Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
66/06.0PJAMD-A.S1
Nº Convencional: 5ª SECÇÃO
Relator: SOUTO DE MOURA
Descritores: RECURSO DE REVISÃO
PENA DE EXPULSÃO
ESTRANGEIRO
NOVOS FACTOS
MENOR
CONSTITUCIONALIDADE
TRIBUNAL DE EXECUÇÃO DAS PENAS
Data do Acordão: 02/17/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: RECUSADA A REVISÃO DO ACÓRDÃO
Sumário :

I - O recorrente fundamenta o seu pedido de revisão de sentença, no que respeita à condenação na pena acessória de expulsão, com afastamento do território nacional, na al. d) do n.º 1 do art. 449.º do CPP, sendo certo que o facto novo invocado (nascimento de um filho) teve lugar depois da sentença condenatória que se quer ver revista.
II - Assim, parece claro que a revisão será de recusar, desde logo porque a referida al. d) utiliza a expressão “Se descobrirem novos factos ou meios de prova”: a literalidade do preceito aponta para uma descoberta, e de uma realidade que embora existente era desconhecida. Não para uma realidade nova, moldada por factos entretanto acontecidos.
III - Será ir longe demais atender, em nome da justiça, não apenas ao desconhecimento de factos que poderiam ter sido conhecidos à data da prolação da decisão, como também a uma situação sobrevinda depois da decisão, que obviamente o juiz não tinha que prever. Não fora assim, e estaria aberta a porta à invocação de um sem número de factos supervenientes, responsáveis pela criação de uma situação que se veio a revelar injusta. Tudo isso constituiria motivo de revisão, e abalaria de modo insuportável o efeito de caso julgado, ou seja, a segurança das decisões.
IV - A justiça da condenação não poderá confundir-se com a situação em que o condenado possa ter ficado depois da condenação, em virtude de factos sobrevindos ulteriormente; a essa situação posteriormente criada só poderá atender-se, a nosso ver, em sede de execução da pena, porque não é a decisão que se mostra injusta, é a execução da decisão que, face ao novo condicionalismo, se veio a revelar injusta.
V - A CRP tanto estabelece a garantia de que os cidadãos portugueses não poderão ser expulsos do território nacional (art. 33.º, n.º 1), como garante também aos filhos o direito a não serem separados dos pais, salvo quando estes não cumpram os seus deveres fundamentais e exigindo-se para tanto uma decisão judicial (art. 36.º, n.º 6).
VI - O direito à convivência, ou seja, o direito dos membros do agregado familiar a viverem juntos, não é “apenas um direito dos pais ou dos filhos portugueses, mas também dos filhos portugueses em relação ao progenitor estrangeiro ou deste em relação aos filhos portugueses”, não sendo consentida outra interpretação com base nos princípios da equiparação e da igualdade.
VII - O TC declarou com força obrigatória geral, no Ac. n.º 232/2004, a inconstitucionalidade material do art. 101.º, n.ºs 1, als. a), b) e c), e 2, do DL 244/98, na sua versão original, “na dimensão em que permite a expulsão de cidadãos estrangeiros que tenham a seu cargo filhos menores de nacionalidade portuguesa residentes em território nacional, por violação conjugada do disposto nos arts. 33.º, n.º 1 e 36.º, n.º 6 da Lei Fundamental”, com fundamento de que “o cidadão estrangeiro que tenha os filhos a seu cargo, que com eles mantenha uma relação de proximidade, que contribua decisiva e efectivamente para o seu sustento e para o desenvolvimento das suas personalidades”, tem o direito a não ser separado dos filhos, assim como os filhos têm o direito a não ser separados dos pais, salvo se estes não cumprirem os seus deveres fundamentais para com aqueles.
VIII - A citada decisão do TC exige que o indivíduo a expulsar tenha os filhos a seu cargo, mantenha uma relação de proximidade com eles, ou contribua decisiva e efectivamente para o seu sustento e para o desenvolvimento das suas personalidades, e é a essa luz que se deverá interpretar, sendo o caso, a expressão do art. 135.º, al. b), da Lei 23/2007, de 04-07, “Tenham efectivamente a seu cargo”. Por outras palavras, será preciso que a separação entre pai e filho redunde num prejuízo material ou psicológico significativo.
IX - No presente caso falece o condicionalismo de que a lei faz depender a admissibilidade do recurso de revisão, já que a previsão do art. 449.º, n.º 1, al. d), do CPP não admite que se dê relevância a factos supervenientes à decisão a rever. Seja como for, não é de excluir que a execução da pena acessória de expulsão, na altura de se efectivar, possa vir a revelar-se injusta.
X - De acordo com o art. 138.º, n.º 4, al. d), do CEPMPL, compete ao TEP determinar a execução da pena acessória de expulsão e, se na altura dessa decisão, se verificar a existência de um impedimento à sua execução, decorrente de facto superveniente à decisão condenatória, não determinará a expulsão, por impossibilidade legal.
XI - No caso em apreço, o TEP não poderá determinar a expulsão, se verificar que na altura em que a mesma vier a ter lugar o menor é português, e está efectivamente a cargo do arguido, ou o menor é estrangeiro, reside em Portugal e é o arguido que assegura o seu sustento e educação, exercendo sobre ele o poder paternal. Tudo, ponderando, evidentemente, o condicionalismo específico decorrente da situação de reclusão.


