Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
791/12.6GAALQ.L2.S1
Nº Convencional: 3ª SECÇÃO
Relator: RAUL BORGES
Descritores: HOMICÍDIO QUALIFICADO
MAUS TRATOS
DESCENDENTE
DANO
CONCURSO DE INFRACÇÕES
CONCURSO DE INFRAÇÕES
CÚMULO JURÍDICO
FALTA DE ASSINATURA
JUIZ
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL COLECTIVO
IRREGULARIDADE
REPETIÇÃO DA MOTIVAÇÃO
ACORDÃO DA RELAÇÃO
NULIDADE
EXAME CRÍTICO DAS PROVAS
LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
ATENUAÇÃO ESPECIAL DA PENA
PENA PARCELAR
ESPECIAL CENSURABILIDADE
ESPECIAL PERVERSIDADE
MEDIDA CONCRETA DA PENA
PENA ÚNICA
IMAGEM GLOBAL DO FACTO
ILICITUDE
FRIEZA DE ÂNIMO
BEM JURÍDICO PROTEGIDO
CONDIÇÕES PESSOAIS
PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
Data do Acordão: 04/29/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Área Temática:
DIREITO PENAL - CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS DO FACTO / PENAS / ESCOLHA E MEDIDA DA PENA / PUNIÇÃO DO CONCURSO DE CRIMES.
DIREITO PROCESSUAL PENAL - PROVA - SENTENÇA - RECURSOS.
Doutrina:
- Cristina Líbano Monteiro, A Pena «Unitária» do Concurso de Crimes, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 16, n.º 1, pp. 151 a 166.
- Figueiredo Dias, Direito Penal Português - As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, § 420, págs. 290/1, § 421, págs. 291/2; Liberdade, Culpa e Direito Penal, Coimbra Editora, 2.ª edição, 1983, pp. 183 a 185.
- Maia Gonçalves, in “Código Penal” Português Anotado e Comentado, 15.ª edição, pp. 277; 275 da 16.ª edição, de 2004; e, 295 da 18.ª edição, de 2007.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO PENAL (CPP): - ARTIGOS 97.º, N.º5, 123.º, 127.º, 283.º, N.º 3, ALÍNEA G), 374.º, N.º3, 375.º, N.º1, 379.º, N.º1, ALÍNEA C), 400.º, N.º 1, ALÍNEA F), 412.º, N.º 3 E 4, 425.º, N.º4.
CÓDIGO PENAL (CP): - ARTIGOS 40.º, 71.º, N.º3, 77.º, N.ºS 1 E 2.
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGO 205.º, N.º1.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

I - NULIDADE DO ACÓRDÃO RECORRIDO POR FALTA DE EXAME CRÍTICO DAS PROVAS E POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA

-DE 14 DE NOVEMBRO DE 2002, PROFERIDO NO PROCESSO N.º 3092/02-5.ª
-DE 12-02-2002, PROCESSO N.º 3221/02-5.ª, DE 6-06-2002, PROCESSO N.º 1874/02-5.ª, DE 17-10-2002, PROCESSO N.º 2815/02, DE 12-12-2002, PROCESSO N.º 3221/02, DE 21-05-2013, PROCESSO N.º 616/03-3.ª, DE 22-05-2003, PROCESSO N.º 1672/03-5.ª, DE 15-07-2004, PROCESSO N.º 2005/2004 E DE 27-05-2004, CJSTJ 2004, TOMO 2, PÁG. 209
-DE 22-09-2004, CJSTJ 2004, TOMO 3, PÁG. 158
-DE 24-01-2007, PROCESSO N.º 4812/07- 3.ª
-DE 12-04-2007, NOS PROCESSOS N.ºS 255/07 E 516/07, AMBOS DA 5.ª SECÇÃO, E DE 02-10-2008, PROCESSO N.º 4725/07 – 5.ª
-DE 7-11-2007, PROCESSO N.º 3990/07 – 3.ª
-DE 30-10-2013, PROCESSO N.º 806/09.5JAPRT.S1-3.ª. EM SENTIDO OPOSTO PODE CITAR-SE, V. G., O ACÓRDÃO DE 10-10-2007, PROFERIDO NO PROCESSO N.º 3315/07-3.ª. NO MESMO SENTIDO SE PRONUNCIOU O ACÓRDÃO DO MESMO DIA E SECÇÃO, NO PROCESSO N.º 2684/07, CONHECENDO-SE, AINDA, POR OBVIAMENTE ADMITIDOS, DE RECURSOS NESTAS CONDIÇÕES, NOS ACÓRDÃOS DE 17-10-2007, NO PROCESSO N.º 3265/07 E DE 17-04-2008, NOS PROCESSOS N.ºS 677/08 E 823/08, TODOS DA 3.ª SECÇÃO, PODENDO AINDA VER-SE O ACÓRDÃO DE 22-10-2008, PROCESSO N.º 3274/08-3.ª
-NUM QUADRO DE UM MESMO TIPO DE IMPUGNAÇÃO DIZ-SE NO ACÓRDÃO DE 27-05-2010, PROCESSO N.º 58/08.4JAGDR.C1.S1-3.ª, IN CJSTJ 2010, TOMO 2, PÁG. 206
-DE 19 DE JANEIRO DE 2011, PROCESSO N.º 376/06.6L1.S1, DESTA SECÇÃO, APÓS CITAR-SE O ACÓRDÃO DE 7-11-2007
-DE 30-04-2008, NO PROCESSO N.º 4723/07, DE 25-06-2008, NO PROCESSO N.º 449/08, DE 03-09-2008, NO PROCESSO N.º 3982/07, DE 21-01-2009, NO PROCESSO N.º 2387/08, DE 06-07-2011, NO PROCESSO N.º 774/08.0JFLSB.L1.S1, DE 11-12-2012, PROCESSO N.º 951/07.1GBMTJ.E1.S1, E REVENDO-SE, A PARTIR DO PRIMEIRO CITADO, A POSIÇÃO ASSUMIDA NOS ACÓRDÃOS DE 10-10-2007, NO PROCESSO N.º 3197/07 E DE 12-03-2008, NO PROCESSO N.º 112/08
- MAIS RECENTEMENTE, ACÓRDÃO DE 29-05-2013, PROCESSO N.º 1264/11.0PCSTB.E1.S1-3.ª, CJSTJ 2013, TOMO 2, PÁG. 185, O ACÓRDÃO DE 10-04-2014, PROCESSO N.º 563/12.8PBEVR.E1.S1-3.ª E OS ACÓRDÃOS DE 24-09-2014 E DE 25-02-2015, NOS PROCESSOS N.º 994/12.3PBAMD.L1.S1 E N.º 1514/12.5JAPRT.P1.S1
-DE 19-09-1990, PROCESSO N.º 40 924, IN ACTUALIDADE JURÍDICA N.º 10/11, COLECTÂNEA DE JURISPRUDÊNCIA 1990, TOMO 4, PÁG. 13 E BMJ N.º 399, PÁG. 260; DE 03-07-1991, BMJ N.º 409, PÁG. 597; DE 29-06-94, PROCESSO N.º 45.530, CJSTJ 1994, TOMO 2, PÁG. 258; DE 14-06-1995, PROCESSO N.º 47.994, BMJ N.º 448, PÁG. 259; DE 21-06-1995, PROCESSO N.º 47.717, BMJ N.º 448, PÁG. 278 (A VERSÃO DO RECORRENTE SOBRE A VALORAÇÃO DA PROVA NÃO INTEGRA O VÍCIO DO ERRO NOTÓRIO); DE 28-06-1995, PROCESSO N.º 47.987, BMJ N.º 448, PÁG. 297; DE 29-02-1996, PROCESSO N.º 46.740, BMJ N.º 454, PÁG. 531; DE 10-07-1996, PROCESSO N.º 48.675, CJSTJ 1996, TOMO 2, PÁG. 229 (MAXIME, 243); DE 01-10-1997, PROCESSO 876/97-3.ª; DE 08-10-1997, PROCESSO 874/97-3.ª; DE 06-11-1997, PROCESSO N.º 122/97; DE 18-12-1997, PROCESSOS N.º 47325 E 930/97, SUMÁRIOS DE ACÓRDÃOS DO STJ, VOL. II, PÁGS. 156, 158, 216 E 220; DE 15-04-1998, PROCESSO N.º 285/98-3.ª, BMJ N.º 476, PÁG. 82; DE 29-10-1998, BMJ N.º 480, PÁG. 292; DE 24-03-1999, PROCESSO N.º 176/99-3.ª, CJSTJ 1999, TOMO 1, PÁG. 247; DE 24-03-1999, PROCESSO N.º 1293/98, BMJ N.º 485, PÁG. 281; DE 16-06-1999, PROCESSO N.º 422/99, BMJ N.º 488, PÁG. 262; DE 19-01-2000, PROCESSO N.º 871/99-3.ª; DE 06-12-2000, PROCESSO N.º 733/00.
-DE 18-12-1997, PROCESSO N.º 701/97, SUMÁRIOS, IBID., PÁG. 220
-DE 20-11-2014, PROCESSO N.º 87/14.9YFLSB.P1.S1, TENDO NA ORIGEM O N.º 689/12.8JAPRT.P1
-DE 05-12-2007, PROFERIDO NO PROCESSO N.º 3406/07; DE 12-03-2008, PROCESSO N.º 112/08; DE 30-04-2008, PROCESSO N.º 4723/07; DE 28-05-2008, PROCESSO N.º 1147/08; DE 12-06-2008, PROCESSO N.º 4375/07; DE 04-12-2008, PROCESSO N.º 2507/08; DE 21-01-2009, PROCESSO N.º 2387/08; DE 27-05-2009, PROCESSO N.º 484/09; DE 27-05-2010, PROCESSO N.º 18/07.2GAAMT.P1.S1; DE 14-07-2010, PROCESSO N.º 149/07.9JELSB.E1.S1; DE 28-09-2011, PROCESSO N.º 172/07.3GDEVR.E2.S1; DE 20-10-2011, PROCESSO N.º 36/06.8GAPSR.L4.S4; DE 09-11-2011, PROCESSO N.º 43/09.9PAAMD.L1.S1; DE 05-12-2012; PROCESSO N.º 250/10.1JALRA.E1.S1, DE 11-12-2012 PROCESSO N.º 951/07.1GBMTJ.E1.S1, DE 10-09-2014, PROCESSO N.º 1027/11.2PCOER.L1.S1 E DE 20-11-2014, PROCESSO N.º 87/14.9YFLSB.P1.S1, HOMICÍDIO DE JOANE (NA ORIGEM N.º 689/12.8JAPRT.P1), POR NÓS RELATADOS, E DE 2 DE FEVEREIRO DE 2011, PROCESSO N.º 1375/07.6PMMTS.P1.S2-3.ª; DE 05-06-2012, PROCESSO N.º 148/10.3SCLSB.L1.S1-3.ª; DE 4-07-2013, PROCESSO N.º 39/10.8JBLSB.L1.S1-3.ª (INADMISSÍVEL O RECURSO DO ARGUIDO NO SEGMENTO EM QUE VISA O REEXAME DA MATÉRIA DE FACTO SOB A ALEGAÇÃO DE QUE A PROVA FOI INCORRECTAMENTE APRECIADA E QUE O ACÓRDÃO DA RELAÇÃO ENFERMA DOS VÍCIOS DO ARTIGO 410.º, N.º 2 DO CPP); DE 4-07-2013, PROCESSO N.º 1243/10.4PAALM.L1.S1-3.ª (A PREFERÊNCIA DADA NA FORMAÇÃO DA CONVICÇÃO PROBATÓRIA A CERTOS MEIOS DE PROVA, DE LIVRE VALORAÇÃO PELO TRIBUNAL, EM DETRIMENTO DE OUTROS, QUE, SEGUNDO A DEFESA, IMPELIRIAM PARA DECISÃO DISTINTA, NÃO INTEGRA O VÍCIO DO ERRO NOTÓRIO NA APRECIAÇÃO DA PROVA)
-DE 21-06-1995, BMJ N.º 448, PÁG. 278
-DE 8-10-1997, PROCESSO N.º 897/97-3.ª, SUMÁRIOS DA ASSESSORIA 1997, N.º 14, PÁG. 132
-DE 27-11-1997, PROCESSO N.º 1130/97-3.ª, IBIDEM, PÁG. 186. NO MESMO SENTIDO, O ACÓRDÃO DE 27-11-1997, PROCESSO N.º 291/97, 3.ª, IBIDEM, PÁG. 188
-DE 19-05-2004, PROFERIDO NO PROCESSO N.º 904/04 - 3.ª
-DE 22-11-2006, PROCESSO N.º 4084/06-3.ª. CITANDO O ANTERIOR PODE VER-SE O ACÓRDÃO DE 07-04-2010, PROFERIDO NO PROCESSO N.º 2792/05.1TDLSB.L1.S1-3.ª
-DE 17-10-1996, PROCESSO N.º 633/96; DE 06-05-1998, PROCESSO N.º 113/98; DE 05-04-2000, PROCESSO N.º 47/00, OU ACÓRDÃO DE 18-04-2002, PROCESSO N.º 1082/02,
-DE 21-05-2008, PROCESSO N.º 678/08; DE 28-05-2008, PROCESSO N.º 1147/08; DE 4-12-2008, PROCESSO N.º 2507/08; DE 21-01-2009, PROCESSO N.º 2387/08; DE 14-07-2010, PROCESSO N.º 149/07.JELSB.E1.S1; DE 28-09-2011, PROCESSO N.º 172/07.3GBEVR.E2.S2; DE 09-11-2011, PROCESSO N.º 43/09.9PAAMD.L1.S1; DE 15-12-2011, PROCESSO N.º 17/09.0TELSB.L1.S1; DE 26-09-2012, PROCESSO N.º 460/10.1JALRA.C1.S1, DE 5-12-2012, PROCESSO N.º 250/10.1JALR.E1.S1; DE 10-09-2014, PROCESSO N.º 1027/11.2PCOER.L1.S1 E DE 20-11-2014, PROCESSO N.º 87/14.9YFLSB.P1.S1 HOMICÍDIO DE JOANE (NA ORIGEM N.º 689/12.8JAPRT.P1).

II - NULIDADE POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA

-DE 13-11-2002, SASTJ, N.º 65, PÁG. 60
-DE 13-02-2008, PROCESSO N.º 4729/07-3.ª; DE 07-05-2008, PROCESSOS N.ºS 294/08-3.ª E 1132/08-3.ª; DE 25-06-2008, PROCESSO N.º 2046/07-3.ª SECÇÃO
-DE 10-09-2008, PROCESSO N.º 2506/08-3.ª; DE 08-10-2008, PROCESSO N.º 3068/08-3.ª; DE 22-10-2008, PROCESSO N.º 215/08-3.ª; DE 27-05-2009, PROCESSO N.º 484/09-3.ª; DE 25-06-2009, PROCESSO N.º 5/05.5PBOLH-3.ª; DE 23-09-2010, PROCESSO N.º 65/09.9JACBR.C1.S1-3.ª; DE 19-05-2010, PROCESSO N.º 459/05.0GAFLG.G1.S1-3.ª; DE 12-07-2012, PROCESSO N.º 350/98.4TAOLH.E1.S1-3.ª SECÇÃO
-DE 06-01-2011, PROCESSO N.º 355/09.1JAAVR.C1.S1-5.ª SECÇÃO
-DE 13-01-2011, PROCESSO N.º 316/07.5GBSTS.G2.S1-5.ª, CITANDO O ACÓRDÃO DE 10-12-2009, PROCESSO N.º 22/07.0GACUB.S1-3.ª SECÇÃO.


III - DA ATENUAÇÃO ESPECIAL

-DE 11-12-2008, PROCESSO N.º 3632/08-5.ª SECÇÃO (CITADO NO ACÓRDÃO DE 27-5-2010 PROCESSO N.º 601/05)
-DE 13-07-2009, PROCESSO N.º 1187/07.7PAPTM.S1-5.ª SECÇÃO
-DE 27-05-2010, PROCESSO N.º 601/05.0SLPRT.P1.S1-5.ª SECÇÃO
-DE 9-06-2010, N.º 468/06.1PGLSB.S2 - 5.ª SECÇÃO
-DE 15-11-2012, PROCESSO N.º 5/04.2TASJP.P1.S1-3.ª E DE 5-12-2012, PROCESSO N.º 1213/09.5PBOER.S1-3.ª SECÇÃO
-DE 4-07-2013, PROCESSO N.º 144/10.0JBLSB.L1.S2-5.ª SECÇÃO
-DE 20-02-2014, PROCESSO N.º 99/12.7JALRA.L1.S1-5.ª SECÇÃO
-DE 6-03-2014, PROCESSO N.º 352/10.4PEOER.S1-3.ª SECÇÃO
-DE 25-06-2014, PROCESSO N.º 14447/08.0TDPRT.S4-3.ª SECÇÃO
-DE 9-07-2014, PROCESSO N.º 832/10.1JAPRT.S1-5.ª SECÇÃO
-DE 17-12-2014, PROCESSO N.º 512/13.6PGLRS.L1.S1-3.ª. SECÇÃO
-DE 27-05-2010, PROCESSO N.º 6/09.4JAGRD.C.S1-3.ª SECÇÃO.

