Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
111/23.4YRPRT.S1
Nº Convencional: 6.ª SECÇÃO
Relator: ANTÓNIO BARATEIRO MARTINS
Descritores: DECISÃO ARBITRAL
ANULAÇÃO DE SENTENÇA
IMPUGNAÇÃO
FUNDAMENTOS
ENUMERAÇÃO TAXATIVA
ERRO DE JULGAMENTO
MATÉRIA DE DIREITO
MATÉRIA DE FACTO
MODIFICABILIDADE DA DECISÃO DE FACTO
PROVA PERICIAL
CONHECIMENTO DO MÉRITO
PROCESSO ARBITRAL
NULIDADE DE SENTENÇA
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
Data do Acordão: 02/22/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE.
Sumário :

I - Na impugnação duma sentença arbitral, “apenas” se podem invocar/discutir os vícios do percurso, do processo arbitral, que levou os árbitros até à sentença, assim como, atento o disposto nas subalíneas v) e vi) da alínea a) do art. 46.º/3, se podem invocar os vícios da condenação por excesso ou defeito e a falta de fundamentação.

II – Pelo que, sendo taxativos os fundamentos da impugnação de uma sentença arbitral, como claramente resulta do corpo do art. 46.º/3 da LAV, não pode “aproveitar-se” a instauração de tal impugnação para invocar outros e diversos fundamentos, designadamente fundamentos respeitantes ao “mérito” da sentença arbitral.

III – Dizendo-se na sentença arbitral que se irá acompanhar, na decisão da matéria de facto, o relatório pericial, mas transpondo-se incorretamente, por vários vícios de raciocínio, o que resulta do relatório pericial para o que factualmente foi sendo decidido pela sentença arbitral, ocorre um erro no julgamento de facto por parte da sentença arbitral: estamos perante uma sentença arbitral que está “errada” (e não perante uma sentença arbitral não fundamentada), “erro” este que, tendo a ver com o “mérito”, não pode sequer ser corrigido numa impugnação de sentença arbitral.

IV – Uma sentença arbitral mal fundamentada ou erradamente fundamentada, seja de facto ou de direito, não padece das nulidades/vícios referidos nas alíneas v) e vi) do art. 46.º/3/a) da LAV.

Decisão Texto Integral:

Proc. 111/23.4YRPRT.S1

6.ª Secção

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

I – Relatório

Sport C. Salgueiros instaurou, em 12/04/2023, no T. Relação do Porto, contra Pauta de Flores, Lda., a presente ação de anulação de sentença arbitral1 (que julgou a ação arbitral intentada pela Pauta Flores totalmente improcedente e parcialmente procedente a reconvenção do S. C. Salgueiros, condenando a A. Pauta Flores a pagar ao R. S. C. Salgueiros a quantia de € 262.188,95, acrescida de juros de mora à taxa legal a contar da citação e até efetivo e integral pagamento), formulando afinal o seguinte pedido: “deve a presente ação de anulação ser considerada totalmente procedente por provada, com todas as consequências legais.”.

Alegou e concluiu que:

1. A Sentença Arbitral proferida pelo Tribunal Arbitral constituído por acordo das partes ora litigantes não merece aquiescência da A./Requerente;

2. Deve a Sentença em crise ser expurgada, por via da procedência do presente pedido de anulação, na parte que relativa a fixação do montante devido por conta de repartição de lucros devidos até 31.12.2017, e assim na parte em que ao montante fixado por relatório pericial no qual o Colégio Arbitral assentou a fixação de uma parte dos montantes devidos à A./Requerente, deduziu a quantia de €350.882,92, ao montante de € 613,431,87, (359.118,25 + €254.313,62) quando aquele valor (€350.882,92) já havia sido deduzido para o Colégio Pericial alcançar o valor de €359.118,25, mínimo, como devido à A./Requerente; (a este último, o Tribunal Arbitral, sem assentar no relatório arbitral, condenou a R./Requerida em mais €254.313,62, perfazendo o total de € 613,431,87 e subtraindo €350.882,92 atinge o valor de €262.548,95);

