Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
2395/11.1TBFAF.G2.S1
Nº Convencional: 6.ª SECÇÃO
Relator: RICARDO COSTA
Descritores: RECURSO DE REVISTA
COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
MATÉRIA DE FACTO
LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA
PRESUNÇÕES JUDICIAIS
AUTORIDADE DO CASO JULGADO
Data do Acordão: 04/13/2021
Votação: UNANIMIDADE COM * DEC VOT
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA.
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO.
Sumário :
I - O STJ conhece matéria de direito, como princípio geral de um tribunal de revista, sendo as decisões proferidas pela Relação no plano dos factos, em regra, irrecorríveis (arts. 662.º, n.º 4, 674.º, n.º 3, e 682.º, n.os 1 e 2, do CPC).
II - O STJ pode, no entanto, sindicar a aplicação da lei adjectiva pela Relação em qualquer das dimensões relativas à decisão da matéria de facto provada e não provada (arts. 662.º, n.os 1 e 2, 674.º, n.º 1, al b), do CPC) – não uso ou uso deficiente ou patológico dos poderes-deveres em segundo grau –, com a restrição constante do art. 662.º, n.º 4, do CPC.
III - Assumindo-se a 2.ª instância como um verdadeiro e próprio segundo grau de jurisdição relativamente à matéria de facto, com autonomia volitiva e decisória nessa sede, mediante a reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou daqueles que se mostraram acessíveis com observância do princípio do dispositivo, sempre que essa reapreciação se move no domínio da livre apreciação da prova e sem se vislumbrar que tenha desrespeitado a força plena de qualquer meio de prova, imposta por regra vinculativa extraída de regime do direito probatório, essa actuação regida pelo art. 662.º, n.º 1, do CPC é insindicável em sede de revista, nos termos conjugados dos arts. 662.º, n.º 4, e 674.º, n.º 3, 1.ª parte, do CPC.
IV - Tem sido jurisprudência constante do STJ que, por via da válvula de escape residual de reapreciação da matéria de facto prevista no art. 674.º, n.º 3, 2.ª parte, amparada no art. 682.º, n.º 2, 2.ª parte, sempre do CPC, a revista possa servir legitimamente para controlar o uso da construção de presunções judiciais utilizadas pelas instâncias, tendo em vista verificar a violação de norma legal (nomeadamente os arts. 349.º e 351.º do CC), a sua coerência lógica (ilogismo manifesto e evidente) e a fundamentação probatória de base quanto ao facto conhecido. Esse controlo jurisdicional não abarca a migração e consideração de factos provados em outro processo envolvendo as partes, ao abrigo da autoridade de caso julgado (que não é de conhecimento oficioso), para conjugar essa factualidade prejudicialmente vinculativa por decisão judicial anterior com a factualidade provada no processo a decidir, a fim de extrair, em conjunto, a sua convicção quanto à aplicação do direito confrontado com o material probatório trazido ao processo (art. 607.º, n.º 4, pela remissão do art. 663.º, n.º 2, 2.ª parte, do CPC), culminada na subsunção jurídica pertinente.
Decisão Texto Integral:

Processo n.º 2395/11.1TBFAF.G2.S1

Revista – Tribunal recorrido: Relação …….., …… Secção Cível

Acordam na 6.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça

I) RELATÓRIO

1. AA e cônjuge mulher BB (falecida no decurso da ação, com habilitação, como sucessores, do co-Autor, de CC e de DD) intentaram acção declarativa, com processo sumário (que seguiu termos sob a forma de processo ordinário, por determinação resultante de despacho proferido em 26/4/2012), contra EE e cônjuge marido FF, pedindo: “a) se reconheça o direito de propriedade dos autores sobre o prédio rústico descrito no artigo 1.º da petição inicial; b) se reconheça que as parcelas de terreno identificadas nos artigos 24.º, 27.º, 28.º, 30.º, 31.º e 33.º da petição inicial fazem parte integrante do prédio identificado no artigo 1.º; c) se condene os réus: i) a reconhecer aqueles direitos; ii) a desocupar as parcelas de terreno identificadas nos artigos 31.º e 33.º da petição inicial, repondo-as no estado em que se encontravam, designadamente destruindo o passeio e retirando a casota do cão bem como todos e quaisquer objetos nelas colocados de modo a deixá-las livres e desimpedidas, no prazo máximo de trinta dias após o trânsito em julgado da ação; iii) a tapar a abertura a que se alude no artigo 27.º da petição inicial, que fizeram na parede nascente do anexo, bem como a destruir a cornija que executaram e que propende sobre o prédio dos réus, ocupando o espaço aéreo correspondente, repondo a parede no estado em que se encontrava antes das obras, tudo no prazo máximo de trinta dias após o trânsito em julgado da ação; iv) a abster-se da prática de quaisquer atos que perturbem ou impeçam o acesso e circulação dos autores ao seu identificado prédio; v) a abster-se de aceder, passar ou circular no prédio dos autores a partir da Rua  …….. e para a Rua  …….; vi) a pagar aos autores a quantia de € 2500,00 a título de danos sofridos, acrescida de juros à taxa legal desde a citação até efetivo e integral pagamento”. Alegaram, em síntese, que são proprietários do prédio que identificam, denominado “…….. da Casa”, por o ter o autor adquirido por escritura pública em comum com o seu pai e, posteriormente, adquirido por permuta com seus pais a parte destes, imóvel que igualmente invocam ter adquirido por usucapião, o qual confronta com um prédio pertencente aos réus, nos termos da linha divisória que descrevem, a qual sustentam ter sempre sido respeitada pelos antepossuidores do prédio dos réus. Acrescentam que, em 2010, os réus executaram obras no anexo do respetivo prédio, tendo alteado a parede nascente daquele e aberto uma janela que deita diretamente para o prédio dos autores, sem deixar a distância de metro e meio; tendo construído uma cornija que propende sobre o prédio dos autores, ocupando o respetivo espaço aéreo; tendo colocado um tubo de condução de água num muro de suporte de terras pertencente aos autores; tendo ocupado a parcela de terreno descrita no artigo 31.º da petição inicial e da qual alteraram o pavimento; tendo ocupado a parcela de terreno descrita no artigo 33.º da petição inicial, nela colocando uma casota de cão, depositando lenha e objetos diversos, estacionando veículos, assim estorvando e impedindo os autores de aceder ao seu prédio com veículos automóveis e tratores; tendo passado a circular a pé e com veículos pelo acesso construído pelos autores no seu prédio e que o liga à Rua do …… . Mais sustentam que a ocupação descrita é contrária à respetiva vontade, causando-lhes os danos morais que descrevem.

Os Réus apresentaram Contestação, alegando terem os pais e antecessores da ré, há cerca de 25 anos, procedido a obras de ampliação lateral da casa e aumento do pátio com escadas, bem como, há cerca de 20 anos, cedido terreno à Câmara Municipal ……. para construção da estrada camarária atualmente denominada Rua……..; acrescentam que, há cerca de 5 anos, procederam a obras de remodelação na cozinha que fica separada da casa, abriram uma janela na fachada nascente e construíram uma cornija na referida fachada, bem como construíram um muro em betão de suporte de terras de uma das leiras que sobrou do terreno cortado para a dita estrada camarária; sustentam que, habitando a casa há cerca de 10 anos, cultivam os terrenos e tratam do jardim e da horta; sustentam que, na frente da casa de habitação, existe um terreiro por onde sempre existiu uma servidão de passagem a favor, não só do prédio dos autores, como de outros prédios rústicos, que o autor marido pretendeu empedrar, propondo aos réus custear estes metade do valor de tais obras, o que estes aceitaram, tendo a pavimentação sido feita até ao limite nascente do prédio dos réus; afirmam sempre terem sido os réus e seus antecessores quem usou e fruiu o prédio e o terreiro, invocando a prática de atos de posse sobre o prédio por via dos quais igualmente invocaram a sua aquisição por usucapião, acrescentando que o “…….. da Casa” nunca foi cultivado pelos autores, que não vivem no local; mais impugnam as confrontações e a linha divisória dos prédios apresentadas pelos autores, pugnando no sentido da improcedência da ação.

Deduziram ainda Reconvenção, pedindo o reconhecimento da propriedade do prédio que identificam, com as características e delimitação que indicam, bem como a condenação dos autores a tal reconhecerem e a absterem-se da prática de atos que perturbem o exercício do seu direito. Mais pugnaram pela improcedência da acção.

Notificados da Contestação, os Autores apresentaram Resposta, na qual, além de concluírem como na petição inicial, se pronunciam quanto ao pedido reconvencional, defendendo-se por impugnação e pugnando pela improcedência do pedido formulado.

Os Réus apresentaram Tréplica e Articulado Superveniente.

Foi fixado o valor da causa em € 30.250 (despacho de 26/4/2012).

2. Foi admitida a Reconvenção deduzida pelos Réus e proferido despacho saneador, no qual foi enunciada a matéria de facto assente e fixada a base instrutória (despachos proferidos em 4/2/2013 pelo …… Juízo do Tribunal Judicial……).

3. Realizada a audiência de discussão e julgamento em várias sessões, sendo a última em 3/6/2015, foi proferida sentença pelo Juiz …. da Secção Cível da Instância Local  …….. (Tribunal Judicial da Comarca…….) em 3/7/2015, da qual foi interposto recurso de apelação pelos Autores. Por acórdão proferido pelo Tribunal da Relação …… (TR….), em 28/9/2017 e constante de fls. 585 e ss, foi decidido “anular a decisão recorrida, determinando a ampliação dos temas de prova; a realização das diligências probatórias e a oportuna repetição do julgamento para suprimento das omissões e insuficiências (…) notadas”, acrescentando-se que a “repetição não abrangerá a parte não viciada, sem prejuízo das alterações que se revelem necessárias para evitar contradições na decisão a proferir”.

4. Tramitada a instância para efeitos probatórios (fls. 647 e ss), e realizada nova audiência de discussão e julgamento em sessões de 26/10, 23/11 e 7/12/2018, foi proferida sentença em 28/1/2019 pelo Juízo Local Cível…… (Tribunal Judicial da Comarca ……..), que concluiu com o seguinte dispositivo: “julgar a acção declarativa de condenação, sob a forma sumária, que AA e BB intentaram contra EE e FF parcialmente improcedente e o pedido reconvencional procedente por provado e, em consequência, decido: a) reconhecer a propriedade dos AA. sobre o prédio identificado em 1) dos factos provados; b) condenar todos os RR. a reconhecerem o direito de propriedade referido em a) e absterem-se de praticar quaisquer actos que impeçam ou limitem o gozo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição ou disposição por parte dos AA. sobre aquele prédio; c) reconhecer o direito de propriedade dos RR. sobre o prédio identificado em 7), com a extensão identificada em 40), conforme planta topográfica de fls. 666; d) condenar os AA. a reconhecerem o direito de propriedade referido em c) e absterem-se de praticar quaisquer actos que impeçam ou limitem o gozo pleno e exclusivo dos direitos dos RR. relativamente ao prédio; e) absolver os RR. do demais peticionado pelos AA.”

5. Inconformados, os Autores interpuseram recurso de apelação para o TR…., visando a revogação da sentença e respectiva substituição por decisão que reconhecesse o direito de propriedade dos apelantes sobre o prédio identificado no ponto 1 da factualidade assente, bem como que dele fazerem parte integrante as parcelas de terreno, identificadas em 8, 11, 16, 17 e 18, condenando-se os Réus a reconhecer tal direito e a abster-se da prática de quaisquer actos que perturbassem o seu exercício. Foram identificadas as seguintes questões para resolução: “A) Impugnação da decisão sobre a matéria de facto; B) Direito de propriedade sobre as parcelas de terreno em litígio e respetivas consequências.”

