Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
171/15.1T8STR.E2.S1
Nº Convencional: 6.ª SECÇÃO
Relator: ANA PAULA BOULAROT
Descritores: DESTITUIÇÃO DE GERENTE
PACTO SOCIAL
INTERPRETAÇÃO DA DECLARAÇÃO NEGOCIAL
TEORIA DA IMPRESSÃO DO DESTINATÁRIO
DIREITO ESPECIAL À GERÊNCIA
GERÊNCIA PLURAL
CADUCIDADE
CLÁUSULA CONTRATUAL
REPRESENTAÇÃO
ABUSO DO DIREITO
VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM
Data do Acordão: 10/19/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA (COMÉRCIO)
Decisão: NEGADA A REVISTA.
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO.
Sumário :
I - Sendo o contrato de sociedade obrigatoriamente reduzido a escrito, como deflui do art. 7.º, n.º 1, do CSC, a interpretação das suas cláusulas obedecerá ao princípio da impressão do declaratário.
II - A propósito da interpretação da declaração negocial o art. 236.º, n.º 1, do CC preceitua: “A declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário possa deduzir do comportamento do declarante salvo se este não puder razoavelmente contar com ele.”, acrescentando o n.º 2 “Sempre que o declaratário conheça a vontade real do declarante é de acordo com ela que vale a declaração emitida”.
III - Como deflui da cláusula 5.ª, cuja interpretação é questionada “a gerência da sociedade, dispensada de caução e remunerada ou não, conforme for deliberado em assembleia geral, pertence a ambos os sócios, que desde já ficam nomeados gerentes. Para obrigar validamente a sociedade, em qualquer ato ou contrato, em juízo ou fora dele, tornam-se necessárias as assinaturas dos dois sócios gerentes”, daí resultando é que a gerência ficaria a pertencer a ambos os sócios, o recorrente e o recorrido, impondo-se como exigência para obrigar a sociedade, a intervenção e assinatura de ambos.
IV - Contudo, aí não se exigiu que a gerência apenas fosse exercida por aqueles dois específicos sócios, nem se excluiu a possibilidade de a gerência ser assumida por outras pessoas estranhas à sociedade, nos termos do disposto no art. 252.º, n.º 1, do CSC; nem se antolha que naquela cláusula se tivesse consignado algum direito especial, nos termos do art. 24.º, n.º 1, do mesmo diploma, maxime, estabelecendo, quiçá, a imposição de que a gerência da sociedade apenas tivesse sido cometida àqueles ad eternum, sem possibilidade de intervenção de outrem.
Decisão Texto Integral:



PROC 171/15.1T8STR.E2.S1

6ª SECÇÃO

ACORDAM, NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

I AA, instaurou contra BB ação especial de destituição de titulares de órgãos sociais, pedindo (i) a suspensão imediata do Requerido da gerência da sociedade, (ii) a destituição do Requerido da gerência da sociedade, (iii) a declaração de caducidade da cláusula do contrato social relativa à gerência plural da sociedade e (iv) a condenação do Requerido no pagamento de uma indemnização a liquidar para ressarcimento dos prejuízos causados à sociedade.

Alegou, em resumo, que Requerente e Requerido são os únicos sócios e gerentes da sociedade social por quotas “Eduardo Marques & Rosa, Ldª”, a qual tem por objeto o fabrico de cantaria para a construção civil, em mármore, granito e outros produtos de pedra e comércio por grosso dos mesmos produtos e que, para além da gerência exerciam, respetivamente, as funções ........; a partir de Março de 2014, o Requerido passou a ausentar-se continuamente das instalações fabris da sociedade o que motivou desentendimentos entre os sócios, uma vez que o Requerente, para além das funções de ... passou também, contra a sua vontade, a desempenhar funções que incumbiam ao Requerido; a relação entre os sócios agravou-se e o Requerido começou a recusar-se a assinar documentação essencial ao funcionamento da sociedade, uma vez que esta se obriga com a assinatura de ambos os gerentes, visando paralisar a sociedade com prejuízo para a atividade para acabar.

Foi proferida decisão que suspendeu o Requerido das funções de gerente da sociedade e ordenou a citação deste para a ação de destituição.

Contestou o Requerido por excepção e por impugnação, tendo deduzido pedido reconvencional; em sede de defesa indirecta invocou o erro na forma do processo e a ilegitimidade passiva e ativa das partes para a ação; em sede de defesa directa, impugnou os factos alegados pelo Requerente, considerando, em resumo, que sempre cumpriu com as suas funções de gerente e demais atribuições societárias que lhe incumbem, o mesmo não ocorrendo com o Requerente que desde meados de 2014 começou a tentar controlar unilateralmente a sociedade e a excluir o Requerido das decisões societárias, destituindo-o das funções ....., reduzindo unilateralmente o seu vencimento, tomando outras decisões unilaterais com prejuízo para o Requerido e para a sociedade, expulsando o Requerido das instalações da sociedade, com recurso a agressões físicas e a ameaças de morte, incentivando os empregados do sociedade a não receberem ou executarem ordens suas, insultando e ameaçando frequentemente o Requerido e desautorizando-o junto de clientes e fornecedores da sociedade.

Concluiu pela absolvição da instância; caso assim não se entendesse, pela improcedência da ação; em qualquer caso, pela condenação do Requerente no pagamento de uma indeminização para ressarcimento de danos patrimoniais e não patrimoniais, aqueles a liquidar e estes no montante de € 9.500,00.

Na resposta o Requerente concluiu pela improcedência das exceções e do pedido reconvencional.

Foi proferido despacho a julgar inadmissível o pedido reconvencional, improcedentes a exceção do erro na forma do processo e da ilegitimidade das partes.

