Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
02A3669
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: RIBEIRO COELHO
Nº do Documento: SJ200212170036691
Data do Acordão: 12/17/2002
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: T REL COIMBRA
Processo no Tribunal Recurso: 13/02
Data: 04/09/2002
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Sumário :
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:


"A" pediu, em acção declarativa proposta no 2º Juízo do Tribunal de Família e Menores de Coimbra, contra B, depois de acordo homologado judicialmente lavrado em processo de inventário para separação de meações após o divórcio de ambos, a anulação dessa transacção por vícios na formação da sua vontade e a entrega por precatório-cheque da quantia de 2.000.000$00 que depositou e respectivos juros; subsidiariamente, pediu a emenda da partilha por forma a que dela ficasse a constar que do lote nº 2 fazia parte um determinado imóvel, redefinindo-se a sua linha divisória, tudo com cancelamento de qualquer registo predial já efectuado ou que viesse a sê-lo com base na partilha anulanda.
Após contestação " onde se defendeu a improcedência da acção ", réplica e tréplica, prosseguiu a tramitação adequada até que foi proferida sentença que julgou improcedente o pedido principal e, quanto ao pedido subsidiário, decidiu:
- Determinar que se emendasse a partilha levando ao inventário o terreno de inscrição matricial nº 14953, a incluir no lote nº 2;
- Declarar ter o seguinte sentido a cláusula nº 5 exarada no acordo lavrado em 6/10/97: "É acordado entre ambos os interessados que será feita a delimitação entre as verbas nº 42 e 49 a partir da esquina norte do anexo mais alto (isto é, o anexo que tem um telhado com duas águas), até ao marco que se encontra no lado oposto, em linha recta";
- Determinar o cancelamento de qualquer registo em desconformidade com o assim decidido.

Apelaram ambas as partes, vindo o Tribunal da Relação de Coimbra a proferir acórdão que, dando procedência à apelação do autor e considerando com isso prejudicada a apelação da ré, revogou a sentença e julgou procedente o pedido principal, anulando a transacção realizada naquele processo de inventário, com ordem de restituição ao autor da quantia de 2.000.000$00 (9.975,96 euros), com juros desde a citação.

Inconformada, a ré interpôs este recurso de revista em cujas alegações pede que se anule o acórdão recorrido e se mantenha a partilha efectuada na transacção com emenda no sentido de que da verba nº 49 adjudicada ao autor faz parte o prédio rústico com a inscrição matricial nº 14.953 e que no mesmo está implantado o prédio urbano nº 1914, ao mesmo pertencente; pede ainda que se declare não escrito o acrescento "isto é, o anexo que tem um telhado com duas águas" ou que se ordene a formulação de novos quesitos para apurar tal facto.
Nas conclusões, invocando violação dos arts. 653º, 668º, nº 1, al. d) e 712º, nº 4 do CPC e do art. 1353º do CC, defende que:
- não há erro vício sobre as qualidades do objecto porque quanto ao prédio nº 14953 sempre se prontificou a fazer o necessário para que o mesmo fosse registado em nome do autor visto lhe ser devido pela partilha e porque sempre esteve convencida de que o mesmo prédio está em duplicação indevida com o prédio urbano nº 1914, pertencente ao lote nº 2 que coube ao autor " conclusões a) a d);
- não há divergência entre a vontade real e a declarada visto que o prédio rústico abarcado pela verba nº 49 adjudicada ao autor foi logo por ele ocupado e fruído, tendo-o a autora advertido para a divergência entre a sua situação jurídica e a situação real " conclusões e) e f);
- a haver erro, é incidental e sem influência na partilha " conclusão g);
- a transacção efectuada deve subsistir por força do princípio da redução do negócio jurídico, já que a divergência respeita apenas à área do prédio e sua delimitação, apenas se justificando, quando muito, a emenda " conclusões h) e i);
- aceitando a recorrente que na verba nº 49 se incluía uma área de terreno que se estendia até ao anexo mais alto da verba nº 42, apenas há que proceder à delimitação, por haver conflito em concreto quanto à definição dessa área " conclusões j) e k);
- o acrescento "isto é, o anexo que tem um telhado com duas águas" não corresponde a qualquer facto alegado, nem quesitado, nem provado, sendo que essa afirmação se não mostra fundamentada " conclusões m) a t);
- a matéria assente prevalece sobre qualquer outra " conclusão u);
- há obscuridade na medida em que a sentença não explica por que motivo se considera anexo mais alto aquele que tem duas águas " conclusão v);
- só em acção de demarcação se poderia ter pedido a delimitação dos prédios, pelo que o tribunal conheceu de questão de que não podia ou devia conhecer " conclusões x) a aa).