Em acórdão proferido em 30/1/2020, o TR…. julgou procedente a apelação e decidiu:
“a) na parcial procedência da ação:

i) declarar que as parcelas de terreno a que aludem os pontos 15 a 18 da matéria de facto provada integram o prédio rústico identificado no ponto 1 de tal matéria de facto;

ii) condenar os réus a restituir aos autores as parcelas referidas em i), livres e desimpedidas, no estado em que se encontravam antes de as terem ocupado, devendo: destruir o passeio a que alude o ponto 16, retirar a casota e quaisquer objetos colocados na parcela a que alude o ponto 17, tapar a janela a que alude o ponto 8 e retirar a cornija a que alude o ponto 9;
iii) condenar os réus a abster-se de fazer uso do prédio dos autores;
b) na parcial procedência da reconvenção:

i) reconhecer o direito de propriedade dos réus/reconvintes sobre o prédio identificado no ponto 7 da matéria de facto provada;

ii) absolver os autores/reconvindos do demais peticionado;

c) revogar parcialmente, em conformidade, a decisão recorrida, mantendo-a no mais.”

5. Revelando que não se resignavam ao veredicto da 2.ª instância, vieram os Réus EE e cônjuge marido interpor recurso de revista para o STJ, visando contestar a procedência da acção de acordo com o pedido constante da petição inicial e confirmar a sentença proferida na 1.ª instância ou remeter os autos à 1.ª instância para resolver as contradições alegadas no que toca ao acórdão recorrido e proferir nova sentença. Finalizaram a sua peça com as seguintes Conclusões:

“A – A questão nuclear dos presentes autos era a definição dos limites físicos do prédio urbano dos Recorrentes e a respectiva fruição ao longo do tempo, tendo esses limites e essa fruição sido adequamente percepcionados em 1ª instância e correctamente reflectidas na respectiva sentença.

B – Para isso contribuiu a prova produzida em 1ª instância, que permitiu ao Tribunal uma compreensão exacta e rigorosa da situação verificada no terreno, tendo sido muito relevantes as inspecções judiciais.

C – No Acórdão recorrido, o Tribunal da Relação, ignorando em absoluto a realidade do terreno, optou por fazer assentar o seu raciocínio na análise e interpretação de uma decisão proferida num processo anterior cujo objecto não era, sem mais, transponível para estes autos.

D – Concretamente, a decisão anterior apreciou a questão de uma servidão existente sobre um quinteiro, tendo cuidado de definir os limites físicos desse quinteiro.

E – No Acórdão recorrido, o Tribunal da Relação desenvolveu um raciocínio de natureza presuntiva, sem perceber que o anteriormente decidido acerca dos limites físicos do quinteiro não permitia definir os limites físicos do prédio urbano dos Recorrentes, desde logo porque tal quinteiro é apenas uma parte (e uma parte interior) do prédio dos Recorrentes.

F – Daí resultou a afirmação de um quadro factual que, além de não ter correspondência com a realidade das coisas – tal como o Tribunal da Relação poderia ter constatado se decidisse realizar uma inspecção judicial, em vez de fazer considerações especulativas e abstractas –, é totalmente inverosímil e absurdo.

G – Basta dizer que as consequências práticas do Acórdão recorrido são as de transformar o prédio urbano dos Recorrentes, que sempre teve acesso à via pública, num prédio encravado.

H – Com o absurdo de, a cumprir-se o definido no Acórdão recorrido, os Recorrentes, mal ponham o pé fora da sua casa de habitação, logo estarem a pisar terreno que, diz o acórdão recorrido, é dos Recorridos.

I – E isto é tão mais absurdo quanto, ao longo de décadas, tantos os Recorrentes como os seus antecessores, sempre terem saído da casa de habitação directamente para a via pública, pisando somente terreno a si pertencente.

J – O Supremo Tribunal de Justiça pode e deve sindicar o modo como o Tribunal da Relação, partindo de uma decisão anterior, que versava sobre outro objecto, estabeleceu presunções sobre a questão objecto destes autos, em especial a dos limites físicos do prédio urbano dos Recorrentes.

K – O douto acórdão recorrido viola manifestamente o art. 662º do CPCivil.

L – Este Tribunal de recurso tem poderes para analisar o uso feito dos poderes conferidos ao Tribunal da Relação, nos termos do disposto no art. 682º do CPCivil.

M – O douto acórdão recorrido conseguiu colocar, a Casa de Habitação dos Recorrentes, como um prédio urbano encravado.

N – Ao decidir como decidiu esquecendo, completamente, que os presentes autos teve duas inspecções ao local, no curso da audiência de julgamento,

O – E, que a alteração das respostas à matéria de facto só é admissível quando haja um meio de prova plena, resultante de documentos, confissão ou acordo das partes ou havendo prova irrefutável em sentido diverso e que não possa ser afastada pela prova produzida em audiência de julgamento.

P – Mantém-se em vigor os princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, princípios estes que este Acordão sob recurso não respeitou.

Q – Na ponderação da decisão da matéria de facto o julgador no Tribunal da Relação tem que reflectir, na decisão [d]a sua própria convicção, na plena aplicação e uso do princípio de livre apreciação da prova, nos mesmos termos que faz o juiz da primeira instância. – Acordão proferido no Proc. 1022/11.1TVLSB.21.S1 – 1ª Secção do STJ.

R – Tal ponderação é completamente omissa no Acordão recorrido, devendo este Tribunal revogar o douto acórdão sob recurso.

S – Podendo o Tribunal intervir em matéria de facto, quando a factualidade selecionada for insuficiente para decidir uma questão de direito e,

Haja errada utilização dos meios de prova que o tribunal dispôs para apreciar a questão de facto, o que não é o caso sub judice.

T – Aponta-se na presente alegação os manifestos erros de localização dos prédios, quer no Acórdão proferido na caracterização da servidão que onerava o eido/quinteiro e só nessa parte, e que tal matéria estava delimitada a essa questão e que o Acórdão sob recurso foi transpor para este,

U – Acabando por inquinar o Acórdão recorrido pois, dá como provado que a servidão termina no portão Nascente do eido/quinteiro quando, na realidade continuava o seu curso, atravessando a frente/Norte da casa de habitação dos Recorrentes, antes em terra batida e agora calcetada, local onde os Recorrentes depositavam lenhas e outros utensílios e estacionavam automóveis,

V – O douto acórdão deslocaliza as Leiras do Alpendre, as Leiras de Trás da Casa, no item 26., dos factos provados, em contradição com os itens 23., e 24., que coloca as Leiras do Alpendre a Norte e no item 26. a Sul.

X – Depois um e outro acórdão colocam a casa de habitação dos Recorrentes, com o quinteiro e as Leiras …. da Casa, que situa e bem, entre os prédios – urbano dos Recorridos a Poente e o ……. da Casa a Nascente.

Z- Não conseguindo localizar todo o tracto de terreno calcetado, nem se consegue divisar e localizar a parte restante que sobrou das Leiras …“atirando-o” para o Nascente – item 26., é a confusão completa – desculpem-me a expressão.

AA – Pois, se o terreno sobrante se localiza a sul são, exactamente, os ditos canteiros e tracto de terreno calcetado, cujas leiras se estendiam de Norte para Sul, confrontando a Norte com o antigo Caminho Público e agora Rua de Fundo de Vila.

BB – Que terminavam na esquina Norte/Poente do portão de acesso ao eido/quinteiro confrontado a Sul com o caminho de servidão antigo e tracto de terreno onde depositavam as lenhas e estacionavam os carros.

CC – O acórdão sob recurso deslocaliza e contradiz-se na localização dos prédios e tracto de terreno calcetado e acabando por não saber localizar, nem o tracto de terreno calcetado (em causa), nem o tracto de terreno onde estacionavam os carros, nem o tracto de terreno onde depositavam as lenhas.

DD – O Tribunal da Relação não conhece o local, ao contrário do Tribunal da primeira instância que este lá por duas vezes.

EE – Não é possível formar a convicção do julgador sem conhecimento do local.

FF – Perante estas contradições, deslocalização dos prédios urbanos e rústicos, o Tribunal da Relação conseguiu com a Decisão constante do Acórdão sobre recurso encravar o prédio urbano dos Recorrentes, que ficou sem quaisquer servidão de acesso à Rua de Fundo de Vila (antigo caminho público), à casa, ao eido/quinteiro, as Leiras de Trás da Casa, ao espigueiro.

GG – Pois o Acordão em recurso é muito claro, ou seja:

“iii) condenar os réus a abster-se de fazer uso do prédio dos autores”

HH – Descendo as escadas do primeiro anda da casa dos Recorrentes, mal termine a última escada – entra-se no prédio dos Recorridos (abster-se de fazer uso do prédio dos autores).

Do rés do chão onde existe uma porta de entrada da garagem e transposto o terreno que se encontra por baixo da varanda do primeiro andar, entra-se no prédio dos Recorridos (abster-se de fazer uso do prédio dos autores).

Das Leiras ….da Casa acedem à porta da garagem e logo de seguida entra-se no prédio dos Recorridos (abster-se de fazer uso do prédio dos autores).

Saindo do eido/quinteiro pelo dito portão, entra-se no prédio dos Recorridos (abster-se de fazer uso do prédio dos autores).

II – Não se constituindo qualquer servidão, devendo assim lançar mão de constituição de servidão a favor de todos os seus prédios, o que não se aceita de modo algum.

JJ – Ficando os prédios dos Recorrentes totalmente encravados, pelo Norte, Sul que não há acesso nem possibilidade de o fazer dada a ausência de terreno, Nascente e Poente, ao arrepio do disposto no Código Civil – art. 1552º, que proíbe o encrave de prédios urbanos ou rústicos.

KK – Este Supremo tem poderes não só pelo simples facto deste acórdão em recurso, tornar os prédios da Recorrente encravados, mas também por não haver ponderação da decisão da matéria de facto pois o julgador, no Tribunal da Relação, tem que reflectir, na decisão, a sua própria convicção, na plena aplicação e uso do princípio de livre apreciação da prova, nos mesmos termos que faz o juiz da primeira instância.

LL – Não tendo sido mantidos os princípios de imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, no seu conjunto, quer a prova resultante das inspecções ao local, quer da prova testemunhal, quer da prova documental.

MM – Pelo que este Supremo Tribunal pode e deve apreciar os poderes da Relação e face ao aqui alegado, revogar ou douto Acórdão sob recurso, confirmando a sentença proferida pela primeira instância.”

6. Os Recorridos apresentaram contra-alegações, pugnando pela improcedência da revista e confirmação do acórdão recorrido, assim rematando de forma conclusiva, no que é relevante:

“(…)

5º- Os Réus/Recorrentes insurgem-se quanto à forma como foi reapreciada a matéria de facto pelo Tribunal da Relação……….. e, consequentemente, discordam com a alteração produzida na mesma.

6º- Os réus/Recorrentes consideram ter havido errada utilização dos meios de prova por parte do Tribunal da Relação e dão especial realce ao facto de o Tribunal não conhecer o local para daí retirarem a conclusão de que não foi possível ao Tribunal formar a convicção.

7º- É sabido que o Supremo Tribunal é um Tribunal de Revista ao qual compete aplicar o regime jurídico que considere adequado aos factos fixados pelas instâncias. (cfr nº 1 do artigo 674º do Código de Processo Civil).

8º- É às instâncias e, designadamente à Relação, que cabe apurar a factualidade relevante para a decisão do litígio, não podendo o Supremo Tribunal, em regra, alterar a matéria de facto por elas fixada.

9º- O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objeto do recurso de Revista, a não ser nas duas hipóteses previstas no nº 3 do artigo 674º do Código de Processo Civil.

10º- No caso, os Recorrentes reprovam a decisão da matéria de facto feita pelo Tribunal da Relação. Porém, não invocam a violação por parte do Tribunal da Relação de ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova.

11º- Os Recorrentes limitam-se a censurar a decisão do Tribunal da Relação por este ter apreciado as provas segundo a sua livre apreciação, tal como lhe é permitido.