IV - MEDIDA DA PENA CONJUNTA

-DE 6-05-2004, IN CJSTJ 2004, TOMO 2, PÁG. 191
-DE 08-07-1998, CJSTJ 1998, TOMO 2, PÁG. 246; DE 24-02-1999, PROCESSO N.º 23/99-3.ª; DE 12-05-1999, PROCESSO N.º 406/99-3.ª; DE 27-10-2004, PROCESSO N.º 1409/04-3.ª; DE 20-01-2005, PROCESSO N.º 4322/04-5.ª, IN CJSTJ 2005, TOMO I, PÁG. 178; DE 17-03-2005, NO PROCESSO N.º 754/05-5.ª; DE 16-11-2005, IN CJSTJ 2005, TOMO 3, PÁG. 210; DE 12-01-2006, NO PROCESSO N.º 3202/05-5.ª; DE 08-02-2006, NO PROCESSO N.º 3794/05-3.ª; DE 15-02-2006, NO PROCESSO N.º 116/06-3.ª; DE 22-02-2006, NO PROCESSO N.º 112/06-3.ª; DE 22-03-2006, NO PROCESSO N.º 364/06-3.ª; DE 04-10-2006, NO PROCESSO N.º 2157/06-3.ª; DE 21-11-2006, IN CJSTJ 2006, TOMO 3, PÁG. 228; DE 24-01-2007, NO PROCESSO N.º 3508/06-3.ª; DE 25-01-2007, NOS PROCESSOS N.ºS 4338/06-5.ª E 4807/06-5.ª; DE 28-02-2007, NO PROCESSO N.º 3382/06-3.ª; DE 01-03-2007, NO PROCESSO N.º 11/07-5.ª; DE 07-03-2007, NO PROCESSO N.º 1928/07-3.ª; DE 14-03-2007, NO PROCESSO N.º 343/07-3.ª; DE 28-03-2007, NO PROCESSO N.º 333/07-3.ª; DE 09-05-2007, NOS PROCESSOS N.ºS 1121/07-3.ª E 899/07-3.ª; DE 24-05-2007, NO PROCESSO N.º 1897/07-5.ª; DE 29-05-2007, NO PROCESSO N.º 1582/07-3.ª; DE 12-09-2007, NO PROCESSO N.º 2583/07-3.ª; DE 03-10-2007, NO PROCESSO N.º 2576/07-3.ª; DE 24-10-2007, NO PROCESSO Nº 3238/07-3.ª; DE 31-10-2007, NO PROCESSO N.º 3280/07-3.ª; DE 09-04-2008, NO PROCESSO N.º 686/08-3.ª (O ACÓRDÃO AO EFECTUAR O CÚMULO JURÍDICO DAS PENAS PARCELARES NÃO ELUCIDA, PORQUE NÃO DESCREVE, O RACIOCÍNIO DOS JULGADORES QUE ORIENTOU E DECIDIU A DETERMINAÇÃO DA MEDIDA DA PENA DO CÚMULO); DE 25-06-2008, NO PROCESSO N.º 1774/08-3.ª; DE 02-04-2009, PROCESSO N.º 581/09-3.ª, POR NÓS RELATADO, IN CJSTJ 2009, TOMO 2, PÁG. 187; DE 21-05-2009, PROCESSO N.º 2218/05.0GBABF.S1-3.ª; DE 29-10-2009, NO PROCESSO N.º 18/06.0PELRA.C1.S1-5.ª, IN CJSTJ 2009, TOMO 3, PÁG. 224 (227); DE 25-11-2009, PROCESSO N.º 490/07.0TAVVD.S1-3.ª; DE 04-03-2010, NO PROCESSO N.º 1757/08.6JDLSB.S1-5.ª; DE 10-11-2010, NO PROCESSO N.º 23/08.1GAPTM-3.ª SECÇÃO
-DE 20-02-2008, PROFERIDO NO PROCESSO N.º 4733/07 E DE 8-10-2008, NO PROCESSO N.º 2858/08, DA 3.ª SECÇÃO
-DE 17-03-2004, 03P4431; DE 20-01-2005, CJSTJ 2005, TOMO 1, PÁG. 178; DE 08-06-2006, PROCESSO N.º 1613/06 – 5.ª; DE 07-12-2006, PROCESSO N.º 3191/06 – 5.ª; DE 20-12-2006, PROCESSO N.º 3379/06-3.ª; DE 18-04-2007, PROCESSO N.º 1032/07 – 3.ª; DE 03-10-2007, PROCESSO N.º 2576/07-3.ª, IN CJSTJ 2007, TOMO 3, PÁG. 188; DE 09-01-2008, PROCESSO N.º 3177/07-3.ª, IN CJSTJ 2008, TOMO 1, PÁG. 181; DE 06-02-2008, PROCESSOS N.º S 129/08-3.ª E 3991/07-3.ª, IN CJSTJ 2008, TOMO I, PÁG. 221; DE 06-03-2008, PROCESSO N.º 2428/07 – 5.ª; DE 13-03-2008, PROCESSO N.º 1016/07 – 5.ª; DE 02-04-2008, PROCESSOS N.º S 302/08-3.ª E 427/08-3.ª; DE 09-04-2008, PROCESSO N.º 1011/08 – 5.ª; DE 07-05-2008, PROCESSO N.º 294/08 – 3.ª; DE 21-05-2008, PROCESSO N.º 414/08 – 5.ª; DE 04-06-2008, PROCESSO N.º 1305/08 – 3.ª; DE 25-09-2008, PROCESSO N.º 2891/08 – 3.ª; DE 29-10-2008, PROCESSO N.º 1309/08– 3.ª; DE 27-01-2009, PROCESSO N.º 4032/08 – 3.ª; DE 29-04-2009, PROCESSO N.º 391/09 – 3.ª; DE 14-05-2009, PROCESSO N.º 170/04.9PBVCT.S1 – 3.ª; DE 27-05-2009, PROCESSO N.º 50/06.3GAVFR.C1.S1 – 3.ª; DE 18-06-2009, PROCESSO N.º 577/06.7PCMTS.S1 – 3.ª; DE 18-06-2009, PROCESSO N.º 8253/06.1TDLSB-3.ª; DE 25-06-2009, PROCESSO N.º 274/07-3.ª, CJSTJ 2009, TOMO 2, PÁG. 251 (A DECISÃO QUE EFECTIVA O CÚMULO JURÍDICO DAS PENAS PARCELARES NECESSARIAMENTE QUE TERÁ DE DEMONSTRAR FUNDAMENTANDO QUE FORAM AVALIADOS O CONJUNTO DOS FACTOS E A INTERACÇÃO DESTES COM A PERSONALIDADE); DE 21-10-2009, PROCESSO N.º 360/08.5GEPTM.S1-3.ª; DE 04-11-2009, PROCESSO N.º 296/08.0SYLSB.S1-3.ª; DE 18-11-2009, PROCESSO N.º 702/08.3GDGDM.P1.S1-3.ª; DE 25-11-2009, PROCESSO N.º 490/07.0TAVVD-3.ª; DE 10-12-2009, PROCESSO N.º 496/08.2GTABF.E1.S1-3.ª (CITADO NO ACÓRDÃO DE 23-06-2010, PROCESSO N.º 862/04.2PBMAI.S1-5.ª); DE 04-03-2010, NO PROCESSO N.º 1757/08.6JDLSB.L1.S1-5.ª; DE 10-03-2010, NO PROCESSO N.º 492/07.7PBBJA.E1.S1-3.ª; DE 18-03-2010, NO PROCESSO N.º 160/06. 7GBBCL.G2.S1-5.ª; DE 15-04-2010, NO PROCESSO N.º 134/05.5PBVLG.S1-3.ª; DE 28-04-2010, NO PROCESSO N.º 260/07.6GEGMR.S1-3.ª; DE 05-05-2010, NO PROCESSO N.º 386/06.3SLSB.S1-3.ª; DE 12-05-2010, NO PROCESSO N.º 4/05.7TDACDV.S1-5.ª; DE 27-05-2010, NO PROCESSO N.º 708/05.4PCOER.L1.S1-5.ª; DE 09-06-2010, PROCESSO N.º 493/07.5PRLSB-3.ª; DE 23-06-2010, NO PROCESSO N.º 666/06.8TABGC-K.S1-3.ª; DE 20-10-2010, PROCESSO N.º 400/08.8SZLB.L1-3.ª; DE 03-11-2010, NO PROCESSO N.º 60/09.9JAAVR.C1.S1-3.ª; DE 16-12-2010, PROCESSO N.º 893/05.5GASXL.L1.S1-3.ª; DE 19-01-2011, PROCESSO N.º 6034/08.0TDPRT.P1.S1-3.ª; DE 02-02-2011, PROCESSO N.º 217/08.0JELSB.S1-3.ª; DE 31-01-2012, PROCESSO N.º 2381/07.6PAPTM.E1.S1-3.ª; DE 12-09-2012, PROCESSOS N.º 223/07.1GCVIS.C1.S1-3.ª E 2745/09.0TDLSB.L1.S1-3.ª; DE 06-02-2013, PROCESSO N.º 639/10.6PBVIS.S1-3.ª; DE 14-03-2013, PROCESSO N.º 224/09.5PAOLH.S1 E N.º 13/12.0SOLSB.S1, AMBOS DESTA SECÇÃO E DO MESMO RELATOR; DE 10-07-2013, PROCESSO N.º 413/06.4JAFAR.E2.S1-3.ª; DE 12-09-2013, PROCESSO N.º 1445/09.6JAPRT.P1.S1-3.ª; DE 04-06-2014, PROCESSO N.º 186/13.4GBETR.P1.S1-3.ª.
-DE 20-01-2010, DE 24 DE FEVEREIRO DE 2010, DE 9 DE JUNHO DE 2010, DE 10 DE NOVEMBRO DE 2010, DE 2 DE FEVEREIRO DE 2011, DE 18 DE JANEIRO DE 2012, DE 5 DE JULHO DE 2012, DE 12 DE SETEMBRO DE 2012 (DOIS), DE 22 DE MAIO DE 2013, DE 1 DE OUTUBRO DE 2014 E DE 17 DE DEZEMBRO DE 2014, PROFERIDOS NO PROCESSO N.º 392/02.7PFLRS.L1.S1, IN CJSTJ 2010, TOMO 1, PÁG. 191, PROCESSO N.º 655/02.1JAPRT.S1, PROCESSO N.º 493/07.5PRLSB-3.ª, PROCESSO N.º 23/08.1GAPTM.S1, PROCESSO N.º 994/10.8TBLGS.S1-3.ª, PROCESSO N.º 34/05.9PAVNG.S1, CJSTJ 2012, TOMO 1, PÁG. 209, PROCESSO N.º 246/11.6SAGRD, PROCESSOS N.º 223/07.1GCVIS.C1.S1 E N.º 2745/09.0TDLSB.L1.S1, PROCESSO N.º 344/11.6PCBRG.G1.S1, PROCESSO N.º 11/11.0GCVVC.S1 E PROCESSO N.º 512/13.6PGLRS.L1.S1
-DE 21-11-2006, PROCESSO N.º 3126/06-3.ª, CJSTJ 2006, TOMO 3, PÁG. 228 (A DECISÃO QUE EFECTUE O CÚMULO JURÍDICO NÃO PODE RESUMIR-SE À INVOCAÇÃO DE FÓRMULAS GENÉRICAS; TEM DE DEMONSTRAR A RELAÇÃO DE PROPORCIONALIDADE ENTRE A PENA CONJUNTA A APLICAR E A AVALIAÇÃO DOS FACTOS E A PERSONALIDADE DO ARGUIDO); DE 14-05-2009, NO PROCESSO N.º 170/04.9PBVCT.S1-3.ª; DE 10-09-2009, NO PROCESSO N.º 26/05.8SOLSB-A.S1 -5.ª, SEGUIDO DE PERTO PELO ACÓRDÃO DE 09-06-2010, NO PROCESSO N.º 493/07.5PRLSB.S1-3.ª; DE 18-03-2010, NO PROCESSO N.º 160/06. 7GBBCL.G2.S1- 5.ª; DE 15-04-2010, NO PROCESSO N.º 134/05.5PBVLG.S1-3.ª; DE 21-04-2010, NO PROCESSO N.º 223/09.7TCLSB.L1.S1-3.ª; E DO MESMO RELATOR, DE 28-04-2010, NO PROCESSO N.º 4/06.0GACCH.E1.S1 -3.ª SECÇÃO; DE 28-04-2010, PROCESSO N.º 260/07.6GEGMR.S1-3.ª SECÇÃO; DE 18-06-2009, PROCESSO N.º 334/04.5PFOER.L1.S1 E DE 10-09-2009, PROCESSO N.º 26/05.8.SOLSB-A.S1, AMBOS DA 5.ª SECÇÃO; DE 12-05-2010, PROCESSO N.º 4/05.7TACDV.S1-5.ª E DE 16-12-2010, NO PROCESSO N.º 893/05.5GASXL.L1.S1-3.ª; DE 11-01-2012, PROCESSO N.º 131/09.1JBLSB.L1.-A.S1-3.ª; DE 18-01-2012, PROCESSO N.º 34/05.9PAVNG.S1-3.ª; DE 31-01-2012, PROCESSO N.º 2381/07.6PAPTM.E1.S1-3.ª; DE 05-07-2012, PROCESSO N.º 246/11.6SAGRD.S1-3.ª E OS SUPRA REFERIDOS DE 12-09-2012, PROCESSOS N.º 223/07.1GCVIS.C1.S1-3.ª E N.º 2745/09.0TDLSB.L1.S1-3.ª; DE 22-01-2013, PROCESSO N.º 651/04.4GAFLTG.S1-3.ª; DE 27-02-2013, PROCESSO N.º 455/08.5GDPTM.S1-3.ª; DE 22-05-2013, PROCESSO N.º 344/11.6PCBRG.G1.S1-3.ª; DE 19-06-2013, PROCESSO N.º 515/06.7GBLLE.S1-3.ª; DE 10-07-2013, PROCESSO N.º 413/06.4JAFAR.E2.S1-3.ª; DE 12-09-2013, PROCESSO N.º 1445/09.6JAPRT.P1.S1-3.ª; DE 3-10-2013, PROCESSO N.º 522/01.6TACBR.C3.S1-5.ª
-DE 2-05-2012, PROCESSO N.º 218/03.4JASTB.S1-3.ª; DE 21 DE JUNHO DE 2012, PROCESSO N.º 38/08.0GASLV.S1; DE 27 DE JUNHO DE 2012, PROCESSO N.º 70/07.0JBLSB-D.S1-3.ª; DE 10-09-2014, PROCESSO N.º 455/08-3.ª
-DE 22-01-2013, PROCESSO N.º 651/04.4GAFLG.S1-3.ª, DE 4 DE JULHO DE 2013, PROCESSO N.º 39/10.8JBLSB.L1.S1-3.ª (CFR. ACÓRDÃOS DE 9 DE FEVEREIRO DE 2011, PROCESSO N.º 19/05.5GAVNG.S1 - 3.ª, E DE 23 DE FEVEREIRO DE 2011, PROCESSO N.º 429/03. 2PALGS.S1-3.ª). NO MESMO SENTIDO, O ACÓRDÃO DE 2 DE FEVEREIRO DE 2011, PROCESSO N.º 217/08.0JELSB.S1, IGUALMENTE DA 3.ª SECÇÃO.
Sumário :

I - Estabelece o art. 374.º, n.º 3, do CPP, que o dispositivo contém para além do mais (al. a)), a data e as assinaturas dos membros do tribunal. Nos termos do art. 283.º, n.º 3, al. g), do CPP, a falta de assinatura na sentença constitui irregularidade – art. 123.º do CPP.
II - Em termos globais, o presente recurso mais não é do que a mera repetição do recurso interposto para a Relação. Sendo os argumentos agora utilizados, na sua totalidade, exactamente os mesmos que foram dirigidos ao acórdão da 1.ª instância, tal significa que, em rigor, a recorrente não impugna o acórdão da Relação, esquecendo-se que a decisão agora em reexame é esta e não a da 1.ª instância.
III -Contudo, a repetição/renovação de motivação não dever ser equiparada à sua falta, e por não estar prevista a possibilidade de rejeição de recurso para os casos em que o recorrente se limita a repetir a argumentação já apresentada no recurso interposto para o Tribunal da Relação, entende-se não ser de rejeitar o recurso por essa razão.
IV - A divergência do recorrente quanto à avaliação e valoração das provas feitas pelo tribunal é irrelevante no recurso interposto para o STJ. Na valoração das provas, a análise a efectuar há que ter em conta que a fixação da matéria de facto teve na sua base uma apreciação da prova segundo as regras da experiência e a livre convicção do julgador, nos termos do art. 127.º do CPP. Quanto a essa matéria, o recurso será, pois, de rejeitar por manifesta improcedência.
V - Por força do n.º 4 do art. 425.º do CPP é correspondentemente aplicável aos acórdãos proferidos em recurso o disposto no art. 379.º, ou seja, a arguição ou o conhecimento oficioso de nulidade (no caso por o tribunal ter deixado de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar – al. c) do n.º 1 daquele art. 379.º). Mas a aplicabilidade desse normativo tem os limites decorrentes da própria natureza da intervenção do tribunal de recurso a nível da fundamentação de facto e mais especificamente da motivação e do exame crítico das provas, que têm lugar na 1.ª instância, com amplas possibilidades de cognição e investigação, actuando em registo de oralidade, imediação e concentração, o que não acontece na Relação.
VI - No caso, a Relação cumpriu o tema proposto nos quadros da fundamentação derivada como lhe competia, nos termos do art. 425.º, n.º 4, do CPP, não se verificando qualquer nulidade por omissão de pronúncia.
VII - A questão da atenuação especial da pena coloca-se em relação à determinação da medida concreta das penas parcelares, as quais no que concerne às dos homicídios qualificados não vêm impugnadas, sendo que em relação às restantes a respectiva medida concreta e a dupla conforme, nos termos do art. 400.º, n.º 1, al. f), do CPP, impediriam sempre qualquer reapreciação. Sendo de ter por inimpugnadas umas, atenta a tese do recurso que foca apenas a medida da pena única e sendo inimpugnáveis outras, fica precludida a possibilidade de apreciação da aplicação do instituto da atenuação especial.
VIII - Noutra perspectiva há incompatibilidade de atenuação especial de penas respeitantes a crimes com agravação com base na especial censurabilidade e perversidade.
IX - A recorrente foi condenada pela prática, em autoria material, de dois crimes de homicídio qualificado, p. e p. pelos arts. 131.º e 132.º, n.ºs 1 e 2, al. a), do CP, na pena de 20 anos de prisão por cada um deles, pela prática, em autoria material, de um crime de maus-tratos, p. e p. pelo art. 152.º-A, n.º 1, al. a), do CP, na pena de 4 anos de prisão, pela prática, em autoria material, de um crime de dano, p. e p. pelo art. 212.º, n.º 1, do CP, na pena de 1 ano e 8 meses de prisão. Efectuado o cúmulo jurídico, foi aplicada a pena única de 24 anos de prisão.
X - Assim, ao nível da determinação da medida concreta da pena única resultante do cúmulo jurídico, a moldura penal do concurso é de 20 anos a 25 anos de prisão (art. 77.º, n.º 2, do CP). A soma material das penas aplicadas atinge os 45 anos e 8 meses de prisão.
XI - No caso presente estamos perante um quadro de quatro crimes, sendo o crime de maus tratos praticado em 12-08-2012, e os dois homicídios como o crime de dano no dia 19-12-2012, todos com acentuada gravidade, não se indiciando propensão ou inclinação criminosas.
XII - No caso presente é evidente a conexão e estreita ligação entre os crimes de homicídio qualificado e de dano provocado pelo incêndio, que libertou o monóxido de carbono que determinou a morte por asfixia dos bebés, sendo cometidos na mesma ocasião, sendo o de dano efeito do meio escolhido para causar a morte. Distante no tempo fica o crime de maus tratos, mas com a conexão consistente em ter afectado a integridade física do menor H. O ilícito global é fruto de factores meramente ocasionais.
XIII - A pena unitária tem de responder à valoração, no seu conjunto e inter conexão, dos factos e personalidade da arguida. No caso presente, olhando o ilícito global, não pode deixar de ser tomado em consideração todo o processo executivo adoptado pela arguida, preenchendo nos homicídios qualificados quatro outros factos-indíce, caracterizado por uma enorme insensibilidade perante a vida humana e por uma crueldade enorme, matando por asfixia as crianças por si geradas, actuando com frieza de ânimo e gélida concepção de valoração.
XIV - Ponderados todos os elementos disponíveis, procedendo a uma avaliação da gravidade do ilícito global e a personalidade da arguida evidenciada pelas condutas analisadas, não havendo que introduzir factor de compressão, mantém-se a pena conjunta fixada em 24 anos de prisão, que não se mostra contrária às regras da experiência, sendo proporcional à dimensão do ilícito global.
Decisão Texto Integral:

      No âmbito do processo comum com intervenção do Tribunal Colectivo n.º 791/12.6GAALQ, do então 1.º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Alenquer, integrante do Círculo Judicial de Vila Franca de Xira, foi submetida a julgamento a arguida AA, ..., nascida em ..., em prisão preventiva, sucessivamente, no Hospital Prisional São João de Deus em Caxias (Facto provado n.º 104 e fls. 688 e 701), Estabelecimento Prisional de Tires (fls. 1221) e Estabelecimento Prisional Especial de Santa Cruz do Bispo (fls. 1018 verso, 1030, 1038 verso, 1252 e 1260 e verso).

      A arguida foi detida no dia 23 de Dezembro de 2012 (fls. 147).

      Submetida a primeiro interrogatório judicial em 24 Dezembro de 2012 (auto de fls. 177 a 183), por se mostrar indiciada, pela prática de factos de 19 de Dezembro de 2012,

na autoria material de dois crimes de homicídio qualificado, p. e p. pelos artigos 131.º e 132.º, n.ºs 1 e 2, alíneas a), c), e), h) e j), do Código Penal, e um crime de incêndio, p. e p. pelo artigo 272.º, n.º 1, alínea a), do mesmo Código, foi validada a detenção e determinada a sujeição da arguida à situação de prisão preventiva.

     

     Pela acusação de 22-04-2013, constante de fls. 544 a 554, foi-lhe imputada a autoria material de dois crimes de homicídio qualificado, p. e p. pelos artigos 131.º e 132.º, n.ºs 1 e 2, alíneas a), c), e), h) e j), do Código Penal, e um crime de incêndio, p. e p. pelo artigo 272.º, n.º 1, alínea a), do mesmo Código, em concurso aparente com um crime de dano, p. e p. pelo artigo 212.º, n.º 1, e um crime de maus tratos, p. e p. pelo artigo 152.º -A, n.º 1, alínea a), do Código Penal e pedida a condenação na pena acessória de expulsão do território nacional, nos termos do artigo 134.º, n.º 1, alíneas a), e) e f) e n.º 2 e artigo 151.º da Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho.

     BB, progenitor dos menores falecidos, foi admitido a intervir nos autos como assistente, conforme fls. 411, 611 verso e 621.

     Deduziu acusação, acompanhando integralmente a acusação pública, bem como pedido de indemnização, conforme fls. 588 a 596 e, em original, de fls. 598 a 606.

     A arguida contestou, conforme fls. 719 a 724 e, em original, de fls. 785 a 790.

     Realizado o julgamento, com sessões em 19 (fls. 687-690) e 26 de Junho (fls. 706-8) e em 12 de Julho 2013 (fls. 747-750), foi designado para leitura do acórdão o dia 12 de Agosto de 2013.

     Como se colhe da acta de leitura de fls. 865 a 870, o Colectivo de Alenquer procedeu então a alteração não substancial dos factos descritos na acusação em 31 pontos e ainda a alteração da qualificação jurídica, de modo a substituir a agravante da alínea h) do n.º 2 do artigo 132.º do Código Penal pela da alínea i).

    Por acórdão de 12 de Agosto de 2013, constante de fls. 793 a 864, do 3.º volume, depositado no mesmo dia, conforme fls. 877, foi deliberado:

     Parte Criminal

     Absolver a arguida da prática de um crime de incêndio, p. e p. pelo artigo 272.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, de que vinha acusada.

    Condenar a arguida 

     Pela prática, em autoria material, de dois crimes de homicídio qualificado, p. e p. pelos artigos 131.º e 132.º, n.ºs 1 e 2, alínea a), do Código Penal, na pena de 20 anos de prisão por cada um deles;

     Pela prática, em autoria material, de um crime de maus-tratos, p. e p. pelo artigo 152.º-A, n.º 1, alínea a), do Código Penal, na pena de 4 anos de prisão;

     Pela prática, em autoria material, de um crime de dano, p. e p. pelo artigo 212.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 1 ano e 8 meses de prisão.

     Efectuado o cúmulo jurídico, foi aplicada a pena única de 24 anos de prisão.

     Parte Cível

     Absolver a arguida do pedido deduzido pelo demandante civil relativo às quantias de 8.000,00 euros para cada um dos falecidos menores a título de indemnização por danos não patrimoniais por eles sofridos.

     Condenar a arguida/demandada no pagamento ao demandante BB da quantia de 10.000,00 euros, como compensação pelo dano causado pela privação do direito à vida de cada um dos filhos, CC e DD, sendo 5.000,00 € por cada um deles.

     Decretada foi também a expulsão da arguida do território nacional “assim que se mostre verificado o legal condicionalismo”.

                                                                 *******

     Inconformada com o teor da decisão, dela interpôs a arguida recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, conforme expressão de fls. 883 a 906 do 3.º volume, impugnando matéria de facto e de direito, tendo respondido o Ministério Público, conforme fls. 914 a 921, de novo de fls. 922 a 929, e finalmente, em original, de fls. 930 a 937.

     Por acórdão da 5.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 14 de Janeiro de 2014, constante de fls. 967 a 1003, foi o recurso julgado parcialmente procedente e anulado o acórdão recorrido por enfermar de falta de fundamentação (falta de exame crítico das provas) e por outro lado, por omissão de tomada de posição sobre a conclusão pericial onde se diz “embora possa considerar-se a sua atenuação”, não a aferindo e valorando, quer para efeitos de enquadramento jurídico-criminal da conduta da recorrente, quer para a graduação das penas.

     O acórdão recorrido foi então declarado nulo, por falta de fundamentação e ainda por omissão de pronúncia, nos termos dos artigos 374.º, n.º 2 e 379.º, n.º 1, alíneas a) e c) e n.º 2, do CPP.

    Remetido, por força da anulação, o processo à 1.ª instância, foi agendado para leitura do acórdão perfectibilizador, o dia 4 de Abril de 2014 - fls. 1020.

    Foi proferido então novo acórdão em 1.ª instância, em 4 de Abril de 2014, conforme fls. 1135 a 1216, depositado no dia 7 seguinte, como consta de fls. 1218, tendo sido suprida a invocada omissão de pronúncia e mantidas as supra mencionadas absolvições e condenações, anotando-se que no respectivo relatório, omite-se, por completo, o que não faz grande sentido, a menos que se trate de descuidado esquecimento, qualquer, mínima mesmo, referência ao anterior acórdão impugnado e à anulação do mesmo, decretada pela Relação - fls. 1136.