A final foi produzida sentença onde se deixou consignado:

«(…) decido julgar procedente a presente ação e, nessa conformidade:

1) destituir o requerido BB das funções de gerente da sociedade “Eduardo Marques & Rosa, Lda.”, e

2) julgar caduca a cláusula quinta do pacto social da referida sociedade, na parte referente à existência duma gerência plural.».

Desta decisão, inconformado, recorreu o Requerido, tendo sido proferido Acórdão a julgar parcialmente procedente a Apelação, revogando-se a sentença na parte em que julgou caduca a cláusula quinta do pacto social da sociedade Eduardo Marques & Rosa, Lda, mantendo-a quanto ao mais.

Irresignado com este desfecho recorre agora de Revista o Requerido, apresentando as seguintes conclusões:

- A cláusula 5ª do pacto social da Eduardo Marques & Rosa, Lda expressa: A gerência da sociedade, dispensada de caução e remunerada ou não, conforme for deliberado em assembleia geral, pertence a ambos os sócios, que desde já ficam nomeados gerentes. Para obrigar validamente a sociedade, em qualquer ato ou contrato, em juízo ou fora dele, tornam-se necessárias as assinaturas dos dois sócios gerentes;

- O mesmo é dizer que a gerência da sociedade pertence a AA e BB, que desde já ficam nomeados gerentes;

- E, para a obrigar é necessária a assinatura dos dois sócios gerentes.

- Só aos sócios podem ser criados atribuídos direitos e deveres especiais (Art.º 24º, n. 1º C.S.C.)

- É possível criar direitos especiais aplicáveis a todos os sócios;

- Recorrente e recorrido quiseram criar esse direito especial – atribuir a gerência unicamente a eles próprios e só, conforme resulta da interpretação do contrato social;) Para se ser gerente ter-se-á de se ser sócio – esta é a especialidade de tal direito;

- Ainda que os sócios venham a recorrer à nomeação judicial de um gerente, a nomeação desse gerente pelo Tribunal não respeitará a cláusula quinta do contrato social;

- Impondo igualmente a sua alteração através de deliberação, o que não se antevê possível.

- A cláusula quinta do contrato social configura um direito especial à gerência dos sócios;

- O douto Acórdão em crise violou o art.º 253º, n.º 3, primeira parte, do Código das Sociedades Comerciais.

Nas contra alegações, o Requerente, aqui Recorrido, concluiu, no que à economia da temática em tela diz respeito, o seguinte:

- A Douta Decisão emanada do Douto Tribunal da Relação, tendo   dado provimento ao recurso apresentado pelo ora Recorrido quanto à Questão da Caducidade da Cláusula Quinta do Pacto Social, e assim alocando a pretensão do ora Recorrido na questão, essencial, da gestão da Sociedade; - Não deixou, contudo, de dar resposta positiva ao Pedido formulado pelo ora recorrente na sua Petição Inicial da Acção que intentou na 1. ª Instância; -Uma vez que o ora Recorrente especificou, no seu Pedido, a título alternativo: - “…seja julgada caduca a clausula do contrato social respeitante à gerência plural, constante do nº 5 do contrato social ou, se assim se não entender, seja nomeado gerente, nos termos da lei…”;

- Ou seja, o ora Recorrente admitiu ad initio, no seu Pedido Inicial que podia não ser julgada caduca a cláusula Quinta do Pacto social: - “…ou se assim se não entender…”;

- Ora, como resulta da Lei do processo, o Pedido só pode ser alterado até ao início da Discussão na 1. ª Instância, na salvaguarda do Princípio da Estabilidade da Instância; sendo que tal não ocorreu!

- Sendo ainda o Pedido Inicial que norteia todo o processado subsequente, designadamente os Recursos e demais tramitações que vierem a ocorrer;

- Pelo que o Douto Tribunal da Relação ..... não deixou de dar uma resposta Positiva ao Pedido Inicial do ora Recorrente; formulado no sentido de admitir que não fosse declarada caduca a cláusula Quinta do Pacto social da Sociedade Eduardo Marques & Rosa Ld. ª;

- Assim, vindo agora com o presente recurso da Douta Decisão do Tribunal da Relação, em absoluta desconformidade com o seu Pedido Inicial na Acção Judicial que deu origem a tudo o que, entretanto, se processou;

- Está o ora Recorrente, salvo o devido respeito, a cair numa concreta situação de “Venire contra factum proprium”; Pelo que, em claro Abuso de Direito;

- Não devendo pois, o Recurso de Revista apresentado, ser admitido, uma vez que a pretensão do recorrente configura Abuso de Direito;

- Para além de mais inexistem os fundamentos de Facto invocados pelo Recorrente;

Pois, embora seja verdade que o recorrente AA e o recorrido BB são cunhados e que quando, em 1995, constituíram entre si a sociedade Eduardo Marques & Rosa, Lda, pretendendo distribuir o capital de forma igualitária, de modo que ambas as posições societárias fossem equiparadas; Almejando manter uma sociedade de cariz familiar;

- Já não é verdade que pretendessem vedar a entrada de estranhos na sociedade, obrigando ao consentimento do sócio não cedente, dado que uma vez que os sócios se não entendem entre Si, haverá necessidade da interposição de uma outra pessoa – como gerente – Doutro modo e como tem acontecido um dos Sócios é “Rei e Senhor” como único Gerente e o outro Sócio é, simplesmente, ignorado;

. O alegado direito especial de apenas os sócios acederem à gerência jamais pode ser invocado num caso em que não a salvaguarda dos interesses de ambos os sócios e da própria Sociedade;

- E estará, sempre, subordinado às necessidades e vontades de ambos os Sócios, que podem designar, na competente Assembleia, ou por Via Judicial, outros Gerentes;

II As instâncias declararam como assentes os seguintes factos:

1. O A. e o R. são os únicos sócios e gerentes da sociedade comercial por quotas com a firma “Eduardo Marques & Rosa, Ldª”, com sede em Valinho de Fátima, freguesia de Fátima, com o número único de matrícula e pessoa coletiva 501 642 951, com o capital social de € 500.000,00 €, dividido em duas quotas, no valor nominal de € 250.000,00 € cada uma, pertencente uma a cada um dos sócios.

