a cujo cumprimento se encontra adstrito em caso de suspensão do contrato de trabalho, assim se esvaziando de relevância o contrato originário (o de trabalho).

P. Mais se refira, ad absurdum, que, a vingar a tese da decisão recorrida, o despedimento do Recorrido assumiria a natureza de um prémio, na medida em que aquele ficaria claramente numa situação diferenciadora face aos demais trabalhadores abrangidos pelo despedimento coletivo, desde logo porque (i) lograria antecipar financeiramente as prestações de pré-reforma; (ii) a partir da cessação do contrato de trabalho e mediante o recebimento da suposta compensação, calculada nos moldes preconizados pela sentença recorrida, passaria a estar imunizado perante quaisquer vicissitudes negativas que pudessem ser sofridas pelo empregador (v.g. a insolvência), (iii) libertar-se-ia do cumprimento de todo e qualquer dever jus laboral e, adicionalmente, (iv) acederia ao subsídio de desemprego.

Neste mesmo sentido apontam os pareceres do Ilustres Senhores Professores, que se encontram juntos aos autos e para os quais se remete.

Q. A decisão recorrida não acolheu o argumento da conformidade com a Lei Fundamental, tendo considerado que a mera invocação, em abstrato, da violação do princípio constitucional da igualdade não é suficiente para alcançar tal conclusão, que apenas se poderá alicerçar em “juízos de facto muito circunstanciados”.

Ora, não pode o Recorrente conformar-se com este entendimento, porquanto o conteúdo interpretativo que se atribui ao n.º 2 do artigo 366.º do Cód. do Trabalho, ainda que tenha sido alegado com abstração, foi objeto de valoração e consunção ao caso concreto, sendo que em causa está uma interpretação constitucionalmente (des) conforme do artigo 366.º do Cód. do Trabalho e do critério utilizado para enquadrar a situação dos autos.

Não se tratando apenas da correção logico-jurídica da inclusão do caso na norma, do que se cuida é, pois, da indicação de critérios jurídicos genérica e abstratamente referidos pelo julgador ao texto legal para decidir casos semelhantes.

Ademais, nos termos do disposto no art.º 204.º da Constituição da República Portuguesa, nos feitos submetidos a julgamento não poderão os Tribunais aplicar normas que infrinjam o disposto da Lei Fundamental ou os princípios nela consagrados.

Ora no caso vertente, a decisão recorrida não só mal interpreta tecnicamente a lógica de fiscalização de constitucionalidade vigente no nosso ordenamento jurídico, ignorando a possibilidade de fiscalização concreta da constitucionalidade de normas jurídicas, como mal aplica ao caso vertente uma norma que, na interpretação sufragada pelo Tribunal a quo, claramente, infringe princípios constitucionais, a saber o da igualdade e o de “para trabalho igual, salário igual”, respetivamente previstos nos art.ºs 13.º e 59.º da Constituição da República Portuguesa.

Impondo-se concluir que a compensação que o R. e ora Recorrente se disponibilizou a pagar ao A. e ora Recorrido, por ocasião a cessação do contrato de trabalho, em virtude de despedimento coletivo e pese embora a situação de suspensão contratual acordada entre as partes, foi corretamente calculada pelo R. e ora Recorrente, nos termos do disposto no art.º 366.º do Cód. do Trabalho e, consequentemente, mal andou o Tribunal a quo ao decidir na sentença recorrida que a compensação deveria ter sido calculada ao abrigo do estabelecido no art.º 322.º, n.º 2, do Cód. do Trabalho, desconsiderando, assim, o art.º 366.º do Cód. do Trabalho e o princípio da igualdade que se encontra subjacente.

A decisão recorrida, ao aplicar o Direito, fez uma errada aplicação e interpretação do disposto nos arts.º 322.º, n.º 2, 339.º, 366.º e 383.º, al. c), todos do Cód. do Trabalho e, bem assim, dos estabelecido nos art.º 13.º, 59.º e 204.º da Constituição da República Portuguesa.

R. Termos em que, deverá ser a decisão recorrida revogada e substituída por outra que julgue totalmente improcedente os pedidos do Recorrido e confirme que o montante que o Recorrente se disponibilizou para lhe pagar, a título de compensação pela cessação do contrato de trabalho no âmbito do processo de despedimento coletivo em que aquele foi abrangido foi corretamente calculado.

7. O autor contra-alegou, defendendo a improcedência do recurso interposto pela ré.

8. Neste Supremo Tribunal de Justiça, o Excelentíssimo Senhor Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que deve ser concedida revista, revogando-se a sentença recorrida, a qual deverá ser substituída por decisão que declare que a situação dos autos não configura o instituto da pré-reforma e que a indemnização/compensação devida ao autor deverá ser calculada nos termos do art.º 366.º do Código do Trabalho.

9. O Autor apresentou a sua resposta ao parecer.

10. Nas suas conclusões, a recorrente suscita a questão de saber se o contrato celebrado, em 18 de novembro de 2014, entre as partes, é um verdadeiro contrato de pré-reforma, ou um contrato de suspensão atípico, com a consequente aplicação de diferentes regimes legais, no que respeita à forma de cálculo da indemnização a pagar ao autor.