3. Atento o alegado supra 2., deve ser expurgado em concreto o ponto 18, o ponto 30 último paragrafo na pág.33/52, (“Aos €613.431,87 deverão, contudo, ser subtraídas a quantias que a Ré terá de pagar à Autora, (i)pela sua meação nos prejuízo incorridos pelo Consórcio no primeiro ano de exploração da actividade, e (ii) a titulo de devolução dos adiantamentos recebidos por conta de lucros futuros, quantias essas cuja soma atinge um valor global de €350.882,92. Dessa subtração resulta um valor final, que a Autora terá de pagar à Ré, de €262.548,95.”, o parágrafo inserto na página 48/52, onde se lê, “Aos €613.431,87 deverão, contudo, ser subtraídas a quantias que a Ré terá de pagar à Autora, a titulo quer de meação nos prejuízo incorridos pelo Consórcio no primeiro ano de exploração da actividade, quer de devolução dos adiantamentos recebidos por conta de lucros futuros, quantias essas cuja soma atinge um valor global de €351.242,92.Dessa subtração resulta um valor final, que a Autora terá de pagar à Ré, de €262.188,95.”; o quarto paragrafo da pág.51/52, onde se lê “Com base na matéria de facto apurada, e na ilicitude da resolução contratual, é a Autora/Reconvinda condenada a apagar à Ré/Reconvinte a quantia de €262.188,95, acrescida de juros moratórios à taxa legal a contar da citação e até efectivo e integral pagamento (…)”, e tudo o que, por consequência, se mostre, sequente, em contradição;

4. Sendo que, a actuação do Colégio Arbitral, depois de considerar o relatório pericial de fls., e a confirmação do mesmo por parte do testemunho do Presidente do Colégio Arbitral e Perita, corresponde a “pronúncia sponte sua” sobre questões excedentárias de que não podia tomar conhecimento, por já terem sido apreciadas pelos peritos em cujo relatório pericial basearam a Sentença Arbitral, ob.cit.;

5. Violando assim o disposto no artigo 46.º n.º 3 alínea a), subalínea V, da LAV;

6. A Sentença Arbitral, na mesma parte alegada nas conclusões antecedentes, sempre teria de ser objecto de anulação uma vez que, a fixação de pelo menos €359.118,25 por conta dos lucros como valor devido à A./Requerente, mostra-se corroborada pelo depoimento do Presidente do Colégio Arbitral, (minutos 1:00:47 a 1:01:41, cuja transcrição integral se anexou como doc.17) e bem assim, confirmado pela Perita, Dra. AA, na qualidade de testemunha nas providências cautelares ut docs. 19 e 20, juntas aos autos arbitrais, ut docs.21 e 22 dos quais – prova testemunhal e decisões judiciais – resultou que o valor de €359.118,25, era um valor que já incluía todas as deduções relativas a comparticipação da A./Requerente nos prejuízos e adiantamentos a mais no âmbito do desenvolvimento do Contrato de Consórcio de fls. e assim resultado das correcções que introduziram perante os falseados resultados apresentadas pela R./Requerida;

7. Perante tais elementos probatórios, e atento o teor do pedido de rectificação/ reforma e prolacção de Sentença Adicional de fls., mais precisamente os pontos 8 a 37 alegados supra art.º 23.º, a Sentença Arbitral Final/Retificada, (além do vício invocado nas conclusões 2 a 5) omite por completo pronúncia sobre as concretas questões suscitadas pela A./Requerente,

8. Incorrendo no vício previsto no artigo 46.º n.º 3 alínea a), subalínea V da LAV;

9. A Sentença Arbitral, veio a condenar a R./Requerida no pagamento da quantia de €262.548,95., acrescida de juros vencidos e vincendos desde a data da citação, como resulta da mesma, mais precisamente do quarto paragrafo da pág.51/52, onde se lê “Com base na matéria de facto apurada, e na ilicitude da resolução contratual, é a Autora/Reconvinda condenada a apagar à Ré/Reconvinte a quantia de €262.188,95, acrescida de juros moratórios à taxa legal a contar da citação e até efectivo e integral pagamento (…)”;

10. Compulsado o pedido reconvencional formulado pela A./Requerente – ut doc.9 e art.º 39.º supra -, resulta do mesmo pedido a condenação da R./Requerida, ali A./Reconvinda, no pagamento de determinada quantia “(…) acrescida de juros à taxa legal desde a data do vencimento até efectivo e integral pagamento “;

11. A Sentença Arbitral, assim, fixou a condenação da R./Requerida considerando um pedido que não lhe foi formulado (“desde a data da citação” - que também omite) em detrimento do que lhe foi formulado “desde a data do vencimento), suscetível de influir não apenas na quantia condenatória, mas também na fixação de custas/decaimento;

12. A Sentença Arbitral deve ser expurgada na parte correspondente a quarto paragrafo da pág.51/52, onde se lê “(…) é a Autora/Reconvinda condenada a apagar à Ré/Reconvinte a quantia de €262.188,95, acrescida de juros moratórios à taxa legal a contar da citação e até efectivo e integral pagamento (…)”;