    

     Novamente se mostrou inconformada a arguida, vindo interpor recurso de tal acórdão – fls. 1226 a 1250 – visando a reapreciação da prova gravada e da matéria de direito, tendo o Ministério Público respondido como consta de fls. 1261 a 1269.

    Por acórdão da  mesma 5.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 9 de Setembro de 2014, constante de fls. 1304 a 1368, foi negado provimento ao recurso.

    A arguida interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, conforme motivação de fls. 1374 a 1390, e em original, de fls. 1392 a 1406, o qual foi admitido por despacho de 21-10-2014, a fls. 1408.

    

     Nota: Há duas conclusões XXII, a recorrente salta da conclusão XXXI para a XXXIII e utiliza numeração romana até à conclusão XXXIX, mas a seguir prossegue com as conclusões XXXX, XXXXI, e assim por diante, até à XXXXVIII.

     A recorrente apresenta as seguintes conclusões:
A matéria de facto considerada como provada e não provada pelo Tribunal a quo está deficientemente apreciada uma vez que, da prova documental junta aos autos e dos depoimentos das testemunhas e Perito tem que se retirar as seguintes conclusões:

I - O Tribunal não poderia olvidar estas declarações periciais, e deveria ter dado como provado que a arguida, aquando da prática dos factos, estaria numa situação de consciência muito diminuída;

II - Outra não podia ser a decisão que não fosse a de concluir pela imputabilidade diminuída da arguida e ter sido tomada em conta no momento da aplicação da medida da pena;

III - Por outro lado, o Tribunal a quo volta a não pronunciar-se sobre matéria de facto que cumpria apreciar devidamente.
IV - A pena de 24 anos de prisão (em cúmulo jurídico) aplicada pelo tribunal a quo é gravosa e afasta-se fortemente do limite mínimo. Veja-se que o Tribunal a quo nem sequer teve em conta o fato de a arguida ser primária, ter confessado os factos (ainda que sob o efeito de forte medicação) e ter demonstrado arrependimento.
V - Assim, deve a pena de 24 anos de prisão ser reduzida para a sua duração mínima, atendendo ao fato da Recorrente à data da prática dos factos ter a sua imputabilidade diminuída, ser primária, ter demonstrado arrependimento, e confessar os factos.

VI - Salvo o devido respeito por solução diversa, é modesto entendimento da recorrente, após cotejar o Acórdão recorrido, que na parte relativa à fundamentação, mais concretamente na indicação das provas que serviram para formar a convicção do tribunal, não procedeu o tribunal a quo, ao seu exame crítico, conforme art.º 374 n.º 2 e art.º 379 n.º 1 a) e c) ambos do CPP, o que gera a nulidade da Sentença;

VII - Pois, a prova que serviu de base para formar a convicção do tribunal, designadamente, a confissão livre, efetuada pela arguida, devia ser objeto de exame crítico como se impõe e ter sido levada em consideração;

VIII - Com efeito, para cumprimento dos referidos preceitos legais, carece o tribunal de, não apenas indicar as provas que serviram para formular a sua convicção (inclusive a confissão pelo arguido), mas também de as analisar criticamente, pois só assim, se garante que na sentença se seguiu um processo lógico e racional na complexa tarefa de apreciação da prova, não sendo portanto, uma decisão ilógica, arbitrária, contraditória ou notoriamente violadora das regras da experiência comum da apreciação da prova.

IX - A falta de ponderação em conjunto, dos factos e personalidade do agente que serviram para a determinação da medida concreta da pena, nos termos do disposto no art.º 77 n.º 1 do Código Penal. O douto Acórdão não procedeu, como lhe está imposto, à ponderação em conjunto, dos factos e à personalidade do agente que serviram para a determinação da medida concreta da pena.

X - O douto Acórdão não procedeu, como lhe está imposto, à ponderação em conjunto, dos factos e à personalidade do agente que serviram para a determinação da medida concreta da pena, nos termos do disposto no art.º 77 n.º 1 do Código Penal.

XI - Os critérios de escolha e determinação da medida da pena impostos pelas normas dos artigos 70.º e 71.º do Código Penal também não foram devidamente ponderados pelo tribunal recorrido.

XII - O Tribunal a quo devia, nos termos da lei, ter ponderado todos os factos e analisado e examinado criticamente além destes, a personalidade do arguido e só depois desse exame podia, de forma coerente, lógica e sobretudo garantística dos direitos fundamentais do recorrente, formar a sua convicção, devidamente sustentada na determinação da medida concreta da pena, no seu todo, e não de forma seletiva e insuficiente;

XIII - Pelo que, e desde logo, ofendeu, de forma directa e intolerável os direitos e garantias do arguido, com consequente violação do princípio da judicialidade, consagrado no art. 32º, nº. 1 da Constituição da República Portuguesa;

XIV - Só finalidades relativas de prevenção, geral e especial, e não finalidades absolutas de retribuição e expiação, podem justificar a intervenção do sistema penal e conferir fundamento e sentido às suas reações específicas. A prevenção geral assume, com isto, o primeiro lugar como finalidade da pena;

XV - Prevenção geral, porém, não como prevenção geral negativa, de intimidação de delinquente e de outros potenciais criminosos, mas como prevenção positiva ou de integração, isto é, de reforço da consciência jurídica comunitária e do seu sentimento de segurança face à violação da norma ocorrida: em suma, na expressão de JAKOBS, como estabilização contrafática das expectativas comunitárias na validade e vigência da norma infringida;

XVI - Um outro princípio de relevo político-criminal incontestável é o princípio da culpa: o princípio segundo o qual em caso algum pode haver pena sem culpa ou a medida da pena ultrapassar a medida da culpa. O princípio da culpa não vai buscar o seu fundamento axiológico a uma qualquer conceção retributiva da pena, antes sim ao princípio da inviolabilidade da dignidade pessoal. A culpa é condição necessária, mas não suficiente, da aplicação da pena; e é precisamente esta circunstância que permite uma correta incidência da ideia de prevenção especial positiva ou de socialização;

XVII - A medida da pena não pode, em caso algum, ultrapassar a medida da culpa. A verdadeira função desta última, na doutrina da medida da pena, reside, efetivamente, numa incondicional proibição de excesso: a culpa constitui um limite inultrapassável de todas e quaisquer considerações preventivas - sejam de prevenção geral positiva ou antes negativa, de integração ou antes de intimidação, sejam de prevenção especial positiva ou negativa, de socialização, de segurança ou de neutralização. O limite máximo de pena adequado à culpa não pode ser ultrapassado. Uma tal ultrapassagem, mesmo em nome de instantes exigências preventivas, poria em causa a dignidade humana do delinquente e seria assim, logo por razões jurídico-constitucionais, inadmissível.

XVIII - Há decerto uma medida ótima de tutela dos bens jurídicos e das expectativas comunitárias: medida, pois, que não pode ser excedida em nome de considerações de qualquer tipo. Mas, abaixo desse ponto ótimo, outros existem em que aquela tutela é ainda efetiva e consistente e onde, portanto, a medida da pena pode ainda situar-se sem que esta perca a sua função primordial; até se alcançar um limiar mínimo, abaixo do qual já não é comunitariamente suportável a fixação da pena sem se pôr irremediavelmente em causa a sua função tutelar. Nesta acepção, poderá até afirmar-se que é a prevenção geral positiva, ela sim (e não a culpa), que fornece um «espaço de liberdade ou de indeterminação», uma «moldura de prevenção», dentro das quais podem e devem atuar considerações extraídas das exigências de prevenção especial de socialização”.

XIX - Dentro dos limites consentidos pela prevenção geral positiva ou de integração - entre o ponto ótimo e o ponto ainda comunitariamente suportável de medida da tutela dos bens jurídicos, podem e devem atuar pontos de vista de prevenção especial de socialização, sendo eles que vão determinar, em último termo, a medida da pena. Esta deve, em toda a extensão possível, evitar a quebra da inserção social do agente e servir a sua reintegração na comunidade, só deste modo e por esta via se alcançando uma eficácia ótima de proteção dos bens jurídicos.
XX - Por sua vez a imputabilidade diminuída reflete-se na capacidade de culpa, traduzindo-se numa diminuição da culpa.
XXII - A estes factos há que acrescer a idade da recorrente 32 anos, trata-se duma jovem que confessou os factos e demonstrou o seu arrependimento.
XXII - A recorrente sofre pelo ato que praticou e sente uma permanente penalização pela morte dos filhos, facto que a acompanhará para o resto da sua vida.
XXIII - A aplicação de qualquer pena tem em vista a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, art° 40° n° 1 do CP, não podendo ultrapassar a medida da culpa, assim se definindo a medida da pena no seu limite máximo.
XXIV - Por outro lado, a medida da pena faz-se também em função das exigências de prevenção de futuros crimes, o que definirá a medida da pena no seu limite mínimo.
XXV - Na determinação da medida da pena há um limite mínimo que nenhuma consideração de socialização pode ultrapassar: a defesa do ordenamento jurídico.
XXVI - A atenuação especial da pena é exclusiva das penas singulares e dirige-se à moldura penal abstrata que o legislador fixa para cada tipo legal de crime.
XXVII - Como prescreve Figueiredo Dias, esta figura deve ser utilizada em “hipóteses especiais, quando existam circunstâncias que diminuam por forma acentuada as exigências de punição do facto, deixando aparecer a sua imagem global especialmente atenuada, relativamente ao complexo normal de casos que o legislador terá lido ante os olhos quando fixou os limites da moldura penal respetiva“.
XXVIII - Todas as circunstâncias atenuantes deverão ser consideradas no excecional quadro do art° 72° de CP, diminuindo de forma acentuada a culpa, bem como as exigências de punição do facto, deixando aparecer uma imagem global do facto especialmente atenuada.
XXIX - A moldura penal abstrata, fixada de acordo com o art° 73° do CP tem que ter em consideração o grau de ilicitude que é elevado e as consequências que são irreparáveis, contudo não se pode esquecer a ausência de antecedentes criminais, o sofrimento que para a mesma resultou do seu ato, que se traduz numa permanente penalização pela morte dos filhos que a acompanhará para o resto da sua vida.
XXX - Conclui-se assim que não foram suficientemente valoradas circunstâncias atenuantes que a lei expressamente enumera no seu elenco exemplificativo: a ausência de antecedentes criminais, o impacto da situação da recorrente junto da sociedade.
XXXI - Refere o acórdão do STJ de 18/02/2004 que o “passado do arguido, a sua integração familiar e profissional, a sua personalidade, o carácter mais ou menos ocasional do delito, etc., etc., são factos-índice a ponderar na emissão de um juízo de prognose favorável na prevenção da sucumbência ao crime “.
XXXIII - Face ao exposto há que concluir, salvo o devido respeito, que a pena aplicada foi excessiva, devendo a mesma ser atenuada/reduzida nos termos do art.º 73 do CP, por se afigurar-nos ser justa, adequada, acautelando, dentro do limite inultrapassável imposto pela culpa, as finalidades retributivas da pena e as exigências de prevenção geral, tendo sempre em mente a finalidade de ressocialização da recorrente.
XXXIV -“A pena que exceda a necessidade de prevenção é uma pena desnecessária e, portanto, puro desperdício”.
XXXV - A pena aplicada não obedeça no seu quantum aos critérios dosimétricos do art° 71° do CP.
XXXVI - O douto acórdão violou deste modo os art°s 40°, 71° n°s 1 e 2, 72°, 73° e 132° todos do C. Penal.

XXXVII - Sabendo-se que, nos termos do art° 71° do Código Penal, a determinação da medida da pena é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, carece em absoluto de fundamento a aplicação, em cúmulo jurídico, de uma pena de 24 anos de prisão.

XXXVIII - Considerando a personalidade da arguida, a sua quase completa falta de consciência da ilicitude, a sua idade, o seu bem enquadramento familiar e social, a possibilidade do seu tratamento e completa recuperação, estão reunidas todas as condições para, em respeito pela filosofia do nosso direito penal, ao arguido ser aplicada uma pena atenuada.

XXXIX - Nunca a arguida deveria ter sido “brindada” com a pena que lhe foi aplicada. Na verdade,

XXXX - Ao aplicar-se tal pena, violaram-se as mais elementares regras e princípios subjacentes à determinação da medida da pena, aos princípios da adequação e proporcionalidade.
XXXXI - Mesmo que assim não se entenda, impõe-se a revisão da determinação da medida concreta desta pena parcelar, balizada pelos fins legalmente estatuídos, visando a aplicação de pena concreta mais adequada, justa e equitativa do que aquela que foi aplicada e se reputa de desproporcionada.
XXXXII - Na determinação da pena aplicada ao Recorrente, não foi analisada corretamente a sua concreta culpa e as exigências de prevenção sentidas.
XXXXIII - Na procedência da revisão das qualificações jurídicas ou das penas parcelares, impõe-se a revisão da pena única aplicada, que deverá ser substancialmente reduzida/atenuada.
XXXXIV - Todavia, independentemente da procedência do expedido, a pena única aplicada à Recorrente é manifestamente excessiva.
XXXXV - Como bem elucida Figueiredo Dias, considerando o disposto no artigo 77°, n° 1, do C. Penal, se deve ter em conta, "a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão, e o tipo de conexão, que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade - unitária - do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos se reconduz a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma "carreira") criminosa, ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta. De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização)."

XXXXVI - Para quem esteja a ser julgado pela prática de um crime, constitui uma garantia fundamental o tratamento próprio, que as especificidades do seu caso reclama e também constitui uma evidência que, em muitas situações, as variáveis a ponderar se repetem.

XXXXVII - E então, é possível chegar a resultados parecidos em matéria de medida da pena, os quais, podem ser lidos como “bitolas” da jurisprudência do S.T.J. para certo tipo de casos.
XXXXVIII - Pelo que, deve o douto Acórdão recorrido ser alterado e substituído por outra decisão que aplique ao Recorrente uma pena única mais adequada, justa e equitativa.

      Pede que seja concedido provimento ao recurso.

                                                              *******

     A Exma. Procuradora-Geral Adjunta no Tribunal da Relação de Lisboa apresentou resposta, conforme consta de fls. 1412 a 1423, defendendo que o acórdão ora recorrido não está ferido de nulidade, tendo conhecido e decidido no que diz respeito à impugnação da matéria de facto; será de rejeitar o recurso na parte respeitante aos crimes de dano e maus tratos, pois as penas aplicadas não ultrapassam os 8 anos, invocando o artigo 400.º, n.º 1, alínea f) do CPP; as penas aplicadas mostram-se graduadas de acordo com os critérios legais, concluindo que o acórdão não merece censura, devendo ser mantido.

                                                              *******    

    A Exma. Procuradora-Geral Adjunta neste Supremo Tribunal, indo os autos com vista, a fls. 1427, apôs o seguinte: “Visto (nada a acrescentar ao entendimento defendido pelo Ministério Público a fls. 1412 e ss.)”.

   

                                                              *******

     Não foi cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, face ao teor do parecer emitido.

                                                              *******

     Não tendo sido requerida audiência de julgamento, o processo prossegue com julgamento em conferência, nos termos dos artigos 411.º, n.º 5 e 419.º, n.º 3, alínea c), do Código de Processo Penal.

                                                              *******

     Colhidos os vistos, realizou-se a conferência, cumprindo apreciar e decidir.

                                                              *******

     Como é jurisprudência pacífica, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso – detecção de vícios decisórios ao nível da matéria de facto emergentes da simples leitura do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, referidos no artigo 410.º, n.º 2, do Código de Processo Penal (neste sentido, o acórdão do Plenário da Secção Criminal, de 19 de Outubro de 1995, proferido no processo n.º 46580, Acórdão n.º 7/95, publicado no Diário da República, I Série - A, n.º 298, de 28 de Dezembro de 1995, e BMJ n.º 450, pág. 72, que fixou jurisprudência, então obrigatória, no sentido de que “É oficioso, pelo tribunal de recurso, o conhecimento dos vícios indicados no artigo 410º, nº 2, do Código de Processo Penal, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito”) e verificação de nulidades, que não devam considerar-se sanadas, nos termos dos artigos 379.º, n.º 2 e 410.º, n.º 3, do CPP – é pelas conclusões que o recorrente extrai da motivação, onde sintetiza as razões de discordância com o decidido e resume o pedido (artigo 412.º, n.º 1, do Código de Processo Penal), que se delimita o objecto do recurso e se fixam os limites do horizonte cognitivo do Tribunal Superior.

    As conclusões deverão conter apenas a enunciação concisa e clara dos fundamentos de facto e de direito das teses perfilhadas na motivação (assim, acórdão de 25 de Março de 1998, proferido no processo n.º 53/98-3.ª Secção, in BMJ 475, pág. 502).

 

                                                             *******

     Questões propostas a reapreciação e decisão

 

     O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões onde o/a recorrente resume as razões de divergência com o deliberado no acórdão recorrido.

     O caso presente apresenta alguma singularidade, uma vez que as conclusões extravasam o conteúdo da motivação, o objecto do recurso aí delimitado.

     A recorrente ao longo da motivação reporta apenas a nulidade do acórdão por falta de exame crítico das provas e por omissão de pronúncia e a medida da pena única.

      Em ponto algum a recorrente faz referência a atenuação especial, o que não a impediu, fora de contexto do recurso, pedir a atenuação especial da pena nas conclusões XXVI a XXIX, XXXIII e XXXVI, esta na parte em que invoca os artigos 72.º e 73.º do Código Penal, e ainda nas conclusões XXXVIII e XXXXIII, in fine.

      Igualmente fora do tema da motivação pede a “revisão das qualificações jurídicas” na conclusão XXXXIII, num exercício inovador, quando não disse rigorosamente nada na motivação sobre tal questão.

 

      As questões a apreciar são as seguintes:

 

      Questão I - Nulidade do acórdão por falta de exame crítico das provas e por omissão de pronúncia   

      Questão II - Medida da pena única

      Por outro lado, para além de se fazer referência a irregularidade do acórdão de Alenquer, de 4 de Abril de 2014, colocar-se-á a questão prévia da admissibilidade do presente recurso, na medida em que se verifica na quase totalidade, a repetição da motivação e conclusões do anterior recurso, no que toca às questões da invocada nulidade e da medida da pena única e mesmo nos extravagantes pedidos de atenuação especial da pena e de revisão das qualificações jurídicas.

                                                                *******

   

       Apreciando.

       Fundamentação de facto.

 

     Foi dada como provada a seguinte matéria de facto, que é de ter-se por imodificável e definitivamente assente, já que da leitura do texto da decisão, por si só considerado, ou em conjugação com as regras de experiência comum, não emerge a ocorrência de qualquer vício decisório ou nulidade de conhecimento oficioso, mostrando-se a peça expurgada de insuficiências, erros de apreciação ou contradições que se revelem ostensivos, sendo o acervo fáctico adquirido suficiente para a decisão, coerente, sem contradição, harmonioso, e devidamente fundamentado.

     Ademais, como se verá, a invocada nulidade do acórdão não se verifica, sendo de rejeitar o recurso nessa parte por manifesta improcedência.

      Nota - Pese embora o que acaba de ser declarado, a verdade é que o texto contém uma incongruência que de todo não releva para a conformação dos factos essenciais, pois que no FP 1 se deu por assente que “A arguida e BB mantiveram entre si uma relação amorosa desde o ano de 2008” e no FP 78 deu-se por assente que “É na vida nocturna de Lisboa, na zona das docas em Belém, que em 2009 a AA conheceu o BB com quem viria a iniciar um relacionamento afectivo alguns meses depois”.

      

     Factos Provados

   

1. A arguida e BB mantiveram entre si uma relação amorosa desde o ano de 2008, passando a residir em união de facto numa casa arrendada sita na ....

2. Em Outubro de 2011, por motivos económicos o casal mudou-se para uma casa cedida ao companheiro da arguida, situada na Rua ..., casa esta que se encontrava isolada das demais casas habitadas.

3. Da relação referida em 1. nasceram dois filhos: CC, nascido a ...2010 e DD, nascido a...2011.

4. Desde pelo menos o nascimento de DD, a arguida foi sentindo que a sua relação com o companheiro BB se estava a deteriorar e que este apenas dava atenção aos filhos.

5. No dia 12 de Agosto de 2012, a arguida e o seu companheiro BB decidiram passar o dia na praia, em Sesimbra, levando consigo os filhos de ambos, CC e DD.

6. Nesse dia e quando já se encontravam na praia de Sesimbra, pelas 17:30 horas, a arguida estava a jogar à bola com o companheiro BB, enquanto o filho CC ficou a brincar perto do casal e o bebé DD encontrava-se um bocado mais afastado debaixo do chapéu-de-sol, dentro de um porta-bebés, vulgarmente conhecido como “ovo”.

7. A dada altura, o DD começou a chorar e o BB interrompeu o jogo da bola, afastou-se do local onde se encontrava a arguida AA e dirigiu-se até ao chapéu-do-sol para ver o que se passava com o bebé.

8. Então, a arguida teve uma discussão que teve com o companheiro devido ao facto de este estar a dar mais atenção ao filho do que a ela.

9. E como retaliação, a arguida abandonou o local levando consigo o menor CC, que se encontrava descalço e que contava, na altura, apenas dois anos de idade.

10. Seguindo a pé por diversas ruas de Sesimbra, a arguida efectuou o trajecto com o CC descalço e puxando o mesmo para a acompanhar, de forma impetuosa, não se coibindo por a criança chorar compulsivamente e indiferente à idade e compleição física de CC.

11. Nesse trajecto, CC caiu por diversas vezes no chão e mesmo nessas alturas a arguida continuava a puxar a criança, levantando-a de forma brusca e seguindo o seu percurso.

12. A arguida nunca largou a criança, continuando a arrastá-la pelas ruas de Sesimbra e fazendo com que, pelo menos por uma vez, a criança embatesse com a cabeça num poste de sinalização.

13. Nos termos atrás descritos, a arguida circulou pelo menos desde a praia de Sesimbra, passou pela Avenida da Liberdade, seguindo para a Rua Virgílio Mesquita Lopes e Largo Cinco de Outubro.

