Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
06A3271
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: BORGES SOEIRO
Descritores: INSOLVÊNCIA
PRAZO
CADUCIDADE
INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE
Nº do Documento: SJ200611140032711
Data do Acordão: 11/14/2006
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Decisão: NEGADA A REVISTA.
Sumário : I - O CIRE, aprovado pelo DL n.º 53/2004, de 18-03, não contém norma equivalente à do art. 9.º do CPEREF.

II - O prazo estabelecido no art. 18.º do CIRE não é um prazo de caducidade.

III - Mesmo que se admita ser de sopesar da verdadeira utilidade em abrir um processo de insolvência quando antecipadamente se presume a inexistência de bens susceptíveis de satisfazerem os interesses dos credores, a verdade é que, mesmo nesse caso, não é de todo inútil o processo, quer porque podem existir outros bens do insolvente que o credor, na respectiva acção executiva, não logrou encontrar, quer porque a finalidade do processo não se resume à apreensão dos bens do património do insolvente para posterior liquidação e pagamento dos credores.

IV - Com efeito, relevam também, entre outros fins, o saneamento do mercado, expurgando-se as empresas ou pessoas singulares económica ou financeiramente inviáveis, e a produção de vários efeitos decorrentes da declaração de insolvência como o vencimento imediato de todas as obrigações do insolvente. *

* Sumário elaborado pelo Relator.

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:


1. No processo de declaração de insolvência em que é requerente o Empresa-A, e requerido AA foi proferida decisão que declarou a insolvência do requerido.
Não se conformando com esta decisão, dela, atempadamente, apelou o referido requerido para o Tribunal da Relação de Guimarães, o qual manteve a decisão recorrida.
De novo, inconformado veio a interpor para este S.T.J., concluindo a sua alegação pela seguinte forma:

1ª- Está documentalmente provado que o recorrente - conjuntamente com outros co-obrigados, que estão a ser executados pela mesma dívida - assumiu as obrigações emergentes das livranças dadas à execução na qualidade de sócio gerente de uma empresa industrial e que abandonou tais funções há muitos anos bem como que as livranças de onde emerge a pretensa dívida do banco requerente foram a este entregues em branco.
2ª- Os factos referidos na conclusão precedente são relevantes para efeitos do art°. 9° do CPEREF, e estão assentes, para decidir se ocorre ou não caducidade do direito de o requerente pedir a insolvência do recorrente, bem como para decidir se pode ter-se por assente a existência da dívida.
3ª- Ora, tal prova fez-se documentalmente, era relevante e estava assente pelo que relevava face ao disposto no art°. 9° do CPEREF, ou seja, para decidir se ocorria ou não o direito de o requerente pedir a falência do recorrente.
4ª- Requerida a insolvência do recorrente, este deduziu oposição, na qual em resumo alegou, entre o mais que:
a) O recorrente subscreveu as livranças como sócio gerente de uma empresa industrial, da qual se apartou, conforme escritura junta aos autos em 29 de Janeiro de 1998, renunciando à gerência, e está reformado por velhice desde 19/10/1993, conforme documentou igualmente, pelo que o pedido de insolvência deve ser julgado caducado, nos termos do art°. 9° do CPEREF, uma vez provada a cessação da sua actividade há mais de 7 anos;
b) Alegando o requerente que o recorrente não tem quaisquer bens móveis ou imóveis, tal facto "não pode conduzir à declaração de falência mas antes à extinção da instância por inutilidade da lide" (conforme doutrinou o Ac. do STJ de 8/6/1995 in www.dgsi.pt).
5ª- O acórdão recorrido confirmou a sentença recorrida que decretou a insolvência do recorrente por ter entendido, face à matéria de facto que fixou que:
não caducou o direito de formular o pedido de insolvência pois ao caso não é aplicável o disposto nos art°s. 8° e 9° do CPEREF mas o CIRE;
o facto de o recorrente não possuir quaisquer bens susceptíveis de penhora não determina a inutilidade da lide e a extinção da instância, pois o credor pode ter interesse na declaração de insolvência para outros efeitos.
6ª- Afigura-se ter-se erradamente decidido porquanto:
a) não está provado que o recorrente deva o valor das livranças, já que o banco requerente promoveu a execução contra os demais co-executados ao ter concluído pela inexistência de bens ou rendimentos do ora recorrente, o que significa que pode ser pago, ou até já ter sido pago, por esses outros co­executados;
b) ao direito de formular o pedido de insolvência, atenta a data dos factos é indubitavelmente aplicável o CPEREF (e não o CIRE) sucedendo que esse direito caduca no prazo de 1 ano contado da cessação da actividade do devedor, nos termos dos art°s. 8° e 9° do CPEREF e essa cessação da actividade está comprovado documentalmente ter ocorrido pelo menos em 29 de Janeiro de 1998;
c) estando tal prazo inteiramente esgotado no domínio temporal de aplicação do CPEREF não podia o mesmo "ressuscitar" pelo "advento" do CIRE; d) a jurisprudência tem decidido (cfr. o acórdão citado no texto) que "a inexistência de bens no património do devedor não pode conduzir à declaração de falência mas antes à extinção da instância por inutilidade da lide" pelo que ocorrendo tal inexistência, sempre a instância seria inútil;
Na contra alegação o recorrido defende a manutenção do julgado.
Foram colhidos os vistos.
Decidindo.