2. A sociedade tem por objeto: “fabricação de cantaria para a construção civil, em mármore, granito e outros produtos de pedra e comércio por grosso e a retalho dos mesmos produtos”.

3. A sociedade obriga-se mediante a assinatura dos dois sócios gerentes.

4. A constituição da sociedade foi registada em 26-2-1986.

5. A mesma viu a sua atividade e volume de negócios alavancados pela construção civil até, pelo menos, 2004. 6. A exploração da pedreira iniciou-se, pelo menos, por volta de 2004, tendo o negócio sido alavancado pela exportação de pedra em bloco, exploração essa atualmente diminuta.

7. Pelo menos parte da reserva financeira que a sociedade atualmente possui resulta da exploração de pedreiras próprias e exportação de blocos.

8. O R., além de gerente, exercia as funções ..., auferindo, pelo exercício do cargo de gerente …... o salário de 2.820,00 €.

9. No primeiro trimestre de 2014 o R. negociou a aquisição, para si, de uma grande propriedade, em ..., tendo adquirido a mesma em abril de 2014.

10. Em data não concretamente apurada, mas seguramente após o período das férias do Verão de 2014, o R. começou a recusar-se a assinar, nomeadamente, a documentação respeitante: à certificação de qualidade da sociedade Eduardo Marques & Rosa, Ldª; e a movimentação de contas bancárias, junto do BCP, BES e Montepio.

11. A sociedade Eduardo Marques & Rosa, Ldª, tinha uma reserva financeira superior a 2.000.000,00 €.

12. A distribuição de tal reserva financeira não era favorável à sociedade, quer por causa das dificuldades que o sector da construção civil atravessa, quer porque as mesmas representam uma necessária “almofada” aos negócios sociais, cuja principal vantagem, ao nível de descontos conseguidos, está na aquisição, a pronto, dos blocos de pedra para transformar.

13. A Diretora Financeira da “Eduardo Marques & Rosa, Ldª” é esposa do A. e irmã do R. e desde sempre preparou os pagamentos transferências, sendo que há mais de 6 anos a esta parte, o fazia através de homebanking.

14. O R., junto dos Bancos, logo nos primeiros dias de setembro/2014, unilateralmente, retirou os poderes de movimentação bancária à irmã.

15. Assim, antes de 12/09/2014, o R. conseguiu retirar os poderes que havia conferido a sua irmã, CC, Diretora Administrativa e Financeira, para que esta em nome da sociedade Eduardo Marques & Rosa, Ldª, efetuasse operações bancárias online, isto é, pagamentos a fornecedores, Estado, trabalhadores e demais entidades.

16. Por carta registada com aviso de receção datada de 16-9-2014, remetida em 17-9-2014 e recebida em 18-9-2014, o A. convocou o R. para uma reunião de gerência para o dia 26/09/2014, pelas 17 horas «dadas as dificuldades surgidas nos últimos meses, quanto à prática dos atos necessários ou convenientes para a realização do objeto social da sociedade», integrando na Ordem de Trabalhos os seguintes pontos «(…) 3 Análise e cessação dos contratos de arrendamento de terrenos para exploração da pedreira; 4 Análise e reajustamento do organigrama da sociedade e das funções de chefia e direção; 5 Análise e fixação do salário das Chefias / Direção e dos trabalhadores; 6 Análise e ratificação dos atos praticados apenas por um dos gerentes, nomeadamente: 6.1. Respeitantes à certificação de qualidade da sociedade; 6.2 À movimentação de contas bancárias; 7 Análise e aprovação dos orçamentos respeitantes aos trabalhos a realizar nas instalações fabris da sociedade; 8 Análise e apreciação das perspetivas futuras da sociedade».

17. Da referida convocatória constava «Se à hora marcada não estiverem presentes todos os Gerentes a reunião terá lugar meia hora mais tarde com os gerentes presentes.».

18. Em resposta, o R., por carta registada que remeteu ao A. em 19-9-2014, declarou, nomeadamente, que «Recebi a Vossa missiva, que considero sem qualquer efeito por não cumprir o prazo da convocatória estabelecido no disposto do artigo 248º do Código das Sociedades Comerciais, que é de 15 dias. (…) Fico, no entanto, consternado com a vossa proposta da ordem de trabalhos uma vez que propõe a adoção de procedimentos contrários ao legalmente estabelecido. É meu entendimento que os mesmos devem ser debatidos em Assembleia Geral da qual anexo convocatória…».

19. Em anexo à referida resposta, o R. juntou documento intitulado “Convocatória” para Assembleia Geral Extraordinária a decorrer no dia 10 de Outubro às 10 horas, com, nomeadamente, os seguintes pontos da ordem de trabalhos: «Ponto três: Análise e cessação dos contratos de arrendamento de terrenos para exploração da pedreira; Ponto quatro: Análise e reajustamento do organigrama da sociedade e das funções de chefia e direção; Ponto cinco: Análise e fixação do salário das Chefias/Direção e dos trabalhadores; Ponto seis: Análise e ratificação dos atos praticados apenas por um dos gerentes, nomeadamente: 1. Respeitantes à certificação de qualidade da sociedade; 2 À movimentação de contas bancárias; Ponto sete: Análise e apreciação dos orçamentos respeitantes aos trabalhos a realizar nas instalações fabris da sociedade; Ponto oito: Análise e apreciação das perspetivas futuras da sociedade; Ponto nove: Destituição de gerente; Ponto dez: Transmissão de quota».

20. O R. informou o A. que não poderia estar presente na reunião de gerência por compromissos assumidos em nome da sociedade, e sugeriu que fosse agendado outro dia para a reunião.

