Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
| ||
Nº Convencional: | JSTJ00031146 | ||
Relator: | MARTINS DA COSTA | ||
Descritores: | ARRENDAMENTO COMPROPRIEDADE PRÉDIO INDIVISO MENOR AUTORIZAÇÃO JUDICIAL REPRESENTAÇÃO LEGAL | ||
![]() | ![]() | ||
Nº do Documento: | SJ199610220002761 | ||
Data do Acordão: | 10/22/1996 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Referência de Publicação: | BMJ N460 ANO1996 PAG737 | ||
Tribunal Recurso: | T REL LISBOA | ||
Processo no Tribunal Recurso: | 961/95 | ||
Data: | 01/25/1996 | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
![]() | ![]() | ||
Meio Processual: | REVISTA. | ||
Decisão: | NEGADA A REVISTA. | ||
Área Temática: | DIR CIV - DIR CONTRAT. | ||
Legislação Nacional: | CCIV66 ARTIGO 217 ARTIGO 1024 N2 ARTIGO 1029 ARTIGO 1204 N2 ARTIGO 1877 ARTIGO 1889 N1 M. CPC67 ARTIGO 1331 N1. | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário : | I - A subscrição de contrato de arrendamento de prédio indiviso por um dos comproprietários, como senhorio, que é também o representante legal de outro comproprietário, seu filho menor, implica o assentimento dele em nome desse filho, apesar de não ser invocada a qualidade de representante legal e de o filho ter sido indevidamente representado no contrato por um curador. II - A necessidade de autorização do tribunal para a celebração de arrendamento de prédio pertencente a menor apenas é exigida quando o prazo inicial do contrato for superior a 6 anos, independentemente das suas prorrogações. | ||
![]() | ![]() | ||
Decisão Texto Integral: | Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça: I - A e B intentaram a presente acção de processo comum, na forma ordinária, contra C e mulher D, pedindo a condenação dos réus a reconhecerem que as autoras são comproprietárias do prédio urbano sito na Rua ..., em Laveiras, a restituirem-lhes parte desse prédio, ocupada sem qualquer título, e a pagarem-lhes indemnização a liquidar em execução de sentença, com fundamento em nulidade do contrato de arrendamento dessa parte do prédio por falta de legal representação das autoras nesse contrato. Houve contestação. As autoras requereram a intervenção principal de E, F e G, como os restantes comproprietários do prédio, o que foi admitido, tendo os intervenientes declarado que faziam seus o articulado apresentado pelas autoras. No despacho saneador, julgou-se a acção improcedente, com absolvição dos réus do pedido. Em recurso de apelação, essa sentença veio a ser confirmada pelo acórdão de fls. 154 e seguintes. Neste recurso de revista, as autoras e os intervenientes pretendem a revogação daquele acórdão e a procedência da acção, formulando, em resumo, as seguintes conclusões: - as autoras eram menores, na data da celebração do contrato de arrendamento; - não foram representadas nesse contrato por sua mãe, que não invocou essa qualidade, mas por um terceiro, que invocou a qualidade de curador; - nunca deram o seu assentimento a esse contrato, que não foi celebrado por todos os comproprietários; - pelo n. 2 do artigo 1024 do C.CIV., o arrendamento de prédio indiviso só se considera válido quando os restantes comproprietários manifestarem o seu assentimento; - ainda que o contrato tivesse sido celebrado pela representante das autoras, seria necessária autorização do tribunal, nos termos das alíneas a) e b) do artigo 1889 do citado Código; - os réus sabiam as qualidades em que os intervenientes no contrato o faziam e que as autoras eram então menores; - não pode ser assim alegado o princípio da impossibilidade contra facto próprio. Os réus, por sua vez, sustentam ser de negar provimento ao recurso. II - Factos dados como provados: As autoras e os intervenientes são comproprietários do prédio urbano sito na Rua ... em Laveiras, constituído por ... garagem, com área coberta de 86,70 m2 e logradouro de 389,30 m2, inscrito na matriz urbana da freguesia de Paço de Arcos sob o artigo 800 e descrito na Conservatória sob o n. 518. As autoras são dele comproprietárias na proporção de 13/72 para cada uma. Parte do prédio (4/16) foi objecto de partilha, no inventário por óbito de H, I e J, que correu termos no 3. Juízo da Comarca de Oeiras sob o n. 5/81. As autoras A e B nasceram em 11 de Julho de 1974 e 10 de Julho de 1974, respectivamente, e são filhas de H e de G. Em 1 de Novembro de 1981, foi celebrado entre E, F, G e L (este, na qualidade de curador das menores A e B), como senhorios, e C, como inquilino, o contrato de arrendamento de três salas assoalhadas, uma cozinha, uma casa de banho e uma despensa, situadas no r/ch do referido prédio. Esse contrato de arrendamento foi celebrado para habitação do inquilino, pelo prazo de seis meses, renovável por iguais períodos, e a mãe das autoras interveio nele "na qualidade de herdeira de seu marido..." (doc. de fls. 27 e 28). III - Quanto ao mérito do recurso: A presente acção de reivindicação baseia-se em ilícita ocupação de parte do prédio, pelos réus, por motivo de nulidade do respectivo contrato de arrendamento, em consequência de as autoras, então menores, não terem nele sido representadas pela mãe, sua representante legal, mas por um curador. Na data do contrato, as autoras não eram ainda comproprietários do prédio e antes herdeiras de herança indivisa, em que se incluía o direito a 4/6 dele, estando então pendente o correspondente inventário obrigatório, no qual esse direito veio a