                                                           II

A) Fundamentação de facto:

O Tribunal da 1.ª instância deu como provados os seguintes factos:

1. No dia 16 de agosto de 2012, o autor e o “CC, S.A.” subscreveram o convénio denominado “Contrato de Trabalho” sendo o seguinte o seu teor:

«Contrato de Trabalho

O CC, S.A. (…) tendo celebrado com,

AA (…) adiante designado Trabalhador,

um contrato de trabalho por tempo indeterminado, vem, nos termos e para os efeitos do artigo 106.º do Código do Trabalho, prestar as seguintes informações:

1.ª Local de Trabalho: …

2.ª Enquadramento Profissional

2.1 Grupo INível: 17Categoria – …

2.2 Data de Início do Contrato: 1 de setembro de 2012

2.3 Duração do Contrato: Sem termo

2.4 Remuneração Mensal (valores ilíquidos): € 6.500,00.

2.5 Remuneração base: € 2.462,28.

2.6 – O Trabalhador receberá mensalmente, um complemento de remuneração na quantia de € 4.037,72 a qual poderá ser incorporada, total ou parcialmente, na remuneração base por força de futuras promoções, ou aumentos contratuais.

(…)». – Documento de fls. 47, dos autos, não impugnado.

2. Até 1 de dezembro de 2014, a ré pagava ao autor, em contrapartida da sua atividade, a retribuição base mensal de € 2.462,28, a remuneração complementar mensal de € 4.037,72 – cfr., artigo 29.º, da petição inicial, e artigo 198.º, da contestação; cfr., ainda, os documentos de fls. 448 a 455, dos autos.

3. O autor beneficiava, ainda, de seguro de saúde - SAMS Quadros (associado do sindicato), de serviço de assistência médico-social – SAMS, sendo que, mediante apresentação de fatura, a ré reembolsava-lhe os valores despendidos em gasolina, portagens e estacionamento – cfr. artigo 29.º, da petição inicial, e artigo 198.º, da contestação.

4. Até 31 de dezembro de 2015, o autor utilizava um veículo de serviço cujo valor de leasing ascendia a € 550,00 por mês – cfr., artigo 30.º, da petição inicial, e artigo 199.º, da contestação.

5. Por deliberação do Banco de Portugal de 3 de agosto de 2014, foi determinada a transferência de ativos, passivos, elementos extrapatrimoniais e ativos sob gestão do “CC, S.A.” para a ora ré, sendo que todos os trabalhadores daquele Banco foram transferidos para a ré que, assim, assumiu a qualidade de empregadora do autor – cfr., o documento de fls. 93 a 119, maxime, fls. 116, alínea e), onde se lê «[t]odos os trabalhadores e prestadores de serviços do CC são transferidos para o BB, S.A.».

6. A ré propôs ao autor a suspensão do contrato de trabalho vigente entre as partes, sendo que, no dia 14 de novembro de 2014, DD, da Direção de Recursos Humanos, remeteu ao autor email cujo conteúdo é o seguinte:

«(…)

Caro AA

Conforme combinado na nossa reunião desta manhã, junto envio para sua análise o draft do acordo de pré-reforma.

Fico ao dispor caso necessite de esclarecer alguma dúvida e aguardo os seus comentários.

(…)». – Cfr., o artigo 188.º, da contestação, e o documento junto a fls. 55, dos autos, não impugnado.

7. No dia 18 de novembro de 2014, autor e ré subscreveram o convénio denominado “Acordo de Pré-Reforma”, sendo o seguinte o seu teor:

«Acordo de Pré-Reforma

Entre:

O BB S.A. (…) adiante designado por BANCO,

E

AA (…) adiante designado por Trabalhador,

Considerando que:

A – O Trabalhador se encontra ao serviço do BB, exercendo funções de Diretor, correspondente à categoria profissional de Diretor, com o nível 17 da tabela remuneratória do ACT para o Sector Bancário;

B – A retribuição mensal ilíquida do Trabalhador é de € 6.500,00, constituída pelas seguintes parcelas:

Retribuição base: € 2.462,28;

Diuturnidades: € 0;

Remuneração Complementar: € 4.037,72;

C – O Trabalhador tem 56 anos de idade;

D – O Banco manifestou interesse em suspender a relação de trabalho, e o Trabalhador também tem interesse nessa situação, passando assim à situação de pré-reforma,

é celebrado e reciprocamente aceite o presente Acordo, o qual se regerá pelo constante das Cláusulas seguintes:

CLÁUSULA PRIMEIRA

O Trabalhador faz parte do quadro de pessoal efetivo do BANCO desde 1 de setembro de 2012, sendo que a sua antiguidade, para efeitos de rescisão contratual, se reporta a 5 de julho de 2004.

CLÁUSULA SEGUNDA

O BANCO e o Trabalhador acordam em que este, a partir de 1 de dezembro de 2014, continuando a fazer parte dos seus quadros de pessoal e abrangido pelo ACT para o Sector Bancário, passe à situação de pré-reforma.

