Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
99B232
Nº Convencional: JSTJ00037154
Relator: ABÍLIO VASCONCELOS
Descritores: EXECUÇÃO
Nº do Documento: SJ199906020002322
Data do Acordão: 06/02/1999
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: T REL COIMBRA
Processo no Tribunal Recurso: 336/97
Data: 06/23/1998
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Decisão: CONCEDIDA A REVISTA.
Área Temática: DIR PROC CIV - PROC EXEC.
Sumário : Se uma sentença condena a pagar o que se liquidar em execução, não condenada em juros de mora, não pode, na execução, pedir-se juros de mora.
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:
A, requereu contra B, execução de liquidação de sentença proferida na acção, com processo ordinário, a que os presentes antes se encontram apensos, na qual a executada foi condenada a pagar-lhe "a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença, e que exceda 1400000 escudos, correspondentes aos honorários devidos pelos trabalhos prestados pelo autor, referidos em 2,3,4 e 8" da mesma sentença, pedindo a procedência da liquidação por si efectuada e a condenação da executada a entregar-lhe 5112020 escudos de capital, 1725307 escudos de juros, à taxa legal, desde a mora até 28 de Fevereiro de 1995, e juros vincendos.
A executada contestou a liquidação.
Na sentença proferida na 1. instância foi a quantia exequenda fixada em 2283246 escudos e 40 centavos, aí se decidindo não acrescerem juros de mora por o título não os prever, nem poder prever face ao disposto no artigo 805 n. 3 do CCIV.
Na sequência de recurso interposto por exequente e executada, o Tribunal da Relação de Coimbra condenou a executada a pagar ao exequente a quantia de 4823450 escudos e cinquenta centavos, acrescidos de juros de mora, às taxas legais, desde a data da sentença proferida na 1. instância (30 de Outubro de 1996).
Do respectivo acórdão recorreu a executada, restringindo o recurso à parte do mesmo que incidiu sobre os juros, formulando as seguintes conclusões:
1- a sentença que serviu á execução não prevê o pagamento de quaisquer juros;
2- é por aquele título que se determinam o fim e os limites da acção executiva;
3- os juros que a recorrente foi condenada a pagar extravasam os limites do título executivo;
4- caso assim se não entenda, então os juros apenas poderão ser contados a partir da prolação do acórdão recorrido, pois só com este é que o crédito se tornou líquido;
5- foi violado o disposto nos artigos 345 n. 1 do CPC e 805 n. 3 do CCivil.
Respondeu a recorrida alegando, fundamentalmente, que a executada não contestou o pedido de juros por si feito no requerimento executivo, e conclui pela improcedência do recurso.
A primeira questão a dirimir consiste em se saber se na presente acção executiva há ou não causa de pedir para a condenação no pagamento de juros de mora.
Vejamos o que, com interesse, está provado:
- Na acção declarativa condenatória o Autora, ora exequente, pediu a condenação da ré, aqui executada, a pagar o capital de 4953440 escudos, 185754 escudos de juros de mora calculados até 10 de Fevereiro de 1993 e juros vincendos;
- na sentença, transitada em julgado, proferida na referida acção, a ré foi, apenas, condenada a pagar ao autor "a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença, e que exceda 1400000 escudos, correspondentes aos honorários devidos pelos trabalhos prestados pelo autor, referidos em 2,3,4 e 8" da mesma sentença;
- na petição desta execução, o autor-exequente pediu a procedência da liquidação por efectuada e a condenação da executada a entregar-lhe 5112020 escudos de capital, 1725307 escudos de juros, à taxa legal, desde a mora até 28 de Fevereiro de 1995, e juros vincendos.
Nos termos do artigo 45 n. 1 do CPC de 61, então vigente, "Toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva".
Mas, este normativo não impõe que se considere a causa de pedir como sendo o próprio título.
Segundo o disposto no artigo 498 n. 4 do CPC, e em conformidade com a teoria da substanciação perfilhada neste diploma, a causa de pedir é o facto jurídico nuclear constitutivo de uma determinada obrigação (v. Alberto dos Reis no CPC Anotado, II, 351, Antunes Varela no Manual de Processo Civil, 2. edição, 245, Acs. do S.T.J. de 28 de Maio de 1991 e de 8 de Junho de 1993, respectivamente, no B.M.J. 407-448 e C.J.(A.S.T.J. I, 3, 6).
O que acontece é que não pode haver acção executiva sem titulo que, processualmente, constitua a sua base formal e que lhe define, nos termos daquele artigo 45 n. 1, o seu fim e limites.
In casu, o título executivo é a sentença condenatória, com trânsito em julgado, e é no seu texto que se tem de encontrar a extensão do pedido para a acção executória.
Como vimos, desta, sentença, não consta a condenação no pagamento de juros moratórios.
E o facto de a ré ter sido condenada a pagar ao autor a quantia que se viesse a liquidar em execução de sentença não era obstáculo para a condenação no pagamento de juros de mora, desde que para tal houvesse fundamento.
É que um acto é a decisão sobre se há ou não lugar a condenação a pagamento de juros moratórios por retardamento no cumprimento da obrigação, que consubstancia um pedido diverso do de pagamento da dívida - artigo 561 do CCIV.
Outro, é a determinação do momento da constituição da mora; ou seja, da data a partir da qual os juros de mora são devidos - artigo 805 daquele mesmo Código.
São duas situações distintas e que não são incompatíveis entre si.
Ora, como a obrigação de pagamento de juros não consta do título executivo, a execução não os pode abarcar (cfr.Ac. STJ de 19 de Janeiro de 1984 no BMJ 333-386). - A este propósito, escreve Alberto dos Reis, no Cod.Proc.Civil Anotado, vol.I, pg. 151: "Desde que a execução não é conforme ao título, na parte em que existe a divergência tudo se passa como se não houvesse título: nessa parte a execução não encontra apoio no título."
Este mesmo princípio é enunciado por Lopes Cardoso no seu Manual da Acção Executiva, 3. ed., quando diz, a fls. 240, que a liquidação deve estar em harmonia com o teor do título.
Assim, não sendo admissível a execução para pagamento de juros de mora, por essa obrigação não constar do título executivo, procede a revista.
Termos em que se revoga o acórdão da Relação na parte em que condenou a recorrente no pagamento de juros moratórios.
Custas pelo recorrido.
Lisboa, 2 de Junho de 1999.
Abílio Vasconcelos,
Roger Lopes,
Simões Freire.