Decisão Texto Integral:


AA, cidadão cabo-verdiano nascido a 30/3/19, filho de BB e de CC, solteiro, pedreiro, residente em ...., Sintra, antes de preso, foi condenado a 7/12/2007, no Pº 66/06.0PJAMD da 5ª Vara Criminal de Lisboa, na pena de 5 anos de prisão, pela prática do crime de tráfico de estupefacientes, previsto no art. 21º nº 1 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro. Interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa que foi julgado improcedente, mantendo-se portanto essa pena.
No Pº 9429/04.4TDLSB da 2ª Vara Criminal de Lisboa, o aqui requerente havia já sido condenado como reincidente, pela prática do crime de tráfico de menor gravidade, previsto no art. 25º do referido Decreto-Lei nº 15/93, na pena principal de 3 anos de prisão e na pena acessória de expulsão por 10 anos, pena esta reduzida por acórdão da Relação de Lisboa, de 6/6/2004, para 5 anos de afastamento do território nacional.
No referido Pº 66/06.0PJAMD, por acórdão de 14 de Julho de 2008, procedeu-se ao cúmulo jurídico da pena aí imposta, com as aplicadas no Pº 9429/04.4TDLSB da 2ª Vara Criminal de Lisboa, tendo a pena única sido fixada em 6 anos e 6 meses de prisão e na expulsão do território nacional com interdição de entrada no mesmo pelo período de 5 anos.
Interpõe agora recurso extraordinário de revisão desta decisão, relativamente à condenação na pena acessória de expulsão, com afastamento do território nacional durante 5 anos.

A - RECURSO

Em síntese, o recorrente fundamentou assim o seu recurso:
Invoca o disposto no art. 449, nº 1, al. d) do C P P, e alega que, já após a sua condenação, lhe nasceu a 15 de Setembro de 2008 um filho, de que cuida, “garantindo-lhe sustento e educação com as economias angariadas antes da sua condenação à pena de prisão”.
Após invocar o disposto no art. 135º da Lei nº 23/2007, de 4 de Julho, afirma que o preceito foi violado, já que “o nascimento do filho em data posterior à sua condenação constitui um facto novo surgido após o julgamento e a condenação do arguido ora recorrente, ao qual caso àquela data fosse conhecido, não teria sido aplicada ao recorrente a pena acessória de expulsão do País por força da supra mencionada Lei 23/2007 [indicada, por evidente lapso como Lei nº 23/2009], de 4 de Julho”.
Juntou com certidão do assento de nascimento de DD, no qual consta que é filho do requerente e que nasceu efectivamente a 15/9/2008 (fls. 5).

O Ministério Público respondeu, e não deixando de pôr em relvo algumas incongruências do requerimento, nomeadamente a invocação do disposto em ambas as alíneas b) e c) do art. 135º da Lei nº 23/2007, que reciprocamente se excluem, entendeu dever ser produzida a prova indicada pelo requerente e sugeriu que fosse ordenado à Direcção-Geral de Reinserção Social que procedesse a inquérito sobre as condições em que vivem a criança e sua mãe, bem como acerca do relacionamento passado e presente desta com o arguido, nacionalidade do menor e enquadramento familiar do arguido em território nacional, existência de mais filhos e seu relacionamento com o progenitor e se, quando em liberdade ou já na prisão, o condenado tem contribuído para o respectivo sustento económico e para o processo de formação educacional da criança.
Por lapso os autos foram enviados ao Supremo Tribunal de Justiça sem o despacho judicial acerca desta promoção, bem como sem a informação a que o art. 454º do Código de Processo Penal se refere, pelo que foram mandados baixar.
Perante o relatório social entretanto elaborado, foi entendido pelo juiz do processo não ser necessário ouvir o arguido, por constituir uma mera duplicação de diligências. Na informação prevista no art. 454º do Código de Processo Penal, concluiu aquele magistrado que “se verifica «in casu» o condicionalismo previsto no art. 449º nº 1 al. d), do C.PP, conjugado com o art. 135º al. b) da Lei nº 23/2007, de 4/7, que legitima o recurso de revisão do acórdão ora impugnado”, pelo que se pronunciou no sentido do provimento do recurso de revisão.
Já neste Supremo Tribunal, e pós ter promovido a junção do acórdão proferido pela 2ª Vara Criminal, onde o requerente foi condenado na pena acessória de expulsão, o que foi deferido, o magistrado do Ministério Público emitiu fundamentada opinião no sentido de que não deverá ser autorizada a revisão.
Para tanto, depois de referir que a jurisprudência se divide quanto à questão, considera que “mesmo a adoptar-se a posição jurisprudencial mais favorável ao recorrente, a citada em primeiro lugar, dificilmente, e em face dos elementos de prova apresentados, se poderá dizer que aquele, que se encontra em reclusão desde 14.01.08, ou seja 8 meses antes do nascimento do menor, exerce efectivamente o poder paternal e assegura o sustento e educação do menor, seu filho. O alegado contributo para o sustento do filho menor, com as economias amealhadas fruto do seu trabalho na construção civil enquanto estava em liberdade, não são propriamente confirmadas pelo relatório social e, sabendo-se como se sabe, que o recorrente esteve preso entre 12.06.02 a 9.12.04, não se vê bem que meios de subsistência o arguido pôde angariar para agora sustentar o filho menor, para além dos outros que tem de relação anterior.”
Concluiu, por isso, que “a situação efectivamente apurada nos autos não integra nenhuma das restrições à aplicação da pena acessória de expulsão prevista no art. 135.º da Lei 23/2007 - o arguido não nasceu em território português, nem se encontra no nosso país desde idade inferior a 10 anos e, fundamentalmente, não tem a seu cargo filhos menores residentes em Portugal, sejam ou não de nacionalidade portuguesa, pelo que a não verificação desse pressuposto sempre levaria à negação da revisão pretendida.”