CLÁUSULA TERCEIRA

1 – A partir da data referida na Cláusula anterior, o BANCO passará a pagar ao Trabalhador uma prestação mensal de pré-reforma de € 4.875,00 (quatro mil oitocentos e setenta e cinco euros), composta pela retribuição mensal base, diuturnidades e remuneração complementar.

2 – A prestação de pré-reforma será paga 14 vezes por ano, sendo a 13.ª e a 14.ª prestações pagas até ao dia 31 de janeiro e 30 de novembro de cada ano, respetivamente.

CLÁUSULA QUARTA

A prestação de pré-reforma referida na Cláusula anterior será anualmente atualizada em percentagem igual à que for negociada para a retribuição em sede de ACT para o Sector Bancário.

CLÁUSULA QUINTA

A prestação de pré-reforma goza de todas as garantias, e privilégios, reconhecidos à retribuição.

CLÁUSULA SEXTA

O Trabalhador continuará a usufruir da atual viatura de serviço até 31 de dezembro de 2015, data em que deverá entregar a viatura de serviço, nas devidas condições de conservação, de acordo com a política AOV em vigor no Banco, ou, querendo, a partir da referida data, deverá negociar com Locarent a aquisição do mesmo.

CLÁUSULA SÉTIMA

1 – Durante a situação de pré-reforma, o Trabalhador pode exercer atividade profissional remunerada.

2 – O disposto no número anterior não prejudica os deveres de respeito, lealdade e o de não concorrência que impendem sobre o Trabalhador, o qual se obriga a manter absoluta confidencialidade sobre todos os dossiers, documentos, dados e informações que obteve no exercício de funções.

3 – Enquanto se mantiver na situação de pré-reforma, o BANCO poderá solicitar ao Trabalhador a prestação de trabalho, sempre que tal se revele necessário, interrompendo-se, nesse momento, a suspensão da prestação de trabalho.

CLÁUSULA OITAVA

O Trabalhador será colocado na situação de reforma em 16 de abril de 2023, data em que completa 65 anos de idade, ou antes desta data se assim for acordado, ou eventualmente vier a ocorrer a sua invalidez.

CLÁUSULA NONA

1 – A situação de pré-reforma cessa, ou é levantada:

a) – Com a passagem à reforma do Trabalhador, quer por limite de idade, quer por invalidez;

b) – Com o regresso do Trabalhador ao pleno exercício de funções, devendo este comparecer no Departamento de Recursos Humanos no prazo máximo de 60 (sessenta) dias, após ter sido notificado para o efeito.

CLÁUSULA DÉCIMA

A caducidade do contrato de trabalho por limite de idade ou invalidez, confere ao Trabalhador e seus familiares, todos os direitos, relativos à pensão de reforma e de sobrevivência previstos no sistema de Segurança Social constante do ACT, para o Sector Bancário.

(…)». Cfr., o documento de fls. 48 a 50, dos autos.

8. Após 1 de dezembro de 2014, o autor passou a auferir da ré, apenas e exclusivamente, a prestação mensal de € 4.875,00, paga catorze vezes ao ano. – acordo das partes, cfr., artigos 31.º e 32.º, da petição inicial, e artigos 200.º e 201.º, da contestação.

9. No dia 20 de junho de 2016, a ré remeteu ao autor a missiva constante de fls. 51 a 54, dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, relevando do teor da mesma a «comunicação de decisão de despedimento no âmbito de procedimento de despedimento coletivo» e a decisão, tomada pela ré, de fazer cessar o contrato de trabalho com o autor, com efeitos reportados a 7 de setembro de 2016. – Cfr., o documento de fls. 51 a 54, dos autos; cfr., igualmente, o acordo das partes: artigos 34.º a 36.º, da petição inicial, e artigo 202.º, da contestação.

10. Na comunicação referida em 9., a ré informou o autor que a compensação fixada no âmbito do despedimento coletivo era calculada nos termos do artigo 366.º do Código do Trabalho, ascendendo o seu valor a € 65.709,95. – cfr., o documento de fls. 51 a 54; cfr., igualmente, o acordo das partes: artigo 37.º, da petição inicial, e artigo 203.º, da contestação.

11. No dia 20 de junho de 2016, o autor remeteu à ré missiva, sendo o seguinte o seu teor:

«(…)

Exmos. Senhores,

Na sequência da vossa carta, hoje recebida, em que comunicaram a cessação do meu contrato de trabalho por despedimento no âmbito de um despedimento coletivo, cumpre-me informar V. Exas. que não me conformo com a decisão tomada por V. Exas., nomeadamente, por entender que a compensação que me foi atribuída não corresponder à legalmente devida.

Como V. Exas. bem sabem, ou pelo menos deveriam saber, por me encontrar em situação de pré-reforma, a indemnização a que tenho direito na sequência da cessação do meu contrato de trabalho no âmbito de processo de despedimento coletivo deverá ser calculada nos termos previstos no n.º 2 do art.º 322º do Código do Trabalho, sendo o seu montante o correspondente às prestações de pré-reforma que se venceriam desde a data da cessação do meu contrato de trabalho até à idade legal da minha reforma por velhice.