13. Sendo que o Tribunal Arbitral ao pronunciar-se sobre pedido que não lhe foi formulado, inquina a Sentença Arbitral Final/Retificada vício previsto no artigo 46.º n.º 3 alínea a), subalínea V da LAV, e sempre sem qualquer fundamentação cfr. 46.º n.º 3 alínea a), subalínea VI da LAV ;

14. A Sentença Arbitral Final/Retificada, declarou a resolução contratual perpetrada pela R./Requerida como ilícita, declarando-a eficaz sem fundamentar a opção pela declaração de eficácia da mesma;

15. Na verdade, alude a Sentença Arbitral a suposta doutrina “dominante” – sem o mínimo de confronto com qualquer doutrina que seja - assente na transcrição parcial de um parágrafo de uma citação de um autor – respeitável, não obstante – quando o parecer em causa, lido no todo contraria a parte transcrita, mas sempre sem que se alcance como concluiu o Tribunal Arbitral que tal orientação é dominante, quando não é, seja pela doutrina seja pela recente jurisprudência retro citada, por cautela;

16. A Sentença Arbitral Final/Retificada não só assenta a sua posição em parecer que não corresponde à integralidade do mesmo (transcreve uma parte, que depois, na parte sequencial, considerando o reconhecimento do vício formal da resolução, diz precisamente o contrário da parte transcrita), bem como não fundamentou, de facto e de direito, a opção por considerar a eficácia da resolução – ilicitude declarada e que se aceita – tornando ininteligível como chegou a tal, inquinando a mesma com o vício previsto no art.º 46 n.º 3 al. a) subalínea VI, da LAV.

17. Devendo, pois, ser anulada nessa concreta parte, e mais precisamente ser expurgada no primeiro e segundo parágrafos da pág.44/52, em que declara a resolução eficaz sem que a declaração de eficácia esteja fundamentada; expurgada no último parágrafo da pág. 50/52, (inserta no ponto VIII e não VI como certamente por lapso de escrita ali se refere, considerando que na pág. 45/52 se encimou por ordem o ponto VII) onde se lê “(…) produziu a resolução os respectivos efeitos, extinguindo o contrato”; e expurgado o segundo parágrafo da pág.51/52, onde se lê “Sendo eficaz, até ao momento, a resolução do contrato, não é juridicamente possível a declaração judicial de resolução do mesmo por justa causa pedida pela Ré/Reconvinte, na sua reconvenção.”;

18. Quando tal não se entenda, o que se hipotisa por mero dever de ofício, sempre deverá ser anulada causa do vício previsto no art.º 46 n.º 3 al. a) subalínea V, da LAV;

19. Uma vez que, direccionado o parecer evocado - no qual terá assentado a opção do Tribunal Arbitral -, no seu todo para um sentido distinto daquele em que se efectivou a opção vertida para a que se mostra em crise, tal sempre corresponderia a questões excedentárias de que não podia tomar conhecimento, por já terem sido apreciadas pelo aludido parecer e em sentido diverso;

20. A A./Requerente, confrontada com a Sentença datada de 25.10.2023, ut doc. 12 pontos 38 a 48, argumentou a sua discordância no que tange a absolvição da R./Requerida como litigante de má-fé.

21. A Sentença Arbitral Final/Retificada, por total falta de fundamentação de facto e de direito para a absolvição e omissão de pronuncia sobres as concretas questões suscitadas pela A./Requerente ut doc.12, padece dos vícios plasmados no art.º 46 n.º 3 al a) subalínea V e VI, da LAV,

22. Devendo ser expurgada do último parágrafo da pág.51/52 e início da pág. 52/53, onde se lê “A Ré Reconvinte pede a condenação da Autora/Reconvinda em litigância de má-fé. Afigura-se, contudo, infundado esse pedido: com efeito, esgrimiu a Autora, na defesa da licitude da resolução contratual, e designadamente nas suas alegações finais, argumentos jurídicos coerentes e minimamente consistentes embora não o suficiente para convencer o Tribunal); e, mais do que isso, reconheceu o Tribunal assistir-lhe toda a razão no pedido de devolução das quantias por si adiantadas à Ré por conta de lucros futuros. E, por conseguinte, absolvida a Autora do pedido de condenação em litigância de má-fé.”;

