Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
| Relator: | SALVADOR DA COSTA | ||
| Descritores: | DECLARAÇÃO DE FALÊNCIA AVAL LIVRANÇA RELAÇÕES IMEDIATAS PAGAMENTO RELAÇÃO JURÍDICA SUBJACENTE | ||
| Nº do Documento: | SJ200410190034707 | ||
| Data do Acordão: | 10/19/2004 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Tribunal Recurso: | T REL GUIMARÃES | ||
| Processo no Tribunal Recurso: | 533/04 | ||
| Data: | 04/21/2004 | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | REVISTA. | ||
| Decisão: | CONCEDIDA A REVISTA. | ||
| Sumário : | 1. As garantias pessoais autónomas de funcionamento à primeira solicitação - on first demand - implicam a obrigação do garante de pagar a quantia estabelecida com base em mera exigência pelo beneficiário, sem que o primeiro possa invocar excepção fundada na relação fundamental existente entre o último e o ordenante. 2. A declaração da falência do ordenante, com a consequência da exigibilidade da pluralidade das suas obrigações, não extingue a obrigação do garante no confronto com o beneficiário, pelo que, não obstante a referida declaração falimentar, deve cumpri-la, logo que tal lhe seja exigido pelo beneficiário. 3. O garante não viola o pacto de preenchimento da livrança em branco que lhe foi entregue pelo ordenador, por este subscrita e avalizada por outrem, para garantia de pagamento no que despendesse em função do accionamento da garantia, ao preenchê-la depois da falência do ordenante subscritor. 4. O avalista do subscritor da livrança vincula-se em termos de solidariedade perante o portador da livrança, passando a ser um devedor cambiário, sujeito de uma obrigação cambiária autónoma, embora dependente, em regra, no plano formal da do avalizado. 5. Não obstante a independência das obrigações cambiárias do avalista e do avalizado, o primeiro pode opor ao portador da livrança a excepção da extinção da obrigação do segundo decorrente do pagamento ao último. 6. Pedindo o autor a declaração da inexistência de um direito de crédito da titularidade do réu no seu confronto com base em contrato de liberação de responsabilidade cambiária de avalista e na ilegalidade do preenchimento por virtude da ilegalidade do cumprimento do contrato de garantia, e tendo a primeira instância, no fim dos articulados, julgado a acção procedente por virtude do último dos referidos fundamentos, sem qualquer referência ao primeiro, e tendo isso sido confirmado pela Relação, se o Supremo Tribunal de Justiça revogar o acórdão recorrido, deve conhecer do mérito ou demérito do fundamento não conhecido nas instâncias, ouvidas as partes sobe a matéria, se os factos assentes lho permitirem. 7. Havendo factos controvertidos articulados necessários à decisão com base naquela causa de pedir, impõe-se ao Supremo Tribunal de Justiça a anulação do acórdão recorrido com vista à ampliação da matéria de facto pela Relação e a definição do regime jurídico aplicável. | ||
| Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I "A" intentou, no dia 13 de Novembro de 2002 contra o Banco B, a presente acção declarativa de apreciação, com processo ordinário, pedindo a declaração de não dever ao réu qualquer quantia enquanto avalista de indicada livrança, invocando contrato celebrado entre ambos de desoneração da responsabilidade de pagamento que lhe advinha daquele título de crédito e o seu indevido preenchimento, acrescentando que o réu, em razão de se verificar a respectiva caducidade, pagara indevidamente o valor da garantia que prestara ao C. O réu, na contestação, afirmou que o acordo referido pelo autor não englobava a quantia titulada pela livrança por se tratar de responsabilidade não vencida e eventual e que a caducidade só ocorrera em 9 de Fevereiro de 2002, data da declaração da falência de D. O autor replicou ter a falência da mencionada sociedade sido declarada no dia 9 de Janeiro de 2002, ter o réu reclamado o seu direito de crédito no processo falimentar e que o C lhe reclamara o valor da garantia no dia 12 de Março de 2002, quanto ela já havia caducado. No tribunal da 1ª instância, na fase da condensação do processo, foi proferida sentença final na qual se declarou que o autor, na qualidade de avalista, não devia ao réu o montante titulado pela indicada livrança. Apelou o réu, e a Relação, por acórdão preferido no dia 21 de Abril de 2004, negou provimento ao recurso. Interpôs o apelante recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - o acórdão recorrido não se pronunciou sobre a alegada natureza da garantia em causa nem quanto à sua caducidade à luz da interpretação baseada no artigo 236º, n.