Não houve resposta.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
Vêm dados como provados os seguintes factos:
1. Tendo-se casado em 10/1/65 sem convenção antenupcial, foi o casamento do autor e da ré dissolvido litigiosamente por sentença de 6/5/94, transitada, por separação de facto por seis anos consecutivos, sem atribuição de culpas a qualquer deles;
2. No inventário para separação de meações que se seguiu, foram relacionadas pela ré, cabeça de casal, as verbas nº 1 a 49, tendo-se formado na conferência de interessados, em 6/10/97, dois lotes, o nº 1 com as verbas nº 1 a 48, o nº 2 com a verba nº 49, e adjudicando-se aquele à ré e este ao autor, dando ainda este 2.000.000$00 à ré, o que foi homologado e transitou;
3. A verba nº 42 corresponde à inscrição matricial rústica nº 14.958 da freguesia de Maçãs de D. Maria, Alvaiázere, com a área de 8.300 m2, que foi comprada pelo então casal, por escritura de 6/1/76, aos herdeiros de C, confrontando do norte com D e outro, do nascente com E, do sul com F e outro e do poente com casas do proprietário e estrada;
4. A verba nº 49 corresponde ao artigo urbano nº 1.914 da mesma freguesia e é casa de habitação com 108 m2;
5. Por escritura de 12/1/76 os então cônjuges compraram a D o prédio rústico com a inscrição nº 14.953 da mesma freguesia, confrontando do norte com estrada, do nascente com G, do sul com H e do poente com C (herdeiros), com 2.200 m2, tendo sido nesta inscrição que foi implantada a casa com a inscrição nº 1.914 da verba nº 49, inscrita como dito em 4.;
6. Esta inscrição nº 14.953 foi inscrita na relação de bens referida em 2., embora conste da inscrição matricial junta mais tarde, tendo sido determinado o não relacionamento dela nos autos, o que transitou;
7. Na conferência de interessados referida em 2. autor e ré acordaram fazer a delimitação entre as verbas nº 42 e 49 a partir da esquina do anexo mais alto até ao marco que se encontra no lado oposto, em linha recta;
8. Ambas as partes estão de acordo em que a inscrição nº 14.953 está englobada ou contida na verba nº 49, adjudicada ao autor;
9. O anexo mais alto referido em 7. fica implantado no terreno da verba nº 42, comprada aos herdeiros de C;
10. O autor estava convencido, aquando da conferência e acordo referidos, que a verba nº 49 que lhe estava adjudicada compreendia, além do terreno da inscrição nº 14.953, também o terreno contíguo da verba nº 42 até ao anexo referido em 9.;
11. Sendo isso decisivo para ele acordar ficar só com a verba nº 49 e ainda pagar 2.000.000$00 de tornas à ré;
12. A ré sabia que o autor pretendia também o terreno da verba nº 42 até ao anexo mais alto, bem sabendo que ele não negociaria de outro modo;
13. Tendo a ré, após o acordo e conferência referidas, iniciado obras sobre o telhado do anexo mais baixo, próximo da casa da inscrição nº 1914, para o fazer subir.

Pode ainda dizer-se, por tal se achar certificado a fls. 28 e 29, que do acordo lavrado na conferência de interessados consta, além do que se disse quanto à formação dos lotes e à sua adjudicação nos termos referidos em 2., que:
- quanto à entrega de 2.000.000$00, o ora recorrido se comprometeu a depositá-la no prazo de 30 dias a favor da ora recorrente e à ordem do tribunal onde corria o inventário;
- a recorrente se comprometeu ainda a desocupar o imóvel que constituía a verba nº 49 no prazo de 30 dias;
- ambos acordaram em que as custas em dívida a juízo seriam suportadas em partes iguais, prescindindo-se de custas de parte e de procuradoria.