2. Foram dados como provados pelas Instâncias, os seguintes factos:

1°. O Requerido é uma pessoa singular, casado com BB, sob o regime de separação de bens (art°. 1° da p.i.);
2°. O Empresa-A, que usa a designação comercial ..., sociedade aberta, NIPC 501 525 882, com sede na Praça .... ..., no Porto, com o capital social de 3.257.400.827,00 €, definitivamente matriculada na la Secção da Conservatória do registo Comercial do Porto sob o n° 40043/850717, incorporou por fusão as sociedades Empresa-B, Empresa-C e Empresa-D, como é do conhecimento público e se encontra definitivamente registado pela inscrição 44, a que corresponde a apresentação 8/000630 (art°. 2° da p.i.);
3°. Em virtude de operação de crédito praticada no exercício do ex-Empresa-B, o Requerente tomou-se legítimo dono e portador de duas livranças cujos respectivos originais encontram-se junto à execução que corre termos sob o número 914/98 do 3° Juízo Cível da Comarca de Guimarães, conforme certidão judicial que se junta, subscrita à ordem do ex-Empresa-B pelo Requerido, vencidas a 01/01/1997 e 01/07/1997, na importância de 53.997,34 € (10.825.514$00) cada (art°.3°dap.i.);
4°. Apresentadas a pagamento nas datas dos respectivos vencimentos, as livranças não foram pagas, então, nem posteriormente (art°. 4° da p.i.),
5°. Porém, relativamente à livrança que se venceu a 01/01/97, em 30/04/97, o Banco Requerente recebeu valores para pagamento de juros vencidos e de capital que reduziram o respectivo valor de capital para 49.762,06 €, em 30/04/1997 (art°. 6° da p.i.);
6°. Pelo que, os juros relativos àquela livrança e vencidos desde a data do recebimento e os juros relativos à outra livrança, contabilizados até à data da distribuição da presente petição inicial (26/09/2005), ascendem a 64.836,6.5 € (art° 7° da p.i.);
7°. Pelo que, o crédito do Banco Requerente sobre o Requerido ascende, com base nas supra referidas livranças, a 168.596,05 € (art°.8° da p.i.);
8°- Na execução supra identificada o Banco Requerente indicou à penhora o recheio da residência do Requerido sito no Lugar da ...,..., Guimarães, tendo sido notificado do auto de diligências para penhora com a indicação de que o Requerido já lá não residia (art°. 12°dap.i.),
9°- No mesmo requerimento, o Banco Requerente indicou ainda à penhora, e no que ao Requerido diz respeito, o direito de propriedade em comum e na proporção de 1/3 na compropriedade do prédio rústico sito á freguesia de ..., concelho de Guimarães, com a descrição número 45111 na respectiva Conservatória de Registo Predial e inscrito na matriz sob o artigo 350, sucede que por venda anteriormente efectuada o referido imóvel já não era propriedade do Requerido (art°. 13° da p.i.);
10°- No auto de diligências para penhora referido no artigo 12° supra, constava a indicação de que o Requerido residia na ..., ..., Póvoa de Lanhoso, pelo que o Banco Requerente indicou à penhora os bens móveis constantes nessa morada (art°. 14° da p.i.);
11°- Sucede que, o recheio da habitação do Requerido não lhe pertence, sendo propriedade de um terceiro (art°. 15° da p.i.),
12°- Posteriormente, o Banco Requerente indicou à penhora os saldos bancários de que o Requerido fosse titular nas entidades bancárias a operar em território nacional. sem qualquer efeito útil (art°. 16° da p.i.),