ser adjudicado às autoras e a F, na proporção de um quarto para cada uma das primeiras e de metade para a última (doc. de fls. 16 e seguintes). A questão controvertida respeita à interpretação e aplicação do disposto no artigo 1024 n. 2 do C.CIV., segundo o qual "o arrendamento de prédio indiviso feito pelo consorte ou consortes administradores só se considera válido quando os restantes comproprietários manifestem, antes ou depois do contrato, o seu assentimento...", disposição que se deve ter como aplicável à comunhão hereditária, como se decidiu nas instâncias e não vem posto em causa. Desconhece-se a razão da intervenção, no contrato de arrendamento, do L, "na qualidade de curador das menores...", sendo certo que estas tinham, como representante legal, sua mãe, a interveniente G (artigo 1877 e seguintes do C.CIV.), e apenas se poderá adiantar que a tal facto não terá sido porventura estranha a circunstância de estar então pendente o processo de inventário, no qual as autoras teriam de ser representadas por curador, em virtude de a mãe concorrer à partilha (artigo 1331 n. 1 do C.P.C., na redacção em vigor nessa data). De qualquer modo, seria irrelevante a intervenção no contrato desse curador, por falta de legitimidade para vinculação das autoras, e a questão que importa aqui apreciar é a de saber se a mãe delas, como sua representante legal, deu ou não "assentimento" a esse contrato. Tal assentimento, com o significado normal de concordância ou adesão, não estava sujeito a qualquer forma especial, uma vez que só quando "a lei exigir escritura pública para a celebração do arrendamento, deve o assentimento ser prestado por igual forma" (parte final do n. 2 do citado artigo 1204), e não era esse o caso (artigo 1029 do C.CIV.). A correspondente declaração de vontade podia ainda ser expressa ou tácita, verificando-se a segunda "quando se deduz de factos que, com toda a probabilidade, a revelam" (artigo 217 n. 1 do citado Código), ou seja, quando "um acto ou uma exteriorização verbal que, embora não exprima imediatamente uma determinada vontade de efeitos jurídicos, permite mediatamente uma conclusão sobre uma vontade negocial aí manifestada" (Vaz Serra, na Rev. Leg. J., artigo 110, p.377), pelo que basta que "um certo sentido negocial ..., objectivamente, de fora, numa consideração de coerência ..., possa ser deduzido do comportamento do declarante" (Mota Pinto, na Teoria Geral ..., p.425). Ora, a mãe das autoras subscreveu o contrato de arrendamento, como senhoria, "na qualidade de herdeira de seu marido, o qual era proprietário de 1/6 do imóvel ...", e manifestou assim, de modo expresso, a vontade de celebração desse contrato, aceitando ainda a intervenção nele do L, "na qualidade de curador das menores ...". Daqui resulta que ela quis a cedência do prédio aos réus, como arrendatários, e essa declaração tem como necessária ou logicamente implícita a vontade de também as menores, suas filhas, ficarem vinculadas pelo contrato, sob pena de flagrante violação do princípio geral da boa fé, por ser inadmissível ou contraditória a vontade de celebração do contrato apenas na qualidade expressamente invocada. De resto, não haveria mesmo necessidade de invocação da qualidade de representante legal das filhas, uma vez que tal qualidade resulta da própria lei. Assim, porque a mãe das autoras deu o seu "assentimento" ao contrato, não só como senhoria mas ainda, pelo menos de modo tácito ou implícito, na qualidade de representante legal das filhas menores, está excluída a nulidade por elas alegada. Por outro lado, a questão da necessidade de autorização do tribunal para a celebração do arrendamento, em representação das filhas menores, reconduz-se, em rigor, a questão nova, por não ter sido suscitada ao longo do processo, pelo que se deve ter como excluída do objecto do recurso. Apesar disso, sempre se nota que tal autorização só é exigida para a locação de bens "por prazo superior a seis anos" (alínea m) do artigo 1889 n. 1 do C.CIV.) e, no caso presente, o arrendamento foi celebrado "pelo prazo de seis meses", embora renovável por iguais períodos, nos termos legais. O prazo previsto naquele preceito é apenas o prazo inicial do contrato, independentemente das suas prorrogações, e essa disposição legal será "muito discutível, de jure condendo", uma vez que, não podendo o senhorio denunciar o contrato para o fim do prazo estabelecido, o prédio "fica tão agravado, praticamente, como o arrendado por mais de 6 anos" (Pereira Coelho, no Arrendamento, lições de 1984, p. 97), mas é essa a solução actualmente consagrada na lei. Em conclusão: A subscrição de contrato de arrendamento de prédio indiviso por um dos comproprietários, como senhorio, que é também o representante legal de outro comproprietário, seu filho menor, implica o assentimento dele em nome desse filho, apesar de não ser invocada a qualidade de representante legal e de o filho ter sido indevidamente representado no contrato por um curador (artigo 1024 n. 2 e 217 n. 1 do C.CIV.). A necessidade de autorização do tribunal para a celebração de arrendamento de prédio pertencente a menor apenas é exigida quando o prazo inicial do contrato for superior a 6 anos, independentemente das suas prorrogações (artigo 1889 n. 1 alínea m) do citado Código). Pelo exposto: Nega-se a revista. Custas pelos recorrentes. Lisboa, 22 de Outubro de 1996. Martins da Costa. Pais de Sousa. Machado Soares. |