23. A A./Requerente formulou junto do Tribunal Arbitral, por este o ter omitido, a fixação da concreta proporção do decaimento das partes, ut doc.12 pontos 50 a 52, e perante tal petitório, a Sentença Arbitral Final/Retificada, veio em 08.03.2023, lapidarmente, dizer o seguinte: “Relativamente a custas e atendendo ao decaimento de cada parte vai a Autora condenada a pagar 45% dos encargos do processo e a Ré/Reconvinte 55% dos mesmos.”;

24. Despida que se mostra de qualquer fundamento que permita alcançar o iter percorrido pelo Tribunal Arbitral para atingir tais, errados, (errados pois, desde logo, dos 6 pedidos em apreciação, os três pedidos da R./Requerida foram improcedentes; o primeiro pedido da A. Requerente é procedente; o segundo dos pedidos não foi objecto de pronuncia e houve e o terceiro dos pedidos é parcialmente procedente) valores;

25. Incorrendo assim a Sentença no vício plasmado no art.º 46 n.º 3 al a) subalínea VI, da LAV, devendo ser ordenada a sua expurgação por este Venerando Tribunal, no parágrafo inserto na pág.52/53, onde se lê: “Relativamente a custas e atendendo ao decaimento de cada parte, vai a Autora condenada a pagar 45% dos encargos do processo e a Ré/reconvinte 55% dos mesmos”.

26. Subsidiariamente e por cautela, sempre tal concreto ponto da Sentença em crise deverá ser expurgado, se, como se admite inevitável, se mostrar procedente a anulação alegada supra I, nas alegações supra 1. a 8.;

27. Ao Tribunal estava vedado condenar em quantidade superior ao pedido, nos termos do disposto no art.º 46.º n.º 3 alínea a), subalínea V, da LAV, o que não sucedeu nas partes de segmento decisório em que, atento o pedido de condenação da A./Requerente por parte da R./Requerida, na quantia de €321.896,09 acrescida de juros à taxa legal (ut doc.8 de fls.);

28. Logo, por violar o citado normativo, da Sentença Final/Retificada, deve ser expurgado o primeiro parágrafo da pág.21/52; o ponto 30 último paragrafo na pág.33/52; 3.º parágrafo da pág.46/52, e o parágrafo inserto na página 48/52, e tudo o sequente que se mostre contraditório,

29. Com acrescida relevância, uma vez que, além estar vedado ao Tribunal, influi decisivamente no montante a ser fixado em beneficio da A./Requerente, que, em caso de improcedência do alegado supra I, o que se configura por mero exercício de raciocínio académico, sempre determinaria em benefício da A./Requerente, o recebimento da quantia de 262.188, 95 + (351.242,92 – 321.896,09) €29.346, 83, ou seja, €291.535,78”.

Conclusos os autos no T. da Relação do Porto, foi proferida, em 10 de agosto de 2023, a seguinte decisão singular:

“(…) ao abrigo do disposto no nº 1 do artigo 590º do Código de Processo Civil, com fundamento em manifesta improcedência dos pedidos formulados por S. C. Salgueiros nestes autos de anulação de acórdão arbitral indefere-se liminarmente a petição inicial.”

Decisão singular de que o S. C. Salgueiros reclamou, tendo o T. da Relação do Porto, por Acórdão da Conferência, julgado totalmente improcedente a reclamação para a Conferência deduzida em 11 de setembro de 2023 pelo Sport C. e Salgueiros e, consequentemente, mantido a decisão reclamada proferida em 10 de agosto de 2023.

Inconformado, interpõe agora o Sport C. e Salgueiros o presente recurso de apelação, pedindo afinal que seja “integralmente revogada a Decisão/Acórdão”.

Terminou a sua alegação com as seguintes conclusões:

“(…)

1. - A Decisão singular e Acórdão recorrido violaram o disposto nos art.º 42.º, n.º 3 e 46.º, n.º 3, al. a), sub al. V) e VI), da LAV, art.º 615.º, n.º 1, al. a) e d), do C.P.C.; art.º 20.º, CRP; art.º, 2.º, 6.º, 410.º, 411.º, 413.º, 417.º, 421.º, 590.º, n.º 1, al. c), 651.º, n.º 2, 662.º, n.º 2, al. d), 665.º e 666.º, n.º 1, todos, do C.P.C.;

2.- Dispõe o n.º 2, do art.º 651.º, do CPC, “As partes podem juntar pareceres de jurisconsultos até ao início do prazo para a elaboração do projeto de acórdão.”, sendo que, o Tribunal “a quo”, indeferiu a junção do Parecer que ora se junta, por alegada intempestividade, uma vez que alegadamente havia formulado despacho de 14.09.23, cujo teor aqui se transcreve, “Atentas a extensão da decisão reclamada, da reclamação para a conferência e bem assim do projeto de acórdão que se remeteu aos Exmos. Juízes-adjuntos, determina-se que os autos vão aos vistos simultâneos dos restantes membros do coletivo e que após isso se inscreva imediatamente em tabela.”;