14. A situação descrita só terminou com a intervenção da GNR que interceptou a arguida e o menor.

15. Na sequência da abordagem feita pela GNR, a arguida dirigindo-se aos agentes declarou que “Nada tinham a ver com a sua vida” e para justificar a sua caminhada com a criança acrescentou que “estava perdida, não encontrou o carro”.

16. Como consequência directa e necessária da conduta da arguida, o CC sofreu escoriações em ambos os pés.

17. A arguida AA agiu apenas movida pela intenção de se afastar rapidamente do companheiro e para atingir este objectivo, não se absteve de arrastar o menor CC descalço pelas ruas de Sesimbra.

18. E previu a arguida que na sua caminhada apressada, com passadas largas era insusceptível de poder ser acompanhada pelo filho CC, com apenas dois anos de idade e que ao arrastá-lo descalço pela calçada quente, num dia de Verão, por diversas ruas de Sesimbra, tal iria necessariamente provocar ofensas na integridade física e psíquica do menino, resultado este com que se conformou.

19. A arguida agiu com desrespeito pela dignidade do menor CC, indiferente ao sofrimento da criança que chorava e caía durante a caminhada e à sua idade mas apesar de tal situação estar a ocorrer com o seu filho não se absteve de actuar como referido, movida pela intenção de se afastar do seu companheiro.

20. A arguida, não se encontrando satisfeita com a relação que mantinha com o seu companheiro BB, concebeu um plano que lhe permitisse vingar-se do seu companheiro e da família deste.

21. Então, a arguida foi engendrando um plano para matar os menores CC e DD através da inalação de fumo mediante o atear de fogo ao sofá da casa, o que provocava um processo de combustão lenta, libertando monóxido de carbono, gás susceptível de causar a morte após a inalação de determinada quantidade.

22. Em data não concretamente determinada, mas por volta de dia 12 de Dezembro de 2012, a arguida, aproveitando que se encontrava sozinha em casa com as crianças, decidiu que era o momento para concretizar o seu plano.

23. Assim, fechando os filhos na sala que servia simultaneamente de quarto de dormir daqueles, pegou fogo com um isqueiro a um sofá que lá se encontrava, mais concretamente na base do sofá junto dos respectivos pés.

24. Todavia, a arguida ao ser confrontada pelo assistente BB sobre o estado do sofá, invocou que tinha ocorrido um pequeno acidente do qual dera logo conta, tendo apagado de imediato o fogo.

25. No entanto, durante a semana seguinte a arguida continuou com o pensamento de magoar o seu companheiro e a mãe deste mediante a morte dos seus próprios filhos, como forma de mostrar àqueles que se ela não podia ficar com os filhos na sua companhia, também não iria deixar que o pai e a avó ficassem.

26. No dia 19 de Dezembro de 2012, pelas 8 horas da manhã, ocorreu uma grande discussão entre a arguida e o companheiro, após a qual aquela disse ao BB que queria que ele se fosse embora de casa.

27. Todavia, o companheiro da arguida não deu resposta nem arrumou os seus pertences e saiu para ir trabalhar.

28. Ao longo dessa manhã, a arguida tentou várias vezes ligar para o telemóvel do companheiro mas ele desligava as chamadas até que pelas 12:00 horas, este finalmente atendeu a chamada.

29. Nessa altura, a arguida pediu ao BB para comprar Cerelac ou leite para as crianças porque já se tinha acabado.

30. E na execução do seu plano disse ainda ao companheiro que «Tu não te vais ficar a rir», com isto pretendendo referir que se ela (AA) não ficasse com os filhos, o companheiro BB também não ficaria.

31. Nesse mesmo dia, pelas 21:00 horas, o BB depois de sair da oficina, passou por casa só para deixar os produtos de alimentação para as crianças que a arguida havia previamente pedido ao telefone.

32. Nessa altura, a arguida perguntou ao BB se afinal ele iria deixar a casa mas o mesmo respondeu “que já estava tudo bem”.

33. E de seguida, o BB saiu de casa para ir para o ginásio como habitualmente fazia nesse dia da semana.

34. Então, a arguida perante a aludida resposta do BB e aproveitando o facto de se encontrar sozinha com as crianças na sua residência, preparou as suas malas de viagem e deitou os seus filhos CC e DD no quarto destes, ficando o CC deitado no tapete e o irmão DD no berço.

35.Após, a arguida fechou as janelas do quarto e, pegando num isqueiro que trazia consigo, ateou fogo ao sofá já referido que se encontrava no interior do aposento onde as crianças estavam deitadas.

36.Certificando-se que o sofá se encontrava a arder, a arguida fechou a porta do quarto de forma a impedir que as crianças saíssem e afixou na porta do quarto um manuscrito preso por uma estrela de cartão de cor encarnada habitualmente usada para decorações natalícias.

37. Esse manuscrito tinha o seguinte teor:

“Eu avisei-te seu desgraçado, voçê não acreditou, quem faz mal aos outros paga aqui mesmo.

Você desgraçou a minha vida agora é a minha vez de desgraçar a tua.

Já podes ficar com os miúdos só para você e sua mãezinha. (Aquela grande filha da Puta) que criou um Diabo como você.

Obrigado por me fazer perder minha família por um lixo humano como tu.

Demônio”

38. Após, a arguida saiu da habitação, levando consigo as suas malas e fechando as janelas e a porta de saída da mesma.

39.  Não satisfeita e para completar o seu plano de vingança, pelas 21:18 horas, a arguida ligou para a mãe do companheiro, EE e disse: «eu peguei fogo na casa e os meninos morreram».

40. Entretanto, o BB recebeu um telefonema da polícia a informar que havia fogo na sua residência e ao dirigir-se até aí cruzou-se no caminho com a arguida que caminhava na rua, carregando umas malas na zona da ....

41. Assim que a viu, o BB perguntou à arguida “O que se passa com os miúdos?” ao que ela respondeu “Vai ver”.

42. E depois, sentindo-se assustada a arguida fugiu do local e esteve ausente durante três dias até se entregar às autoridades.

43. A conduta da arguida teve como consequência directa e necessária a morte de CC, apresentando uma taxa de carboxihemoglobina (monóxido de carbono) de 40%, de que resultou a morte por asfixia por monóxido de carbono, causa de morte violenta.

44. A conduta da arguida teve como consequência directa e necessária a morte de DD , apresentando uma taxa de carboxihemoglobina (monóxido de carbono) de 37%, de que resultou a morte por asfixia por monóxido de carbono, causa de morte violenta.

45. Só pela acção dos Bombeiros Voluntários de Alenquer, chamados ao local por vizinhos, se conseguiu impedir a progressão do fogo, tendo sido necessária a intervenção dos bombeiros durante 5 horas e 35 minutos para evitar a sua propagação para as restantes divisões da casa, envolvendo 13 elementos e 4 viaturas.

46. O fogo ateado pela arguida destruiu as paredes do quarto da casa de habitação, propriedade de ..., destruindo ainda que aí se encontrava, provocando prejuízos de valor não apurado.

47. A arguida agiu motivada por sentimento de vingança contra o pai dos menores e a avó paterna, EE.

48. A arguida formulou tal propósito de matar os filhos, pelo menos uma semana antes, propósito que interiorizou e não mais abandonou até o consumar.

49. A arguida conhecia a natureza do meio empregado supra descrito e estava ciente de que o monóxido de carbono do fumo libertado pelo fogo quando inalado em determinada quantidade era apto a tirar a vida das crianças que se encontravam no interior da habitação.

50. Ao agir da forma descrita, a arguida para alcançar o seu fim (matar os menores através da inalação de monóxido de carbono do fumo proveniente do fogo) previu que o fogo ateado necessariamente causaria estragos na casa e no respectivo recheio, resultado esse com o qual se conformou.

51. A arguida confessou a quase totalidade dos factos, apesar de ter relatado os mesmos de uma forma distante e fria, sem revelar grande emoção.

52. No decurso da audiência de julgamento, a arguida declarou que ainda tinha valido a pena causar a morte dos filhos para castigar o marido e a sogra.

53. No final da audiência de discussão e julgamento, a arguida declarou estar arrependida dos factos praticados.

54. Na sequência do nascimento do seu primeiro filho, a arguida desenvolveu um quadro clínico compatível com Depressão Pós-Parto, situação que nunca mereceu qualquer tratamento.

55. A arguida apresenta também com elevada probabilidade um quadro clínico-psiquiátrico compatível com o diagnóstico de uma perturbação de personalidade tipo Cluster B (Dissocial ou Boderline), sem sintomas psicóticos.

56. Contudo, o estado da arguida não interferiu com a sua capacidade de avaliar a ilicitude dos factos e/ou de se determinar de acordo com essa avaliação.

57. A arguida não revelou qualquer diminuição da imputabilidade médico-legalmente admitida para os factos que praticou.

58. O tipo de perturbação da personalidade de que a arguida padece confere-lhe vulnerabilidade e faz surgir a necessidade de seguimento psiquiátrico/psicoterapêutico, circunstância que, no entanto, não afecta a sua imputabilidade.

59. Em tudo, agiu a arguida sempre livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.

60. À data dos factos, a arguida tinha 31 anos de idade, contando actualmente com 32 anos.

61. A arguida tem nacionalidade brasileira e já correu contra a mesma processo administrativo de expulsão no Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, com o n.º 1107/07-DRLVTA.

62. A arguida não possui qualquer ligação séria ou profunda a Portugal, pois a sua família permanece no país de origem e, pese embora ter tido dois filhos com nacionalidade portuguesa, os mesmos foram mortos pela própria arguida, cortando qualquer ligação ao território nacional.

63. Os homicídios dos menores destes autos causaram grande alarme social e chocaram o sentimento da população portuguesa.

(Certificado de registo criminal da arguida)

64. A arguida AA não tem condenações criminais registadas.

Mais se provou (relatório social da arguida AA):

65. A AA é natural de S. Paulo, no Brasil e é a primeira de uma fratia de dois, separando-se os seus pais quando ela tinha apenas um ano de idade.

66. Nessa altura, a AA e o outro irmão ficaram entregues aos cuidados da mãe, a qual quando aquela tinha quatro anos, encetou novo relacionamento afectivo, mudando-se a família para a morada do novo companheiro da mãe.

67. Fruto deste novo relacionamento da mãe da AA, nasceu uma filha, que é a irmã mais nova uterina da arguida.

68. Desde a separação dos pais, a AA não voltou a manter qualquer contacto com a figura paterna, considerando o seu padrasto como verdadeiro pai.

69. A mãe da arguida trabalha num lar de idosos e o padrasto exerce a profissão de mecânico.

70. O percurso escolar da AA decorreu de forma regular, sem retenções, completando o 12.º ano com apenas 16 anos de idade.

71. Por motivos de natureza económica, a AA iniciou nessa altura a sua vida laboral, como ama e empregada doméstica, actividade que manteve de forma continuada.

72.  Em Dezembro de 2005, a AA aceitando uma proposta apresentada por uma amiga sua, resolvei emigar para Salamanca.

73. Ainda no Brasil, a AA assinou um contrato de trabalho pelo período de um ano para exercício de funções em Espanha no sector da restauração, como empregada de mesa.

74. Todavia, quando chegou a Espanha confrontou-se com um cenário diferente do esperado, pois foi obrigada a prostituir-se, situação que durou apenas quatro dias; após o que conseguiu fugir para Portugal.

75. Em Portugal, a AA foi acolhida por uma amiga de infância, também ela brasileira, que residia no Barreiro, localidade onde permaneceu durante um ano.

76. Durante esse período, a arguida manteve-se laboralmente inactiva, sendo a sua subsistência assegurada pela amiga, que era “stripper”.

77. Posteriormente, a AA foi residir para uma pensão em Lisboa e trabalhou como empregada de mesa na “Boite ...”.

78. É na vida nocturna de Lisboa, na zona das docas em Belém, que em 2009 a AA conheceu o BB com quem viria a iniciar um relacionamento afectivo alguns meses depois.

79. O casal começou a viver maritalmente num apartamento arrendado na zona da ... e a sua relação, numa fase inicial, pautou-se por proximidade, entre-ajuda e companheirismo.

80. Nesse contexto, a AA engravidou do primeiro filho, CC, que viria a nascer em ....2010.

81. A arguida refere que desde essa data começou a sentir-se depressiva, com sentimentos de adinamia e angústia mas que não chegou a ter qualquer intervenção especializada.

82. Cerca de um ano depois, a AA, o BB e o filho mudaram-se para uma casa sita em ..., em contexto rural, área desta comarca de ... e perto da morada dos pais do companheiro.

83. Tal mudança de residência deveu-se a dificuldades financeiras do casal e a nova habitação foi cedida por conhecidos da família de BB.

84. Todavia, a integração da AA na comunidade da nova residência foi difícil dado que aquela se recusava a conviver com os familiares do companheiro BB.

85. A arguida permanecia por longos períodos em casa, circunscrevendo o seu quotidiano a cuidar do filho do casal.

86. Entretanto, a AA ficou grávida pela segunda vez, tendo sido uma gravidez não planeada, a qual só não interrompeu porque quando teve conhecimento da mesma às 12 semanas já não o poderia fazer por ser posterior ao prazo legal.

87. Aquando desta segunda gravidez, a AA sentiu que os sintomas de angústia e de depressão se agravaram e a relação conjugal foi-se deteriorando.

88. Foi neste contexto que o seu segundo filho, DD nasceu no dia ....2011.

89. Após o nascimento deste segundo filho, a AA sentia-se cada vez mais isolada, além de estar economicamente dependente e com o seu passaporte caducado.

90. Não obstante, a AA verbalizou junto do companheiro a sua intenção em regressar ao Brasil, acompanhada dos filhos, o que este nunca concordou.

91. Após o nascimento do segundo filho, uma enfermeira do Centro de Saúde ... deslocou-se à habitação da família para efectuar o teste do pezinho ao recém-nascido.

92. Aí chegada, a enfermeira deparou-se com uma situação de aparente negligência parental ao nível da higiene e vestuário, bem como indícios de falta de estimulação das crianças.

93. Em face da situação deste agregado, a referida técnica sinalizou a situação dos menores à Comissão de Protecção e Jovens de ... (CPCJ).

94. Porém, ambos os progenitores não se mostraram receptivos à intervenção da Segurança Social, pelo que esta entidade remeteu o caso em 15.07.2012 para os serviços do Ministério Público do Tribunal de Família e de menores de Vila Franca de Xira.

95. À data dos factos dos autos, AA vivia com o companheiro e os dois filhos do casal, o mais velho, CC, que contava com 29 meses e o mais novo, DD , que contava 12 meses.

96. Refere a arguida que a relação conjugal era caracterizada por marcada conflitualidade, com discussões frequentes e episódios de agressividade física e verbal.

97. E ainda que mantinha um relacionamento conturbado e distante com “sogra” (mãe do seu companheiro).

98. Os referidos episódios da vida conjugal da arguida seriam motivados aparentemente pela perturbação emocional daquela e pelo seu sentimento que tinha de perda dos filhos.

99. A situação económica do agregado registava algumas dificuldades dado o BB nem sempre ter trabalho na oficina de automóveis, propriedade do seu pai.

100. A AA assume que em determinadas situações terá agido de forma desadequada com os filhos, uma das quais careceu de intervenção por parte da entidade policial.

101. A arguida justifica tais atitudes com a saturação da situação familiar que vivenciava e pelo comportamento de indiferença do companheiro em relação a si, encontrando-se num contexto intra-familiar de conflitualidade profunda e com uma reduzida capacidade para gerir situações de tensão e dificuldade no exercício das competências parentais.

102. Relativamente aos factos por que vem acusada, a arguida, assume a prática dos mesmos embora os contextualize nas circunstâncias adversas que vivenciou: a relação conflituosa com o companheiro e a animosidade que sentia pela sogra e ao isolamento social em que se encontrava.

103. AA refere que dispõe do apoio da sua família de origem no Brasil, país para onde pretende regressar logo que a sua situação penal o permita.

104. A arguida encontra-se sujeita à medida de coacção de prisão preventiva que cumpre desde 29.12.2012 na Clínica de Psiquiatria do Hospital de S. João de Deus em Caxias.

105. Nesta clínica, a arguida beneficia de acompanhamento psicofarmacológico por quadro de síndrome depressiva grave.

106. A arguida era vista como uma mãe dedicada aos filhos e como sendo uma boa mãe, tanto aos olhos do seu companheiro como aos da mãe deste último.

107. Na sequência do referido em 94., no dia 22.10.2012 foi celebrado no Tribunal de Família e de menores de Vila Franca de Xira um acordo de promoção e protecção, no âmbito do qual foi aplicada em favor dos menores CC e DD a medida de promoção e protecção de apoio junto dos pais com a duração de um ano e de cujo teor, constam, entre outras, as seguintes cláusulas:

“1. Os pais providenciaram pela saúde, higiene e segurança dos menores.

2. Os pais comprometem-se a que ambos os menores frequentem equipamento de infância.

3- A mãe compromente-se em comparecer em consultas de psicologia e a manter o acompanhamento, caso se mostre necessário.

4. A mãe compromete-se, ainda a efectuar procura activa de trabalho (...)”.

108. Em cumprimento deste acordo e desde Novembro de 2012, os menores já se encontravam a frequentar equipamento de infância, sendo o progenitor quem os levava e trazia diariamente de carro.

109. Igualmente, em cumprimento do acordo de promoção e protecção celebrado, a arguida aguardava que fosse agendada uma data para dar inicio ao acompanhamento psicológico aí contemplado.

110. A arguida chegou a telefonar mais do que uma vez para os serviços de Segurança Social para saber se a sua consulta já estava marcada.

(Pedido de Indemnização civil deduzido pelo assistente BB)

111. O demandante perdeu de forma violenta e inesperada os dois filhos que tanto amava e que eram a razão da sua existência.

112. Em virtude da morte dos filhos CC e DD e do modo como estes morreram, o assistente sente que a sua vida ficou irremediavelmente destruída.

113. O assistente recorda-se constantemente dos filhos, a quem dedicava grande parte do seu tempo e atenção.

114. Devido à morte dos filhos, BB perdeu a alegria de viver e sentindo a sua falta como a maior perda da sua vida.

115. Até se lembra dos filhos em ocorrências simples da vida diária, como as idas ao supermercado, quando o CC lhe costumava pedir para comprar brinquedos.

116. O assistente brincava muito com os filhos e o filho CC era muito agarrado a ele.

117. Neste momento, tem estado ocupado a tratar dos pais, os quais estão muito necessitados de cuidados de saúde devido ao choque que sofreram com a morte dos netos.

118. Após a ocorrência dos factos dos autos, o pai do assistente ficou internado num hospital e a sua mãe sofreu um acidente vascular cerebral.

119. Em consequência da morte dos seus filhos, o assistente teve que ser acompanhado a nível psicológico/psiquiátrico por especialista em saúde mental; acompanhamento este que mantém até à data.

                                                              *******

      Apreciando.

 

      Fundamentação de Direito.

      Irregularidade - Falta de assinatura do acórdão do Colectivo de Alenquer de 4 de Abril de 2014 

     Embora do final do acórdão do Tribunal Colectivo de Alenquer, de 4 de Abril de 2014, a fls. 1215, conste que foi assinado pelos juízes que compõem o Tribunal Colectivo, e da acta de leitura do acórdão de fls. 1217, conste igualmente que o acórdão foi assinado por todos os juízes, como se vê do final do mesmo, a fls. 1215, a Juíza de Círculo ... não assinou o acórdão.

     Estabelece o artigo 374.º, n.º 3, do CPP, que o dispositivo contém para além do mais, - alínea e) - a data e as assinaturas dos membros do tribunal.

     Diversamente do que ocorre com a falta de assinatura na acusação que é sancionada com nulidade, nos termos do artigo 283.º, n.º 3, alínea g), do CPP, a falta de assinatura na sentença constitui irregularidade - artigo 123.º do CPP.

     Desconhecem-se as razões da omissão de assinatura na data da leitura, provavelmente por a senhora juíza não ter estado presente, pois que a acta apenas dá conta da presença da Juiz Presidente, da Procuradora Adjunta e Funcionária.

    A falta de assinatura do acórdão, mesmo que tardia, não se deveu, claramente, a falta de empenho da Sra. Funcionária, como se alcança da “Cota” de fls. 1222, lançada em 7 de Abril, onde consignou que contactada telefonicamente, a Dr.ª ... transmitiu-lhe que para assinar o acórdão se deslocaria ao Tribunal no dia 11-04-2014. 

    A senhora juíza não deverá ter comparecido, de modo que a mesma senhora funcionária, na inequívoca demonstração do exercício pessoal do dever profissional de zelo, após falta de comparência da Sra. Juíza e de falta de correspondência ao apelo, vê-se na necessidade de emitir nova cota em 26-06-2014, a fls. 1284, onde consigna que tendo sido contactada a senhora juíza para informar que o processo iria ser remetido no dia seguinte ao Tribunal da Relação de Lisboa e não se mostrando aposta a sua assinatura, a mesma declarou que deveria remeter os autos sem assinatura.

   A intervenção, rectius, a falta de intervenção da Sra. Juíza só pode ser entendida como um exercício de absoluta displicência – cremos ser o termo correcto –, o que não está escrito no código genético de um Juiz, aqui com perfeita distanciação de consideração a propósito de género. Ponto final.

                                                          *******

 

     Antes de abordarmos as questões propostas, quer no que toca à nulidade do acórdão, quer no que tange à medida da pena conjunta, atenta a circunstância de a motivação apresentada e segmento conclusivo serem praticamente simétricos com os anteriormente apresentados nos recursos interpostos para a Relação de Lisboa, é de colocar uma questão prévia relacionada com a rejeição ou não de recurso em tais condições.

  

     Questão Prévia – (In)Admissibilidade do recurso por reedição/renovação no presente recurso de parte substancial da motivação e das conclusões apresentadas nos anteriores recursos para o Tribunal da Relação de Lisboa  

     Decisão recorrida é o acórdão da Relação de Lisboa de 9 de Setembro de 2014 e não o do Tribunal Colectivo de Alenquer.

     A manutenção no presente recurso do texto dos anteriores recursos para a Relação inculca a ideia de que a recorrente continua a dirigir-se ao acórdão da primeira instância, olvidando o acórdão da Relação de Lisboa que confirmou aquele e que deveria ter impugnado.