21. Em 22/09/2014, o R. elaborou o documento junto a fls. 99, que aqui se dá como integralmente reproduzido, intitulado “alteração de procedimentos”, onde expressa, além do mais, o seguinte: “… 2 depósitos vencidos: contactar Contabilidade, para averiguar a distribuição de dividendos dos montantes vencidos desde que salvaguardadas as reservas legais obrigatórias. 6 Certificação da empresa uma vez que se anteveem alterações profundas na administração da sociedade, questionar entidade certificadora da possibilidade de adiamento da auditoria.

22. Com este documento, o R. pretendia alterar um conjunto de regras de funcionamento interno, unilateralmente e sem consultar o outro gerente.

23. Porque nada havia sido deliberado ou sequer acordado em gerência, o A. apôs no documento “Dona CC, em relação a todos os procedimentos listados neste documento deverá proceder como é usual na empresa”.

24. Porque a Diretora Financeira continuou a proceder como até aí habitualmente vinha procedendo, o R. criou a convicção de que a Diretora Financeira não fazia o que ele mandava.

25. O R. não compareceu à reunião de gerência, mas o A. efetuou-a não obstante, tendo mandado lavrar a respetiva ata, nos termos constantes de fls. 76-86, que aqui se dão por integralmente reproduzidos.

26. Até à presente data, o R. não impugnou judicialmente qualquer deliberação resultante desta reunião de gerência.

27. No âmbito desta reunião de gerência, o único gerente presente, o Autor, votou favoravelmente, nomeadamente, as seguintes propostas, que passaram a ser executadas, sem que da Ata, no fim, conste a sua aprovação:

a) O valor da renda mensal paga pela sociedade aos sócios pelo arrendamento de terrenos respeitante à exploração da pedreira foi reduzido em 70%;

b) O R. deixou de constar do organigrama da sociedade como seu ..., passando tal função a ser exercida por DD;

c) A retribuição mensal do R. foi reduzida em € 1.500,00, parcela considerada como respeitante às funções de ...;

d) O trabalhador DD foi atualizado para € 1.500,00, a partir do mês de outubro de 2014.

28. O trabalhador DD é filho do A. e da Diretora Financeira da sociedade, e foi quem passou a desempenhar as funções de ....

29. DD manteve o mesmo salário e a mesma categoria profissional não obstante a votação na reunião de gerência do mesmo passar a ser ....

30. Em consequência da votação, o ordenado base do R. foi reduzido para € 1.320,00.

31. O vencimento do R. foi reduzido com fundamento na ausência, frequente do R. das instalações fabris e porque o mesmo, a determinada altura, declarou que só queria ser gerente da sociedade.

32. O valor das rendas mensais pagas pela sociedade em cumprimento do contrato de arrendamento de terrenos respeitante à exploração da pedreira foi diminuído com fundamento na integral exploração dos terrenos cedidos, faltando apenas executar o plano de lavra.

33. O R. opôs-se verbalmente a todas estas medidas, quer perante o A., quer perante funcionários da empresa.

34. O contabilista da sociedade, EE, deu nota da ata da reunião de gerência ao R.

35. Ao tomar conhecimento da mesma, o R. apenas assinou parte dos salários, por não concordar com o aumento salarial do sobrinho em cerca de 73%. ao sobrinho do R. não foram assinados pelo R., e como tal não foram pagos, porque a Diretora Financeira recusou-se a tirar o vencimento do filho da mesma.

37. Desde essa data, o R. deixou de assinar os pagamentos aos fornecedores.

38. A Direção Administrativa e Financeira tinha preparadas as transferências dos salários em 30/09/2014 mas o R. inicialmente recusou-se a assiná-las e, só depois de muitas insistências, as assinou.

39. A Direção Administrativa e Financeira processou os salários e, como usualmente, solicitou ao R. que se procedesse à transferência bancária dos mesmos.

40. O R. recusou-se a assinar a transferência bancária, pelo que os trabalhadores na mesma referida, bem como os gerentes, não receberam salário de outubro na data de vencimento.

41. Porque as relações entre os sócios se agudizaram cada vez mais, e a empresa tinha sido advertida pela Seguradora de Acidentes de Trabalho da necessidade de existir controlo de assiduidade, no dia 01/10/2014 foi afixada junto do relógio de ponto uma comunicação solicitando a todos os trabalhadores a correta marcação do relógio de ponto, acompanhada de uma declaração a ser assinada por estes, em como tomaram conhecimento.

42. Nesse mesmo dia, o R. impediu o filho FF de marcar o ponto, e retirou a comunicação do local onde estava afixado, tendo-a devolvido à Direção Administrativa e Financeira.

43. Realizou-se em 10/10/2014 a Assembleia Geral Extraordinária, sendo que, no início da mesma, o R. pediu a sua suspensão, por não ter sido admitida a intervenção do seu Mandatário, cujos poderes incluíam os de estar presente e representar o R. na referida AG podendo em seu nome discutir e votar todos os pontos da ordem de trabalhos da mesma, e, perante o indeferimento da suspensão pelo A., na qualidade de Presidente da A.G., o R. abandonou a reunião, e recusou-se a assinar a ata respetiva, junta a fls. 110-113 dos autos, cujos

termos se dão aqui por integralmente reproduzidos.

44. A sociedade Eduardo Marques & Rosa, Ldª, requereu a notificação judicial avulsa do R., nos termos e para os efeitos do artº 63/1 C. S. C., a qual foi efetuada em 12/11/2014.

45. Até à presente data o R. não impugnou a referida Assembleia Geral;

46. Após estes acontecimentos, o R. recusa-se, em geral, a assinar todo e qualquer documento respeitante à gestão da sociedade;

47. Desde o início de outubro até pelo menos maio de 2015, o R. apenas assinou o pagamento ao IAPMEI, em março, no montante de +/- 22.000,00 €.