3. - Não se conforma o Recorrente com tal indeferimento, por alegada extemporaneidade, é absolutamente violador do princípio da legalidade e da tutela jurisdicional efetiva e igualdade de armas, pois o Acórdão em crise foi proferido ainda antes de esgotado o prazo para pronúncia sobre tal indeferimento, e mais ainda, não era expectável que no dia em que os autos foram conclusos (14.09.2023), do despacho lavrado nesse dia constasse que o projeto de Acórdão havia sido enviado aos demais membros do Coletivo, e nessa perspetiva, por não haver notificação da data de conclusão ou do início da contagem do prazo para elaboração do projeto de Acórdão sempre estaria encontrada forma para de modo discricionário se admitirem ou não Pareceres, uma vez que as partes não sabem e nem podem imaginar que, havendo um mero lapso, ainda mesmo antes da conclusão, o projeto de Acórdão fora remetido aos demais Srs. Desembargadores - e que não se pretendia, com ou sem parecer, ponderar as “extensas” e “inovatórias” razões aduzidas pelo aqui Recorrente;

4.- Devendo pois ser tal despacho revogado, por nulo, e admitido o Parecer naquela sede, senão, pelo menos nesta, uma vez que, por cautela se reenvia o mesmo que o Tribunal “a quo”, ainda que alegada a sua pertinência para o apuramento da verdade material inerente à tutela jurisdicional efetiva, não o desejou admitir;

5. O Acórdão proferido praticamente copy paste da Decisão Singular - persiste nos vícios invocados na Reclamação de fls., não sanados no Acórdão recorrido, e incorre ainda em renovado vício de omissão de pronúncia quanto a questões ali suscitadas;

6. Senão assente em total falta de fundamentação, pelo menos é inequívoco o gravíssimo e notório erro de interpretação/julgamento da Decisão Singular e Acórdão sub judice quando refere que “tendo a decisão arbitral sido proferida com recurso à equidade”, uma vez que, a decisão arbitral foi assente em Relatório Pericial, no que corresponde ao montante de €359.118,25 e com base, aparentemente, na equidade no que diz respeito à soma dos valores de €170.063,62 e de €84.250,00, cuja soma aos €359.118,25, permitiu ao Colégio Arbitral concluir na parte final do ponto 30.“ (...) estando esse montante também em dívida, tem a o direito a receber da Autora a soma dessas três parcelas, ou seja, a quantia de 613.431,87.”, (€359.118,25+ €170.063,62 + €84.250,00);

7. O Acórdão de fls., ao concluir, erradamente e sem fundamentação, que a Decisão Arbitral decidiu por suposto recurso à equidade, incorreu em manifesto erro interpretativo/julgamento, tendo em consequência de tal erro omitido pronuncia quanto à alegada falta de fundamentação conforme transcrito supra 1 a 9, págs. 9 a 11, como estatuído no art.º 615.º, n.º 1, al. d) do CPC., que se mostra em vigor e que não isenta de tal a Decisão singular e o Acórdão recorrido;

8. A referida omissão sobre o pedido de fundamentação viciadora da Decisão Arbitral para subtrair uma parcela descontada, quando o Colégio Pericial alcançou como devido ao Recorrente, pelo menos, a quantia de €359.118,26, inquina não apenas a Decisão Arbitral, como a Decisão Singular e o Acórdão recorridos, e afigura-se manifestamente relevante, pois que se traduziu num prejuízo injustificado, para o Recorrente na monta de capital, de pelo menos €351.242,92 (€613.431,87 €262.188,95 = €351.242,92), sendo que:

a) €359.118,16, valor mínimo resultante do relatório pericial e dado como seguido pelo Colégio Arbitral;

b) €254.313, 71, valor desconsiderado pelo Colégio Arbitral, assente aparentemente na equidade e devido à Recorrente;

c) €262.188,87, valor deduzido pelo Colégio Arbitral, que havia sido deduzido pelo Colégio Pericial para atingir como mínimo devido à Recorrente o valor expresso na al. a), sem qualquer fundamentação e de forma excedentária, “sponte sua”, de acordo com Parecer do Sr. Ph.D. BB;

9. A Decisão Arbitral, assenta, única e exclusivamente, na Prova Pericial, no que para os presentes releva, contudo decide de forma contrária às conclusões ali exaradas, sem que fundamente tal opção, como se impunha.