Colhidos os vistos, o processo foi apresentado à conferência, para decisão.

B-APRECIAÇÃO

1) O RECURSO DE REVISÃO

Como é sabido, um dos valores fundamentais do direito é o da segurança das decisões judiciais, consubstanciada no instituto do trânsito em julgado.

Contudo, tal valor não é absoluto, e nem sequer é o mais importante, pois sobreleva o da justiça, particularmente quando estão em causa direitos fundamentais da pessoa humana. Esse é o caso das condenações penais, onde são, ou podem ser afrontados os direitos à liberdade, à honra e bom nome do condenado, e onde, portanto, a imutabilidade da sentença que decorre do caso julgado tem de ceder, sempre que se torna flagrante que foi contrariado o sentido da justiça.

No confronto desses dois valores, a justiça e a segurança, o legislador em matéria penal optou por uma solução de compromisso, possibilitando, embora de forma limitada, o direito de serem revistas as sentenças e os despachos que tenham posto fim ao processo, ainda que transitados em julgado.

Figueiredo Dias (1) afirma que a segurança é um dos fins prosseguidos pelo processo penal, mas que “isto não impede que institutos como o do recurso de revisão contenham na sua própria razão de ser um atentado frontal àquele valor, em nome das exigências da justiça. Acresce que só dificilmente se poderia erigir a segurança em fim ideal único, ou mesmo prevalente, do processo penal. Ele entraria então constantemente em conflitos frontais e inescapáveis com a justiça; e, prevalecendo sempre ou sistematicamente sobre esta, pôr-nos-ia face a uma segurança do injusto que, hoje, mesmo os mais cépticos têm de reconhecer não passar de uma segurança aparente e ser só, no fundo, a força da tirania”.

Por isso, o art.º 29.º, n.º 6, da Constituição da República prevê, no domínio dos direitos, liberdades e garantias, sobre a aplicação da lei criminal, que “Os cidadãos injustamente condenados têm direito, nas condições que a lei prescrever, à revisão da sentença e à indemnização pelos danos sofridos.

E, na prossecução desse desiderato, o Código de Processo Penal, entre os recursos extraordinários, prevê de facto o de revisão, no art.º 449.º e segs.

Os fundamentos deste recurso extraordinário vêm taxativamente enunciados no art.º 449.º do Código de Processo Penal, e visam o aludido compromisso entre o respeito pelo caso julgado, e com ele a segurança e estabilidade das decisões, por um lado, e a justiça material do caso, por outro.

Tais fundamentos são apenas estes:

“a) Uma outra sentença transitada em julgado tiver considerado falsos meios de prova que tenham sido determinantes para a decisão;

b) Uma outra sentença transitada em julgado tiver dado como provado crime cometido por juiz ou jurado e relacionado com o exercício da sua função no processo;

c) Os factos que servirem de fundamento à condenação forem inconciliáveis com os dados como provados noutra sentença e da oposição resultarem graves dúvidas sobre a justiça da condenação;

d) Se descobrirem novos factos ou meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação.

e) Se descobrir que serviram de fundamento à condenação provas proibidas nos termos dos n.ºs 1 a 3 do artigo 126.º;

f) Seja declarada, pelo Tribunal Constitucional, a inconstitucionalidade com força obrigatória geral de norma de conteúdo menos favorável ao arguido que tenha servido de fundamento à condenação;

g) Uma sentença vinculativa do Estado Português, proferida por uma instância internacional, for inconciliável com a condenação ou suscitar graves dúvidas sobre a sua justiça.”

Como se viu, o recorrente fundamenta o seu pedido na al. d) do artº 449º referido. Ora, assim sendo, a primeira coisa que importa apurar é a de se saber se estamos perante “novos factos ou meios de prova”, como pressuposto necessário para ser interposto um recurso de revisão, à luz da dita al. d).