Assim, se V. Exas. não corrigirem o valor da compensação que me atribuíram, nos termos referidos no parágrafo anterior, não me restará outra alternativa senão impugnar a licitude do despedimento de que fui alvo.

(…)» - Cfr. documento de fls. 85, dos autos.

12. Por missiva datada de 22 de junho de 2016, o autor comunicou à ré como segue:

«(…)

Exmos. Senhores,

Na sequência da cessação do meu contrato de trabalho por despedimento coletivo promovido por V. Exas., da carta que ontem vos enviei a comunicar a minha não conformação com esse despedimento e da nossa reunião de hoje, comunico-vos uma vez mais que não aceito a decisão de despedimento de que fui alvo, pelo que irei impugnar a licitude da mesma.

Assim, solicito que V. Exas. não procedam ao pagamento, por transferência bancária ou por qualquer outro meio, da compensação que me fixada no âmbito desse despedimento, no valor de € 65.709,95 (…).

Caso V. Exas. não acatem o pedido acima referido, desde já vos informo que não assumirei a responsabilidade pelo pagamento de quaisquer contribuições para a segurança social ou impostos decorrentes do pagamento indevido de tais montantes.

(…)». – Cfr. documento de fls. 86, dos autos.

13. Datada de 8 de julho de 2016, a ré enviou ao autor missiva cujo teor é o seguinte:

«(…)

Exmo. Senhor,

Por comunicação de decisão de despedimento, no âmbito de procedimento de despedimento coletivo, foi V. Exa. informado(a) de que o BB lhe iria pagar a compensação devida nesse âmbito.

V. Exa. veio, por comunicação escrita, informar o BB de que não pretende receber a compensação para, dessa forma, evitar a presunção de aceitação do despedimento, nos termos do art.º 366.º, nºs. 4 e 5, do Código do Trabalho.

Assim, informa-se que, em obediência à sua solicitação, o BB se irá abster de pôr à disposição a compensação cujo pagamento lhe foi oportunamente transmitido, não podendo V. Exa. se prevalecer dessa circunstância para, por qualquer forma, invocar a invalidade do despedimento.

(…)» - Cfr. documento de fls. 87.

14. Mediante solicitação do autor, a ré não procedeu ao pagamento da compensação, no valor de € 65.709,95. – cfr., os documentos referidos em 11. e 12., e a expressa confissão das partes – cfr., o artigo 41.º, da petição inicial, e o artigo 207.º, da contestação.

15. O Acordo referido em 7. não foi submetido nem comunicado à Segurança Social. – facto que se retira dos articulados das partes, maxime, o artigo 14.º, da petição inicial, e os artigos 49.º e 51.º, da contestação.

16. As taxas contributivas sobre a prestação mensal referida na cláusula terceira do acordo referido em 7. mantiveram-se iguais às existentes em momento anterior à celebração desse acordo. – facto que se retira dos articulados das partes, maxime, o artigo 14.º, da petição inicial, e os artigos 49.º a 52.º, da contestação; Cfr. igualmente, os documentos de fls. 438 a 455, dos autos.

17. A prestação mensal referida na cláusula terceira do acordo referido em 7. foi sempre paga pela ré ao autor com o processamento e emissão de recibos de vencimento, integrando essa prestação os seguintes valores: € 2.462,28, a título de vencimento base e € 2.412,72, a título de remuneração complementar. – Cfr. os documentos de fls. 438 a 447, dos autos.

18. O autor nasceu no dia 16 de abril de 1958. Cfr., o documento de fls. 466, dos autos.

B) Fundamentação de Direito:

B1) Os presentes autos respeitam a ação declarativa de condenação instaurada em 6 de fevereiro de 2017, tendo sido proferida sentença pela 1.ª instância em 31 de janeiro de 2017.

Assim sendo, o regime processual aplicável é o seguinte:

- O Código de Processo do Trabalho, na versão operada pela Lei n.º 63/2013, de 27 de agosto;

- O Código de Processo Civil, na versão conferida pela Lei n.º 41/2013, de 26 de junho.

B2) Como já se referiu a questão suscitada pela ré/recorrente neste recurso de revista consiste em saber se o contrato celebrado, em 18 de novembro de 2014, entre as partes, é um verdadeiro contrato de pré-reforma, ou um contrato de suspensão atípico, com a consequente aplicação de diferentes regimes legais, no que concerne à forma de cálculo da indemnização a pagar ao autor.

O Código do Trabalho, no capítulo V, referente às vicissitudes contratuais, prevê a redução da atividade e suspensão de contrato de trabalho, tipificando no art.º 318.º a pré-reforma, que define como a situação de redução ou suspensão da prestação de trabalho, constituída por acordo entre empregador e trabalhador com idade igual ou superior a 55 anos, durante a qual este tem direito a receber do empregador uma prestação pecuniária mensal, denominada de pré-reforma.