Como consabido, sobre os Srs. Árbitros impendia um dever acrescido de fundamentação, na dupla dedução do montante de €350.882,92, em prejuízo do aqui Recorrente. O relatório pericial, os testemunhos do Presidente do Colégio Pericial e Vogal, as Sentenças cautelares e testemunhos subjacentes, e até o sublinhado de todos os quadros do relatório pericial são unânimes em reconhecer que ao montante de €359.118,25€, nada havia a subtrair, por ser o valor mínimo devido ao Recorrente, (vide docs. 17, 19, 20, 22, e minuto 01.00.47 a 01.01.41 da transcrição integral da audiência de julgamento ut doc.18), outrossim havia valores a somar e que o Colégio Arbitral até somou para alcançar como devido ao Recorrente o valor de 613.431,87, cfr. ponto 30 da Decisão Arbitral de fls.;

10. Uma leitura atenta, permite concluir, que a sentença arbitral assenta em dois critérios:

1-No que respeita aos resultados atribuídos ao S. C. Salgueiros nos anos de 2013 a 2016 (dois primeiros meses e meio), assenta em Relatório Pericial, conforme trecho que aqui se transcreve:

“Face a esta discordância, de teor essencialmente técnico, e que o Tribunal, dada a formação, exclusivamente jurídica dos seus membros, sente não estar em condições de apreciar e decidir com plenas ciência e conhecimento, outra solução não resta que não a de aplicar o critério supraenunciado, ou seja, a de privilegiar as conclusões do relatório subscrito também pelo Perito e Presidente (doravante Relatório Pericial), por exprimirem a posição maioritária dentro do colégio pericial.” (negrito nosso).

2- Quanto aos demais valores, expressos no 1.º parágrafo, do ponto 21, da Decisão Arbitral em crise, assenta na equidade, conforme trecho que se transcreve:

“Isto posto, e dada a falta de elementos evidenciada pelos peritos, e que impossibilitam a quantificação dos gastos que deverão ser tidos em conta, com desconsideração dos demais, outro caminho não resta ao Tribunal senão o de decidir estas questões controvertidas (naturalmente as que vão além do apurado e assente valor de 359.118,25) com recurso à equidade, ao abrigo do disposto no art. 0 556. 0, n. 0 3, do Código Civil sempre dentro, naturalmente, dos limites (inferiores e superiores) comprovados nos presentes autos. E, quando com outro critério não seja possível quantificar qual o valor exato que deve ser atendido, o Tribunal, com recurso a juízos de equidade, determina que o montante controvertido deverá ser desconsiderado, como custo, em 50%, conforme é, de seguida, discriminado.”, (pág.33/51). (negrito nosso).

O trecho transcrito no Acórdão Recorrido, “Isto posto, e dada a falta de elementos já evidenciada pelos peritos, e que impossibilitam a quantificação dos gastos que deverão ser tidos em conta, com desconsideração dos demais, outro caminho não resta ao Tribunal senão o de decidir estas questões controvertidas com recurso à equidade, ao abrigo do disposto no art.º 556.º [aliás 566.º], n.º 3 do Código Civil sempre dentro, naturalmente, dos limites (inferiores e superiores) comprovados nos presente autos. E, quando com outro critério não seja possível quantificar qual o valor exato que deve ser atendido, o Tribunal, com recurso a juízos de equidade, determina que o montante controvertido deverá ser desconsiderado, como custo, em 50%, conforme é, de seguida, discriminado.”, reporta-se ao retro indicado ponto 2, sendo que, esta matéria não foi colocada em crise no âmbito da acção de anulação proposta, que apenas versa sobre os montantes indemnizatórios invocados no ponto 1, cuja decisão assentou exclusivamente em Relatório Pericial.

O aludido erro, inquina, irremediavelmente toda a decisão proferida, na medida em que influencia de forma determinante a apreciação de todas as questões submetidas.