2) A DESCOBERTA DE NOVOS FACTOS OU MEIOS DE PROVA

A al. d) supra referida exige que se descubram novos factos ou meios de prova. Essa descoberta pressupõe obviamente um desconhecimento anterior de certos factos ou meios de prova, agora apresentados. Ora, a questão que desde o início se vem por regra colocando, quanto à interpretação do preceito, é a de se saber se o desconhecimento relevante é do tribunal, porque se trata de factos ou meios de prova não revelados aquando do julgamento, ou se o desconhecimento a ter em conta é o do próprio requerente, e daí a circunstância de este não ter levado ao conhecimento do tribunal os factos, ou não ter providenciado pela realização da prova, à custa dos elementos que se vieram a apresentar como novos. Na doutrina, acolheram-se ambas as posições, não interessando à economia do presente recurso expor a respectiva fundamentação. Diremos simplesmente que a posição que se tem mostrado largamente maioritária neste Supremo Tribunal é a primeira. Também temos defendido, porém, dentro dessa linha, não bastar que pura e simplesmente o tribunal tenha desconhecido os novos factos ou elementos de prova para ter lugar o recurso de revisão.

E a limitação é a seguinte: os factos ou meios de prova novos, conhecidos de quem cabia apresentá-los, serão invocáveis em sede de recurso de revisão, desde que seja dada uma explicação suficiente, para a omissão, antes, da sua apresentação. Por outras palavras, o recorrente terá que justificar essa omissão, explicando porque é que não pôde, e, eventualmente até, porque é que entendeu, na altura, que não devia apresentar os factos ou meios de prova, agora novos para o tribunal. Na verdade, existe um elemento sistemático de interpretação que não pode ser ignorado a este propósito, e que resulta da redacção do artº 453º nº 2 do C. P. P.: “O requerente não pode indicar testemunhas que não tiverem sido ouvidas no processo, a não ser justificando que ignorava a sua existência ao tempo da decisão ou que estiveram impossibilitadas de depor”. Isto é, o legislador revela com este preceito que não terá querido abrir a porta, com o recurso de revisão, a meras estratégias de defesa, ou dar cobertura a inépcias ou desleixos dos sujeitos processuais. O que teria por consequência a transformação do recurso de revisão, que é um recurso extraordinário, num expediente que se poderia banalizar.

E assim se prejudicaria, para além do aceitável, o interesse na estabilidade do caso julgado, e também se facilitariam faltas à lealdade processual (cf. v. g. P.P. Albuquerque in “Comentário do Código de Processo Penal”, pag. 1198, ou os Ac. deste S. T. J. de 25/10/2007 (Pº 3875/07, 5ª Secção), de 24/9/2009 (Pº 15189/02.6. DLSB.S1, 3ª Secção), ou de 28/10/2009 (Pº 109/94.8 TBEPS-A.S1, 3ª Secção, entre vários outros).

Se esta é a problemática que mais frequentemente aflora em matéria de revisão da sentença, o presente recurso apresenta-nos um circunstancialismo diferente, porque o facto novo invocado teve lugar depois da sentença condenatória que se quer ver revista.

Ora, assim sendo, parece claro que a revisão será de recusar.

Desde logo porque a al d) do nº 1 do art. 449º do C P P utiliza a expressão “Se descobrirem novos factos ou meios de prova”. A literalidade do preceito aponta para uma descoberta, e de uma realidade que embora existente era desconhecida. Não para uma realidade nova, moldada por factos entretanto acontecidos.

Depois, a justiça da condenação, posta em causa com o que se descobriu, é a justiça da condenação a rever. O recurso em questão propõe-se reparar uma falsa visão da realidade que a sentença a rever teve. Só interessa assim ter em conta a factualidade ocorrida até à data da decisão.

E então, será ir longe demais atender, em nome da justiça, não apenas ao desconhecimento de factos que poderiam ter sido conhecidos à data da prolação da decisão, como também a uma situação sobrevinda depois da decisão, que obviamente o juiz não tinha que prever. Não fora assim, e estaria aberta a porta à invocação de um sem número de factos supervenientes, responsáveis pala criação de uma situação que veio a revelar injusta. Tudo isso constituiria motivo de revisão, e abalaria de modo insuportável o efeito de caso julgado, ou seja, a segurança das decisões.

A justiça da condenação não poderá confundir-se com a situação em que o condenado possa ter ficado depois da condenação, em virtude de factos sobrevindos ulteriormente.

A essa situação posteriormente criada só poderá atender-se, a nosso ver, em sede de execução da pena, porque não é a decisão que se mostra injusta, é a execução da decisão que, face ao novo condicionalismo, se veio a revelar injusta.

3) O LIMITE À EXPULSÃO DE ESTRANGEIROS

Sabe-se que a C R, tanto estabelece a garantia de que os cidadãos portugueses não poderão ser expulsos do território nacional (art. 33º nº 1), como garante também aos filhos o direito a não serem separados dos pais, salvo quando estes não cumpram os seus deveres fundamentais e exigindo-se para tanto uma decisão judicial (art. 36º nº 6).