12º- Ora, tal censura não é sindicável por esta via de recurso.

13º- Não tendo o Tribunal da Relação………… desrespeitado as normas que regulam a força probatória dos diversos meios de prova admitidos no sistema jurídico, não merece censura.

14º- A pretexto duma outra, muito diversa e convocada questão – a do alegado mas não verificado encrave – não podem os Recorrentes, desvirtuar todas as provas produzidas e atendíveis, sejam elas documentais, periciais, testemunhais, por confissão e por inspeção judicial, para tentar, em último recurso ver confirmada a sentença proferida em primeira instância.

15º- Não basta que não se concorde com a decisão dada pelo Tribunal da Relação, antes se exige da parte dos Recorrentes a demonstração da existência de incongruências na apreciação do valor probatório dos meios de prova que efetivamente, no caso, foram produzidos.

16º- Lendo e relendo o douto acórdão recorrido, verifica-se, salvo o devido respeito por opinião diversa, que o Tribunal da Relação……….., decidiu-se pela alteração da matéria de facto sem que tenha havido ofensa de uma disposição expressa de Lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou haja violação de norma legal que fixe a força probatória de determinado meio de prova.

17º- Para além disso, o acórdão recorrido apreciou e fundamentou devidamente a alteração efetuada à matéria de facto e analisou criticamente todas as provas, tendo concluído pela alteração da decisão de primeira instância em consequência de tal apreciação crítica.

18º- Assim sendo, a decisão recorrida nenhuma censura merece.

19º- Acresce que a tese do desconhecimento do local por parte do Tribunal da Relação não teve nem tem base séria nem sustentação firme.

20º- No caso em apreço, muito embora o Tribunal da Relação não tivesse tido oportunidade de conhecer o local por não ter feito uma inspeção, não temos quaisquer dúvidas que o conhece através dos meios de prova que teve à sua disposição, e, mais concretamente, através do auto de inspeção junto aos autos, que contém o relato daquilo que o juiz de 1ª. Instância observou no local e dos pontos que as partes lhe sugeriram que observasse ou que entendeu observar, sendo que dele até constam registos fotográficos.

21º- Através da leitura e visualização do auto, o Tribunal da Relação teve uma ideia clara do que foi percecionado pelo julgador de 1ª. Instância em ordem a formular as suas conclusões sobre essas observações que lhe permitiram compreender e interpretar os outros meios de prova.

22º- Pelo que o recurso terá de claudicar nessa parte.

23º- De igual modo, quanto à hipótese de contradição entre os factos fados como provados no ponto 27 e a decisão a que o Tribunal chegou, cremos, salvo o devido respeito, que a decisão não poderá ser diferente, uma vez que a dita contradição não se verifica.

24º- E não pode ter desfecho diferente no que se refere ao alegado encrave do prédio dos recorrentes uma vez que tal questão, sendo uma questão nova, uma vez que os recorrentes nunca antes a colocaram, também não se coloca.

25º- Perante os factos provados, o Tribunal não podia deixar de reconhecer que as mencionadas parcelas de terreno fazem parte integrante do prédio rústico dos recorridos e que a linha divisória entre este prédio rústico e o prédio urbano dos recorrentes é aquela que ficou definida.

26º- Desta feita, a decisão recorrida nenhuma norma violou.”

7. Os Recorrentes vieram juntar Parecer de jurisconsulto, que faz fls. 823 e ss dos autos, que foi admitido nos autos (arts. 651º, 2, 657º, 1, 680º, 2, CPC).

II) FUNDAMENTAÇÃO E APRECIAÇÃO DO RECURSO

1. Objecto do recurso

Vistas as Conclusões, que delimitam as questões a decidir (arts. 635º, 2 a 4, 639º, 1 e 2, CPC), identifica-se que o escrutínio em sede de revista incide sobre:

— impugnação da decisão proferida pelo acórdão recorrido por alegado incumprimento dos deveres previstos no art. 662º do CPC na reapreciação da matéria de facto, sindicável nos termos do art. 674º, 1, b), do CPC (cfr., em esp., as Conclusões J. a L., S., KK. e LL.), que teria obstado à melhor solução jurídica na questão da “definição dos limites físicos do prédio urbano dos Recorrentes e a respetiva fruição ao longo do tempo” (Conclusão A.);

— impugnação da alegada presunção judicial utilizada pelo acórdão recorrido, sindicável nos termos do art. 674º, 3, 2ª parte, do CPC, baseada na repercussão em termos factuais de uma decisão judicial anterior em que as partes foram as mesmas deste processo (cfr. Conclusões C. a J.).

2. Factualidade

Para a sua decisão, o TR…., após reapreciação, considerou ter ficado estabilizada a seguinte matéria de facto provada:

1 - Encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial …… sob o numero ….90 em nome de AA e BB, a aquisição por compra e por permuta, de um prédio rústico, denominado de “………. da Casa”, sito no lugar………, freguesia………., concelho ……, com a área de 6 000m2, de lavradio, vinho e azeite, a confrontar de norte com caminho, sul com o proprietário, nascente com GG e poente com proprietário, inscrito na matriz rústica da freguesia respectiva sob o artigo …..82 – cfr. fls. 14 e 164 e segs., cujo teor se dá por reproduzido para os devidos e legais efeitos;

2 - Encontra-se junto aos autos a fls. 16 e segs., escritura pública denominada de compra, celebrada junto do Cartório Notarial ………, datada de …… de ……….. de 1967, através da qual o prédio descrito em A) foi adquirido em comum e na proporção de metade para cada um, pelo autor AA e por HH – cfr. fls. 16 e segs. dos autos cujo teor se dá por reproduzido;

3 - Encontra-se junto aos autos a fls. 32 e segs., escritura pública denominada de permuta, celebrada junto do Cartório Notarial……., datada de …… de ……. 1979, através da qual) foi adquirido, na totalidade, pelo autor em, por permuta com HH e mulher, a metade indivisa de vários prédios, entre os quais o prédio melhor identificado em A) – cfr. fls. 32 e segs. dos autos cujo teor se dá por integralmente reproduzido;

4 - Há mais de 20 e 30 anos que os autores por si e passados utilizam o prédio referido em 1), por si ou permitindo que outrem o faça, cultivando-o, lavrando-o, adubando-o, semeando cereais, designadamente milho e centeio, plantando e tratando árvores de fruto e a vinha na sua bordadura, semeando e colhendo batatas, feijão e diversos produtos hortícolas, nele semeando pastos e pondo o gado a pastar;

5 - (…) construindo tanques, regos e muros de suporte e vedação, abrindo acessos, pavimentando-os e conservando-os, dando-o de arrendamento e recebendo a renda respectiva, pagando os impostos sobre ele incidentes;

6 - (…) que tudo sempre têm feito, à vista e com o conhecimento de todos, sem oposição e interrupção, na firme convicção de que estão e sempre estiveram, bem como toda a gente, no exercício pleno e exclusivo do seu direito de propriedade sobre tal prédio;

7 - Encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial …… sob o número ……../….., em nome de EE c.c. FF, a aquisição por doação, de um prédio urbano, sito no lugar de ………, freguesia ………, concelho ……., com a seguinte descrição: “área de 1048m2, sendo 185.25 m2 de área coberta e 863 m2 de área descoberta”, com a seguinte composição: “casa de rés do chão e primeiro andar com a área coberta de 108 m2, anexo com 56m2, quinteiro com 96 m2, alpendre com 18 m2, espigueiro com 3,25m2, leiras de trás da casa e do alpendre com a área de 767m2”, a “confrontar: de Norte com caminho; de Sul, Nascente e Poente com AA, Desanexado do nº …….. a fls. 169vs, do livro B-….; e inscrito na matriz predial respectiva sob o nº …..05-P” – cfr. fls. 167 e segs. cujo teor se dá por reproduzido;

8 - No final de 2010, na sequência na sequência de obras de remodelação que fizeram no anexo do prédio referido em 7), os réus altearam a parede Nascente do anexo e rasgaram uma abertura nessa mesma parede, abertura em forma de janela, com cerca de um metro largura por um metro de altura, a qual deita para uma parcela de terreno ajardinada;

9 - (…) e, construíram uma cornija em toda a extensão do mencionado anexo, com cerca de oito metros e vinte centímetros de comprimento por trinta centímetros de largura;

10 - Antes desta intervenção dos réus, aquela parede nascente não dispunha de qualquer abertura, sendo o anexo coberto de telha e sem beiral;

11 - Os réus colocaram, ainda, um tubo de condução de águas num muro de suporte de terras dessa parcela de terreno ajardinada;

12 - Não obstante o referido em 1, o prédio ali descrito confronta de Norte com Rua…….. e a Poente com o prédio referido em 7 [modificado pela Relação.];

13 - Por volta do ano de 1988 os pais da Ré resolveram fazer obras na casa referida em 7, e construíram umas escadas e uma varanda, para “melhor” acederem ao primeiro andar;

14 - (…) as quais ficaram voltadas para Nascente;

15 - Os réus têm vindo a ocupar a parcela de terreno ajardinada referida em 8 e 11;

16 - (…) e ainda uma parcela de terreno com cerca de um metro de largura por oito metros e cinquenta centímetros metros de comprimento, com a construção de um passeio em cimento, com quatro escadas, o qual se prolonga para nascente a partir das escadas e varanda e em toda a extensão da casa;

17 - (…) e mais recentemente, têm vindo a colocar a casota do cão, depositar lenha e objectos diversos, bem como a estacionar veículos automóveis, ocupando uma parcela de terreno com a área aproximada de quarenta metros quadrados;

18 - (…) Os réus passaram ainda a circular a pé e com todo o tipo de veículos pelo acesso ao prédio referido em 1 e que liga à Rua………, o que fazem em desacordo com a vontade dos autores;

19 - Os AA. decidiram proceder e procederam à abertura do acesso referido em 18, tendo suportado o respetivo custo; posteriormente, pretendendo pavimentar tal caminho de acesso, os autores procederam nos termos constantes dos pontos 34, 35 e 36, suportando o remanescente do custo da pavimentação [modificado pela Relação.];

20 - Os autores sentem-se humilhados, revoltados e maltratados por verem as parcelas referidas em 15 a 18 ocupadas pelos réus;

21 - Há mais de 25 anos que os pais da ré procederam a obras de ampliação lateral da casa de habitação descrita em 7 e ao aumento do pátio com escadas de acesso, existentes a Nascente, transformando-o numa varanda;

22 - (…) e procederam à eliminação da ramada que existia sobre o quinteiro do dito prédio;

23 - (…) tendo cedido, sem contrapartida, à Câmara Municipal……. terreno para construção da estrada camarária, conhecida como Rua ………. e assinalada como Rua ………;

24 - (…) terreno esse destacado das denominadas Leiras do Alpendre e dizendo respeito parte não concretamente apurada da sua área total;

25 - Os réus, desde há cerca de 10 anos, habitam a casa referida em 7 e tratam da parte ajardinada;

26 - Na frente/Nascente da casa de habitação referida em 7, e ladeado pelo terreno, a Sul, que restou das denominadas Leiras …. e, a Norte, pelas Leiras …. da Casa, existe um terreiro;

27 - (…) por onde existe um trato de terreno, em tempos em terra batida e depois pavimentado e empredrado, que permitia aceder por ali ao “……. da Casa” e a outros prédios rústicos das irmãs II, JJ, EE e KK;

28 - Os réus, por si e seus antepossuidores utilizam o prédio descrito em 7., e o terreiro mencionado em 27., guardando e estacionando veículos automóveis, depositando lenhas que vão consumindo e vários objetos e / ou utensílios;

29 - (…) o que fazem à vista de toda a gente;

30 - (…) na convicção de que exercem um direito próprio;

31 - (…) e procedem à limpeza do prédio, colhendo as uvas quando as tinham;

32 - O referido em 23 ocorreu há cerca de 20 anos;

33 - Há cerca de cinco anos os RR., além da janela referida em 8, fizeram obras de remodelação da cozinha, que fica separada da casa, tendo construído uma cornija na mesma fachada nascente da cozinha;

34 - Aquando do referido em 8, o A. marido pretendeu empedrar o caminho de acesso ao seu campo;

35 - Propondo aos RR. pavimentar e empedrar o caminho e pavimentar igualmente todo o terreiro referido, pagando-lhe os RR. apenas metade do custo;

36 - Ao que os RR. acederam, tendo feito entrega ao A. marido em …. …. .2006, de um cheque emitido sobre o Millenium BCP, do montante de 1.116,00€, para pagamento da metade do custo da pavimentação;

37 - Tendo sido acordado entre AA. e RR. como seria feita a pavimentação, a qual foi efetuada nos termos acordados [modificado pela Relação.];

38 - O referido em 28, quanto ao prédio descrito em 7, bem como o referido em 29) e 30), ocorre há mais de trinta anos [modificado pela Relação.];

39 - De forma continuada e ininterrupta;

40 - A área de terreno ocupada pelos RR. é de 1259 m2;

41 - A área coberta da casa existente é de 175 m2, a do anexo (cozinha) de 46 m2, a do quinteiro de 113 m2, a do alpendre de 21 m2, a do espigueiro de 3,25 m2, a das leiras de trás da casa de 292 m2, a da eira de 33 m2, a de 16) dos factos provados (…), de 9 m2, a de 21) dos factos provados (…) de 12 m2, a da área pavimentada referida em 27) dos factos provados (…), de 267 m2, a área de servidão de fls. 312 e ss., de 52 m2 e a da parcela jardinada, de 57 m2.