11. A Decisão Singular e Acórdão sub judice, configuram decisão surpresa, que os inquina com vício de nulidade, atenta:

a) Declaração infundada, segundo a qual, a Decisão Arbitral assentou na equidade, quando, poder decidir-se de acordo com equidade não se confunde com decisão assente em equidade;

b) Indeferimento Liminar, sem fundamentação absoluta, ou quando assim não se entenda por manifesto erro de julgamento;

c) Preterição de produção de prova, apta a influir na decisão da causa, sem que seja conhecida a fundamentação, e sem que tenha sido dada oportunidade às partes para exercer o contraditório perante o perspetivado indeferimento liminar e também a preterição de tal, essencial, produção de prova testemunhal;

d) Preterição/omissão de qualquer apreciação crítica da prova carreada para os autos pelo Recorrente, em particular o Relatório Pericial, considerando o decisório, contraditoriamente fundado no mesmo;

e)Total omissão de pronúncia e apreciação critica sobre a, por sua vez, falta de fundamentação arguida no pedido de reforma/rectificação/esclarecimentos/Sentença Adicional de fls. (especialmente o ponto 32.º, do doc.12 de fls., para além dos pontos 37.º e 38.º, da Acção de Anulação de fls.), atinente a dupla subtracção de um valor, sobre a condenação na quantia global de € 613.431,87, em prejuízo do Recorrente, cfr. ponto 30 da Decisão Arbitral de fls.;

f) Perante as seguintes alegações:

4- “4. Sendo que, a actuação do Colégio Arbitral, depois de considerar o relatório pericial de fls., e a confirmação do mesmo por parte do testemunho do Presidente do Colégio Arbitral e Perita, corresponde a “pronúncia sponte sua” sobre questões excedentárias de que não podia tomar conhecimento, por já terem sido apreciadas pelos peritos em cujo relatório pericial basearam a Sentença Arbitral, ob. cit. Ph.D. BB a fls.; 5. Violando assim o disposto no artigo 46.º, n.º 3, alínea a), subalínea V, da LAV;”

12. O Colégio Arbitral na Sentença Arbitral de 25.10.2023 e de 08.03.2023 seguiu, como amiudadas vezes referiu, o relatório pericial, e com base no mesmo condenou a R. não no mínimo de 359K, mas sim em €262.188,95, sem qualquer fundamentação, e a Decisão Singular e Acórdão sub judice, também sem qualquer fundamentação ou apreciação sobre a alegada falta de fundamentação da Sentença Arbitral, desviam-se para a equidade ou insuficiência ou falta de motivação da matéria de facto (também sem saber ou haver justificação para o “ou”), e em duas depenadas, não fundamentadas, o mínimo assente em €359.118,26 como devido ao Recorrente, passa para €262.188,95 (a conclusão 8 explicita como, com manifesto e ostensivo erro, baseando-se no argumento erróneo de que a decisão arbitral se fundou em equidade, se uma verdadeira pancada ao Recorrente da módica quantia de capital de €351,242.92);

13. A Decisão Arbitral de 08.03.2023, não fundamenta, violando assim o disposto no artigo 46.º, n.º 3, alínea a), subalínea VI, da LAV, o pedido de rectificação a este propósito formulado pelo aqui Recorrente, que por isso mesmo fez questão de voltar a alegá-lo na ação de anulação, em particular nos seus artigos 23.º a 28.º. vício que persiste na Decisão Singular e Acórdão sub judice, que omitem pronúncia sobre este concreto ponto e por conseguinte mantêm a falta de fundamentação, apesar de solicitada no pedido de rectificação/reforma/esclarecimentos/Sentença adicional de fls., ut ponto 32.º, do doc.12 de fls.), pelo que o indeferimento liminar inserto naquelas decisões assenta em falta de fundamentação ou manifesto erro de julgamento;

14. Ao não notificar o ora Recorrente, no que diz respeito a indeferimento liminar de fls., nos termos do disposto no n.º 3, do art. 665.º, do CPC, o Tribunal da Relação omitiu, indubitavelmente, acto prescrito pela Lei, omissão que influiu no exame e na decisão da causa, o que se evoca;

15. Não se mostra fundamentada, (vício que se manteve tanto na Decisão Singular como no Acórdão Recorrido), qual foi a livre apreciação do Tribunal Arbitral para contender com o Relatório Pericial, cujas conclusões aceitou e deu por assentes. Tal ausência de fundamentação foi alegada sem êxito no pedido de rectificação/reforma/esclarecimentos/sentença adicional no ponto 32, ut doc.12 e na Acção de Anulação de fls., sendo que a referida dupla subtracção de valores não consta do Relatório pericial de fls., nem se alcança dos docs. 18, 19, 20 e 22, apenas se sabendo que o Colégio Arbitral seguiu o Relatório Pericial, e que o testemunho dos seus membros foi claríssimo ao afirmar que ao valor de €359.118,25 nada havia a descontar, outrossim a somar, como o mesmo Colégio Arbitral acabaria por concluir, ser devido ao Recorrente o valor global de € 613.431,87;