E o direito à convivência, ou seja, o direito dos membros do agregado familiar a viverem juntos, não é “apenas um direito dos pais ou dos filhos portugueses, mas também dos filhos portugueses em relação ao progenitor estrangeiro ou deste em relação aos filhos portugueses”, não sendo consentida outra interpretação com base nos princípios da equiparação e da igualdade (2) .

O Tribunal Constitucional, declarou com força obrigatória geral, no acórdão nº 232/2004, a inconstitucionalidade material do art. 101º nº 1 als. a), b) e c) e nº 2 do Decreto-Lei nº 244/98, na sua versão original, “na dimensão em que permite a expulsão de cidadãos estrangeiros que tenham a seu cargo filhos menores de nacionalidade portuguesa residentes em território nacional, por violação conjugada doo disposto nos arts. 33º nº 1 e 36º nº 6 da Lei Fundamental.”

Com fundamento de que “o cidadão estrangeiro que tenha os filhos a seu cargo, que com eles mantenha uma relação de proximidade, que contribua decisiva e efectivamente para o seu sustento e para o desenvolvimento das suas personalidades”, tem o direito a não ser separado dos filhos, assim como os filhos têm o direito a não ser separados dos pais, salvo se estes não cumprirem os seus deveres fundamentais para com aqueles.

E já antes, com a revisão do regime respeitante à entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional operada pelo Decreto-lei nº 4/2001, de 10 de Janeiro, deixara de ser admitida a aplicação da pena acessória de expulsão do território nacional aos estrangeiros residentes que tenham filhos menores residentes em território português sobre os quais exerçam efectivamente o poder paternal à data da prática dos factos que determinaram a aplicação da pena e a quem assegurem o sustento e a educação, desde que a menoridade se mantenha no momento previsível de execução da pena. Para tanto era considerado residente, segundo a definição legal prevista no art. 3º do Decreto-Lei nº 244/98, “o estrangeiro habilitado com título válido de residência em Portugal.

O art. 135º da Lei nº 23/2007, de 4 de Julho, estabelece actualmente na sua al. b) que não podem ser expulsos do País os cidadãos estrangeiros que “Tenham efectivamente a seu cargo filhos menores de nacionalidade portuguesa a residir em Portugal”. E, a al. c), que “Tenham filhos menores, nacionais de Estado terceiro, residentes em território português, sobre os quais exerçam efectivamente o poder paternal e a quem assegurem o sustento e a educação”.

A citada decisão do T C exige que o indivíduo a expulsar tenha os filhos a seu cargo, mantenha uma relação de proximidade com eles, ou contribua decisiva e efectivamente para o seu sustento e para o desenvolvimento das suas personalidades, e é a essa luz que se deverá interpretar, sendo o caso, a expressão da actual lei “Tenham efectivamente a seu cargo”. Por outras palavras, será preciso que a separação entre pai e filho redunde num prejuízo material ou psicológico significativo.

4) O CASO DOS AUTOS

De acordo com a posição antes adiantada, importa afirmar, antes do mais, que no presente caso falece o condicionalismo de que, a nosso ver, a lei faz depender a admissibilidade do recurso de revisão. A previsão do artº. 449º nº 1 al d) do C P P não admite que se dê relevância a factos supervenientes à decisão a rever.

Estamos portanto em desacordo com as decisões deste Supremo Tribunal em que se assumiu posição contrária. É o caso do acórdão do S T J de 11/2/1999 que atendeu ao facto superveniente da aquisição da nacionalidade portuguesa por parte do arguido (Pº 1361/98, in B M J 484 pag. 280) e do Ac. de 11/6/2003 (Pº 1680/03, 3ª Secção), ou ainda do Ac. de 17/4/2008 (Pº 4840/07 sempre da 3ª Secção), que teve em conta o nascimento de um filho depois da condenação.

Como se referiu no Ac. de 22/10/2008 (Pº 2042/08, 3ª Secção), “A justeza do recurso de revisão passa pelo crivo da verificação, ex ante à decisão revidenda, da convivência com os filhos, da sua dependência do recorrente, do interesse da preservação da unidade da família, apresentando-se desproporcionada a expulsão por aquele valor se apresentar mais digno de protecção mesmo quando comparado com a evidente lesividade à ordem jurídica nacional como é o caso do recorrente (…)”. Também recusaram relevância aos factos supervenientes os Ac. de 9/6/2010 (Pº 2681/97.1 PULSB-A.S1 da 5ª Secção) e de 8/10/2008 (Pº 2893/08, 3ª Secção).