13°- Face à inexistência de saldos penhoráveis, o Banco Requerente indicou à penhora os certificados da dívida pública e créditos representados por saldos de aforro em nome do Requerido, tendo sido notificado das respectivas inexistências. (art°. 17° da p.i.);
14°- O Banco Requerente indicou ainda à penhora créditos em sede de IRS que existissem em nome do Requerido, tendo sido notificado do oficio da Direcção Geral de Impostos, tendo sido informado da existência de créditos no montante de 962,76 €, valor esse que ficou penhorado à ordem do Banco Exequente, aqui Requerente (art°. 18° da p.i.);
15°- Face à insuficiência das valores penhorados e não tendo mais informações de bens penhoráveis, o Banco Requerente voltou a oficiar diversas entidades, nomeadamente do ramo das telecomunicações, seguros águas e electricidade, para virem aos autos informar a existência de bens penhoráveis do Requerido, contudo, recebeu apenas respostas negativas ou sem qualquer novidade (art°. 19° da p.i.);
16°- Para além disso, o Requerente fez buscas na Conservatória do Registo Automóvel, na Direcção-Geral de Contribuições e Impostos e no Centro Regional de Segurança Social do Norte, não encontrando qualquer veículo ou crédito em nome do Requerido (art°. 20° da p.i.);
17°- A execução baseada nas referidas livranças foi distribuída em juízo em 16/03/1998 (art° 12° da resposta),
18°- A referida execução encontra-se, ainda hoje, pendente (artigo 17° da resposta);
19°- As questões suscitadas pelo Requerido na sua Oposição foram invocadas como fundamento dos embargos de executado, deduzidos por aquele e que correram os seus termos sob o número 416/00 pela 2ª Vara Mista da Comarca de Guimarães (art°. 54° da resposta) (1) .
;
20°- No referido processo n°. 416/00 o embargante e ora Requerido, juntamente com os restantes embargantes e o banco embargado lavraram transacção nos seguintes termos: 1°- Os embargantes exibiram nesta data e procederam a junção aos autos de um documento comprovativo de que o débito exequendo que reclamam foi assumido pela empresa Empresa-E, documento aquele datado de 10/09/1998, que fica a fazer parte integrante desta transacção;2º - Os embargantes desistem desta instância de embargos de executados, desistência esta que é aceite pelo banco embargado; 3º - O banco embargado obriga-se a requerer a suspensão da instância executiva pelo prazo de 120 dias, por forma a que o pagamento do débito exequendo seja negociado com a Empresa-E", sendo que a não ser obtido o tal pagamento ou regularização dentro do referido prazo, a execução prosseguirá os seus respectivos trâmites" (2).
.
21 °- A referida transacção foi homologada por sentença (art°. 56° da resposta).
22°- E não obstante a suspensão da instância executiva (914/98 do 3° Juízo Cível da comarca de Guimarães) pelo prazo de 120 dias, a verdade é que o pagamento não foi efectuado, pelo que, decorrido aquele prazo de suspensão, a execução prosseguiu os seus termos normalmente, como ainda prossegue (art°. 59° da resposta).
23°- 0 requerido assumiu as obrigações emergentes das livranças dadas à execução na qualidade de sócio gerente da Empresa-E, tendo cedido a quota que dispunha nesta sociedade em 29/1/1998, e encontra-se reformado desde 19/10/1993, por ter atingido a idade de reforma (3).