º 1, do Código Civil; - no quadro da interpretação segundo impressão do declaratário ou a vontade real do declarante, a garantia que prestou não tem a natureza de fiança, mas de garantia automática e à primeira solicitação; - o recorrente não podia, por isso, apreciar ou discutir a justeza da reclamação operada pelo C; - a garantia era válida em função do contrato de incentivos financeiros concedidos a D e para além da sua rescisão ou invalidade; - D recebia adiantamentos por conta do subsídio global para execução de determinado projecto mediante apresentação de documentação justificativa e, se executasse integralmente o projecto, nada reembolsava ao C, considerando-se o contrato cumprido e caducado; - se não cumprisse, o contrato podia ser rescindido pelo Ministro do Planeamento e da Administração do Território, com a obrigação de D restituir o subsídio no prazo de noventa dias a contar da notificação; - a obrigação emergente do aludido contrato de concessão de incentivos financeiros era condicional, futura e eventual, e não constituída ao tempo da prolação da sentença declarativa da falência, pelo que não era exigível à luz do artigo 151º, n.º 1, do Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência; - só depois da conclusão do procedimento administrativo tendente à fiscalização da execução do contrato de incentivos financeiros em causa poderia o C considerar se ele deveria ou não ser tido por cumprido, optando pela rescisão na hipótese negativa; - ao tempo da apresentação da reclamação de créditos, no dia 12 de Março de 2002, não havia ocorrido a rescisão do contrato de incentivos financeiros; - na reclamação de créditos que formulou no processo de falência não se fez referência a tal crédito porque então nada ainda havia desembolsado; - a obrigação creditícia emergente do contrato de incentivos financeiros é um novo crédito constituído após a prolação da sentença declarativa da falência, subsumível à disciplina do artigo 205º, n 1, do Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência; - ao recorrente assistia o direito de optar pela instauração do procedimento para verificação deste novo crédito ou pelo preenchimento da livrança- caução subscrita pelo recorrido; - o acórdão recorrido está afectado de omissão de pronúncia acima referida e fez errada interpretação e análise dos documentos, violando o disposto no artigos 236º do Código Civil e 151º, n.º 1, e 205º, n.º 1, do Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência. Respondeu o recorrido, em síntese de conclusão: - a garantia só podia ser accionada até trinta dias após a verificação da caducidade do contrato de financiamento; - declarada falida D no dia 9 de Janeiro de 2002, conhecida do recorrente, operou a caducidade do contrato de incentivo e a garantia só se manteve até trinta dias depois, porque a declaração da falência tornou exigíveis todas as obrigações da primeira; - o recorrente sabia ou devia saber que a garantia havia caducado decorrido o referido prazo de trinta dias; - quanto o C reclamou o pagamento da garantia ao recorrente, já o mesmo não era devido, pelo que o último não podia preencher a livrança com o montante que terá pago ao primeiro, pelo que violou o acordado. II É a seguinte a factualidade declarada provada no acórdão recorrido: 1. D tem o capital social € 250.000,00, dividido em duas quotas iguais, de que são actualmente titulares E e F, tendo a quota desta última lhe sido cedida em Outubro de 1997 por G-Empreendimentos Imobiliários de Barcelinhos Ldª, que nessa altura cessou as suas funções de gerente. 2. No dia 13 de Novembro de 1995, representantes de D solicitaram ao réu uma garantia no valor de 17 281 769$ a favor do C para caucionar 50% do subsídio a fundo perdido atribuído ao abrigo do Decreto-Lei n.º 193/94, de 19 de Julho, do Serviço de Incentivos Regionais, respeitante ao contrato n.º N/95/0516.1557, no valor de 34 563 538$. 3. O autor deu o seu aval pessoal à referida sociedade a favor do réu em livrança por aquela subscrita, destinada a servir de caução à garantia bancária mencionada sob 2. 4. Representantes do réu declararam, por escrito, no dia 16 de Novembro de 1995, a pedido D, prestar perante o C: - garantia bancária autónoma até 17.281.769$, correspondente a 50% do subsídio a fundo perdido atribuído ao ordenador por força de contrato datado de 20 de Outubro de 1995; - responsabilizar-se como principal pagador perante o C pela entrega, no prazo de 20 dias, das importâncias que este lhe solicitasse ao primeiro pedido escrito, sem apreciar da justiça ou direito de reclamação do ordenador, se a empresa acima identificada, não cumprisse qualquer uma das condições ou das obrigações que resultam do referido contrato ou de quaisquer compromissos assumidos em consequência do mesmo; - abranger a garantia o montante do subsídio entregue e os juros respectivos à taxa contratual estabelecida; - manter-se a garantia firme e válida ainda que o contrato a que respeita se extinga por efeito de rescisão ou invalidade, e o incumprimento das obrigações do ordenador para com o garante não prejudica os direitos do beneficiário desta garantia decorrentes; - a garantia tem a duração do contrato de concessão de incentivo, podendo ser accionada até trinta dias após a verificação da caducidade do mencionado contrato. 