Não fora esse o impedimento que como tal se apresenta, à admissão da revisão, sempre seria necessário determinar a nacionalidade do filho do recorrente. Porque se o menor for português a situação estará prevista na al b) do art. 135º da Lei 23/2007 citada, exigindo-se ao arguido[s] ter[em] “efectivamente a seu cargo filhos menores”, e se o[s] menor[es] for[em] estrangeiro[s] cá residente[s] já será o caso da al. c) do preceito. Não podendo então ocorrer a expulsão quando sobre os menores os arguidos “exerçam efectivamente o poder paternal [e] a quem assegurem o sustento e a educação”. O que pode não se revelar exactamente coincidente.

Ora o menor em causa é filho de pais naturais de Cabo Verde, nada se sabendo sobre se se nacionalizaram portugueses. Se os progenitores forem efectivamente estrangeiros, não é por o menor ter nascido em Portugal que adquire automaticamente a nacionalidade portuguesa (art. 1º da Lei 37/81 de 3 de Outubro). Tudo leva então a pensar que o menor em causa é estrangeiro, o que implicaria a aplicação da al. c) do art. 135º referido.

Subsequentemente, mesmo que se enveredasse pela relevância do facto superveniente do nascimento do menor DD, sempre teria que se apurar o preenchimento do requisito, no caso menos exigente, da al. b) do art. 135º da Lei 23/2007, de o arguido ter o menor a seu cargo. Verifica-se então que o recorrente não tinha o menor a seu cargo quando cometeu os factos ou quando foi preso, quando foi proferida a decisão que o condenou na pena de expulsão ou quando iniciou o cumprimento da pena de prisão. Daí que, no presente caso, só possa interessar saber se o recorrente tem e terá a seu cargo o menor, na ocasião da expulsão.

Recorde-se que a sentença que decretou essa expulsão é de 14/7/2008. O recorrente está preso desde 14/1/2008 (já tinha estado preso entre 12/6/2002 e 9/12/2004). O seu filho nasceu a 15/9/2008, dando-se conta desse nascimento, através do presente recurso, um ano e cinco meses depois.

Dispomos de um relatório social elaborado (fls. 91 e seg.) com referência à situação de 25 de Outubro último, data em que o filho em questão tinha 2 anos. Desconhece-se quando é que o arguido adquirirá a liberdade, ainda que condicional.

Segundo aquele relatório, o recorrente deixou dois filhos em Cabo Verde, de uma anterior ligação, com quem mantém contacto regular telefónico.

Vivia antes de preso com uma companheira e três filhas desta. Tal companheira “vem sempre com o filho à visita referindo-nos [ela] que tenta estimular sempre a ligação pai/filho, vendo com alguma apreensão a ordem de expulsão que recai sobre o mesmo. Em termos económicos esta tem passado por algumas dificuldades decorrentes das despesas com o agregado onde se encontram as três filhas que tem a seu cargo, por isso dá valor ao esforço que o arguido tem feito em disponibilizar algum apoio económico que surge condicionado pela precariedade da sua situação resultante do exercício laboral na instituição prisional”.

O Relatório não confirma o facto apresentado como motivação do recurso, segundo a qual o recorrente garante o sustento e educação ao filho “com as economias angariadas antes da sua condenação à pena de prisão”, economias que se supõe feitas quando exercia a profissão de pedreiro. Antes parece aludir, um tanto vagamente, a algum apoio económico assente no trabalho prisional.

Tudo ponderado, não será ousado concluir, que os dados de que se dispõe apontam para que, quem tem efectivamente a seu cargo o menor, e previsivelmente o terá, quando o arguido condenado for restituído à liberdade, é a mãe do dito menor, e não o recorrente. Ou seja, a expulsão poderá representar a impossibilidade de, de futuro, o recorrente ter o menor a seu cargo, mas não parece traduzir um corte, com uma situação caracterizada por o recorrente ter “efectivamente” o filho a seu cargo.

Ainda por este motivo seria de recusar a solicitada revisão.

Seja como for, na linha do anteriormente afirmado, não é de excluir que a execução da pena acessória de expulsão, na altura de se efectivar, possa vir a revelar-se injusta.

De acordo com o art. 138º nº 4 al. d), da lei 115/2009 de 15 de Outubro, compete aos tribunais de execução das penas “Determinar a execução da pena acessória de expulsão declarando extinta a pena de prisão, e determinar a execução antecipada da pena acessória de expulsão”. Parece-nos claro que, se na altura dessa decisão, o tribunal verificar a existência de um impedimento à execução da pena de expulsão, decorrente de facto superveniente à decisão condenatória, não determinará essa execução, por impossibilidade legal. No caso em apreço, o T E P não poderá determinar a expulsão, se verificar que na altura em que a mesma vier a ter lugar o menor é português, e está efectivamente a cargo do arguido, ou o menor é estrangeiro, reside em Portugal e é o arguido que assegura o seu sustento e educação, exercendo sobre ele o poder paternal. Obviamente, tendo em conta o condicionalismo decorrente da situação de recluso a que o recorrente esteve sujeito.

C - DECISÃO

Neste termos, se acorda em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça, em recusar a pretendida revisão do acórdão de 14 de Julho de 2008, na parte em que condenou o arguido AA na pena acessória de expulsão, com afastamento do território nacional por 5 anos.