3. — Análise do objecto da revista —

Face ao teor da alegação de recurso do recorrente, e, nomeadamente ás suas conclusões, constata-se que o objecto da revista incide sobre os seguintes pontos:
a) qual o regime aplicável à situação em debate - se o Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e da Falência (CPEREF) se o Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE).
b) não se encontrar provado que o recorrente deva o valor das livranças, já que o banco requerente promoveu a execução contra os demais co-executados ao ter concluído pela inexistência de bens ou rendimentos do ora recorrente, o que significa que pode ser pago, ou até já ter sido pago, por esses outros co-executados.
c) O recorrente ter subscrito as livranças como sócio gerente de uma empresa industrial, da qual se apartou, renunciando à gerência, e está reformado por velhice desde 19/10/1993, pelo que o pedido de insolvência deve ser julgado caducado, nos termos do art°. 9° do CPEREF.
d) A inexistência de bens no património do devedor não poder conduzir à declaração de falência, mas antes à extinção da instância por inutilidade da lide pelo que ocorrendo tal inexistência, sempre a instância seria inútil.

A questão levantada na apelação para a Relação relativa ao preenchimento das livranças voltou a ser referido na alegação da revista, mas como tal questão não foi levada às conclusões não será conhecida. Consigne-se, no entanto, que não foi, minimamente beliscada a argumentação expendida no Acórdão recorrido.

No que se refere à primeira questão apontada, verifica-se que, sucintamente, poderemos dizer que o regime legal aplicável à situação em apreço é o constante do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, aprovado pelo Dec. – Lei nº 53/2004, de 18 de Março.
Este diploma legal entrou em vigor em 15 de Setembro de 2004 e, face ao que se dispõe no art. 13º, o mesmo aplica-se aos processos instaurados após essa data. Tendo a insolvência a que se reportam os presentes autos dado entrada em juízo em 5 de Outubro de 2005, facilmente se conclui que o diploma aplicável será o C.I.R.E., não revelando, para este efeito, naturalmente a data de vencimento da dívida titulada pela livrança.

O segundo argumento expendido na alegação da revista é um facto novo não submetido à decisão das Instâncias, pelo que não pode ser conhecido por este S.T.J.
Seguindo a lição de Amâncio Ferreira (4), o direito português segue o modelo de revisão ou reponderação. Daí o tribunal “ad quem” produzir um novo julgamento sobre o já pedido e decidido pelo tribunal “a quo”, baseado nos factos alegados e nas provas produzidas perante este. Os juízes do tribunal de 2 ª Instância, ao proferirem a sua decisão, encontram-se numa situação idêntica à do juiz de 1 ª Instância no momento de editar a sua sentença, valendo também para a 2 ª Instância as preclusões ocorridas na 1 ª.
Nesta linha, vem a nossa jurisprudência repetidamente afirmando que os recursos são meios para obter o reexame de questões já submetidas à apreciação dos tribunais inferiores, e não para criar decisões sobre matéria nova, não submetida ao exame do tribunal de que se recorre (5).

Sempre se diga, no entanto, e, em jeito telegráfico, que na linha do decidido pelo Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 11.11.2004 (6), o aval representa um acto cambiário que desencadeia uma obrigação independente e autónoma de honrar o título, ainda que só caucione outro co-subscritor do mesmo – princípio da independência do aval (art. 32º, aplicável “ex vi” do art. 77º da L.U.L.L.), pelo que nunca poderia colher a argumentação do recorrente.

Relativamente à questão referente à caducidade do pedido de insolvência, sustenta o recorrente que, estando provado que o mesmo assumiu as obrigações emergentes das livranças dadas à execução na qualidade de sócio gerente de uma empresa industrial e que abandonou tais funções em 29/1/1998, tendo o débito exequendo sido assumido pela empresa Empresa-E, caducou o direito do requerente/recorrido requerer a declaração da sua insolvência, nos termos do art°.9° do CPEREF.

Preconizava-se nesta disposição legal que “no caso de o devedor ter (...) cessado a sua actividade, a falência pode ainda ser requerida por qualquer interessado (...), dentro do ano posterior a qualquer dos factos referidos nas alíneas a) , b) e c) do n°1 do artigo anterior, quer a situação de insolvência se tenha revelado antes, quer depois da morte ou da cessação de actividade do devedor".
Conforme se salientou “supra” o regime aplicável à situação em apreço é o constante no C.I.R.E, aprovado pelo DL n°.53/2004, de 18 de Março, o qual não contém norma equivalente à acabada de referenciar.
Transcrevendo o Acórdão recorrido, que se secunda “ nem se diga, como o faz o requerido/apelante, estar o requerente, na qualidade de credor legitimado, sujeito ao prazo de 60 dias estabelecido no art. 18° do C.I.R.E., posto que este não é um prazo de caducidade.
Trata-se tão só de um prazo estabelecido como forma de concretizar o dever de apresentação à insolvência que impede sobre devedor, sendo certo que o decurso deste prazo sem que tenha lugar tal apresentação nem sequer faz cessar o correspondente dever e, consequentemente, não retira legitimidade ao insolvente para a instauração da acção.
E muito menos o isenta da sujeição à insolvência que, então, seja desencadeada por credores ou pelo Ministério Público e responsáveis legais pelas dívidas dos insolventes, nos termos do art. 20°, n.°1 do C.I.R.E.
O que acontece, no caso de o referido prazo já se encontrar ultrapassado, quer à data da apresentação do devedor quer à data do requerimento da declaração de insolvência por parte de outros legitimados, é ter-se por incumprido o dito dever do insolvente, o qual fica, por isso, sujeito: à presunção da existência de culpa grave na insolvência (art. 186); à qualificação da insolvência como culposa, com as consequentes sanções a que alude o art. 189°, n.°2 do C.I.R.E; às consequências de carácter criminal contempladas nos arts. 227° a 229° do C. Penal”