     A recorrente no recurso ora em apreciação, ressalvado um segmento, repete ipsis verbis, em jeito de segunda edição não revista nem ampliada, o alegado no anterior recurso, incluído o texto das conclusões, acontecendo que o segundo recurso dirigido ao Tribunal da Relação de Lisboa era já também uma reprodução do primeiro recurso.

     Vindo o presente recurso interposto de acórdão da Relação de Lisboa, ao cotejarmos a motivação e as conclusões ora apresentadas com as que foram formuladas no recurso interposto do acórdão de Alenquer (fls. 883 a 906 – 1.º recurso – e fls. 1226 a 1250 – 2.º recurso) ressalta à evidência a quase total coincidência entre umas e outras, estando-se perante um mero decalque, uma cópia, uma “nova edição”, praticamente não revista do recurso anterior, uma reprodução quase integral, em que pouco de novo e sobretudo, relevante, útil e pertinente, se acrescenta.

    Assim, quanto à questão da nulidade, o que consta na motivação do primeiro recurso a fls. 893 e 894 é repetido no segundo, a fls. 1237 e 1238, e no presente volta a ser repetido a fls. 1393 e 1394.

    No que tange à questão da medida da pena, o que consta da motivação de fls. 894 a 897 no primeiro recurso é repetido no segundo, de fls. 1238 a 1241, e no presente, é de novo repetido, de fls. 1394 a fls.1397.

    As conclusões apresentadas no primeiro recurso, constantes de fls. 897 a 906 são repetidas no segundo recurso de fls. 1241 a 1250 e no presente recurso são de novo repetidas, de fls. 1397 a fls. 1406.

    Apenas são visíveis pequenas diferenças, que têm a ver com erros de numeração das conclusões e a adição no último de duas novas conclusões.

    A conclusão III apresenta agora uma versão sincopada, diferentemente da constante a fls. 898 (1.º recurso) e a fls. 1242 (2.º recurso), sendo suprimida no presente recurso a expressão «Voltando a proferir um Acórdão que aborda as questões jurídicas “pela rama”. Mais uma vez, estamos perante uma sentença nula».

    Este segmento, pelo menos na parte em que foi dirigido ao acórdão no primeiro recurso, não fazia qualquer sentido, pois que era a primeira vez que tinha abordado a questão, tendo sido mantida no segundo recurso.  

    Por outro lado, a conclusão IV que tinha a ver com a matéria alegada na contestação, foi deixada cair no presente recurso. 

    De diferente em relação aos dois anteriores recursos, o presente apresenta erro na dupla conclusão XXII, a fls. 1402, o que estava bem nos anteriores, a fls. 902 e a fls. 1246, com as conclusões XXI e XXII.

    No presente recurso salta-se da conclusão XXXI para a XXXIII, quando nos anteriores saltava-se da conclusão XXX para a conclusão XXXIV.

    Nas três versões mantém-se a continuada alusão ao arguido e ao recorrente e apenas por uma vez refere de modo correcto “à recorrente”, conforme fls. 905 no primeiro recurso na conclusão XXXXVII; a fls. 1249 no segundo recurso, na conclusão XXXXVII; no presente recurso a fls. 1405, na conclusão XXXXIV.

    Em todos os recursos salta-se da conclusão XXXIX para a conclusão XXXX, a que se segue a conclusão XXXXI, e assim por diante.

    De novo no presente recurso apenas as conclusões XXXXVI e XXXXVII, que não trazem grande novidade, como se vê do que segue:

XXXXVI - Para quem esteja a ser julgado pela prática de um crime, constitui uma garantia fundamental o tratamento próprio, que as especificidades do seu caso reclama e também constitui uma evidência que, em muitas situações, as variáveis a ponderar se repetem.

XXXXVII - E então, é possível chegar a resultados parecidos em matéria de medida da pena, os quais, podem ser lidos como “bitolas” da jurisprudência do S.T.J. para certo tipo de casos.

    Como vimos, ao longo da motivação a recorrente coloca a questão da “nulidade da sentença” nas conclusões I, II, III, VI e VII, e a questão da medida da pena conjunta, nas restantes conclusões, incluindo a referência a atenuação especial da pena, matéria não tratada no texto da motivação, nas conclusões XXVI a XXIX, XXXIII e XXXVI, esta na parte em que invoca os artigos 72.º e 73.º do Código Penal, e ainda nas conclusões XXXVIII e XXXXIII, in fine, e ainda igualmente fora do tema da motivação, pede a “revisão das qualificações jurídicas” na conclusão XXXXIII.

    Ora, no que respeita a todas estas questões, o presente recurso mais não é do que a mera repetição do anterior, repetindo a recorrente o que então alegara, o que com toda a clareza se alcança da leitura da(s) motivação (ões) anterior(es) e da actual.

    Percorrendo o segmento conclusivo, no que toca à matéria que ora nos ocupa, as conclusões do presente recurso são a reprodução letra a letra do que se continha nas conclusões dos primeiro e segundo recursos, dirigidos à Relação, com ínfimas diferenças resultantes da numeração, como se assinalou.

    A recorrente age como se estivesse de novo, em segundo “round”, a reagir contra o acórdão do Tribunal de Alenquer, olvidando por completo a reapreciação realizada pela Relação de Lisboa.

    Em termos globais, o presente recurso mais não é do que a mera repetição do recurso anterior, sem qualquer inovação, melhoria ou significativo acrescento, sem introduzir a recorrente qualquer mais valia, elemento novo, relevante, pertinente, útil, uma diversa perspectiva de observação e análise, quase parecendo esquecer que o acórdão a impugnar é agora outro, que se debruçou sobre um segundo acórdão do Colectivo de Alenquer, o qual supriu a nulidade detectada pela Relação no anterior recurso, de tal modo que o segundo acórdão não é exactamente igual ao primeiro, pois que tem essa componente nova, mas nem a isso, a essa novidade, se refere a recorrente, pois que retoma a letra, o tom e o ritmo da primeira impugnação, nada alterando, como se tudo fosse exactamente igual.

    Sendo os argumentos agora utilizados, na sua totalidade, exactamente os mesmos que foram dirigidos ao acórdão da primeira instância, tal significa que, em rigor, a recorrente não impugna o acórdão da Relação, esquecendo-se que a decisão agora em reexame é esta e não a da 1.ª instância.

    Reeditando agora os argumentos e as questões anteriormente postas à consideração da Relação (repetindo, inclusive, a intromissão nas conclusões da atenuação especial e da qualificação jurídica, matérias ausentes na motivação), limita-se a recorrente a devolver ao Supremo Tribunal, ressalvado o segmento relativo a duas conclusões, ao fim e ao cabo perfeitamente anódinas, por nada acrescentarem à linha argumentativa mantida, exactamente as mesmas questões que colocadas foram à Relação de Lisboa, que sobre elas se pronunciou, agindo como se estivesse a recorrer, afinal, uma outra vez, em segunda via, da deliberação do Tribunal de Alenquer.

    A discordância nesta sede só fará sentido se dirigida à solução perfilhada pela Relação, com argumentos novos, específicos, dirigidos ao novo acórdão, com outros enquadramentos, explicitando razões jurídicas novas, dirigidas à nova decisão, agora recorrida, que infirmem os fundamentos nesta apresentados, pois agora é o acórdão da Relação o objecto de recurso e não a já reapreciada decisão da 1.ª instância.

    Tendo esta sido objecto de conhecimento e decisão na Relação, o recurso com tais características só poderá ser entendido como mera repristinação do inconformismo com o deliberado pela 1.ª instância.

    No caso presente, não há um novo esforço argumentativo, limitando-se a recorrente a repetir a linha argumentativa explanada junto do Tribunal da Relação, e olimpicamente ignorando de todo a existência do acórdão da Relação de Lisboa; no fundo, não diz rigorosamente nada de novo, ou diverso.

     Nestes casos é de colocar a questão de saber se o recurso é de rejeitar por manifesta improcedência.

  

     Para uma corrente jurisprudencial o recurso nestas condições é de rejeitar.

 

     Como se refere no acórdão deste Supremo Tribunal, de 14 de Novembro de 2002, proferido no processo n.º 3092/02-5.ª “Quando o STJ é confrontado com um recurso da Relação, são os fundamentos do decidido em 2.ª instância que importa verificar e, não, os da decisão de 1.ª instância já sufragados pelo tribunal recorrido.

      Daí que quando o recorrente se limita a uma espécie de recauchutagem (…) dos fundamentos de recurso que apresentou perante a Relação, sem nada de novo trazer à discussão, verdadeiramente não apresenta motivação.

      O recurso que em tudo reedita o pretenso inconformismo do recorrente perante o deliberado em 1.ª instância não pode ser conhecido - não deveria, mesmo, ter sido admitido – por carência absoluta de motivação - arts. 411.º, n.º 3, 414.º, n.º 2 e 417.º, n.º 3, al. a), do CPP”.

     No mesmo sentido se pronunciaram os acórdãos de 12-02-2002, processo n.º 3221/02-5.ª, de 6-06-2002, processo n.º 1874/02-5.ª, de 17-10-2002, processo n.º 2815/02, de 12-12-2002, processo n.º 3221/02, de 21-05-2013, processo n.º 616/03-3.ª, de 22-05-2003, processo n.º 1672/03-5.ª, de 15-07-2004, processo n.º 2005/2004 e de 27-05-2004, CJSTJ 2004, tomo 2, pág. 209, onde se pode ler “é de rejeitar o conhecimento do recurso interposto para o STJ, no qual o recorrente se limita a reeditar toda a argumentação já expendida no recurso antes interposto para o Tribunal da Relação e à qual aí se deu a necessária resposta”.

     E igualmente no sentido de falta de motivação se pronunciou o acórdão de 22-09-2004, CJSTJ 2004, tomo 3, pág. 158, onde se sintetiza: “No recurso interposto do Tribunal da Relação para o STJ devem-se especificar as razões de discordância com o ali decidido, pelo que a renovação da argumentação da impugnação interposta inicialmente para aquele Tribunal, sem qualquer novidade, equivale a falta de motivação, conducente à sua rejeição liminar”.

     Ou, como se extrai do acórdão de 24-01-2007, processo n.º 4812/07- 3.ª: «A repetição das conclusões ante as instâncias de recurso, particularmente as da Relação perante o STJ, ignorando o teor da decisão proferida na Relação, a qual subsiste inimpugnada e não contrariada em ordem à reparação do erro, conduz à rejeição do recurso por manifesta improcedência, tudo se passando como se a motivação estivesse ausente».

     Ainda neste sentido, podem ver-se os acórdãos de 12-04-2007, nos processos n.ºs 255/07 e 516/07, ambos da 5.ª secção, e de 02-10-2008, processo n.º 4725/07 – 5.ª, onde se afirma: «Quando, no recurso para o STJ, o recorrente nada acrescentou ao que já havia alegado quando se dirigiu à Relação, limitando-se a repetir a motivação, à qual, nesse anterior recurso, já fora dada cabal resposta, que o recorrente ignorou em absoluto, o recurso apresenta-se como manifestamente infundado, por isso sendo rejeitado».

     Como consta do acórdão deste Supremo e desta 3.ª Secção, de 7 de Novembro de 2007, processo n.º 3990/07: «Quando a questão objecto do recurso interposto para o Supremo seja a mesma do recurso interposto para a Relação, tem o recorrente de alegar (motivando e concluindo) como fundamento do recurso, as razões específicas que o levam a discordar do acórdão da Relação: - É que o acórdão recorrido é o acórdão do tribunal superior - o tribunal da Relação -, que decidiu o recurso interposto e, não o acórdão proferido na 1ª instância.

      Não aduzindo o recorrente discordância específica relativamente ao acórdão da Relação, que infirme os fundamentos apresentados pela Relação, no conhecimento e decisão da mesma questão já suscitada no recurso interposto da decisão da 1ª instância, há manifesta improcedência do recurso assim interposto para o Supremo».

     No sentido de rejeição, mais recentemente, pode ver-se o acórdão de 30-10-2013, proferido no processo n.º 806/09.5JAPRT.S1-3.ª.

     Em sentido oposto pode citar-se, v. g., o acórdão de 10-10-2007, proferido no processo n.º 3315/07-3.ª (com um voto de vencido), aí se defendendo que a hipótese de rejeição em caso de reprodução da argumentação do recurso dirigida à Relação não está prevista na lei, explicitando, a propósito: “…os casos de rejeição do recurso, atenta a sua finalidade de reparação de eventual erro judiciário, de melhor decisão no plano substancial, ultrapassando o fim de mero “refinamento” teórico, levam a que se tenha presente que o recorrente pode discordar da decisão da Relação, repetindo os fundamentos antes invocados, por estar convicto de que aquela lhe não deu resposta, justificando a sua duplicação para o STJ e que, sem mais, se não lance mão daquele expediente radical”.  

     No mesmo sentido se pronunciou o acórdão do mesmo dia e secção, no processo n.º 2684/07, conhecendo-se, ainda, por obviamente admitidos, de recursos nestas condições, nos acórdãos de 17-10-2007, no processo n.º 3265/07 e de 17-04-2008, nos processos n.ºs 677/08 e 823/08, todos da 3.ª Secção, podendo ainda ver-se o acórdão de 22-10-2008, processo n.º 3274/08-3.ª.

     Num quadro de um mesmo tipo de impugnação diz-se no acórdão de 27-05-2010, processo n.º 58/08.4JAGDR.C1.S1-3.ª, in CJSTJ 2010, tomo 2, pág. 206: “Neste condicionalismo a rejeição do recurso não tem por contraste um alheamento, ou ostracização, da decisão do Tribunal da Relação, mas sim uma eventual persistência da mesma crítica que já foi dirigida à decisão de primeira instância por considerar que se mantêm as razões anteriormente deduzidas. A rejeição do recurso representaria neste condicionalismo uma insuportável desproporcionalidade perante a irregularidade praticada”.

     No acórdão de 19 de Janeiro de 2011, processo n.º 376/06.6L1.S1, desta Secção, após citar-se o acórdão de 7-11-2007, consta: «Porém, se nos afastarmos dessa perspectiva um tanto redutora ou restritiva, de ordem processual formal, e esgrimirmos numa vertente quiçá mais garantística da ratio do artº 32º nº1 da Constituição da República, poderá dizer-se que embora o recorrente reedite no presente recurso para o Supremo, as mesmas conclusões apresentadas no recurso interposto para a Relação - e, por isso, as questões ventiladas no recurso são as mesmas, e, embora não aduza discordância específica relativamente ao acórdão da Relação, não explicitando razões jurídicas novas perante o acórdão da Relação, que infirmem os fundamentos apresentados pela Relação no conhecimento e decisão das mesmas questões -, não significa, contudo, que fique excluída a apreciação dessas mesmas questões mas agora relativamente à dimensão constante do acórdão recorrido, o acórdão da Relação, no que for legalmente possível em reexame da matéria de direito perante o objecto do recurso interposto para o Supremo, pois que o recurso enquanto remédio, é expediente legal para correcção da decisão recorrida (não seu mero aperfeiçoamento), como meio de impugnar e contrariar a mesma, embora, sem prejuízo de, se nada houver, de novo, a acrescentar relativamente aos fundamentos já aduzidos pela Relação na fundamentação utilizada para o julgamento dessas mesmas questões, e que justifique a alteração das mesmas, seja de concluir por manifesta improcedência do recurso, pois que caso concorde com a fundamentação da Relação, não incumbe ao Supremo que justifique essa fundamentação com nova argumentação».

     Acolhemos esta orientação nos acórdãos de 30-04-2008, no processo n.º 4723/07, de 25-06-2008, no processo n.º 449/08, de 03-09-2008, no processo n.º 3982/07, de 21-01-2009, no processo n.º 2387/08, de 06-07-2011, no processo n.º 774/08.0JFLSB.L1.S1, de 11-12-2012, processo n.º 951/07.1GBMTJ.E1.S1, e revendo-se, a partir do primeiro citado, a posição assumida nos acórdãos de 10-10-2007, no processo n.º 3197/07 e de 12-03-2008, no processo n.º 112/08, por a repetição/renovação de motivação não dever ser equiparada à sua falta e não estar prevista a possibilidade de rejeição de recurso para os casos em que o recorrente se limita a repetir a argumentação já apresentada no recurso interposto para o Tribunal da Relação.

     Mais recentemente, neste sentido se pronunciou o acórdão de 29-05-2013, processo n.º 1264/11.0PCSTB.E1.S1-3.ª, CJSTJ 2013, tomo 2, pág. 185, o acórdão de 10-04-2014, processo n.º 563/12.8PBEVR.E1.S1-3.ª e os acórdãos de 24-09-2014 e de 25-02-2015 por nós relatados nos processos n.º 994/12.3PBAMD.L1.S1 e n.º 1514/12.5JAPRT.P1.S1.

     Pelo exposto, entende-se não ser de rejeitar o recurso, não sendo de colocar o óbice da inadmissibilidade do recurso por esta razão.

     O que não significa que não possa ser rejeitado em parte por outras razões que não a mera reedição da motivação e conclusões.

                                                             *******                                       

    Questão I - Nulidade do acórdão recorrido por falta de exame crítico das provas e por omissão de pronúncia  

    A recorrente no intróito da exposição das conclusões refere uma deficiente apreciação da matéria de facto provada e não provada, pois que da prova produzida, em seu entender, há que retirar outras conclusões, conduzindo a outra convicção, concluindo pela afirmação de imputabilidade diminuída.   

    A recorrente refere-se a matéria de facto e exame crítico das provas nas conclusões I, II, VI, VII e VIII, nas quais repete as conclusões I, II, VII, VIII e IX de fls. 897/9 do 1.º recurso dirigido ao Tribunal da Relação de Lisboa e as conclusões I, II, VII, VIII e IX do 2.º recurso dirigido ao mesmo Tribunal, a fls. 1241/3.

    No intróito da motivação, a fls. 1392, referiu a recorrente interpor recurso para reapreciação da matéria de direito.

    De forma incongruente, repetindo o que afirmara nos anteriores recursos – e aí sim fazia sentido a alusão – alega não ter o acórdão procedido ao exame crítico das provas, conforme determina o artigo 374.º, n.º 2, o que gera nulidade de sentença, nos termos do artigo 379.º, n.º 1, alínea a), como aquele do CPP.

    (A conclusão III repete a conclusão III (parte) dos anteriores dois recursos, reportando omissão de pronúncia, embora nada se concretize, e daí a referência à alínea c) do n.º 1 do artigo 379.º do CPP na conclusão VI).

    Analisando.

    Começar-se-á por assinalar que a divergência da recorrente quanto à avaliação e valoração das provas feitas pelo tribunal é irrelevante, de acordo com jurisprudência há muito firmada - acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 19-09-1990, processo n.º 40 924, in Actualidade Jurídica n.º 10/11, Colectânea de Jurisprudência 1990, tomo 4, pág. 13 e BMJ n.º 399, pág. 260; de 03-07-1991, BMJ n.º 409, pág. 597; de 29-06-94, processo n.º 45.530, CJSTJ 1994, tomo 2, pág. 258; de 14-06-1995, processo n.º 47.994, BMJ n.º 448, pág. 259; de 21-06-1995, processo n.º 47.717, BMJ n.º 448, pág. 278 (a versão do recorrente sobre a valoração da prova não integra o vício do erro notório); de 28-06-1995, processo n.º 47.987, BMJ n.º 448, pág. 297; de 29-02-1996, processo n.º 46.740, BMJ n.º 454, pág. 531; de 10-07-1996, processo n.º 48.675, CJSTJ 1996, tomo 2, pág. 229 (maxime, 243); de 01-10-1997, processo 876/97-3.ª; de 08-10-1997, processo 874/97-3.ª; de 06-11-1997, processo n.º 122/97; de 18-12-1997, processos n.º 47325 e 930/97, Sumários de acórdãos do STJ, vol. II, págs. 156, 158, 216 e 220; de 15-04-1998, processo n.º 285/98-3.ª, BMJ n.º 476, pág. 82; de 29-10-1998, BMJ n.º 480, pág. 292; de 24-03-1999, processo n.º 176/99-3.ª, CJSTJ 1999, tomo 1, pág. 247; de 24-03-1999, processo n.º 1293/98, BMJ n.º 485, pág. 281; de 16-06-1999, processo n.º 422/99, BMJ n.º 488, pág. 262; de 19-01-2000, processo n.º 871/99-3.ª; de 06-12-2000, processo n.º 733/00.

    Como se dizia no acórdão de 18-12-1997, processo n.º 701/97, Sumários, ibid., pág. 220, a convicção do tribunal não pode ser tida por errada apenas porque as partes, eventualmente, valoram a prova de modo diverso.    

    Como referimos no acórdão de 20 de Novembro de 2014, processo n.º 87/14.9YFLSB.P1.S1, tendo na origem o n.º 689/12.8JAPRT.P1 (Homicídio de Joane):

    “A errada valoração da prova, ou o que é o mesmo, o erro de julgamento da matéria de facto é insindicável pelo STJ e pelas mesmas razões escapa aos poderes de cognição da Relação a apreciação da prova produzida em audiência segundo as regras da experiência comum e de acordo com a sua livre convicção, como manda o artigo 127.º do CPP, a menos que seja requerida a reapreciação da prova gravada, mas ainda aí com limitações e desde logo por não ser um segundo julgamento”. 

    Fora dos dois quadros possíveis de impugnação da matéria de facto (de forma mais ampla e abrangente, nos termos do artigo 412.º, n.º 3 e 4, do CPP, caso em que a discordância tem que ser veiculada, ancorada na análise da prova gravada, e da invocação dos vícios decisórios previstos no artigo 410.º, n.º 2, do CPP, com análise circunscrita ao texto da decisão recorrida), e desde que não se esteja perante prova vinculada e a facticidade apurada não se tenha baseado em meios de prova legalmente proibidos, a manifestação de divergência com o decidido sem outra forma, válida, de impugnação, a desconformidade entre a decisão do julgador e a do próprio recorrente é irrelevante, podendo conduzir a manifesta improcedência do recurso e sua rejeição.