E logo de seguida foi proferida para a acta sentença que, dizendo fazê-lo ao abrigo do nº 6 do art. 1352º do CPC " diploma ao qual pertencerão as normas que de seguida citarmos sem outra referência ", homologou o acordo por o considerar válido e adjudicou aos interessados os respectivos quinhões, condenando em custas consoante o acordado.
Houve evidente lapso na identificação deste preceito, já que, à data da sentença, proferida em 6/10/97, e estando em vigor nesta matéria a versão resultante do DL nº 227/94, de 8/9 " deixada incólume, no que nos interessa, pela reforma processual de 1995/96 ", só o art. 1353º tinha um nº 6 em que, na sequência de acordo dos interessados quanto ao termo do inventário e sendo simples a partilha, se previa a possibilidade de esta ser judicialmente homologada em acta.
Na sentença proferida nestes autos entendeu-se que, não podendo haver transacções em inventários para partilha de bens, a sentença proferida na conferência de interessados não fora uma sentença homologatória de uma transacção susceptível de ser anulada nos termos do art. 301º; por isso, constatando-se não poder também a partilha ser anulada ao abrigo do art. 1388º, apenas haveria que considerar a hipótese de ser ordenada a emenda da partilha, ao abrigo do art. 1387º, o que levou a que se julgasse procedente o pedido subsidiário.
No acórdão recorrido, diversamente, entendeu-se que nada obsta a que em inventários sejam lavradas transacções, interpretou-se como sendo dessa espécie a sentença constante da acta da conferência de interessados e, integrando-se os factos na previsão dos arts. 247º e 251º do CC, anulou-se a transacção com base em erro sobre as qualidades do objecto, cuja relevância era permitida, no caso, pelo referido art. 301º.
Nos termos do seu nº 1, a transacção pode ser declarada nula ou anulada como os outros actos da mesma natureza.
Sendo a transacção judicial, em primeira linha, um contrato " cfr. art. 1248º do CC "que determina uma tramitação processual específica " cfr. art. 300º ", conclui-se que os "actos da mesma natureza" referenciados no art. 301º são os negócios jurídicos, o que nos leva à aplicabilidade do regime geral do erro como vício da vontade.

Uma vez que a recorrente não discute a posição tomada pelo acórdão recorrido quanto à admissibilidade de transacção em processo de inventário e aceita a qualificação por ele dada à sentença proferida na conferência de interessados, há que partir desta posição, não a discutindo, e que apreciar a aplicação que dela foi feita face aos factos apurados.

No acórdão recorrido entendeu-se que, não tendo o prédio rústico nº 14953 " onde foi construído o prédio urbano que constitui a verba nº 49 " sido abrangido no acordo, e estando o recorrido convencido de que essa verba abrangia aquele prédio rústico e ainda o terreno contíguo até ao anexo mais alto do prédio da verba nº 42, estava verificado o erro acima mencionado.

Interessa, assim, ver até que ponto as razões invocadas pela recorrente, e constantes das suas conclusões a) a l) "que delimitam objectivamente o âmbito das suas críticas contra esta decisão ", são relevantes.