5. Posteriormente, o autor, que havia prestado antes o seu aval e fiança face ao réu em diversas operações efectuadas perante o último por D, encetou negociações com o réu, este representado pela gerência da sua Agência de Barcelos, com vista à sua liberação e total desoneração das responsabilidades que lhe advinham dessa qualidade. 6. Acordou então em efectuar o pagamento ao réu de vários milhares de contos, saldando todas as dívidas da citada sociedade nas quais figurava como avalista ou fiador e, como contrapartida, o réu assegurou ao autor que o liberava de toda e qualquer responsabilidade que tivesse assumido perante ele, réu, enquanto avalista fiador ou garante da mencionada sociedade D. 7. O C reclamou do réu o pagamento da garantia aludida sob 4 no dia 12 de Março de 2002, nos termos seguintes: "O IAPMEI tem pendente procedimento administrativo tendente à rescisão do contrato n.º N/95/0516.1557, assinado e referenciado no âmbito do SIR (DL n.º 193/94, de 19 de Julho. Por sentença, proferida em 9 de Fevereiro de 2002, foi a referenciada D declarada falida. Essa instituição financeira prestou a garantia bancária n.º 233161, responsabilizando-se nos termos dela perante o IAPMEI por fazer entrega de quaisquer importâncias que o IAPMEI solicite até ao limite de 17 281 769$ (€ 86 201,10). Serve a presente comunicação como interpelação do garante para todos os efeitos legais, pelo que se solicita o pagamento de € 86 210,10". 8. No dia 16 de Abril de 2002, o réu remeteu ao C o cheque bancário n.º 1300009752 no montante de € 86 210,10, e o último emitiu a favor do primeiro recibo de recebimento daquela quantia, com a menção de reposição de incentivos por accionamento da garantia bancária n.º 30.23316.1850. 9. No dia 7 de Agosto de 2002, o réu enviou ao autor uma carta do seguinte teor: "Encontra-se em nosso poder uma livrança subscrita por "D", Ldª e avalizada por V. Exª e E, que serve de caução à operação acima referenciada. Assim, informamos que as mesmas foram preenchidas de acordo com a carta entregue pela subscritora em 13 de Novembro de 1995, pelo montante de 17 282 392$, a que correspondem € 86 204,21, referentes ao débito da operação em assunto, à data de 16 de Abril de 2002. Pela presente, somos a informar que caso todo o débito não seja regularizado no prazo de cinco dias em capital e juros, ver-nos-emos forçados a recorrer à via judicial". 10. O autor respondeu à carta do réu, nos termos da comunicação que lhe dirigiu no dia 12 de Agosto de 2002, que aquele recebeu e na qual, essencialmente, invocava o acordo acima referido celebrado entre o autor e o réu com vista à liberação e desoneração daquele, conforme documento junto a folhas 23 a 26, mas, entretanto o réu insistiu no pagamento do aludido montante e pelo qual preencheu a livrança. 11. A sociedade "D",Ldª foi declarada falida por sentença proferida no dia 9 de Janeiro de 2002, conforme certidão junta a folhas 71 a 74, publicada num jornal diário no dia 16 de Janeiro de 2002, e o réu reclamou nesse processo de falência o respectivo crédito, sabendo, por isso, da prolação da aludida sentença e da respectiva data. III A questão essencial decidenda é a de saber se o recorrido não deve ao recorrente o valor inscrito na livrança mencionada sob II 9. Tendo em conta o conteúdo do acórdão recorrido e das conclusões de alegação do recorrente e do recorrido, a resposta à referida questão pressupõe a análise da seguinte problemática: - natureza do contrato celebrado entre o C e "D", Ldª e sua conexão entre ele e o celebrado pela última e pelo recorrente; - natureza e efeitos do contrato celebrado entre o recorrente e o C; - a relação jurídica subjacente à relação jurídica cambiária decorrente da livrança em causa; - estrutura e efeitos da obrigação cambiária de aval; - extinguiu-se ou não o contrato de garantia bancária celebrado entre o recorrente e o C em razão da declaração da falência de "D" Ldª ? - infringiu ou não o recorrente o pacto de preenchimento da livrança? - consequência jurídica de as instâncias não haverem conhecido do contrato de liberação dito celebrado entre o recorrente e o recorrido; - síntese da solução para o caso decorrente dos factos e da lei. Vejamos, de per se, cada uma das referidas sub-questões. 