Foram aditados pela Relação à matéria de facto provada os seguintes factos:

42 - A linha divisória entre os prédios descritos em 1., e em 7., na parte em que confrontam e confinam um com o outro, passa junto à esquina Norte/Nascente do anexo do prédio referido em 7;

43 - … prolonga-se pela parede Nascente daquele anexo até atingir a esquina Sul/Nascente do mesmo;

44 - … prolonga-se até atingir a esquina Norte/Nascente da casa do prédio referido em 7;

45 - … e continua até atingir o limite Sul/Nascente da referida casa;

46 - Além do referido em 19., há mais de 30 anos que os autores utilizam a parcela de terreno a que aludem os pontos 8 e 11 e a parcela de terreno a que aludem os pontos 18 e 19, designadamente plantando e tratando árvores de fruto e vinha na sua bordadura;

47 - … abrindo acessos, pavimentando-os e conservando-os;

48 - … usando as ditas parcelas ou permitindo o seu uso por outrem;

49 - … o que fazem à vista de toda a gente e sem oposição de quem quer que seja;

50 - … na convicção de que lhes pertencem.

Refere-se ainda na motivação do acórdão recorrido o aditamento como facto provado da al. a) da matéria de facto não provada pela 1.ª instância – “O prédio referido em 1.º confronta a Poente com o prédio referido em 7.” –, o que se fez pela sua integração na modificação operada quanto ao ponto 12. dos factos provados, já aí reflectido.

3. Apreciação de direito

3.1. Sindicação do art. 662º, 1, do CPC

O caso apresentado ao STJ respeita a uma acção de reivindicação em que os Autores e os Réus (estes mediante a dedução de pedido reconvencional) invocam o reconhecimento do direito de propriedade sobre os prédios rústico e urbano inscritos, respectivamente, a favor de cada uma das partes, bem como a integração de determinadas parcelas em disputa em cada um dos prédios. O litígio centra-se na definição da linha divisória entre os dois prédios vizinhos e na titularidade das parcelas de terreno ocupadas pelos Réus – factos provados 15. a 18.[1] –, defendendo ambas as partes o respectivo direito de propriedade sobre estas: os Autores pretendem a sua restituição; os Réus Reconvintes almejam a abstenção de actos que, a cargo dos Autores, perturbem o seu direito.

Em 1.ª instância, para além de se ter reconhecido a propriedade dos prédios de cada uma das partes nos termos registados, deu-se razão aos Réus Reconvintes, condenando-se os Autores a reconhecerem a propriedade dos réus “sobre o prédio identificado em 7), com a extensão identificada em 40), conforme planta topográfica de fls. 666”, por terem provado a aquisição por usucapião das parcelas em disputa.

A Relação, após ter modificado com relevo a matéria de facto – por alteração e aditamento, como se viu –, julgou a apelação interposta pelos Autores procedente em parte e modificou a sentença recorrida na medida em que, sem prejuízo de manter o reconhecimento da propriedade dos prédios nos termos registados, declarou “que as parcelas de terreno a que aludem os pontos 15 a 18 da matéria de facto provada integram o prédio rústico identificado no ponto 1 de tal matéria de facto”, propriedade dos Autores. Em consequência, condenou os Réus a restituir aos autores essas parcelas – “livres e desimpedidas, no estado em que se encontravam antes de as terem ocupado, devendo: destruir o passeio a que alude o ponto 16, retirar a casota e quaisquer objetos colocados na parcela a que alude o ponto 17, tapar a janela a que alude o ponto 8 e retirar a cornija a que alude o ponto 9” – e a absterem-se de fazer uso do prédio dos Autores.

Os Réus reconvintes reagiram contra esta decisão, pedindo a repristinação do decidido em 1.ª instância, sustentando no essencial que o acórdão recorrido violou as regras sobre a apreciação dos meios de prova previstas no art. 662º, 1, do CPC, sendo esta norma adjectivo-processual susceptível de fundar a revista nos termos do art. 674º, 1, b), do CPC, ainda que sempre limitada pela regra obstativa do art. 662º, 4, do CPC («Das decisões da Relação prevista nos n.os 1 e 2 não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.»).

Em particular, os Recorrentes sustentam que o acórdão recorrido não fundamentou a modificação operada na matéria de facto, nomeadamente no que toca à ponderação dos meios de prova sujeitos a livre apreciação e ao respeito pela prova “tarifada”, sem formar uma convicção própria com respeito pelos princípios da imediação e da oralidade (cfr. Conclusões O. a Q.).

Pois bem.

Ao STJ permite-se verificar se o uso dos poderes conferidos pelo art. 662º, 1 e 2, do CPC foi exercido dentro da imposição de reapreciar a matéria de facto de acordo com o quadro e os limites configurados pela lei para o exercício de tais poderes(-deveres) – não uso ou uso deficiente ou patológico –, que, no essencial e no que respeita ao n.º 1 do art. 662º, resultam da remissão do art. 663º, 2, para o art. 607º, 4 e 5, do CPC (o n.º 2 já é reforço dos poderes em segundo grau).

Resulta da análise da apreciação da impugnação da matéria de facto – como fica claro a págs. 29-48 – que o acórdão recorrido procedeu a uma exaustiva análise de toda a prova relevante, nomeadamente documental, testemunhal e depoimentos/declarações de parte sem valor confessório, sempre utilizando um método relacional, dotado de crítica racional e alinhando o conjunto factual na sua globalidade. Não se demitiu nem se refugiou em critérios imprecisos nessa análise, antes se realiza uma convicção própria, reflectida na forma e nas razões com que se funda a modificação e aditamento da matéria de facto. Assim se corporizou e assumiu a 2.ª instância como um verdadeiro e próprio segundo grau de jurisdição relativamente à matéria de facto em crise, ainda que sem as virtualidades da 1.ª instância, mas com autonomia volitiva e decisória nessa sede, mediante a reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou daqueles que se mostraram acessíveis com observância do princípio do dispositivo[2]. Regendo-se no domínio da livre apreciação da prova e sem se vislumbrar que tenha desrespeitado a força plena de qualquer meio de prova, imposta por regra vinculativa extraída de regime do direito probatório material – logo, actuação legítima (art. 607º, 4, 5, 1ª parte, 663º, 2, CPC) e insindicável nos termos dos arts. 662º, 4, e 674º, 3, 1.ª parte, do CPC.

Por outro lado, é manifesto – e reitera-se ex professo – que a fundamentação trazida pelo acórdão recorrido não se esvaiu em considerações genéricas ou alusões vagas à tarefa de reapreciação fáctica para concluir sobre o mérito de tal impugnação; antes deu-se cumprimento aos princípios reitores do art. 662º, 1 («deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa»), em ligação com o art. 607º, 4 e 5, do CPC.

Façamos, para ilustrar esse cumprimento – e só com este propósito, sem qualquer intuito, como resulta da normatividade imperativa dos arts. 662º, 4, e 674º, 3, 1ª parte, do CPC, de rever a matéria de facto apurada –, a transcrição do que se fundamentou perante a impugnação na apelação dos factos provados 28. (“Os réus, por si e seus antepossuidores utilizam o prédio descrito em 7., e o terreiro mencionado em 27., guardando e estacionando veículos automóveis, depositando lenhas que vão consumindo e vários objetos e / ou utensílios.”), que se manteve inalterado, e 38., que resultou na sua relevante alteração para a decisão do mérito da causa:

“Estando em causa a utilização pelos réus, por si e antepossuidores, do terreiro mencionado no ponto 27, cumpre atender ao teor dos pontos 26 e 27, os quais não se encontram impugnados e têm a redação seguinte: «26 - Na frente/Nascente da casa de habitação referida em 7), e ladeado pelo terreno, a Sul, que restou das denominadas Leiras do Alpendre e, a Norte, pelas Leiras de Trás da Casa, existe um terreiro»; «27 - (…) por onde existe um trato de terreno, em tempos em terra batida e depois pavimentado e empredrado, que permitia aceder por ali ao “……….. da Casa” e a outros prédios rústicos das irmãs II, JJ, EE e KK».

Sustentam os apelantes que os factos constantes dos pontos 15, 16, 17, 18 e 25, julgados provados, impõem se considere não provado que os réus ocupem esse terreiro há mais de trinta anos, acrescentando que não foi produzida qualquer prova no sentido de que os indicados factos sejam praticados no aludido terreiro pelos réus, por si e seus antepossuidores, há mais de trinta anos, mas unicamente após terem os mesmos ido morar para aquele prédio, o que só aconteceu por volta do ano de 2010.

Ora, os invocados pontos de facto têm a redação seguinte: «15 - Os réus têm vindo a ocupar a parcela de terreno ajardinada referida em 8) e 11)»; 16 - (…) e ainda uma parcela de terreno com cerca de um metro de largura por oito metros e cinquenta centímetros metros de comprimento, com a construção de um passeio em cimento, com quatro escadas, o qual se prolonga para nascente a partir das escadas e varanda e em toda a extensão da casa»; «17 - (…) e mais recentemente, têm vindo a colocar a casota do cão, depositar lenha e objectos diversos, bem como a estacionar veículos automóveis, ocupando uma parcela de terreno com a área aproximada de quarenta metros quadrados»; «18 - (…) Os réus passaram ainda a circular a e com todo o tipo de veículos pelo acesso ao prédio referido em 1) e que liga à Rua ……., o que fazem em desacordo com a vontade dos autores»; «25 - Os réus, desde cerca de 10 anos, habitam a casa referida em 7) e tratam da parte ajardinada».

Decorre efetivamente desta factualidade julgada provada que os réus, desde há cerca de 10 anos, habitam na aludida casa e tratam da parte ajardinada, tendo mais recentemente começado a ocupar uma parcela de terreno com a área aproximada de 40 m2, aí colocando a casota do cão, depositando lenha e objetos diversos, bem como estacionando veículos automóveis. No que respeita a esta parcela do aludido terreiro, reivindicada pelos autores nos presentes autos, extrai-se destes pontos de facto que a aludida ocupação pelos réus se iniciou “mais recentemente”, por referência à ocasião em que começaram a habitar a casa e a tratar da parte ajardinada, o que se verifica desde há cerca de 10 anos.