Custas pelo recorrente com taxa de justiça de 5 U C.

Lisboa, 17 de Fevereiro de 2011

Souto Moura (relator, por vencimento) **
Arménio Sottomayor (“Vencido conforme declaração de voto anexa”)
Carmona da Mota (“com voto de desempate a favor da actual versão”)
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(1) Direito Processual Penal, 44, citado por Maia Gonçalves no Código de Processo Penal Anotado e Comentado, 11.ª edição, págs. 795

(2) Cf. Anabela Costa Leão, in “Expulsão de Estrangeiros com Filhos Menores a Cargo”, Jurisprudência Constitucional, nº 3, Jul/Set de 2004, pág. 32

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Declaração de Voto

Vencido. Teria autorizado a revisão, pelas razões seguintes:
1. Estabelecendo a Constituição da República a garantia de que os cidadãos portugueses não poderão ser expulsos do território nacional (art. 33º nº 1) e garantindo também aos filhos o direito a não serem separados dos pais, salvo quando estes não cumpram os seus deveres fundamentais e mediante decretamento por decisão judicial (art. 36º nº 6), o Tribunal Constitucional, declarou com força obrigatória geral, no acórdão nº 232/2004, a inconstitucionalidade material do art. 101º nº 1 als. a), b) e c) e nº 2 do Decreto-Lei nº 244/98, na sua versão original, “na dimensão em que permite a expulsão de cidadãos estrangeiros que tenham a seu cargo filhos menores de nacionalidade portuguesa residentes em território nacional, por violação conjugada do disposto nos arts. 33º nº 1 e 36º nº 6 da Lei Fundamental”, por tal poder implicar a expulsão de um cidadão nacional, no caso de o menor vir a acompanhar o progenitor expulso.
Em casos em que o condenado adquiriu nacionalidade portuguesa após a condenação em pena acessória de expulsão do território nacional, o Supremo Tribunal de Justiça entendeu ser de conceder a revisão da sentença, justificando que “não se vislumbra outra solução que não seja a pretendida revisão de sentença, nos termos do aludido artigo 449º nº 1 alínea d) do Código de Processo Penal. Se é certo que não pode ser invocada a «injustiça» contemporânea da condenação, «os factos agora invocados e considerados como novos são-no, de modo vivencial e essencial, na medida em que assumem o significado jurídico da sua consideração ou qualificação como tal, pois é legítimo afirmar-se que se tivessem sido objecto de análise e inclusão na decisão, não se colocaria agora a questão da pena acessória de expulsão, para efeitos de revisão de sentença, por ocorrência da previsão do artigo 33°, n.° 1, da Constituição da República Portuguesa.” (ac. de 11-02-1999 (BMJ, 484, pág. 200).
Entendo, tal como se escreveu no acórdão de 11-06-2003, Proc. n.º 1680/03 - 3.ª Secção, que “a noção de "factos novos" está tipicamente referida às circunstâncias do tempo processual da decisão; a justiça da decisão seria posta em causa se o facto relevante pudesse ter sido conhecido do tribunal do julgamento no momento da decisão. Todavia, a plasticidade da noção não afasta a consideração da novidade subsequente, quando os valores e exigências que estejam em causa assumam igual índice de validade”. Por isso e porque desse modo se concretizam melhor as garantias constitucionais, propendi, como relator inicial, para a concessão da revisão requerida pelo cidadão cabo-verdeano AA, enfileirando na corrente em que o acórdão de 17-04-2008 – Proc. nº 4840/07 - 3ª Sec., se integra, e onde foi autorizada a revisão, em virtude de “se a justiça da pena não suscitava dúvidas aquando da prolação da decisão, já assim não sucede no momento da execução da pena. Ora, não é tolerável que se execute uma pena sobre a qual recaem graves suspeitas de ser injusta. Tendo o recurso de revisão como fundamento e teleologia, precisamente, a reparação de decisões injustas, ainda que o procedimento se encontre extinto ou a pena prescrita ou cumprida, como refere o n.º 4 do art. 449.º do CPP, por maioria de razão ele deve ser admitido a reparar decisões que ainda não se executaram, quando, portanto, é ainda possível evitar que se efective e execute uma decisão injusta”, tendo sido sensível ao argumento de que “é defensável e lógico afirmar-se que a sentença não se esgota no momento do seu trânsito em julgado, mas tão-só quando cessam todos os efeitos, então pode e deve concluir-se ser de atribuir relevância a «factos novos» que tornem a decisão verdadeiramente eivada de injustiça, no tocante aos efeitos que possa produzir enquanto não se mostra inteiramente executada.” (ac. de 11/06/2003, atrás referido).
2. A posição que fez vencimento, considera também que não está provado que o menor seja cidadão português, e parte da premissa de que quem tem efectivamente a seu cargo o menor, e previsivelmente o terá, quando o arguido condenado for restituído à liberdade, é a mãe do dito menor, e não o requerente, fazendo a prognose de que “a expulsão poderá representar a impossibilidade de, de futuro, o recorrente ter o menor a seu cargo, mas não parece traduzir um corte, com uma situação caracterizada por o recorrente ter “efectivamente” o filho a seu cargo.”