1. O contrato celebrado entre o C e "D" Ldª enquadra-se no sistema de incentivos às pequenas e médias empresas industriais, destinado a incentivar o potencial de desenvolvimento endógeno através de medidas que contribuam para a criação de emprego e para a diversificação da produção de bens e serviços regionais (artigo 1º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 193/94, de 19 de Julho). O incentivo a conceder pelo Serviço de Incentivos Regionais do C não podia exceder setenta por cento das aplicações relevantes e é susceptível a forma de subsídio a fundo perdido ou mista, isto e, a fundo perdido e reembolsável, nesta última vertente em termos de empréstimo à taxa de juro zero (artigo 5º do Decreto-Lei n.º 193/94, de 19 de Julho). No caso espécie, no âmbito do referido contrato, com vista à execução de um projecto de investimento pela sociedade "D", Ldª, o C entregou à primeira a quantia correspondente a € 86 210,10. Trata-se, pois, na espécie, de um contrato designado de concessão de incentivos a fundo perdido, sob determinado condicionalismo resolutivo, celebrado entre o C e "D", Ldª. Do texto do referido contrato constava, como é natural, o objectivo do projecto, o montante do incentivo concedido, os direitos e os deveres das partes e as garantias a prestar (artigo 21º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 193/94, de 19 de Julho). O contrato podia ser rescindido, por despacho ministerial, além do mais, em razão da não execução do projecto de investimento nos termos previstos por causa imputável ao promotor, de viciação de dados na fase de candidatura e na fase de acompanhamento do projecto, nomeadamente dos elementos justificativos da despesa (artigo 22º, n.º 1, alíneas a) e c), do Decreto-Lei n.º 193/94, de 19 de Julho). A rescisão do contrato implicava a restituição dos incentivos concedidos e a obrigação do beneficiário a repor as importâncias recebidas no prazo de 90 dias a contar da data do recebimento da notificação, acrescidas dos juros de mora à taxa estabelecida paras as dívidas de impostos ao Estado e aplicada da mesma forma (artigo 22º, n.º 2, alíneas a) e c), do Decreto-Lei n.º 193/94, de 19 de Julho). Por seu turno, o recorrente e "D", Ldª celebraram um contrato de mandato sem representação por via do qual o primeiro deveria prestar ao C uma garantia bancária relativa ao cumprimento do contrato de incentivos acima referido até 17 281 769$. 2. A designada garantia bancária assenta numa prévia relação jurídica subjacente decorrente de um contrato celebrado entre duas partes, envolve um contrato de mandato sem representação celebrado entre o sujeito passivo ou devedor daquela relação jurídica e uma instituição de crédito pelo qual esta se obriga, mediante retribuição, a prestar garantia ao sujeito activo da aludida relação, e num contrato de garantia propriamente dito celebrado entre aquela instituição e o referido credor. Tendo em conta os factos constantes de II 4, o recorrente e o referido Instituto celebraram um contrato de garantia bancária, cuja natureza importa determinar. No grupo das garantias pessoais demarcam-se as acessórias e as autónomas e, no âmbito destas, as que devem funcionar à primeira solicitação e as restantes, por seu turno denominadas simples. A garantia acessória, como é o caso da decorrente do contrato de fiança, caracteriza-se pela íntima relação entre a obrigação de garantia e a relação fundamental, traduzida na comunicação à primeira dos vícios da última. Com efeito, no contrato de fiança, a validade, a eficácia e o conteúdo da garantia acessória são moldados pela relação fundamental, em termos de o garante, quando a garantia é executada, poder opor ao beneficiário todas as excepções que lhe seriam oponíveis pelo devedor (artigos 627º, 631º, 634º, 637º, 638º e 647º do Código Civil). No caso das garantias pessoais simples não basta a mera exigência de pagamento para que o garante seja obrigado a cumprir, certo que lhe deve ser exigido que pague mediante comprovação de que estão preenchidos os pressupostos pré-estabelecidos para a actuação da sua responsabilidade. As garantias pessoais autónomas de funcionamento à primeira solicitação - on first demand -, por seu turno, implicam a obrigação do garante de pagar a quantia estabelecida, com base no mero pedido, solicitação ou exigência do beneficiário, sem que o primeiro possa invocar qualquer excepção fundada na relação fundamental estabelecida entre o ordenante e o beneficiário. O garante, perante o credor, responsabiliza-se pelo pagamento de uma obrigação própria e não pelo cumprimento da dívida do garantido, ou seja, a sua função é a de assegurar a realização do interesse do credor beneficiário da garantia. O contrato de garantia não tem a sua justificação no contrato-base, do qual é independente e, por isso, dele emerge uma obrigação autónoma. Releva essencialmente na qualificação jurídica do contrato em análise o facto de os representantes do recorrente haverem declarado que ele se responsabilizava, como principal pagador, perante aquele Instituto, pela entrega, em 20 dias, das importâncias que ele lhe solicitasse, ao primeiro pedido escrito, sem apreciar da justiça ou direito de reclamação se "D",Ldª se esta não cumprisse qualquer condição ou obrigação contratual. Perante este quadro a conclusão é a de que se trata, na espécie, de garantia autónoma à primeira solicitação, com a estrutura a que acima se fez referência. 