48. Por causa das suas relações de parentesco ou afinidade com A e R., os trabalhadores: CC, esposa do A.; DD, filho do A.; e FF, filho do R., não marcavam relógio de ponto.

49. O R. apresentou 2 (duas) propostas ao Autor, uma das quais na primeira semana de setembro de 2014 e a outra após o dia 10 de outubro de 2014, para divisão de todo o património comum, incluindo o da empresa.

50. O salário dos trabalhadores de novembro e dezembro de 2014 apenas foi pago porque o A. recebeu, em dinheiro, créditos da sociedade, que aplicou ao pagamento dos referidos salários.

51. Em outubro e novembro de 2014, o R., unilateralmente, alterou o procedimento de abastecimento do seu veículo e começou a colocar gasóleo em conta corrente na sequência da sociedade ter deixado de ter forma de pagar as faturas que este apresentava para reembolso.

52. O que o A. não assentiu.

53. A sociedade Eduardo Marques & Rosa, Ldª, ainda no exercício da sua atividade, levou a efeito a exploração de uma pedreira nos terrenos sitos em ..., próximos do seu estabelecimento fabril;

54. A exploração dessa pedreira implica a emissão de garantia bancária a favor da CCDRLVT, cuja emissão o R. solicitou ao BCP, mas recusou-se a assinar.

55. Face ao comportamento do R., já referido, a Direção Administrativa e Financeira passou a relacionar-se com aquele, por escrito, juntando ao diverso expediente uma folha de protocolo que aquele deveria assinar e devolver.

56. O R. recusou-se a assinar esses protocolos, mas tomou conhecimento deles, uma vez que os devolvia, pessoalmente, à Direção Administrativa e Financeira; e foi atestado, por terceiras pessoas a sua entrega.

57. O R. sabe que o IVA, IRS dos trabalhadores, Segurança Social e IMI têm se ser pagos.

58. A sociedade Eduardo Marques & Rosa, Ldª, estava notificada pela AT para penhorar parte do salário do trabalhador GG.

59. Em 06/11/2014 a Direção Administrativa e Financeira deu conhecimento, por escrito, ao R. da necessidade de efetuar a entrega à A. T. do montante penhorado ao trabalhador, mas o R. recusou-se a assinar o cheque para entrega do montante penhorado.

60. Em 06/11/2014 a Direção Administrativa e Financeira deu conhecimento ao R. da emissão da declaração periódica de IVA e da necessidade de fazer a entrega do imposto ao Estado, no montante de 4.718,64 €.

61. O R. recusou-se a assinar o cheque de pagamento, mesmo depois de alertado das consequências pelo contabilista.

62. Em consequência, a sociedade foi citada, em 18/12/2014 da instauração de um processo de execução fiscal e para pagar 4.795,10 €.

63. Em 07/11/2014 a Direção Administrativa e Financeira, entregou notas de pagamento a fornecedores, que já deviam ter sido pagas em outubro / 2014, a saber:

a) Nota de pagamento 5191, de 17/10/2014, no montante de 418,82 €

b) Nota de pagamento 5195, de 20/10/2014, no montante de 95,94 €

c) Nota de pagamento 5196, de 20/10/2014, no montante de 187,42 €

64. Estas notas de pagamento estavam acompanhadas dos respetivos cheques, que o R. não assinou.

65. Em 11/11/2014 a Direção Administrativa e Financeira voltou a dar a conhecer ao R dos pedidos de pagamento do fornecedor ......., Ldª, da sua fatura nº ......, mas o R. recusou-se a assinar o pagamento, apesar de saber e ter sido alertado de que o pagamento era a pronto.

66. Em 11/11/2014 a Direção Administrativa e Financeira deu conhecimento ao R. da necessidade de pagar, a pronto, a pedra comprada a ..., SA, tal como fora contratado.

67. Como o R. não assinou o cheque, a sociedade perdeu o desconto de pronto pagamento.

68. Em 12/11/2014, face à recusa do R. em assinar, a sociedade Eduardo Marques & Rosa, Ldª, remeteu à Direção Regional da Economia de Lisboa e Vale do Tejo do Ministério da Economia o “Programa Trienal de Pedreiras”, assinado apenas pelo A..

69. A sociedade Eduardo Marques & Rosa, Ldª contratara com HH, seu representante em ..., o pagamento de serviço de importação de pedra para o estrangeiro.

70. Em 13/11/2014 a Diretora Administrativa e Financeira telefonou ao R., para vir pagar àquele HH.

71. O R. recusou-se a comparecer e, face ao compromisso assumido, o A. pagou com numerário seu a quantia de 1.470,00 €.

72. Em 17/11/2014 a Direção Administrativa deu conhecimento ao R. da necessidade de pagar a renovação dos Serviços de Auditoria e Certificação, mas o R. nada assinou.

73. A sociedade carece de autorizar o Sr. Arquiteto II para concluir, junto das competentes autoridades administrativas, a alteração do estabelecimento fabril, mas o R. não assina tal autorização, pelo que o procedimento irá ser arquivado.

74. No dia 21/11/2014, foi ao local onde o DD (filho do A.) estava a programar a CNC e daí retirou o programa/sistema de programação que se encontra numa pen/flash drive.

75. Em 15/12/2014 a sociedade Eduardo Marques & Rosa, Ldª, foi notificada pela A.T. da execução fiscal pelo não pagamento, no prazo legal, do IMI, no montante de 498,30 €.

76. A sociedade não fez o pagamento tempestivo do IMI porque o R. não assinou o cheque para o efeito.

77. Em 17/12/2014 a sociedade Eduardo Marques & Rosa, Ldª, foi notificada pela AT da execução fiscal pelo não pagamento, no prazo legal, do IRS no montante de 4.057,96 € e para pagar, agora, 4.132,96 €.