Por outro lado, há que ter presente que os dois prédios em causa – o prédio rústico inscrito na matriz respetiva sob o artigo …...82, pertencente aos autores, e o prédio urbano inscrito na matriz respetiva sob o artigo …..05, pertencente aos réus – pertenceram anteriormente aos mesmos donos. Efetivamente, o autor e o seu pai, HH, adquiriram em comum, por escritura de compra e venda outorgada a ….-….-1967 (a que respeita o ponto 2 da factualidade provada) o aludido prédio rústico inscrito na matriz sob o artigo …...82 e o prédio urbano inscrito na matriz respetiva sob o artigo …..9, do qual provieram o prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo …..44 e o aludido prédio urbano inscrito sob o artigo …..05 (este último proveniente do prédio inscrito sob o artigo …..45, por sua vez proveniente do prédio inscrito sob o mencionado artigo ….9). Posteriormente, através de processo administrativo de discriminação do prédio inscrito na matriz sob o artigo …9, que correu termos sob o n.º …./78 na Repartição de Finanças de ………. (conforme documentos de fls. 657-661v.º), foi operada a divisão em dois do prédio inscrito na matriz sob o artigo …..9, de que resultou o prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo ..…44 e o prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo ……45, do qual proveio o prédio urbano inscrito sob o artigo .…05 De seguida, por escritura de permuta outorgada por autores e pais do autor a 17-01-1979 (a que respeita o ponto 3 da factualidade provada), os pais transmitiram para o autor, além do mais, ½ indivisa do prédio rústico inscrito na matriz sob o artigo ..…82 (a que alude o ponto 1 da factualidade provada) e do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo …..44 (proveniente do prédio inscrito sob o artigo .…9) e os autores transmitiram para os pais do autor o prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo ….45, do qual proveio o prédio urbano inscrito sob o artigo …..05 (a que alude o ponto 7 da factualidade provada). Por escritura de doação de  (constante de fls. 76 e seguintes), este prédio urbano inscrito sob o artigo …05 foi doado pelos pais do autor a sua filha KK, mãe da ré, sendo posteriormente adquirido pelos réus por doação inscrita no registo a 17-06-2008.

Perante o contexto descrito, considerando que os prédios em causa nos presentes autos pertenceram anteriormente aos mesmos donos, verifica-se que, para efeitos da apreciação dos pontos de facto em análise, assumirá relevância a ocupação da aludida parcela de terreno após a doação operada por escritura de 20-07-1979, pelos pais do autor à mãe da ré, do prédio a que alude o ponto 7 da matéria assente.

Reapreciados os depoimentos prestados pela testemunha JJ, irmã do autor e tia da ré, e pela testemunha LL, cunhado do autor e tio da ré, indicados nas contra-alegações apresentadas pelos réus, verifica-se que deles não decorrem elementos que permitam, com segurança, considerar verificada a ocupação do aludido terreiro pelos pais da ré ou pelos próprios réus em momento anterior ao mencionado no ponto 17 da matéria provada, sendo certo que não se extraem da motivação constante da sentença outros concretos meios probatórios que eventualmente tenham baseado a decisão relativa aos pontos de facto em apreciação.

Como tal, cumpre considerar procedente, nesta parte, a impugnação deduzida e, em consequência, julgar não provado que a utilização do terreiro mencionado em 27, nos termos constantes do ponto 28, ocorra há mais de trinta anos, alterando em conformidade o ponto 38, o qual passará a ter a redação seguinte: «O referido em 28) quanto ao prédio descrito em 7, bem como o referido em 29 e 30, ocorre mais de trinta anos».

*

Não obstante, os Recorrentes sustentam também que o acórdão da Relação incorre em contradição a respeito da localização das várias parcelas de terreno cuja propriedade se discute e a respeito dos limites dos prédios em confronto, dando origem, na sua perspectiva, ao “encravamento” do prédio urbano dos Recorrentes Réus, em face da condenação à abstenção de uso do prédio rústico dos Autores onde se julgou integrar as controvertidas parcelas. O pecado essencial estaria na articulação do que consta dos factos provados 27., 26., 23.-24 (cfr. conclusões T a CC.). Note-se, porém, que estes factos não se encontraram impugnados e não foram objecto de reanálise por parte da Relação, mantendo-se tal qual como foi dado como assente pela 1.ª instância. E deles não se alcança, como tem sido entendido pela jurisprudência do Supremo, que se apresentem como factos essenciais e inconciliáveis entre si, de tal modo que tenha ficado inviabilizada a correcta aplicação do direito – que passa pela delimitação dos prédios em confronto e pela ponderação de aquisição usucapiente pelos Réus Recorrentes das parcelas de terreno ocupadas – e se justificasse a cassação decorrente do recurso aos arts. 682º, 3, do CPC.

 É notório que os Recorrentes apresentam um manifesto inconformismo com o julgamento da matéria de facto a cargo da Relação e a sua repercussão na decisão jurídica do pleito. Mas a este tribunal, em último grau, mesmo que fosse de considerar erro de julgamento, está vedada a indagação de erro intrínseco à apreciação crítica das provas produzidas em regime de prova livre ou o decretamento da sanação das contradições que não seja relevante e significativa para a decisão jurídica.

3.2. Do uso e controlo de alegada presunção judicial

Tem sido jurisprudência constante do STJ que, por via da válvula de escape residual de reapreciação da matéria de facto prevista no art. 674º, 3, 2ª parte, amparada no art. 682º, 2, 2.ª parte, sempre do CPC, a revista possa servir legitimamente para controlar o uso da construção de presunções judiciais utilizadas pelas instâncias, tendo em vista verificar a violação de norma legal (nomeadamente os arts. 349º e 351º do CCiv.), a sua coerência lógica e a fundamentação probatória de base quanto ao facto conhecido[3].

Neste encalce, do objecto recursivo consta o ataque a uma alegada presunção judicial operada pelo acórdão recorrido, no que respeita (ainda) aos limites físicos dos prédios em confronto, tendo por base um acórdão proferido noutro processo que opôs as partes a respeito de uma questão diversa do presente objecto litigioso (então, incidiu sobre a existência de um direito de servidão de passagem por usucapião).
A presunção consiste na dedução, na inferência, no raciocínio lógico por meio do qual se parte de um facto certo, provado ou conhecido (“base da presunção”), e se chega a um facto desconhecido (“facto presumido”) – art. 349º do CCiv. A presunção judicial, natural ou de facto funda-se nas regras práticas da experiência, ou seja, nos ensinamentos decorrentes da observação (empírica) dos factos.
Será que, antes de tudo o mais, usou o acórdão recorrido desse método dedutivo-empírico para definir a matéria de facto relativa aos limites físicos (“linha divisória”) dos prédios referidos nos factos provados 1 e 7.?
Para este efeito, interessa destacar as parcelas do acórdão recorrido sobre este ponto.

Em primeiro lugar, o acórdão recorrido – como se verá infra – considerou ter “relevo para a apreciação do objeto da apelação” o constante “do acórdão de fls. 312-337 v.º proferido por esta Relação a 15-10-2013, no âmbito do processo n.º 461/11……..., intentado pelos ora autores contra os ora réus”–, “cujo trânsito em julgado é admitido por ambas as partes, sendo certo que o acórdão desta Relação proferido nos presentes autos a 28-09-2017 adverte que o decidido no mencionado processo através do aludido acórdão vincula as partes”. O acórdão recorrido transcreve, a seguir, o que foi então alegado pelas partes, o pedido dos Autores, a decisão da Relação no seu dispositivo, com transcrição da matéria de facto considerada provada, e um excerto da fundamentação de direito relativa à “constituição de uma servidão de passagem por usucapião”.
             
Depois, o acórdão anteriormente proferido entrou em liça e foi escalpelizado pelo acórdão recorrido no que era pertinentemente demandado pela impugnação feita quanto ao acréscimo de factualidade considerada provada.
Vejamos a transcrição pertinente:

“Defendem os apelantes, por último, o aditamento à matéria provada dos factos, considerados não provados, seguintes:

– os factos constantes das alíneas b), c) e d), com a redação seguinte: «b) A linha divisória entre os prédios descritos em 1) e 7), na parte em que confrontam e confinam um com o outro, parte do pilar que se situa junto à Rua do ……., segue em linha recta até ao segundo pilar e deste segue, de Norte para Sul, em direcção à esquina Norte /Nascente do anexo do prédio referido em 7)»;« c) (…) prolongando-se pela parede Nascente daquele até atingir a esquina Sul /Nascente»; «d) (…) altura onde flecte para Nascente até atingir a esquina Norte / Nascente da casa, continuando depois e da mesma forma, em direcção ao limite Sul da referida casa»;

– os factos constantes das alíneas i), j), k), l) e m), com a redação seguinte: «i) Além do referido em 19), mais de 15, 20, e 30 anos que os autores por si e antepossuidores utilizam as parcelas de terreno referidas em 8), 11) e 18) a 21), designadamente plantando e tratando árvores de fruto e vinha na sua bordadura, semeando e colhendo batatas, feijão, e produtos hortícolas, semeando pastos e pondo-os a pastar»; «j) (…) construindo tanques, regos e muros de suporte e vedação, abrindo acessos, pavimentando-os, e conservando-os»; «k) (…) Usando as ditas parcelas ou permitindo o seu uso por outrem sem qualquer contrapartida ou dando-o de arrendamento e recebendo a renda respectiva, e pagando os impostos sobre elas incidentes»;« l) (…) o que fazem à vista de toda a gente e sem oposição de quem quer que seja»; «m) (…) na convicção de que exercem um direito próprio».

Alegam os recorrentes que, dos factos considerados provados no acórdão de 15-10-2013, proferido por esta Relação no processo n.º 461/11……..., o qual correu termos entre as mesmas partes, se extrai com clareza que a linha divisória entre os prédios a que aludem os pontos 1 e 7, na parte em que confrontam um com o outro, tem a configuração indicada nas alíneas b), c) e d), o que entendem impor se considerem provados os factos constantes de tais alíneas; acrescentam que tal igualmente decorre da decisão proferida nos autos de procedimento cautelar que identificam.

No mais, requerem a reapreciação do novo levantamento topográfico elaborado, conjugado com as declarações prestadas pelo autor, os depoimentos prestados pelas testemunhas MM, NN, OO e PP, bem como por DD, entretanto habilitada como sucessora da autora falecida, e dos depoimentos prestados pelas testemunhas QQ, RR e SS, elementos probatórios que entendem imporem se considerem provados os pontos de facto em apreciação.

(…)

Respeitam os factos constantes das enunciadas alíneas b), c) e d) à definição da linha divisória entre o prédio urbano a que alude o ponto 7, pertencente aos réus, e o prédio rústico a que alude o ponto 1, pertencente aos autores, na parte em que confrontam um com o outro.

Correu termos entre as mesmas partes o processo n.º 461/11……., intentado pelos ora autores/recorrentes contra os ora réus/recorridos, definitivamente julgado, no qual, por acórdão proferido por esta Relação a 15-10-2013: a) se reconheceu o direito de propriedade dos autores sobre o prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo …..44 e sobre o prédio rústico inscrito na matriz sob o artigo …..82 (a que alude o ponto 1 dos presentes autos); b) se reconheceu o direito de servidão de passagem dos autores, constituída por usucapião, enquanto titulares do direito real reconhecido em a), a pé, com gados presos e soltos, com veículos de tração animal, motorizados ou com tratores e respetivas alfaias, durante todo o ano e a qualquer hora, através do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo …..05 (a que alude o ponto 7 dos presentes autos), pertencente aos réus; c) se condenou os réus a reconhecer aqueles direitos a favor dos prédios dos autores e, consequentemente, a não impedir nem estorvar o respetivo exercício; e ainda, d) a demolir o muro que haviam construído, identificado no item gg. dos factos provados, permitindo o livre exercício do direito de servidão de passagem dos autores.