    Quando assim acontece o recorrente expressa uma manifestação de divergência com o acervo fáctico adquirido na primeira instância, pretendendo, afinal, discutir as provas, no fundo atacar o concreto desempenho do princípio da liberdade de apreciação ou da livre convicção dos julgadores estabelecido no citado artigo 127.º, procurando impor o seu ponto de vista. Nesses casos o que na realidade o impugnante faz é manifestar a sua discordância com o decidido ao nível do assentamento da facticidade dada como apurada, pretendendo discutir de novo a prova – agora fora de um quadro de imediação e oralidade –, suscitar a questão da sua valoração, procurando impugnar a convicção adquirida pelos julgadores sobre os factos pertinentes à imputação do(s) crime(s) por que foi condenado, visando a alteração da matéria de facto assente, tendo como objectivo final a sua absolvição.

    Neste aspecto da valoração das provas, dir-se-á que na análise a efectuar há que ter em conta que a fixação da matéria de facto teve na sua base uma apreciação da prova segundo as regras da experiência e a livre convicção do julgador, nos termos do artigo 127.º do CPP.

    A divergência da recorrente quanto à avaliação e valoração das provas feitas pelo tribunal, como se referiu, é irrelevante, de acordo com jurisprudência há muito assente.

    Fazendo aplicação destes princípios, podem ver-se ainda os acórdãos deste Supremo Tribunal, de 05-12-2007, proferido no processo n.º 3406/07; de 12-03-2008, processo n.º 112/08; de 30-04-2008, processo n.º 4723/07; de 28-05-2008, processo n.º 1147/08; de 12-06-2008, processo n.º 4375/07; de 04-12-2008, processo n.º 2507/08; de 21-01-2009, processo n.º 2387/08; de 27-05-2009, processo n.º 484/09; de 27-05-2010, processo n.º 18/07.2GAAMT.P1.S1; de 14-07-2010, processo n.º 149/07.9JELSB.E1.S1; de 28-09-2011, processo n.º 172/07.3GDEVR.E2.S1; de 20-10-2011, processo n.º 36/06.8GAPSR.L4.S4; de 09-11-2011, processo n.º 43/09.9PAAMD.L1.S1; de 05-12-2012; processo n.º 250/10.1JALRA.E1.S1, de 11-12-2012 processo n.º 951/07.1GBMTJ.E1.S1, de 10-09-2014, processo n.º 1027/11.2PCOER.L1.S1 e de 20-11-2014, processo n.º 87/14.9YFLSB.P1.S1, Homicídio de Joane (na origem n.º 689/12.8JAPRT.P1), por nós relatados, e de 2 de Fevereiro de 2011, processo n.º 1375/07.6PMMTS.P1.S2-3.ª; de 05-06-2012, processo n.º 148/10.3SCLSB.L1.S1-3.ª; de 4-07-2013, processo n.º 39/10.8JBLSB.L1.S1-3.ª (inadmissível o recurso do arguido no segmento em que visa o reexame da matéria de facto sob a alegação de que a prova foi incorrectamente apreciada e que o acórdão da Relação enferma dos vícios do artigo 410.º, n.º 2 do CPP); de 4-07-2013, processo n.º 1243/10.4PAALM.L1.S1-3.ª (A preferência dada na formação da convicção probatória a certos meios de prova, de livre valoração pelo tribunal, em detrimento de outros, que, segundo a defesa, impeliriam para decisão distinta, não integra o vício do erro notório na apreciação da prova).

     Do exposto resulta que as conclusões que contenham este tipo de argumentação serão tidas por processualmente inoportunas, impertinentes e irrelevantes.

    Nestes casos o recurso será de rejeitar por manifesta improcedência.

    Como se referia no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 30-03-1995, in BMJ n.º 445, pág. 355, é de rejeitar o recurso por manifesta improcedência quando o recorrente se limita a discutir matéria de facto e a livre apreciação do tribunal.

    De igual sorte o acórdão de 21-06-1995, BMJ n.º 448, pág. 278: “Apresenta-se como manifestamente improcedente, e, portanto, deve ser rejeitado, o recurso cuja fundamentação se circunscreve à interpretação da prova que se diz ter sido produzida em audiência, indicando-se os factos que deveriam ter sido considerados provados, em vez dos que foram dados por provados”.

    Como se extrai do acórdão de 8-10-1997, processo n.º 897/97-3.ª, Sumários da Assessoria 1997, n.º 14, pág. 132 “Na ausência de qualquer prova vinculada, é insindicável pelo STJ a convicção formada pelo tribunal a quo, sendo por isso de rejeitar, por manifestamente improcedente, o recurso em que o recorrente pretende fazer vingar a sua convicção”.

    Diz-se no acórdão de 27-11-1997, processo n.º 1130/97-3.ª, ibidem, pág. 186 “É manifesta a improcedência do recurso, e por isso de rejeitar, quando o recorrente não concorda com a maneira como o colectivo valorou o conjunto das provas e fixou a matéria de facto, fazendo dessas provas uma leitura e avaliação diferentes”.

    No mesmo sentido, o acórdão de 27-11-1997, processo n.º 291/97, 3.ª, ibidem, pág. 188: “É manifestamente improcedente o recurso interposto pelo recorrente quando este se limita a discordar do processo lógico usado pelo Colectivo para formar a sua convicção. O recurso é de rejeitar por manifestamente improcedente”.

    O acórdão de 19-05-2004, proferido no processo n.º 904/04 - 3.ª, pronunciou-se nestes termos: «A recorrente apenas suscita questões relativamente à matéria de facto, discute depoimentos e o modo como a prova foi apreciada, designando como erro notório na apreciação da prova apenas a circunstância de a conclusão probatória do tribunal da Relação ser diversa daquela que, na sua apreciação, deveria ter sido a decisão sobre os factos.

    Ora, nos termos do art. 434.º do CPP, o recurso interposto para o STJ visa exclusivamente o reexame de matéria de direito, sem prejuízo da apreciação oficiosa dos vícios do art. 410.º do CPP.

    Sendo tal apreciação, por oficiosa, apenas do critério do Supremo Tribunal, quando considere que há motivos para conhecer dos referidos vícios, a invocação destes não pode constituir fundamento de recurso.

   E, de qualquer modo, também não vem invocado no recurso qualquer fundamento que se possa integrar em alguma das categorias que a lei de processo enuncia no referido artigo 410.º, n.º 2, do CPP.

  Discutindo apenas matéria de facto, o recurso é, assim, manifestamente improcedente, e deve ser rejeitado, como determina o art. 420.º, n.º 1 do CPP».

   Como se extrai do acórdão do STJ, de 22-11-2006, processo n.º 4084/06-3.ª “A manifesta improcedência constitui um fundamento de rejeição do recurso de natureza substancial, visando os casos em que os termos do recurso não permitem a cognição do tribunal ad quem, ou quando, versando sobre questão de direito, a pretensão não estiver minimamente fundamentada ou for claro, simples, evidente e de primeira aparência que não pode obter provimento. Será o caso típico de invocação contra a matéria de facto directamente provada, de discussão processualmente inadmissível sobre a decisão em matéria de facto, ou de o recurso respeitar à qualificação e à medida da pena e não ser referida nem existir fundamentação válida para alterar a qualificação acolhida ou a pena que foi fixada pela decisão recorrida”. (sublinhado nosso).

   Citando o anterior pode ver-se o acórdão de 07-04-2010, proferido no processo n.º 2792/05.1TDLSB.L1.S1-3.ª, onde se refere que “o entendimento crítico do recorrente sobre a valoração da prova efectuada nas instâncias é matéria específica de duplo grau de jurisdição em matéria de facto, estranha aos poderes de cognição do Supremo Tribunal de Justiça, sendo certo que o duplo grau de jurisdição em matéria de facto não visa a repetição do julgamento na 2.ª instância, mas dirige-se somente ao exame dos erros de procedimento ou de julgamento que lhe tenham sido referidos em recurso e às provas que impõem decisão diversa e não indiscriminadamente a todas as provas produzidas em audiência”.

   A rejeição, por manifesta improcedência, impor-se-á ainda quando, através de uma avaliação sumária dos fundamentos do recurso, se puder concluir, sem margem para dúvidas, que o mesmo será claramente votado ao insucesso, que os seus fundamentos são inatendíveis – assim, acórdãos do STJ de 17-10-1996, processo n.º 633/96; de 06-05-1998, processo n.º 113/98; de 05-04-2000, processo n.º 47/00, ou como se diz no acórdão de 18-04-2002, processo n.º 1082/02, é manifestamente improcedente o recurso quando é clara a sua inviabilidade “quando no exame necessariamente perfunctório a que se procede no visto preliminar, se pode concluir, face à alegação do recorrente, à letra da lei e às posições da jurisprudência sobre as questões suscitadas, que aquele recurso está votado ao insucesso”. 

    Podem ver-se aplicações concretas nos acórdãos de 21-05-2008, processo n.º 678/08; de 28-05-2008, processo n.º 1147/08; de 4-12-2008, processo n.º 2507/08; de 21-01-2009, processo n.º 2387/08; de 14-07-2010, processo n.º 149/07.JELSB.E1.S1; de 28-09-2011, processo n.º 172/07.3GBEVR.E2.S2; de 09-11-2011, processo n.º 43/09.9PAAMD.L1.S1; de 15-12-2011, processo n.º 17/09.0TELSB.L1.S1; de 26-09-2012, processo n.º 460/10.1JALRA.C1.S1, de 5-12-2012, processo n.º 250/10.1JALR.E1.S1; de 10-09-2014, processo n.º 1027/11.2PCOER.L1.S1 e de 20-11-2014, processo n.º 87/14.9YFLSB.P1.S1 Homicídio de Joane (na origem n.º 689/12.8JAPRT.P1), todos por nós relatados.

    A recorrente, pretendendo o reexame das declarações periciais e da confissão, como decorre do teor das conclusões mencionadas, as quais vão para além das referências feitas nos três ligeiros parágrafos da motivação, no fundo, pretende impugnar a convicção dos julgadores, o que não é permitido face ao princípio plasmado no artigo 127.º do CPP, que nesta interpretação não padece de inconstitucionalidade.

   

    Concluindo.

    Neste segmento estamos perante recurso que se apresenta como manifestamente improcedente, o que é causa de rejeição, com este fundamento.

    Destarte, rejeita-se o recurso interposto pela arguida, no segmento em que invoca nulidade do acórdão recorrido por falta de exame crítico das provas.

   

    Passando ao segmento da

    Nulidade por omissão de pronúncia

    Como vimos, a conclusão III repete a conclusão III (parte) dos anteriores dois recursos, afirmando que “o Tribunal a quo volta a não pronunciar-se sobre matéria de facto que cumpria apreciar devidamente”.

    Acontece que a recorrente volta a apresentar uma conclusão que não tem qualquer base no texto da motivação, pois que apenas no primeiro parágrafo do segmento “Nulidade”, a fls. 1393, refere a alínea c) do n.º 1 do artigo 379.º do CPP.

    Sobre a omissão de pronúncia nada se concretiza, surgindo de novo a referência à alínea c) do n.º 1 do artigo 379.º do CPP na conclusão VI, mas a propósito do exame crítico da prova, o que não deixa de revelar alguma confusão quanto aos alegados vícios.

    Sem embargo, sempre se dirá que se não verifica omissão de pronúncia.

     Se é certo que por força do n.º 4 do artigo 425.º do CPP é correspondentemente aplicável aos acórdãos proferidos em recurso o disposto no artigo 379.º, ou seja, a arguição ou o conhecimento oficioso de nulidade (no caso por o tribunal ter deixado de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar - alínea c) do n.º 1 daquele artigo 379.º), não menos verdade será que tal aplicabilidade terá os limites decorrentes da própria natureza da intervenção do tribunal de recurso a nível da fundamentação de facto e mais especificamente da motivação e do exame crítico das provas, que têm lugar na 1.ª instância, com amplas possibilidades de cognição e investigação, actuando em registo de oralidade, imediação e concentração, o que não acontece na Relação.

    Como se pode ler no acórdão deste Supremo Tribunal de 13-11-2002, SASTJ, n.º 65, pág. 60, “aplicada aos tribunais de recurso, a norma do artigo 374.º, n.º 2, do CPP, não tem aplicação em toda a sua extensão, nomeadamente, não faz sentido a aplicação da parte final de tal preceito “exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal”, quando referida a acórdão confirmatório proferido pelo Tribunal da Relação, ou quando referida a acórdão do STJ funcionando como tribunal de revista.

    Se a Relação, reexaminando a matéria de facto, mantém a decisão da primeira instância, é suficiente que do respectivo acórdão passe a constar esse reexame e a conclusão de que, analisada a prova respectiva, não se descortinaram razões para exercer censura sobre o decidido”.

     No mesmo sentido, podem ver-se os acórdãos de 13-02-2008, processo n.º 4729/07-3.ª; de 07-05-2008, processos n.ºs 294/08-3.ª e 1132/08-3.ª; de 25-06-2008, processo n.º 2046/07-3.ª, onde se aduz: “a fundamentação decisória da Relação é exercida sobre uma outra decisão que, por seu turno, já motivou a convicção; nesse sentido, não é uma fundamentação originária, mas uma fundamentação derivada, sendo-lhe lícito recorrer à fundamentação da decisão recorrida para justificar as suas próprias soluções”; de 10-09-2008, processo n.º 2506/08-3.ª; de 08-10-2008, processo n.º 3068/08-3.ª; de 22-10-2008, processo n.º 215/08-3.ª; de 27-05-2009, processo n.º 484/09-3.ª; de 25-06-2009, processo n.º 5/05.5PBOLH-3.ª; de 23-09-2010, processo n.º 65/09.9JACBR.C1.S1-3.ª; de 19-05-2010, processo n.º 459/05.0GAFLG.G1.S1-3.ª; de 12-07-2012, processo n.º 350/98.4TAOLH.E1.S1-3.ª.

    Como diz o acórdão de 06-01-2011, proferido no processo n.º 355/09.1JAAVR.C1.S1-5.ª, em matéria de fundamentação da decisão, a posição hierárquica do tribunal recorrido que é um Tribunal da Relação (um tribunal de recurso, que tendo embora competência para conhecer de facto e de direito, exerce um poder de controle sobre a decisão recorrida numa óptica de reexame do decidido, com vista a detectar erros in judicando ou in procedendo, mas não a proceder a um segundo julgamento), tem reflexos que se traduzem em o artigo 374.º, n.º 2, do CPP, no que respeita ao exame crítico dos meios de prova, não poder ser directamente transposto para a fase de recursos, o que é evidente, por uma razão elementar: o tribunal de recurso não procede a um julgamento com subordinação aos princípios da imediação e da oralidade, não estabelecendo contacto directo com as provas produzidas, nomeadamente, com as provas pessoais, nem com os participantes do processo, salvo casos pontuais de renovação da prova; a fundamentação exigida quanto ao exame crítico da prova não pode, pois, ser do mesmo tipo da que se exige para a 1.ª instância.

O artigo 374.º só indirectamente é aplicável, através do art. 379.º, mas com as devidas adaptações (correspondentemente), sendo que essas adaptações têm de levar em conta que os tribunais da relação, embora tenham competência em matéria de facto não apreciam directamente a prova produzida e não a apreciam nos mesmos termos da 1.ª instância, pelo que a fundamentação exigida para as suas decisões tem de estar em consonância com a natureza do seu objecto, que é a reapreciação de uma outra decisão, no universo de questões levantadas pelo recurso.

 Fundamentalmente, ao tribunal de recurso cabe verificar se a decisão recorrida fundamentou a sua opção em matéria de decisão de forma consistente, lógica e racional e de acordo com as regras da experiência comum, isto é, se tal opção decisória se mostra convincente do ponto de vista da lógica interna da explicitação da sua motivação, referindo criticamente os meios de prova decisivos para a formação da respectiva convicção, e se mostra consentânea com as máximas, os princípios e os ensinamentos da vida, segundo a experiência normal das coisas.

   Como se extrai do acórdão de 13-01-2011, processo n.º 316/07.5GBSTS.G2.S1-5.ª, citando o acórdão de 10-12-2009, proferido no processo n.º 22/07.0GACUB.S1-3.ª, a omissão de pronúncia, no âmbito da impugnação de decisão proferida sobre matéria de facto, só ocorre quando o Tribunal da Relação, em lugar de responder com precisão à interpelação feita pelo recorrente sobre factos considerados provados, em relação à prova produzida, se remete a uma enunciação genérica, sem qualquer correspondência com as questões concretas que lhe são colocadas, não tomando posição sobre os diversos pontos da materialidade considerada provada que são impugnados nem analisando a prova que, quanto a eles, foi produzida.

    Analisando o acórdão recorrido, que a recorrente refere de forma fugaz a fls. 1392, dizendo não se conformar com o mesmo, o qual negou provimento ao recurso por si interposto e confirmou a decisão recorrida.

    Não obstante esta proclamação inicial, como já referido, ao longo de toda a motivação e conclusões, a recorrente parece olvidar que decisão recorrida é o acórdão da Relação de Lisboa, dirigindo a manifestação da sua divergência à primeira instância, o que estará em consonância com o facto de este ser mera repetição dos anteriores recursos, dirigidos esses sim, ao acórdão do Colectivo de Alenquer.  

    No recurso para a Relação a recorrente invocara a nulidade do acórdão então recorrido por falta de exame crítico das provas e por omissão de pronúncia e deduzira ainda impugnação da matéria de facto/erro de julgamento

    A primeira questão foi apreciada no acórdão ora recorrido de fls. 1340 a 1344, concluindo que o tribunal (de Alenquer) foi lógico e congruente, consistente e suficiente, explicando as razões pelas quais se convenceu de que os factos haviam decorrido tal como foram dados por provados na primeira instância, afastando a omissão de pronúncia, aliás, não concretizada, não deixando de assinalar terem sido colmatadas as deficiências de que padecia o anterior acórdão de 12 de Agosto de 2013, que conduziram à sua anulação e, concretamente, entre o mais, com a tomada de posição sobre a eventual verificação de uma situação de imputabilidade diminuída.

    No que toca ao segundo segmento de impugnação da matéria de facto, o Tribunal da Relação deu por minimamente cumpridas as exigências legais, com a discriminação estabelecida no artigo 412.º, n.º 3 e 4, do CPP, seguindo com a análise da prova produzida de fls. 1344 a 1353, abordando concretamente a questão de saber se no momento da prática dos factos a recorrente tinha a sua imputabilidade diminuída, tendo procedido a audição de depoimentos prestados em audiência, concluindo não haver fundamento para a pretendida alteração da matéria de facto, considerando-a definitivamente fixada.

    A Relação cumpriu o tema proposto nos quadros da fundamentação derivada como lhe competia, nos termos do artigo 425.º, n.º 4, do CPP, não se verificando qualquer nulidade por omissão de pronúncia.

    Improcede, pois, esta pretensão de declaração de nulidade por esta via.

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    Muito embora não seja tema de recurso, na medida em que constitui um prius em relação à questão da medida da pena, abordar-se-á a questão      

    Da atenuação especial

    Como vimos, ao longo da motivação a recorrente reporta apenas a “Nulidade” e a “Medida da pena”, o que faz, aliás, copiando, decalcando, o que alegara nos recursos anteriores dirigidos ao Tribunal da Relação de Lisboa.

    A questão da atenuação especial da pena não foi abordada na motivação do recurso, surgindo apenas nas conclusões assinaladas, pelo que não integra o objecto do recurso.

    De qualquer forma sempre se dirá que a medida premial coloca-se em relação à determinação da medida concreta das penas parcelares, as quais no que concerne às dos homicídios qualificados não vêm impugnadas, sendo que em relação às restantes a respectiva medida concreta e a dupla conforme, nos termos do artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do CPP, impediriam sempre qualquer reapreciação.

   Sendo de ter por inimpugnadas umas, atenta a tese do recurso que foca apenas a medida da pena única e sendo inimpugnáveis outras, fica precludida a possibilidade de apreciação da aplicação do instituto, como é jurisprudência assente.

    De acordo com o acórdão do STJ de 11 de Dezembro de 2008, proferido no processo n.º 3632/08-5.ª, não tem fundamento legal a pretensão da recorrente de atenuação especial da pena do concurso, quando se coloca a questão da determinação da pena única /conjunta no concurso de infracções, já cada um dos crimes foi apreciado separadamente, com ponderação da eventual existência de circunstâncias que justificassem a atenuação especial, e é no quadro de uma moldura abstracta, mas balizada agora por penas concretas, em que já foi ponderado e eventualmente corrigida a moldura penal prevista pelo legislador por cada crime, que aquela pena única determina (citado no acórdão de 27-5-2010 processo n.º 601/05)

    Para o acórdão do STJ de 13 de Julho de 2009, proferido no processo n.º 1187/07.7PAPTM.S1-5.ª Secção, “Somente por referência a cada um dos crimes em concurso, e não à operação do cúmulo jurídico das penas parcelares, se pode colocar a questão da atenuação especial da pena, nos termos dos arts. 72.º e 73.º do CP, desde que as circunstâncias do caso evidenciem um menor graus de culpa ou de ilicitude, ou de necessidade de pena, relativamente ao que fora o pensamento do legislador, em sede de moldura abstracta para o correspondente tipo legal.

    Para o acórdão de 27 de Maio de 2010, processo n.º 601/05.0SLPRT.P1.S1-5.ª - o instituto da atenuação especial da pena, é exclusivo do “modelo” de determinação da pena pelo crime (pena singular), não tendo, consequentemente, aplicação à determinação da pena pelo concurso de crimes.

    Segundo o acórdão de 9 de Junho de 2010, proferido no processo n.º 468/06.1PGLSB.S2- 5.ª Secção, “o instituto da atenuação  especial da pena (…) é exclusivo do “modelo” de determinação da pena pelo crime (pena singular), não tendo, consequentemente, aplicação à determinação da pena pelo concurso de crimes.

     O fundamento da atenuação especial da pena, nos termos do art. 72.º do CP, é a verificação de circunstâncias excepcionais, anteriores ou posteriores ao crime ou contemporâneas dele, que confiram ao facto uma imagem global de uma gravidade tão diminuída que leve a considerar que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura penal abstracta para o crime, por forma a justificar que se construa uma nova moldura penal abstracta para o crime, segundo as regras do art. 73.º do CP.