Não procede, tal como se julgou na Relação a invocada excepção de caducidade.
Finalmente no que se refere à aludida inexistência de bens no património do devedor e, assim, por esse efeito, não poder conduzir à declaração de falência mas antes à extinção da instância por inutilidade da lide pelo que ocorrendo tal inexistência, sempre a instância seria inútil, sempre se diga que também, nesta sede, não assiste razão ao recorrente.
Com efeito, o recorrido fundou o seu pedido de declaração de insolvência no disposto nos arts. 3°, n.°1 e 20°, n°. 1, al. e) do C.I.R.E, alegando, para tanto, que o ora recorrente, por falta de meios próprios, de crédito e de património bastante, não cumpre nem ter possibilidade de cumprir pontualmente o crédito do exequente, insuficiência esta verificada no processo executivo que moveu contra ele.
Ora, mesmo que, se admita, que, em regra, seja de sopesar da verdadeira utilidade em abrir processo de insolvência quando antecipadamente se presume a inexistência de bens susceptíveis de satisfazerem os interesses dos credores, a verdade é que, mesmo nestas circunstâncias, conforme se salientou no Acórdão recorrido, não será, de todo, inútil tal processo, quer porque aquela presunção não invalida o facto de poderem existir outros bens do insolvente que, por limitação de meios, o credor, na respectiva acção executiva, não logrou encontrar, quer porque a finalidade do processo de declaração de falência não se resume à apreensão dos bens do património do insolvente para posterior liquidação e pagamento aos credores.
Com efeito, e, concordando-se, por inteiro, neste particular, com o constante na contra alegação da revista, refira-se que a alegação de que a lide (da Insolvência) era inútil, verificada a inexistência de património do devedor, não tem razão de ser, uma vez que o processo de insolvência é um processo de liquidação universal e concursal dos bens do Recorrente para posterior pagamento dos seus credores, visando, em primeira linha, a apreensão dos bens integrantes do património do Recorrente, para posteriormente proceder à respectiva liquidação e pagamento dos créditos aos respectivos beneficiários, mas também, comporta outras finalidades, como o saneamento do mercado, expurgando-se, pois, as empresas ou pessoas singulares económica ou financeiramente inviáveis e recuperando e reorganizando a/os viáveis e, ainda, a produção de vários efeitos decorrentes da declaração de Insolvência, que vão muito além da simples apreensão de bens do Recorrente – nomeadamente e a título meramente exemplificativo, a privação imediata de o Recorrente administrar ou dispor dos bens integrantes da massa Recorrente (artigo 81), o vencimento imediato de todas as obrigações do Recorrente (artigo 91), a possibilidade de exigir alimentos do Recorrente (artigo 93), a suspensão de todos os prazos de prescrição e de caducidade oponíveis ao Recorrente (artigo 100), a impugnação pauliana de actos praticados pelo Recorrente (artigo 127)”.

Não colhe, pois, qualquer dos argumentos trazidos a este Alto Tribunal pelo recorrente, pelo que improcede o recurso.

4. Nestes termos, acordam, no Supremo Tribunal de Justiça, em negar a revista, confirmando o Acórdão recorrido.
Custas pelo recorrente.

Lisboa, 14 de Novembro de 2006

Borges Soeiro (Relator)

Faria Antunes

Sebastião Póvoas

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(1) Redacção que lhe foi dada pela Relação de Guimarães no Acórdão recorrido.

(2) Redacção que lhe foi dada pela Relação de Guimarães no Acórdão recorrido.

(3)Aditado pela Relação de Guimarães no Acórdão recorrido.
(4) in, “Manual dos Recursos em Processo Civil”, pag.106.
5) nesta linha, vide Acs. do S.T.J. de 2.5.1985 (B.M.J. 347º, pag. 363), de 29.11.1989 (B.M.J. 391º, pag. 520 e de 9.3.1993 (B.M.J. 425º, pag. 438).
(6) In, “www. dgsi.pt” (net), Relator Cons. Ferreira de Almeida.