3. Resulta de II 9 a inicial existência de uma livrança parcialmente preenchida, com o valor de 17 282 392$, entregue ao recorrente por "D", Ldª no dia 13 de Novembro de 1995, com a assinatura dos seus representantes na posição de subscritora promitente, e do recorrido na posição de avalista daquela subscritora (artigos (artigos 31º, 75º e 77º da Lei Uniforme Sobre Letras e Livranças -LULL). É um título de crédito cambiário à ordem, de natureza formal, cujo conteúdo envolve, além do mais, a promessa pura e simples de uma pessoa de pagar a outra determinada quantia (artigo 75º da Lei Uniforme Sobre Letras e Livranças -LULL). No quadro da conveniência da fácil circulação dos títulos de crédito, as relações jurídicas cambiárias decorrentes da subscrição de livranças assumem características que as distinguem da generalidade dos negócios jurídicos. Nesse quadro de diferença, ressaltam do regime das livranças, no confronto entre a relação jurídica cambiária e a relação jurídica subjacente, além do mais, os princípios da incorporação e da abstracção. O primeiro dos aludidos princípios envolve a unidade entre ambas as aludidas relações, e o segundo implica que a relação cambiária valha independentemente da causa que lhe deu origem (artigos 1º, nº 2, 14, 16º, 17º, 20º, 21º, 38º, 39º, 1ª e 3ª parte, 40º, 3ª parte, 50º, 51º e 77º da LULL). O preenchimento da referida livrança foi entretanto completado pelo recorrente, com base na relação jurídica de garantia executada no seu confronto pelo C. Assim, a relação jurídica subjacente àquela relação jurídica cambiária consubstancia-se no contrato de garantia bancária celebrado entre o recorrente e o C, na sequência de contrato de mandato sem representação celebrado entre o primeiro e "D",Ldª. 4. Vejamos agora o regime essencial do aval cambiário no confronto com o caso vertente. A livrança em causa foi subscrita por "D",Ldª, como promitente pagadora, no confronto com o recorrente, e avalizada pelo recorrido. O pagamento de uma livrança pode ser no todo ou em parte garantido por aval de terceiro ou de um signatário da livrança (artigos 30º e 77º da LULL). Trata-se, assim, de uma garantia de natureza especial da obrigação cambiária do avalizado e, se não se expressar a identificação do sujeito cambiário a quem é dado, entende-se que o é ao subscritor da livrança (artigos 31º, quarta parte, e 77º da LULL). O dador de aval ao subscritor da livrança, por exemplo, vincula-se como garante, no confronto com o promissário, do mesmo modo que o referido subscritor, o que significa que o conteúdo da sua obrigação é o mesmo que o da obrigação do referido subscritor avalizado (artigos 32º, primeira parte, e 77º da LULL). É um devedor cambiário perante o promissário em face do qual o avalizado seja devedor cambiário e na mesma medida em que ele o seja, mas não é caso de responsabilidade subsidiária da do avalizado, porque é solidária. O avalista vincula-se em termos de solidariedade perante o respectivo portador, passando a ser um devedor cambiário, sujeito de uma obrigação cambiária autónoma, embora dependente no plano formal da do avalizado (artigos 47º, primeira parte, e 77º, da LULL). A obrigação do avalista é materialmente autónoma em relação à do avalizado, embora dela dependente no plano formal, em razão do que alguma limitação de responsabilidade expressa no título pelo segundo aproveita ao primeiro. E mantém-se mesmo no caso de a obrigação por ele garantida ser nula por qualquer razão que não seja um vício de forma, isto é, respeitante aos requisitos externos da obrigação cambiária avalizada (artigos 32º, segunda parte, e 77º da LULL). Só imperfeitamente a obrigação do avalista é acessória da do avalizado, ou seja, não o é perfeitamente como ocorre com o fiador em relação ao afiançado. Embora o avalista não possa opor ao portador da livrança os meios pessoais de defesa do avalizado contra ele, tem sido entendido que se não trata de absoluta inoponibilidade, considerando-se que a independência das obrigações cambiárias, incluindo a do avalista e a do avalizado, não obsta a que o primeiro oponha ao portador da letra ou da livrança a excepção da extinção da obrigação do avalizado ( Ac. do STJ, de 23.01.86, BMJ, 353, pág. 482). 5. Atentemos agora se por virtude da declaração da falência de "D", Ldª se extinguiu o contrato de garantia celebrado entre o recorrente e o C. A lei expressa que a declaração da falência torna imediatamente exigíveis todas as obrigações do falido, ainda que sujeitas a prazo não vencido, e que determina o encerramento de todas a contas correntes (artigo 151º, n.