     Por conseguinte, conforme entendimento sempre afirmado pelo STJ (cf. Ac. de 11-12-2008, Proc. n.º 3632/08 - 5.ª), não tem fundamento legal a pretensão da recorrente de atenuação especial da pena do concurso”.

     Como se extrai dos acórdãos de 15-11-2012, proferido no processo n.º 5/04.2TASJP.P1.S1-3.ª e de 5-12-2012, processo n.º 1213/09.5PBOER.S1-3.ª “O instituto da atenuação especial da pena apenas tem campo de aplicação no domínio das penas parcelares, que não na pena conjunta, pois é no momento da determinação da medida concreta das penas parcelares que se afere dos pressupostos constantes do artigo 72.º do Código Penal”.

    Como diz o acórdão de 4-07-2013, proferido no processo n.º 144/10.0JBLSB.L1.S2-5.ª “a atenuação especial da pena não é uma operação que tem de ser efectuada no cúmulo jurídico das penas, mas em relação a cada uma das penas fixadas em concreto. Na decisão que procede ao cúmulo jurídico, aplicando uma pena única, já o tribunal tem de partir das penas concretamente aplicadas que foram objecto de cognição autónoma, incluindo nesta a atenuação especial, se acaso se verificarem os respectivos pressupostos”.

    E segundo o acórdão de 20 de Fevereiro de 2014, processo n.º 99/12.7JALRA.L1.S1-5.ª “A atenuação especial da pena é instituto exclusivo da determinação da pena pelo crime (crime singular), não contendo, por seu lado, o sistema de determinação da pena do concurso de crimes a previsão da construção de uma moldura penal abstracta especialmente atenuada”.

    Para o acórdão de 6 de Março de 2014, processo n.º 352/10.4PEOER.S1-3.ª – No caso de concurso de crimes, as circunstâncias susceptíveis de justificarem a atenuação especial da pena - portanto, também a aplicação do art. 4.º do regime penal especial para jovens, aprovado pelo DL 401/82, de 23-09 - actuam no momento da determinação da medida concreta de cada uma das penas singulares e não (ou também não) no momento da determinação da pena conjunta.

    Como refere o acórdão de 25 de Junho de 2014, proferido no processo n.º 14447/08.0TDPRT.S4-3.ª “O Regime Penal Especial para Jovens (DL 401/82, de 23-09) e o instituto da atenuação especial da pena (art. 72.º do CP) não são aplicáveis à pena única ou conjunta”.

    Para o acórdão de 9 de Julho de 2014, proferido no processo n.º 832/10.1JAPRT.S1-5.ª, a questão da atenuação especial, em caso de concurso de crimes, coloca-se em relação às penas singularmente aplicadas pelos vários crimes É disso que tratam as normas incluídas na Secção I do Capítulo IV do Título III do Código Penal – arts. 70.º a 74.º. As regras de determinação da pena conjunta são as previstas na secção III – arts. 77.º a 79.º. 

    No mesmo sentido ainda o acórdão de 17-12-2014, proferido no processo n.º 512/13.6PGLRS.L1.S1-3.ª.

    Noutra perspectiva há incompatibilidade de atenuação especial de penas respeitantes a crimes com agravação com base na especial censurabilidade e perversidade.

    Assim o acórdão de 27 de Maio de 2010, processo n.º 6/09.4JAGRD.C.S1-3.ª - A culpa agravada é necessariamente incompatível com a imputabilidade diminuída, da qual decorre uma menor capacidade de autodomínio e auto determinação do agente e acórdão de 18-09-2013, processo n.º 62/12.8PJOER.S1-3.ª. 

    Concluindo: não há lugar a atenuação especial da pena conjunta.

 

    II Questão – Medida da pena conjunta

 

    A recorrente refere-se à medida da pena única, insurgindo-se contra o acórdão por não ter procedido à ponderação em conjunto dos factos e da personalidade do agente que serviram para a determinação da medida concreta da pena, nos termos do disposto no artigo 77.º, n.º 1, do Código Penal, nas conclusões IV, V, IX, X (esta repetindo a segunda parte da anterior), XI a XXV, XXX, XXXI, XXXII, XXXIV a XXXVII, XXXIX a XXXXVIII, as quais de conclusão têm pouco.

    No fundo a recorrente pede redução da pena conjunta aplicada, que considera manifestamente excessiva – conclusão XXXXIV – mas sem adiantar qualquer concretização, limitando-se a referir na última conclusão a pena única mais adequada, justa e equitativa e na conclusão V afirma que deve a pena de 24 anos de prisão ser reduzida para a sua duração mínima.

    

                                                               *******

 

    Estabelece, quanto a regras de punição do concurso de crimes, o artigo 77.º, n.º 1, do Código Penal, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de Março, que operou a terceira alteração ao Código Penal, em vigor desde 1 de Outubro de 1995 (e inalterado pelas subsequentes trinta e duas modificações legislativas, operadas, nomeadamente, e mais recentemente, pelas Leis n.º 59/2007, de 4 de Setembro, n.º 61/2008, de 31 de Outubro, n.º 32/2010, de 2 de Setembro, n.º 40/2010, de 3 de Setembro, n.º 4/2011, de 16 de Fevereiro, n.º 19/2013, de 21 de Fevereiro, n.º 60/2013, de 23 de Agosto, n.º 2/2014, de 6 de Agosto, n.º 59/2014, de 26 de Agosto, n.º 69/2014, de 29 de Agosto, n.º 82/2014, de 30 de Dezembro e n.º 30/2015, de 22 de Abril), que:

    “Quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa pena única. Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente”.

    E nos termos do n.º 2, a pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos, tratando-se de pena de prisão e 900 dias, tratando-se de pena de multa; e como limite mínimo, a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes.

    O que significa que no caso presente, a moldura penal do concurso é de 20 anos a 25 anos de prisão.

    A soma material das penas aplicadas atinge os 45 anos e 8 meses de prisão (20 + 20 + 4 + 1 anos e 8 meses).

     A medida da pena unitária a atribuir em sede de cúmulo jurídico reveste-se de uma especificidade própria.

     Por um lado, está-se perante uma nova moldura penal, mais ampla, abrangente, com maior latitude da atribuída a cada um dos crimes.

     Por outro, tem lugar, porque se trata de uma nova pena, final, de síntese, correspondente a um novo ilícito e a uma nova culpa (agora culpa pelos factos em relação), uma específica fundamentação, que acresce à decorrente do artigo 71.º do Código Penal.

     Constitui posição sedimentada e segura neste Supremo Tribunal de Justiça a de nestes casos estarmos perante uma especial necessidade de fundamentação, na decorrência do que dispõem o artigo 71.º, n.º 3, do Código Penal, e os artigos 97.º, n.º 5 e 375.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, em aplicação do comando constitucional ínsito no artigo 205.º, n.º 1, da CRP, onde se proclama que “As decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei”.
     Como estabelece o artigo 71.º, n.º 3, do Código Penal, “Na sentença são expressamente referidos os fundamentos da medida da pena”, decorrendo, por seu turno, do artigo 97.º, n.º 5, do Código de Processo Penal, que os actos decisórios são sempre fundamentados, devendo ser especificados os motivos de facto e de direito da decisão, e do disposto no artigo 375.º, n.º 1, do mesmo Código, que a sentença condenatória deve especificar os fundamentos que presidiram à escolha e à medida da sanção aplicada.

     Maia Gonçalves, in Código Penal Português Anotado e Comentado, 15.ª edição, pág. 277 (e a págs. 275 da 16.ª edição, de 2004 e pág. 295 da 18.ª edição, de 2007), a propósito do artigo 77.º, salientava que “na fixação da pena correspondente ao concurso entra como factor a personalidade do agente, a qual deve ser objecto de especial fundamentação na sentença. Ela é mesmo o aglutinador da pena aplicável aos vários crimes e tem, por força das coisas, carácter unitário”.

     A punição do concurso efectivo de crimes funda as suas raízes na concepção da culpa como pressuposto da punição – não como reflexo do livre arbítrio ou decisão consciente da vontade pelo ilícito. Mas antes como censura ao agente pela não adequação da sua personalidade ao dever - ser jurídico penal.

     Como acentua Figueiredo Dias em Liberdade, Culpa e Direito Penal, Coimbra Editora, 2.ª edição, 1983, págs. 183 a 185, “ (…) o substracto da culpa (…) não reside apenas nas qualidades do carácter do agente, ético-juridicamente relevantes, que se exprimem no facto, na sua totalidade todavia cindível (…). Reside sim na totalidade da personalidade do agente, ético-juridicamente relevante, que fundamenta o facto, e portanto também na liberdade pessoal e no uso que dela se fez, exteriorizadas naquilo a que chamamos a “atitude” da pessoa perante as exigências do dever ser. Daí que o juiz, ao emitir o juízo de culpa ou ao medir a pena, não possa furtar-se a uma compreensão da personalidade do delinquente, a fim de determinar o seu desvalor ético-jurídico e a sua desconformação em face da personalidade suposta pela ordem jurídico-penal. A medida desta desconformação constituirá a medida da censura pessoal que ao delinquente deve ser feita, e, assim, o critério essencial da medida da pena”.

                                                            *******

    No que concerne à determinação da pena única, deve ter-se em consideração a existência de um critério especial na determinação concreta da pena do concurso, segundo o qual serão considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente, o que obriga a que do teor da sentença conste uma especial fundamentação da medida da pena do concurso.

   Como se lê em Figueiredo Dias, Direito Penal Português - As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, § 420, págs. 290/1, estabelecida a moldura penal do concurso, a pena conjunta do concurso será encontrada em função das exigências gerais de culpa e de prevenção, fornecendo a lei, para além dos critérios gerais de medida da pena contidos no art. 72.º-1 (actual 71.º-1), um critério especial: o do artigo 78.º (actual 77.º), n.º 1, 2.ª parte, segundo o qual na determinação concreta da pena do concurso serão considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente, o que obriga logo a que do teor da sentença conste uma especial fundamentação da medida da pena do concurso.

   E no § 421, págs. 291/2, acentua o mesmo Autor que na busca da pena do concurso, “Tudo deve passar-se como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade – unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma «carreira») criminosa, ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta”.

    Acrescenta ainda: “De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização)”.

    Como se extrai do acórdão deste Supremo Tribunal de 6 de Maio de 2004, in CJSTJ 2004, tomo 2, pág. 191, a propósito dos critérios a atender na fundamentação da pena única, nesta operação o que releva e interessa considerar é, sobretudo, a globalidade dos factos em interligação com a personalidade do agente, de forma a aquilatar-se, fundamentalmente, se o conjunto dos factos traduz uma personalidade propensa ao crime, a dar indícios de projecto de uma carreira, ou é antes, a expressão de uma pluriocasionalidade que não encontra a sua razão de ser na personalidade do arguido, mas antes numa conjunção de factores ocasionais, sem repercussão no futuro – cfr. na esteira da posição do citado Autor, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 08-07-1998, CJSTJ 1998, tomo 2, pág. 246; de 24-02-1999, processo n.º 23/99-3.ª; de 12-05-1999, processo n.º 406/99-3.ª; de 27-10-2004, processo n.º 1409/04-3.ª; de 20-01-2005, processo n.º 4322/04-5.ª, in CJSTJ 2005, tomo I, pág. 178; de 17-03-2005, no processo n.º 754/05-5.ª; de 16-11-2005, in CJSTJ 2005, tomo 3, pág. 210; de 12-01-2006, no processo n.º 3202/05-5.ª; de 08-02-2006, no processo n.º 3794/05-3.ª; de 15-02-2006, no processo n.º 116/06-3.ª; de 22-02-2006, no processo n.º 112/06-3.ª; de 22-03-2006, no processo n.º 364/06-3.ª; de 04-10-2006, no processo n.º 2157/06-3.ª; de 21-11-2006, in CJSTJ 2006, tomo 3, pág. 228; de 24-01-2007, no processo n.º 3508/06-3.ª; de 25-01-2007, nos processos n.ºs 4338/06-5.ª e 4807/06-5.ª; de 28-02-2007, no processo n.º 3382/06-3.ª; de 01-03-2007, no processo n.º 11/07-5.ª; de 07-03-2007, no processo n.º 1928/07-3.ª; de 14-03-2007, no processo n.º 343/07-3.ª; de 28-03-2007, no processo n.º 333/07-3.ª; de 09-05-2007, nos processos n.ºs 1121/07-3.ª e 899/07-3.ª; de 24-05-2007, no processo n.º 1897/07-5.ª; de 29-05-2007, no processo n.º 1582/07-3.ª; de 12-09-2007, no processo n.º 2583/07-3.ª; de 03-10-2007, no processo n.º 2576/07-3.ª; de 24-10-2007, no processo nº 3238/07-3.ª; de 31-10-2007, no processo n.º 3280/07-3.ª; de 09-04-2008, no processo n.º 686/08-3.ª (o acórdão ao efectuar o cúmulo jurídico das penas parcelares não elucida, porque não descreve, o raciocínio dos julgadores que orientou e decidiu a determinação da medida da pena do cúmulo); de 25-06-2008, no processo n.º 1774/08-3.ª; de 02-04-2009, processo n.º 581/09-3.ª, por nós relatado, in CJSTJ 2009, tomo 2, pág. 187; de 21-05-2009, processo n.º 2218/05.0GBABF.S1-3.ª; de 29-10-2009, no processo n.º 18/06.0PELRA.C1.S1-5.ª, in CJSTJ 2009, tomo 3, pág. 224 (227); de 25-11-2009, processo n.º 490/07.0TAVVD.S1-3.ª; de 04-03-2010, no processo n.º 1757/08.6JDLSB.S1-5.ª; de 10-11-2010, no processo n.º 23/08.1GAPTM-3.ª.

    Na expressão dos acórdãos deste Supremo Tribunal de Justiça, de 20-02-2008, proferido no processo n.º 4733/07 e de 8-10-2008, no processo n.º 2858/08, desta 3.ª Secção, na formulação do cúmulo jurídico, o conjunto dos factos fornece a imagem global do facto, o grau de contrariedade à lei, a grandeza da sua ilicitude; já a personalidade revela-nos se o facto global exprime uma tendência, ou mesmo uma “carreira”, criminosa ou uma simples pluriocasionalidade.

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    Na consideração dos factos (do conjunto dos factos que integram os crimes em concurso) está ínsita uma avaliação da gravidade da ilicitude global, como se o conjunto de crimes em concurso se ficcionasse como um todo único, globalizado, que deve ter em conta a existência ou não de ligações ou conexões e o tipo de ligação ou conexão que se verifique entre os factos em concurso - cfr., i. a., acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 17-03-2004,  03P4431; de 20-01-2005, CJSTJ 2005, tomo 1, pág. 178; de 08-06-2006, processo n.º 1613/06 – 5.ª; de 07-12-2006, processo n.º 3191/06 – 5.ª; de 20-12-2006, processo n.º 3379/06-3.ª; de 18-04-2007, processo n.º 1032/07 – 3.ª; de 03-10-2007, processo n.º 2576/07-3.ª, in CJSTJ 2007, tomo 3, pág. 188; de 09-01-2008, processo n.º 3177/07-3.ª, in CJSTJ 2008, tomo 1, pág. 181; de 06-02-2008, processos n.º s 129/08-3.ª e 3991/07-3.ª, in CJSTJ 2008, tomo I, pág. 221; de 06-03-2008, processo n.º 2428/07 – 5.ª; de 13-03-2008, processo n.º 1016/07 – 5.ª; de 02-04-2008, processos n.º s 302/08-3.ª e 427/08-3.ª; de 09-04-2008, processo n.º 1011/08 – 5.ª; de 07-05-2008, processo n.º 294/08 – 3.ª; de 21-05-2008, processo n.º 414/08 – 5.ª; de 04-06-2008, processo n.º 1305/08 – 3.ª; de 25-09-2008, processo n.º 2891/08 – 3.ª; de 29-10-2008, processo n.º 1309/08– 3.ª; de 27-01-2009, processo n.º 4032/08 – 3.ª; de 29-04-2009, processo n.º 391/09 – 3.ª; de 14-05-2009, processo n.º 170/04.9PBVCT.S1 – 3.ª; de 27-05-2009, processo n.º 50/06.3GAVFR.C1.S1 – 3.ª; de 18-06-2009, processo n.º 577/06.7PCMTS.S1 – 3.ª; de 18-06-2009, processo n.º 8253/06.1TDLSB-3.ª; de 25-06-2009, processo n.º 274/07-3.ª, CJSTJ 2009, tomo 2, pág. 251 (a decisão que efectiva o cúmulo jurídico das penas parcelares necessariamente que terá de demonstrar fundamentando que foram avaliados o conjunto dos factos e a interacção destes com a personalidade); de 21-10-2009, processo n.º 360/08.5GEPTM.S1-3.ª; de 04-11-2009, processo n.º 296/08.0SYLSB.S1-3.ª; de 18-11-2009, processo n.º 702/08.3GDGDM.P1.S1-3.ª; de 25-11-2009, processo n.º 490/07.0TAVVD-3.ª; de 10-12-2009, processo n.º 496/08.2GTABF.E1.S1-3.ª (citado no acórdão de 23-06-2010, processo n.º 862/04.2PBMAI.S1-5.ª), ali se referindo: “Na determinação da pena única do concurso, o conjunto dos factos indica a gravidade do ilícito global, sendo decisiva a avaliação e conexão e o tipo de conexão que se verifique entre os factos concorrentes. Na avaliação da personalidade – unitária – do agente importa, sobretudo, verificar se o conjunto dos factos é recondutível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma «carreira» criminosa), ou tão-só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta”; de 04-03-2010, no processo n.º 1757/08.6JDLSB.L1.S1-5.ª; de 10-03-2010, no processo n.º 492/07.7PBBJA.E1.S1-3.ª; de 18-03-2010, no processo n.º 160/06. 7GBBCL.G2.S1-5.ª; de 15-04-2010, no processo n.º 134/05.5PBVLG.S1-3.ª; de 28-04-2010, no processo n.º 260/07.6GEGMR.S1-3.ª; de 05-05-2010, no processo n.º 386/06.3SLSB.S1-3.ª; de 12-05-2010, no processo n.º 4/05.7TDACDV.S1-5.ª; de 27-05-2010, no processo n.º 708/05.4PCOER.L1.S1-5.ª; de 09-06-2010, processo n.º 493/07.5PRLSB-3.ª; de 23-06-2010, no processo n.º 666/06.8TABGC-K.S1-3.ª; de 20-10-2010, processo n.º 400/08.8SZLB.L1-3.ª; de 03-11-2010, no processo n.º 60/09.9JAAVR.C1.S1-3.ª; de 16-12-2010, processo n.º 893/05.5GASXL.L1.S1-3.ª; de 19-01-2011, processo n.º 6034/08.0TDPRT.P1.S1-3.ª; de 02-02-2011, processo n.º 217/08.0JELSB.S1-3.ª; de 31-01-2012, processo n.º 2381/07.6PAPTM.E1.S1-3.ª; de 12-09-2012, processos n.º 223/07.1GCVIS.C1.S1-3.ª e 2745/09.0TDLSB.L1.S1-3.ª; de 06-02-2013, processo n.º 639/10.6PBVIS.S1-3.ª; de 14-03-2013, processo n.º 224/09.5PAOLH.S1 e n.º 13/12.0SOLSB.S1, ambos desta secção e do mesmo relator; de 10-07-2013, processo n.º 413/06.4JAFAR.E2.S1-3.ª; de 12-09-2013, processo n.º 1445/09.6JAPRT.P1.S1-3.ª; de 04-06-2014, processo n.º 186/13.4GBETR.P1.S1-3.ª.

    Como refere Cristina Líbano Monteiro, A Pena «Unitária» do Concurso de Crimes, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 16, n.º 1, págs. 151 a 166, o Código rejeita uma visão atomística da pluralidade de crimes e obriga a olhar para o conjunto – para a possível conexão dos factos entre si e para a necessária relação de todo esse bocado de vida criminosa com a personalidade do seu agente, estando em causa a avaliação de uma «unidade relacional de ilícito», portadora de um significado global próprio, a censurar de uma vez só a um mesmo agente.

      A pena conjunta tenderá a ser uma pena voltada para ajustar a sanção - dentro da moldura formada a partir de concretas penas singulares – à unidade relacional de ilícito e de culpa, fundada na conexão auctoris causa própria do concurso de crimes.

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    Como referimos nos acórdãos de 20 de Janeiro de 2010, de 24 de Fevereiro de 2010, de 9 de Junho de 2010, de 10 de Novembro de 2010, de 2 de Fevereiro de 2011, de 18 de Janeiro de 2012, de 5 de Julho de 2012, de 12 de Setembro de 2012 (dois), de 22 de Maio de 2013, de 1 de Outubro de 2014 e de 17 de Dezembro de 2014, proferidos no processo n.º 392/02.7PFLRS.L1.S1, in CJSTJ 2010, tomo 1, pág. 191, processo n.º 655/02.1JAPRT.S1, processo n.º 493/07.5PRLSB-3.ª, processo n.º 23/08.1GAPTM.S1, processo n.º 994/10.8TBLGS.S1-3.ª, processo n.º 34/05.9PAVNG.S1, CJSTJ 2012, tomo 1, pág. 209, processo n.º 246/11.6SAGRD, processos n.º 223/07.1GCVIS.C1.S1 e n.º 2745/09.0TDLSB.L1.S1, processo n.º 344/11.6PCBRG.G1.S1, processo n.º 11/11.0GCVVC.S1 e processo n.º 512/13.6PGLRS.L1.S1:
  “Perante concurso de crimes e de penas, há que atender ao conjunto de todos os factos cometidos pelo arguido, de modo a surpreenderem-se, ou não, conexões entre os diversos comportamentos ajuizados, através duma visão ou imagem global do facto, encarado na sua dimensão e expressão global, tendo em conta o que ressalta do contexto factual narrado e atender ao fio condutor presente na repetição criminosa, procurando estabelecer uma relação desses factos com a personalidade do agente, tendo-se em conta a caracterização desta, com sua projecção nos crimes praticados; enfim, há que proceder a uma ponderação da personalidade do agente e correlação desta com os concretos factos ajuizados, a uma análise da função e da interdependência entre os dois elementos do binómio, não sendo despicienda a consideração da natureza dos crimes em causa, da verificação ou não de identidade dos bens jurídicos violados, até porque o modelo acolhido é o de prevenção, de protecção de bens jurídicos.