No caso concreto dos autos, o autor e a ré, que estavam vinculados por um contrato de trabalho, iniciado em 1/09/2012, entabularam negociações com vista à suspensão desse contrato, tendo em 14/11/2014, DD, da Direção de Recursos Humanos da ré, remetido ao autor um email com o esboço do que apelidou de “acordo de pré-reforma”. 

Na sequência dessas negociações, o autor e a ré subscreveram, em 18/11/2014, um documento que denominaram de “acordo de pré-reforma”, que se encontra transcrito, na parte que releva, no ponto 7 dos factos provados.

Analisando esse documento constata-se que no mesmo consta a identificação, assinaturas e domicílio ou sede das partes, a manifestação de vontade destas em suspender o contrato de trabalho, a consignação de que o autor tinha na data 56 anos de idade e o montante da prestação mensal que o autor ia receber a partir da data que fixaram para a produção de efeitos do acordo, tudo em conformidade com o disposto nos artigos 318.º e 319.º do Código do Trabalho.

 O acordado quanto à prestação mensal que a ré se comprometeu a pagar ao autor, bem como as futuras atualizações, também está em conformidade com o disposto no art.º 320.º do Código do Trabalho, pois sendo no montante de € 4.875,00, não excede a retribuição que o autor auferia, que era de € 6.500,00, nem é inferior a 25% da mesma, sendo atualizada anualmente em percentagem igual à que for negociada para a retribuição em sede de Acordo Coletivo de Trabalho para o setor bancário.

Quanto aos direitos do trabalhador também foi salvaguardado o disposto no art.º 321 do Código do Trabalho, como se pode observar pelo disposto nas cláusulas 6.º e 7.ª, usufruição da viatura de serviço até 31/12/2015 e a possibilidade de exercer atividade profissional remunerada.

Já quanto à cessação da situação de suspensão do contrato de trabalho o aludido documento, na cláusula 9.ª, faz referência às situações previstas nas alíneas a. (com a reforma do trabalhador, por velhice ou invalidez) e b. (com o regresso do trabalhador ao pleno exercício de funções, por acordo com o empregador ou nos termos do n.º 3 do artigo anterior) do art.º 322.º n.º 1 do Código do Trabalho, mas não faz qualquer referência à alínea c. (com a cessação do contrato de trabalho).

  Neste documento as referências expressas à situação de pré-reforma do autor são recorrentes, denotando, no plano substancial, uma preocupação de adotar a estrutura seguida pelo Código do Trabalho na parte referente à pré-reforma.

A recorrente, em defesa da sua tese de que não se trata de um acordo de pré-reforma mas sim de uma suspensão atípica do contrato de trabalho, veio aduzir alguns argumentos que iremos apreciar de seguida.

Defende a recorrente que a cláusula 1.ª do acordo, que celebrou o autor, indicia que a verdadeira intenção das partes era tão só suspender o contrato de trabalho deste e não passá-lo para uma verdadeira situação de pré-reforma, pois sendo irrelevante a antiguidade do trabalhador para a produção de efeitos do instituto da pré-reforma, a introdução, no referido convénio, de uma cláusula que salvaguarda a antiguidade do autor para efeitos de “rescisão contratual” evidencia essa intenção.

Acrescenta que tal referência, contrariamente ao que considera a decisão da 1.ª instância, não traduz a ideia de o acordo em crise nos autos poder vir a cessar posteriormente, mediante a celebração de um acordo de revogação do contrato de trabalho, parecendo antes mais plausível que o autor tenha procurado salvaguardar a hipótese de a relação laboral vir a cessar através de uma modalidade que lhe conferisse direito a compensação/indemnização, caso em que, por força dessa previsão contratual, a mesma deveria ser calculada tendo em conta uma antiguidade reportada a 5/7/2004, portanto superior à que detinha na ré, pois foi admitido a 16/8/2012.

Reforça ainda o facto de as partes terem convencionado que a antiguidade do autor seria superior à real o que evidencia que estavam conscientes que, em caso de “rescisão contratual”, a compensação que lhe era devida seria a prevista para a respetiva forma de cessação da relação laboral, pois se a indemnização devida ao autor devesse ser apenas calculada nos termos do art.º 322.º, n.º 2, do Código do Trabalho, não teria havido necessidade de inserir no acordo a referida cláusula de salvaguarda da antiguidade.

O enunciado argumento não tem a relevância pretendida pela recorrente para a decisão da questão, pois a introdução na cláusula 1.ª da referência à antiguidade, reportada a 5 de julho de 2004, para efeitos de rescisão contratual, pode ter sido motivada por inúmeras razões, que não foram especificadas, pelo que não se pode agora vir invocar essa referência como determinante para alterar a substância do acordo.

Refere ainda a recorrente que, nos termos do disposto no art.º 85.º do Código dos Regimes Contributivos, encontram-se excluídos do regime de pré-reforma os trabalhadores cujo âmbito de proteção não integre as eventualidades de invalidez, velhice e morte, o que é o caso dos trabalhadores bancários, que nos termos do diploma que procedeu à sua integração parcial no regime geral de Segurança Social, Decreto-Lei n.º 1-A/2011, de 3 de janeiro, excluiu a proteção destes trabalhadores nas eventualidades de invalidez e de morte.