º 1, do Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência). Não resulta deste normativo que a declaração de falência do devedor implique a extinção dos contratos. Com efeito, o que dele resulta é a antecipação do prazo de vencimento de todas as obrigações do falido, naturalmente para que se possa proceder à determinação de todo o passivo. Assim, com a declaração de falência "D", Ldª, no dia 9 de Janeiro de 2002, o que aconteceu foi o imediato vencimento da obrigação de a primeira restituir ao C o capital relativo ao contrato de incentivos, sendo que a primeira deixou de poder continuar a cumprir o respectivo projecto de investimento. Ao tempo da prolação da sentença declarativa da falência de "D", Ldª não estava ainda vencida, como é natural, a obrigação de o recorrente reembolsar aquele Instituto, mas a obrigação da primeira em relação ao último tornara-se exigível. Foi clausulado no mencionado contrato de garantia bancária celebrado entre o recorrente o C, aliás de harmonia com a sua própria natureza, por um lado, que a garantia se mantinha firme e válida ainda que o contrato de mútuo a que respeitava se extinguisse por efeito de rescisão ou invalidade. E, por outro, que o incumprimento das obrigações do ordenador, ou seja, de "D", Ldª para com o garante, isto é, para com o recorrente, não prejudicava os direitos do beneficiário, na espécie o C. Em sentido jurídico mais generalizado, o conceito de caducidade significa a extinção de um direito por virtude do decurso do prazo em que devia ser exercido, ou a extinção de uma relação jurídica por virtude de ter decorrido o prazo convencionado ou legalmente previsto para a sua duração. Na convenção de garantia bancária em causa ficou expresso que a garantia tinha a duração do contrato de concessão de incentivos financeiros e que podia ser accionada até trinta dias após a verificação da caducidade do mencionado contrato. No contexto em que foi inserida, pressupondo o accionamento da garantia, a expressão caducidade significa necessariamente o termo do contrato de incentivos celebrado entre C e "D", Ldª, naturalmente por via de resolução em razão do incumprimento da última em relação ao primeiro. Por isso, inexiste fundamento legal para enquadrar no conceito de caducidade utilizado no referido contrato de garantia bancária a exigibilidade pelo C da restituição do capital mutuado a "D", Ldª por virtude da declaração da falência desta. Assim, ao invés do que foi entendido no acórdão recorrido, não se extinguiu o contrato de garantia bancária celebrado entre o recorrente e o C na data da declaração da falência "D", Ldª nem trinta dias depois dessa data. Consequentemente, porque "D", Ldª, declarada na situação de falência, deixou de cumprir as obrigações decorrentes do referido contrato de mutuo, o C actuou no exercício do seu direito decorrente da garantia autónoma à primeira solicitação quando, no dia 12 de Março de 2002, exigiu do recorrente o pagamento de € 86 201,10. Paralelamente, considerando a natureza da garantia de pagamento a que o recorrente estava vinculado, à primeira solicitação, independentemente da situação do contrato de incentivos a que se reportava, ao proceder ao pagamento ao C, no dia 16 de Abril de 2002, da quantia de € 86 210,10, ele agiu no cumprimento obrigacional que se lhe impunha. 6. Vejamos agora a questão de saber se o recorrido, ao completar o preenchimento da livrança em causa, o fez em violação do pacto de preenchimento. A lei expressa que se a livrança ficou incompleta no momento em que foi emitida e tiver sido completada contrariamente ao acordo para o efeito, não pode esse acordo ser oposto ao portador, salvo se a tiver adquirido de má fé ou adquirindo-a, cometer uma falta grave (artigos 10º e 77º da LULL). Resulta, pois, da lei que as livranças podem ser incompletamente preenchidas, caso em que são designadas por livranças em branco, e entregues a outrem, que assim passa a assumir a posição de portador delas. A lei permite, pois, que antes de liquidada a obrigação subjacente, pode a livrança incompleta, designadamente só assinada, entrar em circulação, no pressuposto de que vai ser completada no futuro, altura em que atingirá a sua perfeição como título cambiário. Dir-se-á que as livranças em branco são válidas, embora os concernentes efeitos cambiários só surjam plenamente depois de completado o convencionado preenchimento. Quem emite uma livrança em branco atribui a quem a entrega o direito de a preencher de acordo com as cláusulas convencionadas entre ambos, em jeito de delegação de confiança. Trata-se de um contrato de preenchimento definidor dos termos da definição da obrigação cambiária, designadamente o montante, condições de conteúdo, tempo de vencimento, local de pagamento e