O desvalor dos negócios jurídicos por razões que se prendem com a vontade do declarante pode emergir, quer da falta, quer dos vícios da sua vontade.
Diz-se que falta a vontade (declarada) quando a declaração negocial diverge da vontade real " situação que, consoante seja ou não acompanhada dos demais requisitos a que a lei alude, pode gerar nulidade por simulação, absoluta ou negativa (cfr. arts. 240º e 241º), ou pode não prejudicar a validade da declaração se se estiver perante uma reserva mental desconhecida do declaratário (cfr. art. 244º); pode ainda uma declaração, verificados determinados circunstancialismos, não produzir qualquer efeito jurídico se estivermos perante declarações não sérias, ou feitas sem consciência ou com coacção física (cfr. arts. 245º e 246º); e finalmente, ainda dentro do mesmo grande campo de declarações negociais não coincidentes com a vontade real, encontramos as declarações em que a desconformidade entre o que é declarado e o que se quer é devida a erro, que pode relevar no sentido da sua anulabilidade (cfr. art. 247º, todos do CC).
A par deste grupo de declarações viciadas fala-se num outro em que a declaração negocial, correspondendo embora ao que o declarante efectivamente queria quando a proferiu, está viciada no processo conducente à sua formação, por falta de esclarecimento ou de liberdade. Surgem aí as figuras do erro sobre a pessoa do declaratário ou sobre o objecto do negócio, do erro sobre os motivos, do dolo e da coacção moral, que podem relevar, embora com pressupostos diversos, no sentido da anulabilidade do negócio" cfr. arts. 251º a 256º do CC.
As figuras do dolo e da coacção moral, em que a má formação da vontade do declarante se deve à intervenção de outra pessoa, seja esta o declaratário ou terceiro, são de afastar, por não terem qualquer correspondência nos factos conhecidos.
No campo de actuação do erro propriamente dito, encontramos a distinção entre, por um lado, o erro sobre a pessoa do declaratário ou sobre o objecto do negócio " que produzirão anulabilidade quando o declaratário conheça ou não deva ignorar a essencialidade, para o declarante, do elemento sobre o qual incidiu o erro (cfr. arts. 251º e 247º do CC) " e, por outro, o erro sobre os motivos que se não refiram à pessoa do declaratário nem ao objecto do negócio " o qual, ressalvado o regime especial aplicável quando incidir sobre a base do negócio, só relevará no sentido da anulabilidade se as partes houverem reconhecido, por acordo, a essencialidade do motivo (cfr. art. 252º do mesmo código).
Face ao que consta dos factos enunciados acima nos pontos 2. e 10., pode ter-se como seguro que o recorrido, ao acordar em ficar apenas com a verba nº 49, agiu em erro sobre o objecto mediato do negócio, uma vez que estava convencido, contra o que se passa na realidade, de que essa verba compreendia o terreno da inscrição nº 14953 e, além dele, a parte do prédio correspondente à verba nº 42 referida em 10..
Na verdade, e apesar do que consta do acordo lavrado na acta da conferência, não pode entender-se que a menção à delimitação a fazer entre as verbas nº 42 e 49 opera, sem mais, o alargamento da área que supostamente a verba nº 49 teria.
Em qualquer dos casos previstos nos nº 3 e 4 do art. 300º a sentença que homologa uma transacção deverá emitir as condenações e/ou absolvições a que houver lugar face ao teor do acordo alcançado, reproduzindo-o. Escreveu, a este propósito, José Alberto dos Reis: "No caso de transacção, (o juiz) ajustará a condenação e a absolvição do pedido aos precisos termos do acordo celebrado entre as partes. ............ É uma sentença de pura homologação do acto ...... das partes" " cfr. Comentário, Vol. III, pgs. 533-534.
Terá que reproduzir, fazendo-o seu, o teor do acordo na parte em que regula de determinada forma as pretensões das partes.
Como se escreveu no acórdão proferido por este STJ em 4/11/93 e publicado no BMJ nº 431, pg. 317 e segs., a sentença homologatória "... chama necessariamente a si a solução de mérito para que aponta o contrato de transacção, acabando por dar, ela própria, mas sempre em concordância com a vontade das partes, a solução do litígio. E, uma vez transitada em julgado, como que corta, e definitivamente, o cordão umbilical que a ligava à transacção de que nascera".
Ora a sentença não acolheu, na sua parte dispositiva, aquela redefinição da área da verba nº 49, limitando-se a adjudicar aos interessados os lotes compostos por determinadas verbas, que só podem configurar-se tal como foram relacionadas; assim fica evidenciado o erro em que o recorrido incorreu ao lavrar o acordo.
E dos factos enunciados nos pontos 11. e 12. extrai-se também a certeza de este erro incidiu sobre qualidade que para o declarante era essencial e que a declaratária conhecia, no tocante à parte do prédio correspondente à verba nº 42, essa essencialidade.
Assim, o enquadramento jurídico feito no acórdão recorrido está de acordo com as normas referidas e os factos conhecidos.

Que críticas dirige a recorrente a este raciocínio?