A meu ver, os elementos de facto que foram carreados para os autos são suficientes para permitem fundar um juízo rescidente. Com efeito, nada no assento de nascimento lavrado em Conservatória do Registo Civil portuguesa consente a dúvida de que o menor DD possa não ser cidadão nacional. É seguro, também, que reside em território português. Por fim, o relatório social elaborado “com base no acompanhamento efectuado pela DGRS em sede de cumprimento de pena de pena, entrevista com o arguido, contacto telefónico com a companheira, articulação com os Serviços de Educação e Vigilância e consulta do dossier individual da DGRS”, revela que o condenado “há cerca de 5 anos iniciou novo relacionamento afectivo que afirma ser gratificante, existindo desta ligação um filho que nasceu durante a sua reclusão, tendo actualmente cerca de dois anos”; que “beneficia de apoio familiar através de visitas regulares por parte da companheira, irmãs e primos …”; e ainda que “a companheira vem sempre com o filho à visita referindo-nos que tenta estimular sempre a ligação pai/filho, vendo com alguma apreensão a ordem de expulsão que recai sobre o mesmo; em termos económicos esta tem passado por algumas dificuldades decorrentes das despesas com o agregado onde se encontram as três filhas que tem a seu cargo, por isso dá valor ao esforço que o arguido tem feito em disponibilizar algum apoio económico que surge condicionado pela precariedade da sua situação resultante do exercício laboral na instituição prisional”.
Acresce que no caso de o progenitor se encontrar preso, o conceito de “ter a seu cargo, efectivamente, filhos menores” tem de ser entendido com a ductilidade própria decorrente dessa circunstância, a qual é susceptível de impedir, ou de limitar, o pleno exercício do poder paternal.
Por outro lado, e perante esta circunstância, deve valorizar-se, para efeito do juízo que ao Supremo compete, a ligação pai/filho, que a companheira do requerente tem procurado estimular e a ajuda económica, ainda que precária, que o condenado tem vindo a proporcionar.
Por este conjunto de razões, teria autorizado a revisão, a fim de na 1ª instância se proceder a novo julgamento com vista à aplicação, ou não, da pena acessória de expulsão, onde deveria ser feito um mais completo juízo acerca do exercício efectivo do poder paternal por parte do requerente.
3. Na posição que fez vencimento defende-se que ao juiz de execução das penas competirá o encargo de, no momento da execução da pena acessória de expulsão, verificar se a mesma pode ser executada, dada a restrição prevista no art. 135º da Lei nº 23/2007, de 4 de Julho.
Esta solução não tem, a meu ver, cobertura legal. Atentando no art. 138º do Código da Execução das Penas verifica-se que apenas quanto às penas ou medida privativas da liberdade compete ao tribunal de execução das penas decidir da sua modificabilidade, substituição ou extinção (nº 2). Relativamente à pena de expulsão, a al. d) do nº 4 atribui aos tribunais de execução das penas a competência para “determinar a execução da pena acessória de expulsão, declarando extinta a pena de prisão, e determinar a execução antecipada da pena acessória de expulsão”. Esta competência não permite, em meu juízo, qualquer ponderação acerca da execução da pena acessória de expulsão imposta por sentença transitada em julgado, com vista a decidir sobre a sua inaplicabilidade, mas apenas a determinação do momento da respectiva execução, nos estritos termos do que consta da mencionada alínea d).
Por isso, o Supremo ao confiar que juiz de execução das penas possa tomar qualquer decisão acerca da verificação da existência de [novas, por subsequentes á decisão condenatória] limitações à pena de expulsão, decisão que não está expressamente incluída na sua esfera de competências desse juiz, arrisca-se a levar os tribunais a não dar cumprimento aos acima referidos preceitos constitucionais.

Começando por este último aspecto, o mesmo não constava do projecto que apresentei por entender que a ponderação da execução, ou não execução, da pena acessória de expulsão não integra a competência do juiz de execução das penas. Com efeito, atentando no art. 138º do Código da Execução das Penas, é possível verificar que, apenas quanto às penas ou medida privativas da liberdade, compete ao tribunal de execução das penas decidir da sua modificabilidade, substituição ou extinção (nº 2); quanto à pena de expulsão, a al. d) do nº 4 atribui aos tribunais de execução das penas a competência para “determinar a execução da pena acessória de expulsão, declarando extinta a pena de prisão, e determinar a execução antecipada da pena acessória de expulsão”. Determinar a execução e não decidir da sua execução. Em meu juízo, o Supremo não deve devolver ao TEP competência para tomar qualquer decisão acerca da verificação da existência de [novas, por subsequentes á decisão condenatória] limitações à pena de expulsão, por tal decisão de modo algum caber na sua esfera de competências. Fazê-lo poderá significar levar os tribunais a não cumprir o preceito constitucional.

Arménio Sottomayor
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