Estando em causa uma ação entre as mesmas partes e relativa aos mesmos prédios, cumpre apreciar em que medida vincula esta decisão as partes nos presentes autos.

Transitada em julgado, a decisão sobre a relação material controvertida tem força obrigatória dentro do processo e fora dele, nos termos fixados nos artigos 580.º e 581.º do CPC. Por outro lado, dispondo o artigo 621.º do CPC que «a sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos em que julga», verifica-se que o alcance do caso julgado decorre dos próprios termos da decisão. O caso julgado abrange apenas a parte decisória e não, em princípio, os fundamentos de facto e de direito em que se baseia, podendo os seus limites integrar a decisão de questões que constituam antecedente lógico que conduza à decisão final.

Neste domínio, dúvidas não há de que o caso julgado vincula as partes, não só no processo onde foi proferida a decisão, mas igualmente noutros processos, impedindo a repetição da causa (artigos 576.º, n.º 2, 577.º, al. i), 580.º e 581.º do CPC) e fazendo valer a sua autoridade, através da imposição da decisão tomada, a título prejudicial relativamente a decisões a proferir noutras ações.

Sendo as mesmas as partes no processo n.º 461/11………. e nos presentes autos, e reportando-se ambos aos mesmos prédios, a autoridade do caso julgado impõe que as questões decididas naquela ação vinculem as partes no âmbito da presente ação, tanto a título principal, como a título prejudicial. Verifica-se, assim, que o caso julgado abrange, não apenas a parte dispositiva do julgado, mas também a decisão de questões conexas com aquela, o que impõe seja tida em conta a resolução das questões fáctico-jurídicas prévias ou preliminares que constituam pressuposto daquela parte dispositiva. Porém, daqui não decorre que o caso julgado se estenda aos próprios factos considerados provados na decisão em causa, assim não podendo tais factos ser invocados por si só, separadamente da decisão que com base neles tiver sido proferida – neste sentido, cfr. o Ac. do STJ de 17-05-2018 (relatora: Rosa Tching), no qual se entendeu o seguinte: «Os fundamentos de facto não adquirem, quando autonomizados da decisão de que são pressuposto, valor de caso julgado, de molde a poderem impor-se extraprocessualmente»; no mesmo sentido, cfr. o Ac. do STJ de 08-11-2018 (relator: Tomé Gomes), no qual se entendeu o seguinte: «(…) IV – Os juízos probatórios positivos ou negativos que consubstanciam a chamada “decisão de facto” não revestem, em si mesmos, a natureza de decisão definidora de efeitos jurídicos, constituindo apenas fundamentos de facto da decisão jurídica em que se integram. V – Nessa medida, embora tais juízos probatórios relevem como limites objetivos do caso julgado material nos termos do art. 621.º do CPC, sobre eles não se forma qualquer efeito de caso julgado autónomo, mormente que lhes confira, enquanto factos provados ou não provados, autoridade de caso julgado no âmbito de outro processo. VI – De resto, os factos dados como provados ou não provados no âmbito de determinada pretensão judicial não se assumem como uma verdade material absoluta, mas apenas com o sentido e alcance que têm nesse âmbito específico. Ademais, a consistência dos juízos de facto depende das contingências dos mecanismos da prova inerentes a cada processo a que respeitam, não sendo, por isso, tais juízos transponíveis, sem mais, para o âmbito de outra acção».

Deste modo, a matéria de facto julgada provada no âmbito da decisão proferida no processo n.º 461/11……... não impõe, por si só, que sejam considerados provados os factos constantes dos pontos b), c) e d), impugnados pelos apelantes.

(…)

Como tal, cumpre reapreciar os demais elementos probatórios indicados.

Está em causa, nas alíneas b) a d), a definição da linha divisória entre o prédio urbano a que alude o ponto 7, pertencente aos réus, e o prédio rústico a que alude o ponto 1, pertencente aos autores, na parte em que confrontam um com o outro. Respeitam as alíneas i), j), k), l) e m), por seu turno, à utilização pelos autores da parcela ajardinada a que aludem os pontos 8 e 11 e da parcela de terreno a que aludem os pontos 18 e 19.

Conforme supra se expôs, os dois aludidos prédios pertenceram anteriormente aos mesmos donos, tendo autor e seu pai adquirido em comum, por escritura de 02-10-1967, o prédio rústico inscrito na matriz sob o artigo …..82, a que alude o ponto 1, e o prédio urbano inscrito na matriz respetiva sob o artigo …..9, do qual provieram o prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo …..44 e o prédio urbano inscrito sob o artigo …..05 (este último proveniente do prédio inscrito sob o artigo ……45, por sua vez proveniente do prédio inscrito sob o mencionado artigo ….9), a que alude o ponto 7.

Na escritura de permuta a que alude o ponto 3 da factualidade provada – outorgada a 17-01-1979, através da qual os pais transmitiram para o autor, além do mais, ½ indivisa do prédio rústico inscrito na matriz sob o artigo …..82 (a que alude o ponto 1 da factualidade provada) e do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo ……44 (proveniente do prédio inscrito sob o artigo …..9) e os autores transmitiram para os pais do autor o prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo …..45, do qual proveio o prédio urbano inscrito sob o artigo …..05 (a que alude o ponto 7 da factualidade provada) –, os prédios urbanos inscritos na matriz sob os artigos …..44 e ….45, provenientes da divisão do prédio urbano inscrito sob o artigo …..9, foram detalhadamente descritos pelos contraentes, tanto no que respeita às respetivas confrontações, como às áreas, tal como já constava no processo de discriminação do aludido prédio inscrito na matriz sob o artigo …..9, de cuja divisão resultaram os mencionados prédios urbano inscritos na matriz sob os artigos …..44 e …..45.

A este propósito, considerou o acórdão desta Relação proferido nos presentes autos a 28-09-2017, cuja pertinência se mantém, o seguinte:

«A vontade das partes em bem definir os limites de ambos os prédios foi evidente e resultou confirmada não só pelo A. em depoimento de parte/declarações de parte; como pelas testemunhas LL (cunhado do A. e tio dos RR.) e JJ, irmã do A. e tia dos RR., as quais (ambas) confirmaram que o pai do A. só após a divisão com o filho dos prédios em comum é que fez as partilhas, após composição de lotes. Tendo inclusive a testemunha JJ confirmado que a divisão entre pai e filho foi feita com medição a metros [ainda que após não sabendo especificar o que em concreto foi entre eles acordado].

No que ao prédio dos RR. concerne, foram em tais docs. identificadas áreas concretas de casa coberta - 108 m2; cozinha separada com 56 m2; quinteiro com 96 m2; alpendre com 18 m2; espigueiro com 3,25 m2; e cinco leiras com 377 m2 (as 3 denominadas do Alpendre) e 390 m2 (as 2 denominadas de Traz da Casa) - vide fls. 106/107 (processo de discriminação dos 2 prédios do inicial artigo mãe …..9). Na escritura de permuta as mesmas áreas foram indicadas (apenas com a omissão da área das leiras de Trás da casa) - vide fls. 38/39; no requerimento subscrito pelo pai do A. que instruiu o processo de discriminação as mesmas áreas foram indicadas, verificando-se uma discrepância quanto à área das leiras de … da Casa que indica com 300 m2 (e não 390 conforme ficou a constar do termo de Avaliação e Discriminação - vide fls. 72 a 75 dos autos).

Na escritura de doação de 20/07/1979 (vide fls. 77 e segs.) constando a mesma descrição deste prédio que os pais do A. doaram a sua filha KK. Uma vez mais quanto a áreas omitindo a área das leiras de Traz da Casa e indicando como área do espigueiro 13,25 m2 - e não 3,25 como consta em todos os demais documentos e que evidencia lapso, tanto mais que nem as partes nestes autos a identificaram como correta.

Finalmente estas mesmas áreas – num total de 1048,25 m2 – são as que se encontram traduzidas na CRP (vide doc. de fls. 94/96 destes autos).»

Com relevo para a apreciação da matéria em análise, cumpre atender aos factos julgados provados sob os pontos 40 e 41, os quais não se encontram impugnados e têm a redação seguinte: 40 - A área de terreno ocupada pelos réus é de 1259 m2; 41 - A área coberta da casa existente é de 175 m2, a do anexo (cozinha) de 46 m2, a do quinteiro de 113 m2, a do alpendre de 21 m2, a do espigueiro de 3,25 m2, a das leiras de trás da casa de 292 m2, a da eira de 33 m2, a de 16) dos factos provados (…), de 9 m2, a de 21) dos factos provados (…) de 12 m2, a da área pavimentada referida em 27) dos factos provados (…), de 267 m2, a área de servidão de fls. 312 e ss., de 52 m2 e a da parcela jardinada, de 57 m2.

Do cotejo destes pontos de facto – e do levantamento topográfico constante de fls. 666, aditado a fls. 680 – com a supra mencionada descrição das confrontações e áreas do prédio inscrito na matriz sob o artigo …..45 (do qual proveio o prédio a que alude o ponto 7) operada pelos contraentes na escritura de permuta e com a descrição constante do processo de discriminação do prédio inscrito na matriz sob o artigo ……9 (de cuja divisão resultaram os mencionados prédios urbano inscritos na matriz sob os artigos …..44 e …..45), decorre que os réus/recorridos ocupam e reclamam uma área de terreno superior àquela que foi considerada pelos contraentes na aludida escritura, bem como à tida em conta no processo de discriminação e à incluída na descrição constante do registo predial.

Da análise destes elementos parece decorrer que o limite nascente do prédio dos réus/recorridos coincide com o limite nascente do anexo a que alude o ponto 7, bem como com o limite nascente da área de passagem adjacente àquele anexo pelo lado sul deste e com o limite nascente da casa a que alude o ponto 7, adjacente à referida passagem pelo lado sul desta, inexistindo qualquer elemento que indicie a pertença ao aludido prédio das questionadas parcelas localizadas a nascente destes limites.

Também a este respeito se mostra pertinente recordar o constante do acórdão proferido nos presentes autos por esta Relação a 28-09-2017, do qual se extrai o seguinte:

«(…) o pedido reconvencional dos RR foi formulado nos seguintes termos: “pela procedência da reconvenção deve ser declarado e reconhecido:

a) serem os RR. os proprietários do prédio urbano referido e identificado em 55º desta contestação/reconvenção;

b) serem os AA. condenados a reconhecer o referido direito de propriedade dos RR.;

(…)

No mencionado artigo 55º da contestação/reconvenção consta:

55º Deve declarar-se reconvencionalmente serem os RR. os exclusivos donos e senhores do seguinte prédio urbano:

uma casa com a área coberta de 108 m2 com uma divisão no rés-do-chão e duas no primeiro andar, com uma cozinha separada com a área de 56 m2 e com um quinteiro com a área de 96 m2, alpendre com 18 m2 e espigueiro com 3,25 m2 e terreno de horta formado por 5 leiras, sendo duas denominadas de Traz da Casa com 390 m2 e 3 denominadas do Alpendre com 377 m2, a confrontar do norte com o caminho, do sul com o mesmo, nascente com os AA. e do poente com a restante parte do prédio de onde foi destacado (AA.), descrito na Conservatória do Registo Predial sob o ……./…….. e inscrito na matriz sob o artigo ……05-P, assinalado e configurado a cor vermelha no levantamento topográfico junto aos autos a fls. como doc. Nº7 desta contestação (…)”.

A área indicada pelos RR. do seu prédio nesta descrição perfaz o total de 1048,25 m2.

E corresponde exatamente à área do mesmo indicada no processo administrativo de discriminação nº …./78 (vide fls. 106/107) relativo ao prédio então descrito na matriz …..9 do qual provieram o prédio urbano dos RR. referido em 7) dos factos provados e o prédio urbano dos AA. identificado sob a verba um da escritura de permuta junta a fls. 35 e segs. dos autos […].