     Todo este trabalho de análise global se justifica tendo em vista descortinar e aferir se o conjunto de factos praticados pelo(a) condenado(a) é a expressão de uma tendência criminosa, isto é, se significará já a expressão de algum pendor para uma “carreira”, ou se, diversamente, a feridente repetição comportamental dos valores estabelecidos emergirá antes e apenas de factores meramente ocasionais”.

    

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      Por outro lado, na confecção da pena conjunta, há que ter presentes os princípios da proporcionalidade, da adequação e proibição do excesso.

    Cremos que nesta abordagem, há que ter em conta os critérios gerais da medida da pena contidos no artigo 71.º do Código Penal – exigências gerais de culpa e prevenção – em conjugação, a partir de 1 de Outubro de 1995, com a proclamação de princípios ínsita no artigo 40.º, atenta a necessidade de tutela dos bens jurídicos ofendidos e das finalidades das penas, incluída a conjunta, aqui acrescendo o critério especial fornecido pelo artigo 77.º, n.º 1, do Código Penal - o que significa que este específico dever de fundamentação de apli parricídio cação de uma pena conjunta, não pode estar dissociado da questão da adequação da pena à culpa concreta global, tendo em consideração por outra via, pontos de vista preventivos, sendo que, in casu, a ordem de grandeza de lesão dos bens jurídicos tutelados e sua extensão não fica demonstrada pela simples enunciação, sem mais, do tipo legal violado, o que passa pela sindicância do efectivo respeito pelo princípio da proporcionalidade e da proibição do excesso, que deve presidir à fixação da pena conjunta, tornando-se fundamental a necessidade de ponderação entre a gravidade do facto global e a gravidade da pena conjunta.

    Neste sentido, podem ver-se aplicações concretas nos acórdãos de 21-11-2006, processo n.º 3126/06-3.ª, CJSTJ 2006, tomo 3, pág. 228 (a decisão que efectue o cúmulo jurídico não pode resumir-se à invocação de fórmulas genéricas; tem de demonstrar a relação de proporcionalidade entre a pena conjunta a aplicar e a avaliação dos factos e a personalidade do arguido); de 14-05-2009, no processo n.º 170/04.9PBVCT.S1-3.ª; de 10-09-2009, no processo n.º 26/05.8SOLSB-A.S1-5.ª, seguido de perto pelo acórdão de 09-06-2010, no processo n.º 493/07.5PRLSB.S1-3.ª, ali se referindo que “Importa também referir que a preocupação de proporcionalidade a que importa atender, resulta ainda do limite intransponível absoluto, dos 25 anos de prisão, estabelecido no n.º 2 do art. 77.º do CP. É aqui que deve continuar a aflorar uma abordagem diferente da pequena e média criminalidade, para efeitos de determinação da pena conjunta, e que se traduzirá, na prática, no acrescentamento à parcelar mais grave de uma fracção menor das outras”; de 18-03-2010, no processo n.º 160/06. 7GBBCL.G2.S1- 5.ª, onde se afirma, para além da necessidade de uma especial fundamentação, que “no sistema de pena conjunta, a fundamentação deve passar pela avaliação da conexão e do tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifica e pela avaliação da personalidade unitária do agente. Particularizando este segundo juízo - e apara além dos aspectos habitualmente sublinhados, como a detecção de uma eventual tendência criminosa do agente ou de uma mera pluriocasionalidade que não radica  em qualidades desvaliosas da personalidade - o tribunal deve atender a considerações de exigibilidade  relativa e à análise da concreta necessidade de pena resultante da inter-relação dos vários ilícitos típicos”; de 15-04-2010, no processo n.º 134/05.5PBVLG.S1-3.ª; de 21-04-2010, no processo n.º 223/09.7TCLSB.L1.S1-3.ª; e do mesmo relator, de 28-04-2010, no processo n.º 4/06.0GACCH.E1.S1-3.ª.

    Com interesse para o caso, veja-se o acórdão de 28-04-2010, proferido no processo n.º 260/07.6GEGMR.S1-3.ª, relativamente a onze crimes de roubo simples a agências bancárias.

    Como se refere nos acórdãos de 18-06-2009, processo n.º 334/04.5PFOER.L1.S1 e de 10-09-2009, processo n.º 26/05.8.SOLSB-A.S1, ambos da 5.ª Secção, “a pena conjunta situar-se-á até onde a empurrar o efeito “expansivo” sobre a parcelar mais grave, das outras penas, e um efeito “repulsivo” que se faz sentir a partir do limite da soma aritmética de todas as penas. Ora, esse efeito “repulsivo” prende-se necessariamente com uma preocupação de proporcionalidade, que surge como variante com alguma autonomia, em relação aos critérios da “imagem global do ilícito” e da personalidade do arguido. Proporcionalidade entre o peso relativo de cada parcelar, em relação ao conjunto de todas elas.

    Se a pena parcelar é uma entre muitas outras semelhantes, o peso relativo do crime que traduz é diminuto em relação ao ilícito global, e portanto, só uma fracção menor dessa pena parcelar deverá contar para a pena conjunta. (Asserção repetida no acórdão do mesmo relator, de 23-09-09, no processo n.º 210/05.4GEPNF.S2 -5.ª).

    A preocupação de proporcionalidade a que importa atender resulta do limite intransponível absoluto dos 25 anos de prisão estabelecido no n.º 2 do artigo 77.º do Código Penal.

    É aqui que deve continuar a aflorar uma abordagem diferente da pequena e média criminalidade, face à grande criminalidade, para efeitos de determinação da pena conjunta, e que se traduzirá, na prática, no acrescentamento à parcelar mais grave de uma fracção menor das outras.

    Como referimos nos acórdãos de 23-11-2010, processo n.º 93/10.2TCPRT.S1, de 24-03-2011, processo n.º 322/08.2TARGR.L1.S1 e de 12-09-2012, processos n.º 223/07.1GCVIS.C1.S1 e n.º 2745/09.0TDLSB.L1.S1 “A determinação da pena do concurso exige um exame crítico de ponderação conjunta sobre a conexão e interligação entre todos os factos praticados e a personalidade do seu autor, de forma a alcançar-se a valoração do ilícito global e entender-se a personalidade neles manifestada, de modo a concluir-se pela motivação que lhe subjaz, se emergente de uma tendência para delinquir, ou se se trata de mera ocasionalidade ou pluriocasionalidade não fundamentada na personalidade, tudo em ordem a demonstrar a adequação, justeza, e sobretudo, a proporcionalidade, entre a avaliação conjunta daqueles dois factores e a pena conjunta a aplicar e tendo em conta os princípios da necessidade da pena e da proibição de excesso.

     Importará indagar se a repetição operou num quadro de execução homogéneo ou diferenciado, quais os modos de actuação, de modo a concluir se estamos face a indícios desvaliosos de tendência criminosa, ou se estamos no domínio de uma mera ocasionalidade ou pluriocasionalidade, tendo em vista configurar uma pena que seja proporcional à dimensão do crime global, pois ao novo ilícito global, a que corresponde uma nova culpa, caberá uma nova, outra, pena.

    Com a fixação da pena conjunta não se visa re-sancionar o agente pelos factos de per si considerados, isoladamente, mas antes procurar uma “sanção de síntese”, na perspectiva da avaliação da conduta total, na sua dimensão, gravidade e sentido global, da sua inserção no pleno da conformação das circunstâncias reais, concretas, vivenciadas e específicas de determinado ciclo de vida do(a) arguido(a) em que foram cometidos vários crimes ”.

    Como se extrai dos acórdãos de 12-05-2010, processo n.º 4/05.7TACDV.S1-5.ª e de 16-12-2010, no processo n.º 893/05.5GASXL.L1.S1-3.ª, a pena única deve reflectir a razão de proporcionalidade entre as penas parcelares e a dimensão global do ilícito, na ponderação e valoração comparativas com outras situações objecto de apreciação, em que a dimensão global do ilícito se apresenta mais intensa.

    Reportam ainda a ideia de proporcionalidade os acórdãos de 11-01-2012, processo n.º 131/09.1JBLSB.L1.-A.S1-3.ª; de 18-01-2012, processo n.º 34/05.9PAVNG.S1-3.ª; de 31-01-2012, processo n.º 2381/07.6PAPTM.E1.S1-3.ª; de 05-07-2012, processo n.º 246/11.6SAGRD.S1-3.ª e os supra referidos de 12-09-2012, processos n.º 223/07.1GCVIS.C1.S1-3.ª e n.º 2745/09.0TDLSB.L1.S1-3.ª; de 22-01-2013, processo n.º 651/04.4GAFLTG.S1-3.ª; de 27-02-2013, processo n.º 455/08.5GDPTM.S1-3.ª; de 22-05-2013, processo n.º 344/11.6PCBRG.G1.S1-3.ª; de 19-06-2013, processo n.º 515/06.7GBLLE.S1-3.ª; de 10-07-2013, processo n.º 413/06.4JAFAR.E2.S1-3.ª; de 12-09-2013, processo n.º 1445/09.6JAPRT.P1.S1-3.ª; de 3-10-2013, processo n.º 522/01.6TACBR.C3.S1-5.ª, onde pode ler-se: «O equilíbrio entre os efeitos “expansivo” e “repulsivo” prende-se necessariamente com uma preocupação de proporcionalidade, que surge como variante com alguma autonomia, em relação aos critérios da “imagem global do ilícito” e da “personalidade do arguido”».

    Como se refere no acórdão de 2 de Maio de 2012, processo n.º 218/03.4JASTB.S1-3.ª, a formação da pena conjunta é uma solução para o problema de proporção resultante da integração das penas singulares numa única punição e o «restabelecimento do equilíbrio» entre crime isolado e pena singular, pelo que deve procurar-se que nas sucessivas operações de realização de cúmulo jurídico superveniente exista um critério uniforme de avaliação de tal proporcionalidade”.

    Como se pode ler no acórdão de 21 de Junho de 2012, processo n.º 38/08.0GASLV.S1, “numa situação de concurso entre uma pena de grande gravidade e diversas penas de média e curta duração, este conjunto de penas tem de ser objecto de uma especial compressão para evitar uma pena excessiva e garantir uma proporcionalidade entre penas que correspondem a crimes de gravidade muito díspar; doutro modo, corre-se o risco de facilmente se poder atingir a pena máxima, a qual deverá ser reservada para as situações de concurso de várias penas muito graves”.

    Focando a proporcionalidade na perspectiva das finalidades da pena, pode ver-se o acórdão de 27 de Junho de 2012, processo n.º 70/07.0JBLSB-D.S1-3.ª, onde consta: “A medida da pena única, respondendo num segundo momento também a exigências de prevenção geral, não pode deixar de ser perspectivada nos efeitos que possa ter no comportamento futuro do agente: a razão de proporcionalidade entre finalidades deve estar presente para não eliminar, pela duração, as possibilidades de ressocialização (embora de difícil prognóstico pelos antecedentes)”. (Sublinhados nossos).

    Sobre o princípio da proporcionalidade, proibição de excesso e princípio da legalidade na elaboração de pena única pode ver-se o acórdão de 10-09-2014, processo n.º 455/08-3.ª.

 

    Revertendo ao caso concreto.

    O acórdão recorrido quanto à questão de saber se era adequada a medida da pena única aplicada pelo Colectivo de Alenquer, a fls. 1366/7, expendeu:

    (…)

    “Existe conexão temporal e de execução entre os ilícitos de homicídio e dano praticados, já não no que concerne ao de maus tratos.

    Quanto à ilicitude do conjunto dos factos, entendida como juízo de desvalor da ordem jurídica sobre um comportamento, por este lesar e pôr em perigo bens jurídico-criminais, estamos face a crimes de homicídio qualificado (em que o valor jurídico tutelado é de ordem iminentemente pessoal – a vida humana), maus tratos (em que se protegem a integridade física e psíquica, a liberdade pessoal, a liberdade e autodeterminação sexual e a honra, como assinala Paulo Albuquerque, Comentário do Código Penal, UCE, 2ª edição, pág. 468) e dano (em que o bem jurídico protegido é a propriedade) sendo que, por estarem em causa bens jurídicos primordiais, designadamente o da vida humana e outros indispensáveis a uma sã e normal convivência social, não se verificando também identidade total dos bens jurídicos violados, se tem de considerar como significativa.

    A recorrente agiu com dolo, na modalidade de directo (a mais grave) e de grau intenso nos crimes de homicídio e de necessário nos de dano e maus tratos.

    No que concerne à sua personalidade, importa considerar a inexistência de condenações penais anteriores, assim como o que provado se mostra quanto às suas condições de vida, as anteriores aos factos em causa e as contemporâneas, assim como a situação psíquica (desenvolvimento após o nascimento do primeiro filho de quadro clínico compatível com depressão pós-parto, não tratada; elevada probabilidade de quadro clínico-psiquiátrico compatível com o diagnóstico de perturbação de personalidade dissocial ou borderline, com vulnerabilidade e necessidade de seguimento psiquiátrico/psicoterapêutico), de onde resulta, pelo menos por ora, não ser o ilícito global agora em apreciação determinado por alguma propensão ou tendência criminosa, antes será fruto de factores meramente ocasionais.

    As exigências de prevenção geral são muito intensas, ponderada a frequência com são praticados crimes contra a vida, com banalização do recurso à violência, que criam nos membros da comunidade forte sentimento de insegurança, potenciando a perda de confiança dos cidadãos no próprio Estado como principal regulador da paz social, impondo-se, por isso, o reforço da validade das normas violadas aos olhos da comunidade.

    No que toca à prevenção especial, dúvidas não há de que a arguida carece fortemente de socialização, com necessidade de fidelização ao Direito, tendo-se em vista a prevenção da prática de futuros crimes.

    Desta forma, cumpre concluir que a pena única de 24 anos de prisão encontrada pela 1ª instância está conforme aos critérios estabelecidos nos nºs 1 e 2 do artigo 77º, do Código Penal, situando-se entre os limites fixados na lei e mostrando-se adequada à consideração conjunta dos factos e da personalidade evidenciada pela recorrente.

    Em conclusão, inexiste também fundamento para alterar a medida em que a pena única foi fixada”.

    A pena conjunta visa corresponder ao sancionamento de um determinado trecho de vida do arguido condenado por pluralidade de infracções.

    Há que valorar o ilícito global perpetrado, ponderando em conjunto a gravidade dos factos e a sua relacionação com a personalidade do recorrente, em todas as suas facetas.                         

    Como vimos, o acórdão ora recorrido não se limitou a sufragar o texto da primeira instância, referindo-se relativamente à conexão entre os factos cometidos e a presença de mera ocasionalidade.

                                                                    *******

    Na elaboração da pena conjunta impõe-se fazer uma nova reflexão sobre os factos em conjunto com a personalidade do arguido, em ordem a adequar a medida da pena à personalidade que nos factos se revelou.

    Importa ter em conta a natureza e diversidade ou igualdade/similitude dos bens jurídicos tutelados, ou seja, a dimensão de lesividade da actuação global do arguido.

    E como referiu o supra citado acórdão de 27 de Junho de 2012, a pena única não pode deixar de ser perspectivada nos efeitos que possa ter no comportamento futuro do agente em função da sua maior ou menor duração. No mesmo sentido os acórdãos de 22 de Janeiro de 2013, processo n.º 651/04.4GAFLG.S1-3.ª, de 4 de Julho de 2013, processo n.º 39/10.8JBLSB.L1.S1-3.ª sobre o ponto e, citando neste particular os acórdãos do mesmo relator, de 9 de Fevereiro de 2011, processo n.º 19/05.5GAVNG.S1-3.ª e de 23 de Fevereiro de 2011, processo n.º 429/03. 2PALGS.S1-3.ª.

    No mesmo sentido, o acórdão de 2 de Fevereiro de 2011, processo n.º 217/08.0JELSB.S1, igualmente da 3.ª Secção, citando expressamente Figueiredo Dias no passo assinalado (§ 421 págs. 291/2).

   No caso presente estamos perante um quadro de quatro crimes, sendo o crime de maus tratos praticado em 12 de Agosto de 2012 (FP 5 a 19) e os dois homicídios como o crime de dano no dia 19 de Dezembro do mesmo ano, todos com acentuada gravidade, não se indiciando propensão ou inclinação criminosas.

     Na verdade, a facticidade dada por provada não permite formular um juízo específico sobre a personalidade da arguida que ultrapasse a avaliação que se manifesta pela própria natureza dos factos praticados, não se mostrando provada tendência radicada na personalidade, ou seja, que o ilícito global seja produto de tendência criminosa do agente, antes correspondendo no singular contexto ora apreciado, a dois episódios isolados de vida, ocorridos num período de quatro meses, restando a expressão de ocasionalidades procuradas pela arguida.

    No caso presente é evidente a conexão e estreita ligação entre os crimes de homicídio qualificado e de dano provocado pelo incêndio, que libertou o monóxido de carbono que determinou a morte por asfixia dos bebés, sendo cometidos na mesma ocasião, sendo o de dano efeito do meio escolhido para causar a morte. Distante no tempo fica o crime de maus tratos, mas com a conexão consistente em ter afectado a integridade física do menor CC.

     E como bem refere o acórdão recorrido, o ilícito global é fruto de factores meramente ocasionais.

     Em suma: A pena unitária tem de responder à valoração, no seu conjunto e inter conexão, dos factos e personalidade da arguida.

     No caso presente, olhando o ilícito global, não pode deixar de ser tomado em consideração todo o processo executivo adoptado pela arguida, preenchendo nos homicídios qualificados quatro outros factos-indíce, caracterizado por uma enorme insensibilidade perante a vida humana e por uma crueldade enorme, matando por asfixia as crianças por si geradas, actuando com frieza de ânimo e gélida concepção de valoração, o que é atestado no post factum com o escrito a explicar como o “Demónio” justifica os seus actos, isto num contexto de condutas praticadas por alguém que dormia com a Bíblia. 

      Ponderados todos os elementos disponíveis, considerando a dimensão e a gravidade global do comportamento delituoso da arguida, não se estando perante uma situação que espelhe uma “carreira criminosa”, a sequência da prática dos crimes, o carácter instrumental do incêndio que determinou o crime de dano, estando em causa violação de bens jurídicos com diferente natureza, a evidente conexão entre as infracções, a forma intensa de dolo nos homicídios, ponderando o contexto em que tudo se passou, procedendo a uma avaliação da gravidade do ilícito global e a personalidade da arguida evidenciada pelas condutas analisadas, atendendo a que a prática dos factos revela desconformidade aos valores tutelados pelo direito, embora não sendo de reconduzi-la a uma tendência desvaliosa, mas antes dentro de um quadro de acidentalidade de cometimento, procedendo-se a uma ponderação da gravidade do ilícito global, não havendo que introduzir factor de compressão, mantém-se a pena conjunta fixada em vinte e quatro anos de prisão, que não se mostra contrária às regras da experiência, sendo proporcional à dimensão do ilícito global.

   Uma nota

   Muito embora não tenha havido recurso da parte cível, não podemos deixar de dar nota sobre texto inserto nesse segmento no acórdão de Alenquer, relativamente ao qual sentimos obrigação de demarcação. 

   Em causa a indemnização por danos não patrimoniais próprios dos menores falecidos, que foi desconsiderada.

   No segundo acórdão do Colectivo de Alenquer, a fls. 1212, a exemplo do que já fora afirmado no primeiro, a fls. 861, ao referir-se ao pedido de condenação da demandada a pagar uma indemnização de € 8.000,00 para cada um dos filhos, a título de danos não patrimoniais sofridos pelos mesmos, afirma-se:

   “Sucede todavia que nesta matéria não foi produzida qualquer prova, sendo certo que nem sequer foram alegados factos sobre os quais devesse ter recaído essa prova, como impõe o princípio do dispositivo.

   Nomeadamente, não ficou provado que os ofendidos tivessem sofrido dores e/ou angústia, qual o tempo que mediou entre a conduta da arguida e a morte das crianças, se estas terão representado a inevitabilidade da própria morte”.

   Estas considerações são feitas, não obstante se ter dado por provado - factos provados 43 e 44 - que as crianças morreram por asfixia por monóxido de carbono, não se vendo como um bebé de onze meses e mesmo de 28 meses possa representar o que quer que seja.

   Embora no FP 95 se tenha dado por assente que à data dos factos o CC e o DD tinham 29 e 12 meses de idade, a verdade é que a tal data ainda não tinham perfeito tais idades, tendo 28 e 11 meses de idade, respectivamente.

   Aliás, como refere o acórdão a própria arguida “escolheu a inalação do fumo por ser o modo menos doloroso de matar as crianças” – fls. 1158 – sendo facto notório que terão sofrido com a asfixia.  

   Decisão

    Pelo exposto, acordam na 3.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça, em rejeitar o recurso interposto pela arguida AA, no que toca à invocada nulidade do acórdão recorrido e no mais julgar improcedente o recurso, mantendo a decisão recorrida.

    Custas pela recorrente, nos termos dos artigos 374.º, n.º 4, 513.º, n.º s 1, 2 e 3 e 514.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, na redacção que lhes foi dada pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro (rectificado pela Declaração de Rectificação n.º 22/2008, de 24 de Abril, e com as alterações introduzidas pela Lei n.º 43/2008, de 27 de Agosto, pelo Decreto-Lei n.º 181/2008, de 28 de Agosto, pelo artigo 156.º da Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro (Suplemento n.º 252), pelo artigo 163.º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, pelo Decreto-Lei n.º 52/2011, de 13 de Abril e pela Lei n.º 7/2012, de 13 de Fevereiro), o qual aprovou – artigo 18.º – o Regulamento das Custas Processuais, publicado no anexo III do mesmo diploma legal, uma vez que de acordo com os artigos 26.º e 27.º daquele Decreto-Lei, o novo regime de custas processuais é de aplicar aos processos iniciados a partir de 20 de Abril de 2009, e o presente processo teve início em Dezembro de 2012.

    Consigna-se que foi observado o disposto no artigo 94.º, n.º 2, do Código de Processo Penal.

                                                 Lisboa, 29 de Abril de 2015