78. A sociedade não fez a entrega do IRS tempestivamente porque o R. não assinou o cheque para o efeito.

79. A sociedade também não fez o pagamento tempestivo por conta do IRC, face à recusa do R. em assinar, nem da Segurança Social de Outubro / 2014.

80. A sociedade Eduardo Marques & Rosa, Ldª, tinha contratado um fornecimento por parte  …..., Ldª a pronto pagamento.

81. Apesar de se saber de tal fornecimento e de esclarecido e informado de toda a documentação por protocolo datado de 10/11/2014, o R. não assinou o cheque.

82. O fornecedor deslocou-se de ... para receber e, face à recusa do R. em assinar, o montante foi pago com numerário do A..

83. Desde 31/10/2014, data em que o R. assinou as transferências de salários dos trabalhadores que recebem pelo BCP, que o mesmo não assina qualquer outro documento, quer respeitante à gestão corrente da sociedade, quer para qualquer outro fim.

84. Em relação às despesas correntes de luz, as mesmas por estarem em débito bancário têm sido pagas.

85. Em relação às comunicações a sociedade esteve na iminência de lhe serem cortadas, por falta de pagamento.

86. Em relação a outras despesas menores, gasóleo, portagens, etc., em que tal seja possível, a sociedade tem vindo a pagá-las recorrendo ao cartão de crédito atribuído pela sociedade ao A..

87. Bem como em relação aos impostos.

88. Em 21-11-2014 verificou-se um desentendimento nos escritórios da empresa entre o A. e o R., com participação da mulher e filho daquele, que careceu da presença de INEM e da GNR, e originou a apresentação de queixa-crime da parte do R..

89. Em 24/11/2014, o R., o seu filho FF e a sua cunhada JJ, apresentaram declaração de baixa médica, remetidas para o contabilista.

90. Situação em que ainda se manteve até 05/01/2015, em relação ao R. e seu filho, e a trabalhadora JJ fez cessar o contrato de trabalho.

91. Até à data acima referida, o R. (e os seus familiares) não se apresentaram ao trabalho.

92. Apesar da baixa médica, o R. foi visto no café de sua mãe diariamente.

93. JJ é concunhada do R. (casada com o irmão da esposa do requerido).

94. Para poder ocorrer à gestão corrente da sociedade, nomeadamente pagar a fornecedores, trabalhadores e ao Estado, o A. abriu conta bancária em seu nome, no Novo Banco, em 15/12/2014, para a qual mandou canalizar os recebimentos da sociedade.

95. Quando o R. pedia documentação à irmã, a mesma mandava-o procurar nos dossiers do escritório, sendo que até outubro de 2016 tinha livre acesso ao escritório e a toda a documentação constante do mesmo, com a exceção de um armário que a irmã mantinha fechado à chave.

96. Relativamente à documentação guardada pelo contabilista e informação detida pelo mesmo, o R. tinha acesso à informação que o Dr. EE lhe fornecia voluntariamente, sendo que o mesmo nunca lhe forneceu informação sobre a conta particular que o Autor abriu e colocou à disposição da sociedade.

97. A partir da primeira decisão cautelar de suspensão das funções de gerente, o contabilista deixou de lhe entregar documentação da sociedade, reencaminhando-o para as instalações da mesma.

98. No dia 24/10/2014 foi feito relatório de acompanhamento às instalações pela entidade de higiene e segurança no trabalho.

99. O R. opôs-se ao cumprimento das recomendações de segurança constante do mesmo, nomeadamente a colocação de grelhas laterais de segurança e as mesmas só foram executadas à revelia deste e ainda não estão pagas porque não disponibiliza os meios financeiros para tal.

100. Igualmente, ao R. foi solicitado que aprovasse orçamento e possibilitasse a sociedade de meios financeiros para aquisição de um conjunto de lâminas diamantadas necessárias para fazer trabalhar o engenho de serragem de pedra;

101. No dia 15/01/2015, o R. apôs, pelo seu punho, os seguintes escritos: “Recusado, o gerente”, sem consignar qualquer justificação, relativamente ao orçamento para aquisição do conjunto de lâminas.

102. No dia 27/01/2015 foi transmitido ao R. que o depósito no Novo banco se havia vencido.

103. No dia seguinte, o R. escreveu, pelo seu punho: “Dividendos”, o Sócio 50% e gerente, ao que o A. apôs no documento “Convoque o sócio e gerente interessado a reunião necessária.”

104. O telemóvel da sociedade que era utilizado pela esposa do R., a título pessoal, foi cortado por falta de pagamento.

105. As instalações fabris são extremamente quentes no verão e muito frias no inverno, o que leva os trabalhadores a queixarem-se.

106. O telhado das instalações fabris da sociedade é em fibrocimento e antigo, podendo ter um pé direito mais alto.

107. Fruto da exploração da pedreira, o pavilhão apresenta já um pilar “descalço”.

108. A sociedade não paga ao requerido qualquer vencimento/retribuição nem lhe paga e/ou à sua esposa quaisquer rendas relativas aos prédios de propriedade comum.

109. Devido à atuação do R., a sociedade incorreu já, por causa das execuções fiscais que foram instauradas, nos seguintes dispêndios:

a) Juros de mora referentes às contribuições para a S.S. de 2014/10 – 79,00 €

b) Juros de mora referentes às contribuições para a S.S. de 2014/11 – 49,77 €

c) Coima e custas referentes ao pagamento do IVA Set./2014 – 1.453,84 €

d) Custas pela falta de pagamento de IMI no montante de 19,10 €

e) Juros e custas referentes a falta IRS/Dez/2014 no montante de 71,77 €

f) Juros e custas referentes a falta IRS/Nov/2014 no montante de 75,96 €

g) Custas referentes ao pagamento do IVA /2014 – 76,46 €

h) Coima e custas de IVA em falta Outubro/2014 no montante de 1.053,05 €

110. Teve de incorrer no pagamento de comissões bancárias no montante de 18,10 €.

111. Em 12-2-2015 foi proferida decisão cautelar de suspensão do R. das funções de gerente na “Eduardo Marques & Rosa, Lda.”, sem a audição prévia do requerido.