Acrescenta que o autor foi trabalhador bancário no período compreendido entre 1/9/2012 e 7/9/2016, e, apesar de abrangido pelo ACT do sector bancário, esteve sempre sujeito ao regime de descontos para a Segurança Social.

Vejamos pois se esta questão, suscitada pela recorrente, tem a virtualidade de produzir alguns reflexos no acordo celebrado pelas partes.

O Decreto-Lei n.º 54/2009, de 2 de março, determinou a inscrição dos novos trabalhadores bancários no regime geral de segurança social.

O articulado deste diploma tem é do seguinte teor:

Artigo 1.º (Âmbito)

1 - Os trabalhadores contratados pelas instituições bancárias após a entrada em vigor do presente decreto-lei são obrigatoriamente abrangidos pelo sistema de segurança social no âmbito do respetivo regime geral.

2 - Para os efeitos previstos no número anterior, as instituições bancárias assumem a qualidade de contribuintes, ficando sujeitas às obrigações decorrentes da respetiva vinculação ao sistema de segurança social nos termos legalmente estabelecidos.

Artigo 2.º (Regime substitutivo em grupo fechado)

Aos trabalhadores do sector bancário contratados até ao dia anterior ao da entrada em vigor do presente decreto-lei e aos quais seja aplicável regime de segurança social substitutivo constante de instrumento de regulamentação coletiva de trabalho vigente no sector, enquanto prestarem serviço em instituição em que vigore regime substitutivo, é aplicável o regime substitutivo vigente nessa instituição.

Artigo 3.º (Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários)

A Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários deixa, a partir da entrada em vigor do presente decreto-lei, de proceder à inscrição de novos beneficiários.

Artigo 4.º (Entrada em vigor)

O presente decreto-lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Por seu turno, o Decreto-Lei n.º 1-A/2011, de 3 de janeiro, veio aprofundar o processo de integração dos trabalhadores do sector bancário no regime geral de segurança social, concretizando o acordo celebrado entre o Governo, através do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, a Associação Portuguesa de Bancos, em representação das instituições de crédito, e a FEBASE - Federação do Sector Financeiro, a 20 de Outubro de 2010.

Este diploma estabeleceu que os trabalhadores bancários, que na altura estavam abrangidos pela Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários (CAFEB), passariam a estar abrangidos pelo regime geral de segurança social para efeitos de proteção nas eventualidades de maternidade, paternidade e adoção e na velhice (art.º 3.º).

No preâmbulo do diploma refere-se: “o regime substitutivo de proteção social previsto nos instrumentos de regulação coletiva de trabalho aplicáveis no sector bancário continua a desempenhar um papel extremamente relevante na proteção social dos trabalhadores para efeitos de proteção nas eventualidades de doença, invalidez, sobrevivência e morte. Assim, mantêm-se as regras constantes dos instrumentos de regulação coletiva de trabalho aplicáveis no sector bancário de forma complementar ao regime geral de segurança social nas eventualidades ainda não integradas”.

O art.º 3.º-A, do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, aprovado pela Lei n.º 110/2009, de 16/9, que entrou em vigor em 1/1/2011, já estabelecia a integração no regime geral da segurança social nas eventualidades referidas de maternidade, paternidade, a adoção e velhice, dos trabalhadores bancários abrangidos por regime de segurança social substitutivo constante de instrumento de regulamentação coletiva de trabalho vigente no sector bancário.

É neste mesmo Código que consta a norma invocada pela recorrente (art.º 85.º) que considera excluídos do regime da pré-reforma os trabalhadores cujo âmbito de proteção não integre as eventualidades de invalidez, velhice e morte.

Só que este art.º 85.º, cuja epígrafe é “ Trabalhadores excluídos” está inserido na secção I, que dispõe sobre “Trabalhadores com âmbito material de proteção reduzida”, que faz parte do Capítulo II, que versa sobre “Regimes aplicáveis a trabalhadores integrados em categorias ou situações específicas”.

No caso concreto, resulta dos autos, e a recorrente sublinha nas suas conclusões, que o autor foi trabalhador bancário no período compreendido entre 1/9/2012 e 7/9/2016, e, apesar de abrangido pelo ACT do sector bancário, esteve sempre sujeito ao regime de descontos para a Segurança Social.

Sendo assim, não estamos perante um trabalhador bancário abrangido pelo regime transitório, em que eventualmente se poderia discutir qual o seu âmbito de proteção, face às disposições legais transitórias referidas e também face ao regime do Acordo Coletivo de Trabalho em vigor.

Está pois em discussão a situação de um trabalhador bancário inscrito no regime geral de segurança social desde que iniciou funções na ré através de contrato de trabalho, em 1/09/2012.

Colocada a questão nestes termos, há que reconhecer que o referido trabalhador está abrangido pelo regime geral de segurança social, com caráter de obrigatoriedade, e beneficia da proteção social conferida pelos regimes do sistema previdencial que integra a proteção nas eventualidades de invalidez, velhice e morte, nos termos dos artigos 19.º e 24.º do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial da Segurança Social.