Não obstante, no levantamento topográfico oferecido pelos RR. e a que corresponde o doc. 7 junto a fls. 108/109 cujos limites se encontram delineados a vermelho é indicada uma área total do prédio dos RR. de 1259 m2.

Nestes limites estão incluídas, à 1ª vista, todas as áreas reclamadas pelos AA. incluindo o caminho de acesso ao(s) prédio(s) através da Rua……. (antes Rua……) – vide 12 e 23 dos factos provados – que ambas as partes reclamam como de sua propriedade e que de acordo com o ponto 18 dos factos provados é acesso do prédio dos AA. referido em 1) dos factos provados (…)».

Reapreciados os depoimentos prestados pelas testemunhas MM e PP, extrai-se dos mesmos, como supra se indicou, que executaram as obras a que alude o ponto 13 da matéria provada, realizadas por volta do ano de 1988 na casa existente no prédio pertencente aos réus, ambos tendo esclarecido que, para a construção da varanda e das escadas aí mencionadas, se mostrou necessário cortar uma ramada existente no local e que se prolongava até ao alpendre da casa, tendo recebido indicação da mãe da ré no sentido de ser previamente pedida autorização ao autor para efetuar tal corte, em virtude de a ramada lhe pertencer, o que foi efetuado, tendo ainda a primeira das indicadas testemunhas visto o autor a podar um bardo aí existente; também a testemunha OO revelou conhecimento da existência de ramada até às casas pertencentes ao prédio dos réus, a qual era vindimada a mando do autor, o que demonstrou ser do seu conhecimento pessoal, em virtude de ter participado nesses trabalhos, a mando do autor; do depoimento prestado pela testemunha NN decorre que, conforme supra exposto, há cerca de 9 ou 10 anos, a mando do autor, procedeu à pavimentação do acesso ao …….. da Casa, o qual se encontrava em terra batida, tendo os trabalhos sido efetuados nos termos indicados pelo autor, que procedeu ao respetivo pagamento, acrescentando que ninguém o impediu de levar a cabo o serviço em causa; do depoimento prestado pela filha dos autores, DD, numa primeira fase na qualidade de testemunha e, posteriormente, na sequência na respetiva habilitação como sucessora da autora falecida, em sede de declarações de parte, igualmente decorre a utilização que vem sendo dada pelo autor às parcelas de terreno em causa, esclarecendo, de forma que se mostrou credível, que eram cultivadas até à casa e ao anexo (cozinha) pertencentes aos réus, tendo inclusivamente participado em vindimas e revelando conhecer os limites do terreno cultivado por seu pai e o uso dado ao mesmo. Por outro lado, tanto do depoimento prestado pelo autor, complementado com as declarações posteriormente prestadas, como dos depoimentos prestados pelas testemunhas LL, cunhado daquele e tio dos réus, e JJ, irmã do autor e tia dos réus, que revelaram conhecimento do contexto no âmbito do qual foram autonomizados os dois prédios supra indicados e estabelecidos os respetivos limites, resultou a forma como foi operada entre pai e filho a divisão dos prédios, a qual antecedeu a aludida permuta e a subsequente doação aos réus do prédio que atualmente lhes pertence, não se extraindo dos depoimentos de parte prestados pelos réus qualquer elemento relevante que ponha em causa tal intenção das partes no sentido de definir claramente os limites de ambos os prédios, plasmando-os nos documentos supra referidos.

Face ao exposto, verifica-se que a reapreciação dos indicados meios de prova impõe se altere a decisão proferida, quanto aos pontos de facto em apreciação, devendo ser excluídos da factualidade considerada não provada e aditado à matéria provada os factos seguintes (…).”

Assim sendo, verifica-se com clareza que a mobilização do acórdão anteriormente proferido em 2013 serviu para se confrontar neste pleito a sua autoridade de caso julgado material e, nesse âmbito, recusar a essa autoridade a legitimidade para migrar desse acórdão todo o complexo de factos provados e não provados, invocados por si só e separadamente da decisão a que dizem respeito, o que eventualmente dispensaria a circunscrição e fundamentação autónomos neste processo dos factos assentes – o que se asseverou não existir (“a matéria de facto julgada provada no âmbito da decisão proferida no processo n.º 461/11……... não impõe, por si só, que sejam considerados provados os factos constantes dos pontos b), c) e d), impugnados pelos apelantes”), partindo-se para o que exige o art. 662º, 1, do CPC, quanto ao aditamento da matéria de facto como provada (antes no elenco de factos não provados).

O que se fez depois, partindo dessa posição de princípio e já em sede de fundamentação da questão de direito a resolver – e apontando que a “definição dos limites de cada um dos prédios constitui uma questão prejudicial, essencial à apreciação do objeto da presente ação, dado que permitirá determinar a titularidade do direito de propriedade sobre a faixa de terreno em litígio e, em conformidade, apreciar os demais pedidos deduzidos pelas partes” –, foi entender que “os limites do caso julgado podem abranger, além da parte decisória, também a decisão de questões que constituam antecedente lógico que conduza à decisão final”, de modo que a força de caso julgado inclui, “além da parte dispositiva propriamente dita, igualmente a decisão de questões conexas com aquela”, o que conduz a que “se tenha em conta a resolução das questões fáctico-jurídicas prévias ou preliminares que constituam pressuposto da decisão final”. Ora, prosseguiu o acórdão recorrido, nesse processo anterior “foi suscitada e decidida, a título de questão prévia, subjacente à apreciação dos pedidos formulados pelos autores, a determinação da realidade física dos prédios em causa, nomeadamente quanto às respetivas confrontações e delimitação, o que constituiu pressuposto e antecedente lógico da decisão final, que reconheceu a constituição de servidão de passagem a favor do prédio a que alude o ponto 1 dos presentes autos, pertencente aos autores, sobre o prédio a que alude o ponto 7 dos presentes autos, pertencente aos réus”. Daí – sempre na perspectiva do acórdão recorrido – “decorre que a questão da determinação da realidade física dos prédios em causa, nomeadamente no que respeita às respetivas confrontações e delimitação dos prédios a que aludem os pontos 1 e 7 dos presentes autos, foi decidida no aludido processo”, em particular “na respetiva confrontação poente/nascente”, e, assim, “vincula as partes nos presentes autos, pelo que cumpre ter em conta a linha divisória entre os dois prédios aí definida”.

Mais acrescentou: “De todo modo, a factualidade julgada provada nos presentes autos mostra-se conforme àquela decisão, como decorre dos pontos 42 a 45, dos quais se extrai que a linha divisória entre os prédios descritos em 1 e em 7, na parte em que confrontam e confinam um com o outro, passa junto à esquina norte/nascente do anexo do prédio referido em 7, prolonga-se pela parede nascente daquele anexo até atingir a esquina sul/nascente do mesmo, prolonga-se até atingir a esquina norte/nascente da casa do prédio referido em 7 e continua até atingir o limite sul/nascente da referida casa. Esta delimitação entre os dois prédios permite concluir que as parcelas de terreno em litígio – as parcelas de terreno a que aludem os pontos 15 a 18 –, localizadas a nascente da casa e do anexo implantados no prédio a que alude o ponto 7, se integram no prédio a que alude o ponto 1, pertencente aos autores”.

Destarte, julgamos ter por certo que o acórdão recorrido não se socorreu desse acórdão, proferido nesse outro processo que opôs as partes, para construir qualquer presunção assente em regras de experiência e observação empírica a partir de factos provados nesse outro processo, que baseassem um raciocínio dedutivo para arvorar um meio de prova autónomo em face de qualquer outra dedução ou inferência inerente a outro meio de prova[4]. Na verdade, o acórdão recorrido não assenta um facto desconhecido a partir de um facto conhecido por provado. E que agora, como presunção natural ou de facto, tal fosse susceptível de controlo jurisdicional em último grau.

O acórdão recorrido focou-se em delimitar o caso julgado prejudicial desse outro aresto – sem que tal fosse agora impugnado[5] –, no que vinculava as partes relativamente à questão prévia de delimitação física dos prédios, e conjugar essa factualidade prejudicialmente vinculativa por decisão judicial anterior com a factualidade provada neste processo, a fim de extrair, em conjunto, a sua convicção, quanto à aplicação do direito confrontado com o material probatório trazido ao processo (art. 607º, 4, pela remissão do art. 663º, 2, 2ª parte, do CPC), de que “as parcelas de terreno em litígio – as parcelas de terreno a que aludem os pontos 15 a 18 –, localizadas a nascente da casa e do anexo implantados no prédio a que alude o ponto 7, se integram no prédio a que alude o ponto 1, pertencente aos autores”. Em suma, fez-se uma nova ponderação e valoração, analítica e crítica, incluindo as ilações (legítimas) que se retiraram, de acordo com as regras da ciência, lógica e experiência, dos factos mobilizados como provados, depois da alteração feita neste processo e tendo em conta a factualidade de processo prejudicial, levando a uma convicção diversa (legítima) da obtida no primeiro grau de decisão, culminada na subsunção jurídica pertinente[6].

Tudo visto, em particular tendo em conta os poderes de cognição do STJ em sede de revista, não resta outro cenário que não seja fazer improceder as Conclusões dos Recorrentes.

III) DECISÃO

Em conformidade, acorda-se em julgar improcedente a revista, confirmando-se o acórdão recorrido.

*

Custas pelos Recorrentes.

STJ/Lisboa, 13 de Abril de 2021

Ricardo Costa (Relator)

Nos termos do art. 15º-A do DL 10-A/2020, de 13 de Março, aditado pelo art. 3º do DL 20/2020, de 1 de Maio, e para os efeitos do disposto pelo art. 153º, 1, do CPC, declaro que o presente acórdão, não obstante a falta de assinatura, tem o voto de conformidade do Senhor Juiz Conselheiro que é 1.º Adjunto neste Colectivo.

António Barateiro Martins

Ana Paula Boularot (Com declaração de voto em anexo)

SUMÁRIO DO RELATOR (arts. 663º, 7, 679º, CPC).

_______________________________________

PROC 2395/11.1TBFAF.G2.S1

6ª SECÇÃO

DECLARAÇÃO DE VOTO

Voto a decisão, mas não posso, de todo em todo, acompanhar a fundamentação expendida.

Se não.

Os Autores em sede de recurso de Apelação, impugnam a decisão sobre a matéria de facto incluída na sentença recorrida, sustentando a alteração da redação dada aos pontos 13, 19, 28, 37 e 38 da matéria provada, bem como o aditamento à matéria provada dos factos constantes das alíneas a), b), c), d), e), i), j), k), l) e m), considerados não provados.