112. Em 5-3-2015 foi registada a instauração da vertente ação no registo comercial da “Eduardo Marques & Rosa, Lda.”, pela Ap. 1.

113. Em 21-4-2016 foi proferido acórdão pelo Tribunal da Relação ..... mantendo a suspensão do R. das funções de gerente da sociedade, e assim revogando a sentença da 1ª instância de 6-5-2015 que, após audição do requerido, tinha levantado a suspensão.

114. Em 27-10-2016 foi registada a decisão final do procedimento cautelar, pela Ap. 1, no sentido da suspensão de BB das suas funções de gerente e determinação que a gerência da sociedade passasse a ser exercida singularmente por AA, com a referência do trânsito em julgado da sentença em 2016-09-30.

115. O R. esteve internado na psiquiatria entre 20-10-2008 e 27-10-2008, no seguimento de um episódio psicótico cujo diagnóstico, pelos contornos psicopatológicos se poderia configurar num contexto maníaco de uma possível Doença Afetiva Bipolar, com quadro de consumo acentuado de álcool, secundário ao quadro afetivo.

116. É desconhecida a evolução clínica do R. desde 7-1-2009, uma vez que faltou às consultas de 15-4-2009 e 9-10-2013.

117. Do artigo quinto do pacto social da “Eduardo Marques & Rosa, Lda.” consta «A gerência da sociedade, dispensada de caução e remunerada ou não, conforme for deliberado em assembleia geral, pertence a ambos os sócios, que desde ficam nomeados gerentes. Para obrigar validamente a sociedade, em qualquer ato ou contrato, em juízo ou fora dele, tornam-se necessárias as assinaturas dos dois sócios gerentes.».

Não provado:

a) Contemporaneamente à celebração do contrato-promessa da …..., até à escritura e após esta, o R. começou a deslocar-se  …... praticamente diariamente, desprezando as suas funções .......

b) Tais ausências eram contínuas.

c) Devido a tais ausências, o A. teve de passar a dar, praticamente todos os dias, as instruções ao pessoal da produção.

d) Não obstante o cancelamento da autorização de movimentação das contas bancárias através do homebanking pela Diretora Financeira, a sociedade sempre manteve disponíveis meios de pagamento como cartões de débito, de crédito e dinheiro, que lhe permitiam continuar, de forma regular, a efetuar todos os pagamentos.

e) O A. remeteu ao R., por carta registada em 30/09/2014, a ata da reunião de gerência de 26/9/2014, que este recebeu.

f) O A., sem qualquer fundamento, a meados do ano 2014 começou a tentar controlar unilateralmente toda a atividade da sociedade, tudo fazendo para excluir o requerido das decisões sobre a mesma.

g) Com o fito, manifesto, de excluir o requerido definitivamente da mesma.

h) Tomando decisões unilaterais e lesivas quer do requerido, quer do filho deste, funcionário da Sociedade, quer de quem, dentro da mesma, respeitava de igual modo as decisões de ambos os gerentes; quer da própria Sociedade.

i) As viaturas foram distribuídas aos sócios para utilização e benefício pessoal dos mesmos, sem ligação específica às suas funções, nomeadamente as de gerente.

j) O A. tinha também projetos, exclusivamente pessoais, relativos a obras faraónicas na sociedade, designadamente a construção/montagem/aplicação de um sistema de painéis fotovoltaicos, com um custo previsto de cerca de 650,000,00 €;

k) Pretende renovar, sem qualquer necessidade, a cobertura da fábrica, o que implica um custo previsto da ordem dos 245.000,00€.

l) Adquiriu, recentemente uma máquina de corte de pedra, que não era de todo prioritária, que custou cerca de 180.000,00 €;

m) Tudo isto contra a vontade expressa do R. e sem qualquer intento que não descapitalizar a sociedade para que o requerido não possa fazer valer a sua vontade, enquanto sócio, designadamente quanto à eventual distribuição de dividendos.

n) O A. proibiu o funcionário das bombas de combustível onde a sociedade abastecia a sua frota, e o R. abastecia o carro da sociedade que lhe estava distribuído, de fornecer a este qualquer combustível a crédito, em nome da sociedade.

1.Questão prévia do abuso de direito.

O Recorrido em sede de contra alegações de recurso sustenta que o Recorrente ao formular, na Petição Inicial, o pedido que fosse julgada caduca a cláusula do contrato social respeitante à gerência plural, constante do nº 5 do contrato social ou, se assim se não entender, seja nomeado gerente, nos termos da lei, admitiu desde logo que podia não ser julgada caduca a cláusula Quinta do Pacto social; ora, resultando da Lei do processo que o pedido só pode ser alterado até ao início da discussão na 1. ª Instância, na salvaguarda do princípio da estabilidade da Instância e porque tal não ocorreu e tendo o Tribunal da Relação dado uma resposta positiva ao pedido inicial do ora Recorrente, formulado no sentido de admitir que não fosse declarada caduca a aludida cláusula, vindo agora com o presente recurso em absoluta desconformidade com o seu pedido inicial, está o Recorrente a cair numa concreta situação de “venire contra factum proprium”, em claro abuso de direito, não devendo o recurso de Revista apresentado, ser admitido.

Carece de razão o Recorrido.

Se não.

Da caducidade da cláusula 5.