Finalmente a recorrente argumenta que a situação de suspensão de contrato de trabalho acordada entre o autor e a ré não pode ser qualificada como um acordo de pré-reforma, porque não houve submissão nem comunicação à Segurança Social.

O Decreto Regulamentar n.º 1-A/2011, de 3 de janeiro, que procede à regulamentação do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, estabelece no seu art.º 43 que a entidade empregadora deve remeter o acordo de pré-reforma à instituição de segurança social competente no prazo de cinco dias após a sua entrada em vigor.

Segundo resulta do ponto 15 dos factos provados o denominado acordo de pré‑reforma não foi submetido nem comunicado à Segurança Social.

Como já foi referido por este Supremo Tribunal de Justiça no acórdão de 12/10/2017, Processo n.º 24623/16.7T8LSB.S1, a falta de comunicação à Segurança Social não é condição de validade do acordo celebrado entre as partes, pois o Código do Trabalho não a enuncia no elenco dos requisitos formais como condição indispensável à existência de um acordo de pré-reforma, nem tão pouco a exige como fator essencial e juridicamente imprescindível à sua validade.

De qualquer forma, e como também foi referido no aludido aresto, esta alegação da recorrente está a questionar um facto próprio, pois cabia-lhe a ela fazer essa comunicação, na sua qualidade de empregador, caso pretendesse beneficiar da redução das prestações contributivas que lhe cabiam.

Neste contexto, este argumento apresentado pela ré não é aceitável, na medida que a aludida omissão é da sua responsabilidade.

Temos assim que a argumentação aduzida pela recorrente, quer no plano formal, quer no plano substancial, não é suscetível de colocar em crise a qualificação do acordo celebrado pelas partes, pois do mesmo constam todos os requisitos exigidos pelo Código do Trabalho para um acordo de pré-reforma, sendo certo, como já se referiu, que é visível que as partes tiveram a preocupação de adotar a estrutura seguida pelo Código do Trabalho na parte referente a este instituto.

Considerando que estamos perante um acordo que encerra uma pluralidade de declarações negociais há que interpretá-lo nas suas várias dimensões sempre com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, como determina o art.º 236.º do Código Civil.

No caso concreto, as manifestações de vontade do autor e da ré consubstanciadas no acordo que denominaram de “pré-reforma”, analisadas de uma forma objetiva não deixam margem para dúvidas de que pretenderam uma suspensão do contrato de trabalho enquadrado no regime da pré-reforma, tal como se encontra previsto no art.º 318.º a 322.º do Código do Trabalho.

B3) Importa agora determinar qual indemnização que é devida ao autor uma vez que o seu contrato de trabalho veio a cessar, em 20 de junho de 2016, por despedimento coletivo.

A ré como resulta do ponto 10. dos factos provados informou o autor que a compensação fixada no âmbito do despedimento coletivo era calculada nos termos do art.º 366.º do Código do Trabalho, ascendendo o seu valor a € 65.709,95.

A sentença recorrida condenou a ré no pagamento da indemnização no montante de € 540.556,25, calculada nos termos do art.º 322.º, n.º 2 e 3, do Código do Trabalho, isto é, o valor das prestações de reforma até à data legal da reforma por velhice.

O art.º 339.º do Código do Trabalho, sob a epígrafe “Imperatividade do regime de cessação do contrato de trabalho”, estatui o seguinte:

1 - O regime estabelecido no presente capítulo não pode ser afastado por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho ou por contrato de trabalho, salvo o disposto nos números seguintes ou em outra disposição legal.

2 - Os critérios de definição de indemnizações e os prazos de procedimento e de aviso prévio consagrados neste capítulo podem ser regulados por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho.

3 - Os valores de indemnizações podem, dentro dos limites deste Código, ser regulados por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho.

O art.º 366.º do Código do Trabalho dispõe quanto à compensação por despedimento coletivo.

Por seu turno, o inserido na subsecção da Pré-reforma, o art.º 322.º do Código do Trabalho, com a epígrafe “Cessação de pré-reforma” refere:

1 - A pré-reforma cessa:

a) Com a reforma do trabalhador, por velhice ou invalidez;

b) Com o regresso do trabalhador ao pleno exercício de funções, por acordo com o empregador ou nos termos do n.º 3 do artigo anterior;

c) Com a cessação do contrato de trabalho.

2 - Na situação prevista na alínea c) do número anterior, caso a modalidade de cessação do contrato de trabalho conferisse ao trabalhador direito a indemnização ou compensação se estivesse no pleno exercício de funções, aquele tem direito a indemnização no montante das prestações de pré-reforma até à idade legal de reforma por velhice.

3 - A indemnização referida no número anterior tem por base o montante da prestação de pré-reforma à data da cessação do contrato de trabalho.

Temos assim que o próprio Código do Trabalho prevê um regime especial de indemnização quando ocorra a cessação da situação de pré-reforma em virtude da cessação do contrato de trabalho, no montante das prestações de pré-reforma até à idade legal de reforma por velhice.

Este regime é bastante claro tanto no plano doutrinário como jurisprudencial.