estipulação de juros. A entidade a quem é entregue o título de crédito a fim de o preencher deve, naturalmente, fazê-lo de harmonia com o convencionado, sob pena de incumprimento do pacto, ocorrendo uma situação de preenchimento abusivo se o tomador do título cambiário desrespeitar a convenção. O preenchimento abusivo do título de crédito constitui um facto impeditivo do direito invocado pelo seu portador e primeiro adquirente, pelo que incumbe a quem o pagamento é exigido a respectiva alegação e prova (artigos 342º, nº 2, do Código Civil e 467º, nº 1, alínea c), do Código de Processo Civil). Resulta dos factos provados a ocorrência de um pacto de completude de preenchimento da livrança em causa celebrado entre o recorrente e "D", Ldª. O completamento do preenchimento da referida livrança, que servia de caução ao referido contrato de garantia bancária, celebrado entre o recorrente e o C, dependia, segundo o referido pacto, do accionamento daquela garantia pelo aludido Instituto. Accionada a aludida garantia pelo C, e cumprida que foi a obrigação dela decorrente pelo recorrente, verificado estava o fundamento do preenchimento da livrança em causa, em que o recorrido figura como avalista da subscritora promitente "D", Ldª. Por isso, ao invés do que foi considerado no acórdão recorrido, não infringiu o recorrente o pacto de preenchimento relativo à mencionada livrança. 7. Atentemos agora na consequência jurídica de as instâncias não haverem conhecido do contrato de liberação dito celebrado entre o recorrente e o recorrido. Conforme resulta do exposto, não procedem os fundamentos pelos quais o acórdão recorrido manteve a decisão proferida no tribunal da primeira instância. Mas o recorrido também invocou na acção, como causa de pedir, em primeiro lugar, para basear o pedido que nela formulou, a celebração de um contrato com o recorrente por via do qual ele o liberou de qualquer responsabilidade que tivesse assumido como avalista, fiador ou garante de D, incluindo a quantia relativa à garantia de € 86 201,10 que foi inscrita na livrança em causa. Mas nem o tribunal de 1ª instância nem a Relação se pronunciaram sobre essa questão, provavelmente, embora o não refiram, por a considerarem prejudicada em razão da solução dada ao litígio com o outro fundamento invocado na acção (artigo 660º, n.º 2, e 713º, n.º 2, do Código de Processo Civil). Mas o nosso ordenamento jurídico não pode consentir, como é natural, que se revogue o acórdão recorrido com base no julgamento negativo de uma questão e não se aprecie a outra questão suscitada na causa de que o tribunal de primeira instância e a Relação não conheceram por a considerar prejudicada em razão da solução de procedência a que chegaram com outro fundamento. Quanto à substituição do tribunal a quo pela Relação no que concerne ao conhecimento de questões cuja decisão o primeiro considerou prejudicadas, rege o artigo 715º, n.º 2, do Código de Processo Civil. Nele se expressa que, tendo o tribunal recorrido deixado de conhecer de alguma questão por a considerar prejudicada pela solução dada ao litígio, a Relação, entendendo que a apelação procede e que nada obsta à sua apreciação, dela deve conhecer no mesmo acórdão em que revogar a decisão recorrida, sempre que disponha dos elementos necessários, caso em que deverá ouvir as partes por dez dias. O referido normativo é aplicável no recurso de revista no caso de o Supremo Tribunal de Justiça dever revogar o acórdão da Relação no quadro da valoração do fundamento por ela apreciado, caso em que deve apreciar o fundamento da acção cujo conhecimento ficou prejudicado (artigo 726º do Código de Processo Civil). Mas o Supremo Tribunal de Justiça só pode julgar a questão cujo conhecimento foi considerado prejudicado pela Relação, ouvindo previamente as partes, se o quadro de facto assente já lho permitir. É isso que importa determinar, sendo que o caso espécie envolve alguma particularidade em razão de o mérito da causa haver sido julgado na fase da condensação do processo, isto é, sem elaboração da especificação, da base instrutória e da passagem do processo às fases de instrução e julgamento. 8. Vejamos, finalmente, tendo em conta o acima exporto, a síntese da solução para o caso espécie decorrente dos factos e da lei. A propósito da questão acima referida de que a Relação não conheceu, naturalmente em razão da solução jurídica para o caso a que chegou, está assente que o recorrido acordou então em efectuar o pagamento ao recorrente de vários milhares de contos, saldando todas as dívidas de D nas quais figurava como avalista ou fiador e como contrapartida assegurou primeiro que o liberava de toda e qualquer responsabilidade que tivesse assumido perante enquanto avalista, fiador ou garante da aludida sociedade. Todavia, a referida factualidade não basta à solução da mencionada questão segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, porque continua sob controvérsia a questão de saber se a mencionada convenção englobou ou não a obrigação de aval aposto na livrança que serviu de caução relativamente ao contrato de garantia bancária. Com efeito à afirmação do recorrido no sentido afirmativo opôs-se o recorrente, negando o facto da referida abrangência. Com efeito, o recorrente afirmou, por um lado, sob os n.