Começa por dizer "conclusões a) e b)" que nunca se negou a que o terreno correspondente à inscrição nº 14953 fosse registado em nome do recorrido, até porque julgava também que o mesmo fazia parte da verba nº 49.
Trata-se, porém, de um ponto irrelevante porque, havendo a seu respeito um erro essencial por parte do recorrido, se sabe que a recorrente conhecia a sua essencialidade.

Diz também "conclusão c)" que na resposta à reclamação apresentada contra a relação de bens informou que as inscrições nº 14953, rústica, e nº 1914, urbana, são duplicações indevidas, devendo a primeira delas ser eliminada, o que não mereceu impugnação por parte do recorrido.
Do ponto 6. da factualidade assente consta que foi decidido, com trânsito, que não fosse relacionada.
Isto permite-nos dizer que o erro do recorrido quanto à inclusão ou não inclusão desta inscrição nº 14953 na verba nº 49 é desculpável, visto que aquela eliminação foi idónea para lhe criar a ideia de que a inscrição nº 1914 compreendia de facto o outro prédio; assim se conclui pela relevância do seu erro nesta parte.

Além do que se disse, acresce que a recorrente nada aduziu no sentido da à irrelevância do erro do recorrido quanto à área do prédio com o nº 14.958, o que aponta para a relevância total do erro em que o recorrido incorreu.

E as subsequentes conclusões e) a k) não alteram este quadro, pois não proporcionam à recorrente o êxito pretendido.

Quanto às conclusões e) e f), a sua improcedência assenta, desde logo, na circunstância de não estar em causa qualquer divergência entre a vontade real e a vontade declarada " que não foi alegada ", mas apenas a existência de vícios na formação da vontade real.

Quanto à conclusão g), a tese da natureza incidental, e não essencial, do erro em que o recorrido laborou não pode ser aceite.
Nem os factos a suportam " cfr., designadamente, o ponto 10. ", nem a recorrente produziu anteriormente, fosse na contestação, fosse em fase de apelação, esse argumento.

E quanto à ideia de simples redução do negócio jurídico, defendida nas conclusões h) e i)?
Este instituto actua quando a causa de nulidade ou anulabilidade respeita apenas a parte do negócio jurídico e leva a que apenas parte deste seja invalidada, a não ser que se mostre que não seria concluído sem a parte viciada.
Diz a recorrente que a anulabilidade deve ser tida apenas como parcial porque respeita apenas a uma determinada área do prédio.
Mas não tem razão.
O erro incidiu sobre uma determinada verba " a única que o recorrido acordou em receber na partilha " e consistiu em ele julgar, contra a verdade, que a sua área era superior.
O erro, afectando toda a sua declaração negocial, inquina todo o negócio, gerando uma anulabilidade total deste.

Finalmente, as conclusões j) e k) também se mostram improfícuas.
Não interessa a disposição em que a recorrente se encontra.
Está em causa o conteúdo da verba nº 49, sobre a qual o recorrido laborou em erro juridicamente relevante, gerador de anulabilidade nos termos dos arts. 247º e 251º do CC, aplicáveis "ex vi" do art. 301º.
A questão não é de simples delimitação dos prédios, mas de formalização, nos lugares próprios, da composição que se pretende que a verba nº 49 tenha.

Face ao exposto, as razões adiantadas pela recorrente não põem em causa os fundamentos do acórdão recorrido e a decisão nele tomada, pelo que se impõe confirmar a anulação da anulação da transacção outorgada no processo de inventário de que o presente processo é um apenso.
E, sendo assim, as demais conclusões formuladas pela recorrente, tendentes à obtenção de uma emenda da partilha, não têm aqui cabimento.
Tê-lo-iam se, não se anulando a dita transacção, houvesse que perspectivar uma solução do litígio a partir da partilha já homologada.
Mas não é este o rumo permitido pela anulação da transacção, que se dirigirá, antes, para um recurso de revisão, nos termos do art. 771º, al. d), contra a sentença dita homologatória " cfr. acórdão deste STJ de 4/11/93, BMJ nº 431, pg. 417 e segs. e Lebre de Freitas, João Redinha e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 1º, pg. 535.

Assim, nega-se a revista.
Custas pela recorrente.

Lisboa, 17 de Dezembro de 2002
Ribeiro Coelho
Garcia Marques
Ferreira Ramos