Maria do Rosário Palma Ramalho (Tratado de Direito do Trabalho, Parte II - Situações Laborais Individuais, 6ª Edição, Almedina, pág. 703) a propósito da cessação da situação de pré-reforma refere que se o contrato de trabalho cessar por outra via há que adaptar à situação o valor da indemnização a que o trabalhador tenha, eventualmente, direito, em virtude da cessação do contrato (art.º 322.º n.º 2 e 3).

Também Júlio Manuel Vieira Gomes (Direito do Trabalho, Volume I, Relações Individuais de Trabalho, Coimbra Editora, pág. 868) tece a seguinte reflexão que se transcreve:

“A situação de pré-reforma não é destituída de riscos para o trabalhador até porque este vê significativamente reduzida a sua indemnização caso seja despedido, já que não terá direito à indemnização por antiguidade. Com efeito, quando o contrato de trabalho cesse, extinguindo-se a situação de pré-reforma, de modo que, se o trabalhador estivesse no pleno exercício das suas funções, teria direito a uma compensação ou indemnização correspondente ao montante das prestações de pré-reforma até à idade legal da reforma, sendo que será tida como base para o efeito do cálculo da indemnização a última prestação de pré-reforma devida à data da cessação do contrato de trabalho.”

Também este Supremo Tribunal de Justiça, no acórdão de 12/10/2017, Processo n.º 24623/16.7T8LSB.S1, já se pronunciou neste sentido afirmando que “os efeitos decorrentes da cessação da pré-reforma, no que concerne à indemnização devida ao trabalhador, são os produzidos em função de tal causa, isto é, os estatuídos no art.º 322.º, n.º 2, do Código do Trabalho de 2009, pelo que deverá o autor ser indemnizado segundo essa regra, calculando-se o montante das prestações nesses termos, e não de acordo com a compensação prevista no n.º 1, do art.º 366.º, do mesmo Código”.

Perante este quadro doutrinário e jurisprudencial bem andou o Tribunal de 1.ª Instância ao calcular a indemnização nos termos do art.º 322.º n.º 2 e 3 do Código do Trabalho.

B4) Finalmente, a ré sustenta que a interpretação feita pelo Tribunal da 1.ª instância das referidas normas, no que concerne ao cálculo da indemnização pela cessação da pré-reforma em virtude de despedimento coletivo, viola os princípios da igualdade e de “para trabalho igual salário igual” (artigos 13.º e 59.º da Constituição da República Portuguesa).

Esta questão também já foi objeto de pronúncia por parte deste Supremo Tribunal de Justiça, no acórdão acima referido, tendo-se concluído de forma negativa.

O conteúdo jurídico-constitucional do princípio da igualdade tem sido sedimentado no plano doutrinário e jurisprudencial numa tríplice vertente: (i) proibição do arbítrio; (ii) proibição de discriminação; (iii) obrigação de diferenciação.

Este princípio basilar do Estado de Direito obriga a que se trate como igual o que for necessariamente igual e como diferente o que for essencialmente diferente, não impedindo a diferenciação de tratamento, mas tão só a discriminação arbitrária e o que for considerado irrazoável.

No presente caso não se verifica qualquer violação de nenhuma das dimensões do princípio da igualdade porque o regime legal previsto no art.º 322.º n.º 2, do Código do Trabalho é aplicável a todos os trabalhadores em situação de pré-reforma cujo contrato venha a cessarem que esta venha a cessar (n.º 1 alínea c) do mesmo diploma legal).

Por outro lado, todos os outros trabalhadores que não estejam nessa situação, e cujo contrato venha a cessar por despedimento coletivo têm direito à indemnização calculada nos termos do art.º 366.º do Código do Trabalho.  

Temos de reconhecer que estamos perante situações diferentes que têm de ser tratadas de forma diferenciada, desde logo porque os trabalhadores na situação de pré-reforma quando celebraram o respetivo acordo criaram expetativas que merecem ser tuteladas.

No caso concreto, também não se vislumbra qualquer violação do princípio consagrado no art.º 59.º da Constituição da República Portuguesa “para trabalho igual salário igual”, pois não está em causa qualquer discriminação em termos remuneratórios de trabalhadores que prestem as mesmas funções, em termos de natureza, quantidade e qualidade.

O que efetivamente está em causa são diferentes fórmulas de cálculo de indemnizações em virtude de despedimento coletivo em relação a trabalhadores que se encontram em situações laborais diferentes, uns na situação de pré-reforma, outros numa situação laboral ativa.

Nem se poderá dizer, em resultado dessas diferentes fórmulas de cálculo, que uns são beneficiados em relação aos outros, pois isso dependerá de cada situação concreta, sendo certo que o que há que tutelar são as expetativas criadas por quem, em determinadas circunstâncias, celebrou um acordo de pré-reforma.

                                                           III

            Decisão:

Face ao exposto acorda-se em negar a revista, confirmando-se a sentença recorrida.

Custas a cargo da recorrente.

Anexa-se sumário do acórdão.

Lisboa, 11 de janeiro de 2018

Chambel Mourisco (Relator)

Pinto Hespanhol

Gonçalves Rocha