Os aludidos pontos de facto têm a seguinte redacção:

Factualidade provada

«13 - Por volta do ano de 1988 os pais da Ré resolveram fazer obras na casa referida em 7), e construíram umas escadas e uma varanda, para “melhor” acederem ao primeiro andar [5.º b.i.];

19 - Os AA. contribuíram para a abertura de acesso referida em 18) e respectiva pavimentação;

28 - Os réus, por si e seus antepossuidores utilizam o prédio descrito em 7), e o terreiro mencionado em 27º, guardando e estacionando veículos automóveis, depositando lenhas que vão consumindo e vários objectos e / ou utensílios [29.º b.i.];

37 - Tendo sido acordado entre AA. e RR. que a pavimentação seria feita, como efectivamente foi, até a limite nascente do prédio dos RR. confinante com a extrema poente …….. da Casa dos AA;

38 - O referido em 28), 29) e 30) ocorre há mais de trinta anos;»

Factualidade não provada

«a) O prédio referido em 1.º confronta a Poente com o prédio referido em 7) [parte do 1.º b.i.];

b) A linha divisória entre os prédios descritos em 1) e 7), na parte em que confrontam e confinam um com o outro, parte do pilar que se situa junto à Rua ……., segue em linha recta até ao segundo pilar e deste segue, de Norte para Sul, em direcção à esquina Norte /Nascente do anexo do prédio referido em 7) [2.º b.i.];

c) (…) prolongando-se pela parede Nascente daquele até atingir a esquina Sul /Nascente [3.º b.i.];

d) (…) altura onde flecte para Nascente até atingir a esquina Norte / Nascente da casa, continuando depois e da mesma forma, em direcção ao limite Sul da referida casa [4.º b.i.];

e) O referido em 13) ocorreu mediante autorização do A. para o efeito;

i) Além do referido em 19), há mais de 15, 20, e 30 anos que os autores por si e antepossuidores utilizam as parcelas de terreno referidas em 8), 11) e 18) a 21), designadamente plantando e tratando árvores de fruto e vinha na sua bordadura, semeando e colhendo batatas, feijão, e produtos hortícolas, semeando pastos e pondo-os a pastar [13.º b.i.];

j) (…) construindo tanques, regos e muros de suporte e vedação, abrindo acessos, pavimentando-os, e conservando-os [14.º b.i.];

k) (…) Usando as ditas parcelas ou permitindo o seu uso por outrem sem qualquer contrapartida ou dando-o de arrendamento e recebendo a renda respectiva, e pagando os impostos sobre elas incidentes [15.º b.i.];

l) (…) o que fazem à vista de toda a gente e sem oposição de quem quer que seja [16.º b.i.];».

O Acórdão da Relação, em sede de reponderação, nos termos do nº1 do artigo 662º do CPCivil, julgou procedente a indicada impugnação, quanto aos seguintes factos:

19. «Os AA. decidiram proceder e procederam à abertura do acesso referido em 18, tendo suportado o respetivo custo; posteriormente, pretendendo pavimentar tal caminho de acesso, os autores procederam nos termos constantes dos pontos 34, 35 e 36, suportando o remanescente do custo da pavimentação». (Alterado)

37. «Tendo sido acordado entre AA. e RR. como seria feita a pavimentação, a qual foi efetuada nos termos acordados». (Alterado)

38. «O referido em 28) quanto ao prédio descrito em 7, bem como o referido em 29 e 30, ocorre há mais de trinta anos».

12. «Não obstante o referido em 1), o prédio ali descrito confronta de Norte com Rua do ……. e a Poente com o prédio referido em 7)» (Alterado por via do aditamento à matéria provada da alínea a) da matéria de facto não provada)

Considerou como provados os factos constantes das alíneas b) a d) e i) a m) da matéria dada como não provada

«42 - A linha divisória entre os prédios descritos em 1) e em 7), na parte em que confrontam e confinam um com o outro, passa junto à esquina Norte/Nascente do anexo do prédio referido em 7);

43 - … prolonga-se pela parede Nascente daquele anexo até atingir a esquina Sul/Nascente do mesmo;

44 - … prolonga-se até atingir a esquina Norte/Nascente da casa do prédio referido em 7);

45 - … e continua até atingir o limite Sul/Nascente da referida casa;

46 - Além do referido em 19), há mais de 30 anos que os autores utilizam a parcela de terreno a que aludem os pontos 8 e 11 e a parcela de terreno a que aludem os pontos 18 e 19, designadamente plantando e tratando árvores de fruto e vinha na sua bordadura;

47 - … abrindo acessos, pavimentando-os e conservando-os;

48 - … usando as ditas parcelas ou permitindo o seu uso por outrem;

49 - … o que fazem à vista de toda a gente e sem oposição de quem quer que seja;

50 - … na convicção de que lhes pertencem.».

Face a esta modificação factual introduzida, o Tribunal da Relação alterou a decisão de direito, concluindo em sede de dispositivo o seguinte:

« a) na parcial procedência da ação:

i) declarar que as parcelas de terreno a que aludem os pontos 15 a 18 da matéria de facto provada integram o prédio rústico identificado no ponto 1 de tal matéria de facto;

ii) condenar os réus a restituir aos autores as parcelas referidas em i), livres e desimpedidas, no estado em que se encontravam antes de as terem ocupado, devendo: destruir o passeio a que alude o ponto 16, retirar a casota e quaisquer objetos colocados na parcela a que alude o ponto 17, tapar a janela a que alude o ponto 8 e retirar a cornija a que alude o ponto 9;

iii) condenar os réus a abster-se de fazer uso do prédio dos autores;

b) na parcial procedência da reconvenção:

i) reconhecer o direito de propriedade dos réus/reconvintes sobre o prédio identificado no ponto 7 da matéria de facto provada;

ii) absolver os autores/reconvindos do demais peticionado;

c) revogar parcialmente, em conformidade, a decisão recorrida, mantendo-a no mais.».

A presente Revista foi interposta pelos Réus, os quais entram em contra mão com a materialidade provada resultante do Aresto impugnado.

A tese que faz vencimento enuncia do seguinte modo as questões a resolver:

«1. Objecto do recurso

Vistas as Conclusões, que delimitam as questões a decidir (arts. 635º, 2 a 4, 639º, 1 e 2, CPC), identifica-se que o escrutínio em sede de revista incide sobre:

— impugnação da decisão proferida pelo acórdão recorrido por alegado incumprimento dos deveres previstos no art. 662º do CPC na reapreciação da matéria de facto, sindicável nos termos do art. 674º, 1, b), do CPC (cfr., em esp., as Conclusões J. a L., S., KK. e LL.), que teria obstado à melhor solução jurídica na questão da “definição dos limites físicos do prédio urbano dos Recorrentes e a respetiva fruição ao longo do tempo” (Conclusão A.);

— impugnação da alegada presunção judicial utilizada pelo acórdão recorrido, sindicável nos termos do art. 674º, 3, 2ª parte, do CPC, baseada na repercussão em termos factuais de uma decisão judicial anterior em que as partes foram as mesmas deste processo (cfr. Conclusões C. a J.).».

O Recurso, visa, na sua globalidade, a alteração por este STJ da materialidade fáctica que foi objecto de reponderação pelo Tribunal da Relação, invocando os Réus, para o efeito, de uma forma genérica, destituída de qualquer concretização precisa, que o Acórdão impugnado violou o disposto no artigo 662º do CPCivil.

Dispõe o artigo 662º nº 1, do CPCivil que «A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.», acrescentando o seu nº4 «Das decisões da Relação previstas nos n.ºs 1 e 2 não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.».

Por seu turno preceitua o artigo 682º do CPCivil no que tange às competências do Supremo Tribunal de Justiça «1 - Aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, o Supremo Tribunal de Justiça aplica definitivamente o regime jurídico que julgue adequado. 2 - A decisão proferida pelo tribunal recorrido quanto à matéria de facto não pode ser alterada, salvo o caso excecional previsto no n.º 3 do artigo 674.º.».

Quer dizer, em termos de julgamento factual, no que à economia da decisão proferida diz respeito, os poderes do STJ estão assim limitados a situações de concreta sindicância se tiver sido invocada uma violação das regras substantivas de direito probatório, nos termos do artigo 674º, nº 3, do CPCivil, bem como poderão abranger igualmente o controlo efectivo da Lei adjectiva na fixação da matéria de facto dada como provada e não provada, nos termos do artigo 674º, nº 1, alínea b) daquele mesmo diploma legal, embora com a restrição que decorre do nº4 do artigo 662º supra extractado.

Daqui decorre que este Órgão jurisdicional pode sancionar uma má utilização pelo segundo grau dos índices aludidos no nº4 do artigo 607º do CPCivil («Na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência.», mas já não poderá imiscuir-se no juízo apreciativo formulado pelo julgador ao abrigo do nº5, primeira parte, do mesmo artigo («O juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto;»), cfr neste sentido os Ac de 3 de Novembro de 2009 (Relator Moreira Alves) e de 24 de Setembro de 2013 (Relator Azevedo Ramos), in www.dgsi.pt.

A factualidade que foi objecto de pronunciamento por banda do Tribunal da Relação estava, como está, sujeita ao princípio da livre apreciação, inexistindo qualquer facto que careça de prova tabelada e, assim sendo, a mesma poderia ter sido obtida através de presunções judiciais, como deflui do disposto no artigo 351º do CCivil.

Ademais, como decorre inequivocamente do excurso explicativo encetado em sede de apreciação da impugnação factual que foi suscitada ao Tribunal da Relação, aí foi dado cabal cumprimento às regras adjectivas atinentes à fundamentação, cfr artigo 607º, nº4 do CPCivil, como se impunha.

Uma vez que os Recorrentes se limitaram a apresentar em sede de acervo conclusivo, proposições genéricas destituídas de qualquer concretização certeira em relação às possíveis violações por parte do Acórdão recorrido na apreciação da materialidade factual que levou a cabo no âmbito da Apelação, mormente onde residiu a ausência de análise critica das provas e/ou onde ocorreu uma violação de regras substantivas de direito probatório, é óbvio que a tese que fez vencimento deveria ter recusado a apreciação genérica formulada e muito menos pronunciar-se, como acabou por fazer, acerca do juízo efectuado pelo segundo grau aquando da alteração operada, excedendo desta forma, os poderes atribuídos a este Supremo Tribunal de Justiça quanto a este particular.

A tese vencedora, fazendo transcrever a fundamentação do Acórdão recorrido em sede de reponderação da materialidade factual (embora a dado passo se diga que se faz «a titulo de ilustração»), exerce uma fiscalização positiva da mesma, concluindo pela bondade do corolário a que se chegou, violando os parâmetros estabelecidos para o julgamento em sede de Revista, aludidos nos nºs 1 e 2 do artigo 682º e conhece, não podendo conhecer, do fundo de tal modificação, nº4 do artigo 662º, este como aquele do CPCivil.

(Ana Paula Boularot)

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[1] A saber: i) uma parcela ajardinada (facto 15., com remissão para os factos 8 e 11), ii) uma parcela com 1 m de largura x 8,5 m de comprimento composta por um passeio em cimento e quatro escadas (facto 16.); iii) uma parcela de 40 m2 que inclui uma casota, depósito de lenha e lugar de estacionamento (facto 17.) e; iv) o acesso ao prédio dos autores que liga à rua do …….. com circulação a pé e de carro (facto 18.).
[2] V. por todos ABRANTES GERALDES, Recursos no novo Código de Processo Civil, 5.ª ed., Almedina, Coimbra, 2018, sub art. 662º, págs. 284 e ss, 290.
[3] V. ABRANTES GERALDES, Recursos… cit., sub art. 674º, págs. 406 e ss.
Até bem mais restritivo se encontra, quanto a este controlo no STJ, JOSÉ LEBRE DE FREITAS, “Ónus do recorrente que impugne a decisão de facto. Controlo pelo STJ do uso de presunções judiciais”, ROA, 2019, I/II, págs. 147 e ss, 153-154, com razões ponderosas.
[4] Em rigor, a prova por presunções não tem autonomia processual, pois “assenta sobre uma base (um facto) que tem de ser provada” (ANTUNES VARELA/J. MIGUEL BEZERRA/SAMPAIO E NORA, Manual de processo civil, 3.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 1985, pág. 503). Talvez mais rigoroso, porém, seja afirmar que a presunção judicial “constitui um meio de prova autónomo quando não se limite às deduções intrinsecamente inerentes ao iter de outro meio de prova” (JOSÉ LEBRE DE FREITAS, “Ónus do recorrente…”, loc. cit., pág. 153).
[5] Sobre a insusceptibilidade de conhecimento oficioso da “autoridade de caso julgado” (efeito positivo do caso julgado), v. RUI PINTO, “Exceção e autoridade de caso julgado – algumas notas provisórias”, Julgar on line, 2018, págs. 35-36.
[6] V., com utilidade, entre muitos outros, o Ac. do STJ de 14/2/2012, processo n.º 6283/09.3TBBRG.G1.S1, Rel. ALVES DO VELHO, in www.dgsi.pt.