Insurge-se o Recorrente contra a decisão recorrida uma vez que na sua tese a cláusula 5ª do pacto social da Eduardo Marques & Rosa, Lda ao expressar que a «gerência da sociedade, dispensada de caução e remunerada ou não, conforme for deliberado em assembleia geral, pertence a ambos os sócios, que desde já ficam nomeados gerentes. Para obrigar validamente a sociedade, em qualquer ato ou contrato, em juízo ou fora dele, tornam-se necessárias as assinaturas dos dois sócios gerentes», sendo que tal é o mesmo que dizer que a gerência da sociedade pertence a AA e BB, que assim ficaram nomeados gerentes e para a obrigar é necessária a sua assinatura, sendo que só aos sócios podem ser criados atribuídos direitos e deveres especiais, nos termos do artigo 24º, nº 1 do CSComerciais, tendo o Recorrente e o Recorrido querido criar esse direito especial – atribuir a gerência unicamente a eles próprios e só, conforme resulta da interpretação do contrato social.

Analisemos, então.

O Acórdão recorrido fundou a sua decisão no seguinte raciocínio:

«Por efeito da falta definitiva do gerente que destituiu, a decisão recorrida declarou a caducidade da cláusula quinta do pacto social, na parte em que a mesma prevê a existência de gerência plural, considerando que esta cláusula exige nominalmente, embora por via indireta, a intervenção do Recorrente para representar a sociedade “Eduardo Marques & Rosa, Ldª”.

O Recorrente diverge desta solução argumentando, em síntese, “que a declaração de caducidade da cláusula n.º 5 será uma decisão absolutamente desproporcionada e altamente lesiva dos interesses da Sociedade” [ccls 23ª a 27ª].

Segundo o nº 3 do artº 253º, do CSC, “faltando definitivamente um gerente cuja intervenção seja necessária por força do contrato para a representação da sociedade, considera-se caduca a cláusula do contrato, caso a exigência tenha sido nominal; no caso contrário, não tendo a vaga sido preenchida no prazo de 30 dias, pode qualquer sócio ou gerente requerer ao tribunal a nomeação de um gerente até a situação ser regularizada, nos termos do contrato ou da lei”.

Constituem pressupostos da previsão da primeira parte da norma (i) a existência de uma

gerência plural e (ii) a existência de uma disposição contratual que torne indispensável a presença de determinado gerente, que falta definitivamente, para a representação da sociedade.

A cláusula 5ª do pacto social da “Eduardo Marques & Rosa, Lda.” consagra o seguinte: «a gerência da sociedade, dispensada de caução e remunerada ou não, conforme for deliberado em assembleia geral, pertence a ambos os sócios, que desde já ficam nomeados gerentes. Para obrigar validamente a sociedade, em qualquer ato ou contrato, em juízo ou fora dele, tornam-se necessárias as assinaturas dos dois sócios gerentes.» [ponto 117 dos factos provados].

Cláusula que exige uma gerência plural - para obrigar validamente a sociedade, em qualquer ato ou contrato, em juízo ou fora dele, tornam-se necessárias as assinaturas dos dois sócios gerentes – mas não estabelece, a nosso ver, a necessidade de intervenção concreta de um determinado gerente – Recorrente ou Recorrido – para representar a sociedade, exige a intervenção de ambos enquanto gerentes nomeados em assembleia geral.

A cláusula não especifica a necessidade de intervenção de um concreto gerente, estabelece a necessidade de intervenção do colégio de gerentes nomeados para obrigar a sociedade, nada obstando a que os sócios, por alteração do contrato social, venham a designar um outro gerente ainda que estranho à sociedade (artºs 252 e 265º do CSC).».

Como deflui inequivocamente da cláusula 5ª, cuja interpretação é aqui questionada «a gerência da sociedade, dispensada de caução e remunerada ou não, conforme for deliberado em assembleia geral, pertence a ambos os sócios, que desde já ficam nomeados gerentes. Para obrigar validamente a sociedade, em qualquer ato ou contrato, em juízo ou fora dele, tornam-se necessárias as assinaturas dos dois sócios gerentes.» [ponto 117 dos factos provados].

Sendo o contrato de sociedade obrigatoriamente reduzido a escrito, como deflui do artigo 7º, nº 1 do CSComerciais, a interpretação das suas cláusulas obedecerá ao princípio da impressão do declaratário.

A propósito da interpretação da declaração negocial o art. 236º, do Código Civil nº 1 preceitua: "A declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário possa deduzir do comportamento do declarante salvo se este não puder razoavelmente contar com ele., acrescentando o nº2 «Sempre que o declaratário conheça a vontade real do declarante é de acordo com ela que vale a declaração emitida.».

Ora, o que decorre da apontada cláusula é que a gerência ficaria a pertencer a ambos os sócios, o Recorrente e o Recorrido, impondo-se como exigência para obrigar a sociedade, a intervenção e assinatura de ambos.

Contudo, não se exigiu que a gerência apenas fosse exercida por aqueles dois específicos sócios, nem se excluiu a possibilidade de a gerência ser assumida por outras pessoas estranhas à sociedade, aliás de harmonia com o preceituado no artigo 252º, nº1 do CSComercial, nem se antolha que naquela cláusula se tivesse consignado algum direito especial, nos termos do artigo 24º, nº1 do mesmo diploma, máxime, estabelecendo, quiçá, a imposição de que a gerência da sociedade Eduardo Marques & Rosa, Lda, apenas tivesse sido cometida àqueles ad eternum, sem possibilidade de intervenção de outrem, sendo que esta interpretação é a que tem correspondência com o texto do documento, nos termos do artigo 238, n.º 1, do CCivil.

A leitura efectuada pelo Recorrente, excede o texto, não tendo o mínimo de correspondência no mesmo.

As conclusões estão assim condenadas ao insucesso.

III Destarte, nega-se a Revista, confirmando-se a decisão plasmada no Acórdão recorrido.

Custas pela Recorrente.

Lisboa, 19 de Outubro de 2021

Ana Paula Boularot (Relatora)

Fernando Pinto de Almeida

José Rainho

Sumário (art. 663º, nº 7, do CPC).