ºs 8º e 9º da contestação que a referida obrigação de aval não foi abrangida pelas negociações efectuadas com a gerência da sua agência de Barcelos por virtude de se tratar de responsabilidade não vencida e eventual. E, por outro, que o recorrido havia proposto ao recorrente, em Junho ou Julho de 2002, o pagamento de metade da quantia em causa, em razão de haver outro avalista, mas que ele não aceitou a proposta. O recorrido, na réplica, não negou haver formulado ao recorrente a mencionada proposta, mas acrescentou que o fez para salvaguardar o seu bom nome e o seu crédito empresarial e não por reconhecer a sua obrigação de pagamento. A regra é no sentido de que aos factos fixados pelo tribunal recorrido o Supremo Tribunal de Justiça aplica definitivamente o regime jurídico que julgue adequado, e a excepção é no sentido de que a decisão da matéria de facto pelo tribunal recorrido não pode ser alterada, salvo o caso excepcional previsto no n.º 2 do artigo 722º do Código de Processo Civil, a que acima se fez referência (artigo 729º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil). Independentemente disso, o processo pode voltar ao tribunal recorrido quando o Supremo Tribunal de Justiça entenda que a decisão de facto pode e deve ser ampliada em ordem a constituir base suficiente para a decisão de direito, ou se ocorreram contradições na decisão sobre a matéria de facto que inviabilizem a decisão jurídica do pleito (artigo 729º, n.º 3, do Código de Processo Civil). Trata-se uma faculdade de ampliação da matéria de facto quando as instâncias a seleccionarem imperfeitamente, amputando-a de elementos que consideram dispensáveis, mas na realidade indispensáveis para que o Supremo Tribunal de Justiça defina o direito aplicável ao caso espécie que deva apreciar. A referida ampliação só pode, porém, efectivar-se no que concerne a factos articulados pelas partes, ou que ao tribunal seja lícito conhecer nos termos do artigo 264º do Código de Processo Civil, envolvidos de essencialidade para a definição da base jurídica do pleito. Ora, no caso vertente, é essencial para a aplicação do direito ao caso vertente apurar se a obrigação de aval do recorrido é ou não abrangida pelo contrato de liberação que celebrou com o recorrente e, para o efeito, há factos articulados pelas partes. No caso de ampliação da matéria de facto, o Supremo Tribunal de Justiça, depois de definir o direito aplicável, deve mandar julgar novamente a causa, de harmonia com a decisão de direito, pelos mesmos juízes que intervieram no primeiro julgamento, sempre que possível (artigo 730º, n.º 1, do Código de Processo Civil). Só no caso de falta ou contradição dos elementos de facto é que o Supremo Tribunal de Justiça não tem de fixar o regime jurídico a aplicar, caso em que a nova decisão admitirá recurso de revista (artigo 730º, n.º 2, do Código de Processo Civil). O regime jurídico relativo ao fundamento apreciado nas instâncias está definitivamente decidido nos termos acima enunciados. Quanto à questão que as instâncias não conheceram por prejudicada, a solução será a da consideração ou não da obrigação do recorrido para com o recorrente pelo pagamento da quantia coberta pelo aval cambiário, consoante os factos a provar vierem ou não revelar que o contrato de liberação não abrangeu ou abrangeu a referida obrigação de aval. Importa, assim, anular o acórdão recorrido e determinar a baixa do processo á Relação a fim de proceder à ampliação da matéria de facto com vista ao esclarecimento do ponto indicado e julgamento posterior da causa de harmonia com o regime jurídico ora definido. O pagamento das custas é, em regra, da responsabilidade de quem ficar vencido na causa e na proporção em que o seja (artigo 446º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil). Tendo em conta que não vai haver decisão do mérito do recurso, mas anulação do acórdão recorrido, o pagamento das custas respectivas será da responsabilidade de quem a final ficar vencido, na proporção respectiva. IV Pelo exposto, anula-se o acórdão recorrido, determina-se a ampliação da matéria de facto nos termos acima referidos com vista à aplicação posterior do regime jurídico ora definido, e condena-se no pagamento das custas do recurso quem a final ficar vencido, na proporção respectiva. Lisboa, 19 de Outubro de 2004. Salvador da Costa Ferreira de Sousa Armindo Luís |