16. A Decisão Singular, refere “o indevido afastamento das conclusões periciais por parte do tribunal na decisão da matéria de facto, não constituem qualquer excesso de pronuncia, mas sim um erro de julgamento na decisão da matéria de facto ou (bolt, itálico e sublinhado nossos) uma insuficiência ou falta de motivação da decisão da matéria de facto (veja-se a alínea d), do n.º2, do art.º 662, do Código de Processo Civil). Neste enquadramento é evidente que esta patologia imputada à decisão arbitral é manifestamente improcedente.” e repetindo no Acórdão em crise, refere “já não estará em causa a resolução de uma questão jurídica que tenha sido suscitada pelas partes mas sim ou um erro na apreciação da prova ou uma falta ou insuficiência da motivação da decisão da matéria de facto.” (sublinhado e negrito nossos), porém a prova, relatório pericial de fls., foi bem apreciado e seguido pelo Colégio Arbitral, (como os seus membros fizeram questão de afirmar na sentença arbitral, conforme transcrições supra), de tal sorte que aceitou na integra o valor ali fixado como mínimo devido à R., aqui Recorrente, mas depois, como demonstrado na conclusão 8, subtrai um valor já deduzido pelo Colégio Pericial e para essa nova subtracção é que nunca proferiu qualquer fundamentação, nem a Decisão Singular, nem o Acórdão recorrido a encontraram ou sequer se pronunciaram sobre tal falta de fundamentação, e,

17. Dispondo o n.º 1, al. b), do art.º 615.º, do CPC, que é nula a sentença quando “Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;”, tal ocorre nos autos, uma vez que a sentença arbitral não fundamenta de facto e de direito, a razão pela qual seguindo o Relatório Pericial, afastou as conclusões periciais, fixando valor distinto do ali apurado, e a Decisão Singular e Acórdão sub judice continuam a contornar singularmente esta questão, sem a apreciar, o que se impunha, quer porque alegada, quer porque a mesma é de conhecimento oficioso, como supra se expôs e conforme vertido na jurisprudência invocada;

18. A Sentença Arbitral, objecto de anulação e datada de 08.03.2023, na sequência de pedido de rectificação do Recorrente, não apresenta os fundamentos pelos quais incorreu na duplicação da subtração de valores, considerando que para atingir os €359.118,26, seja por via do relatório pericial de fls., seja por via do depoimento, seja por via das diversas providencias cautelares decretadas contra a A., aqui Recorrida, resultando daí um inequívoco vício de falta de fundamentação da Decisão Arbitral e por maioria de razão, sobre o qual a Decisão Singular e Acórdão sub judice se deviam pronunciar e apreciar o não o fizeram e que expressamente se invoca.

19. A Decisão Singular e Acórdão sub judice afirmam que “Esta nossa visão crítica quanto à regra da livre apreciação da prova pericial, conduz a uma exigência acrescida de fundamentação da decisão de facto sempre que o julgador se afaste do relatório pericial 14”.”, porém, não houve livre apreciação da prova pericial, mas sim submissão/adesão/aderência/ à mesma, (algo que o Colégio Arbitral repete até à exaustão) e é certo que, o que não houve, foi fundamentação, para atento o que antecede, depois se subtrair uma verba que havia sido dada como assente e devida, e de um mínimo assente em relatório seguido pelo Colégio Arbitral, que deduz valores já subtraídos e considera que à ali R., aqui Recorrente, afinal, sem fundamentação conhecida, são devidos apenas €262.188,95.

20. A Decisão Singular e Acórdão sub judice referem: “A prova pericial, como qualquer outro meio de prova releva para a decisão da matéria de facto e a sua desconsideração total ou parcial, mesmo que não declarada pelo julgador ou até com declaração contrária ao que efetivamente se verifica não constitui tecnicamente qualquer omissão de pronúncia”, porém não foi esta a nulidade invocada, pelo ora Recorrente, outrossim, a falta de fundamentação, por não ter a decisão arbitral justificado decisão diversa da exarada no relatório pericial de fls. confessadamente seguida pelo Colégio Arbitral;

21. O Tribunal “a quo” percebeu na perfeição os vícios evocados e a pertinência e procedência dos mesmos, porém, inexplicavelmente, ou não se pronúncia sobre os mesmos, ou não fundamenta as suas posições, ou deriva para questões que o Recorrente não suscitou;

22. Ocorre assim, vício de falta de fundamentação, previsto no art.º 46, n.º 3, al. a), subalínea VI e art.º 42.º, n.º 3, da LAV, ou caso assim não se entenda, o que se hipotisa por dever de oficio, do vício previsto no art.º 46, n.º 3, al. a), subalínea V, por dizer assentar a sua posição em parecer e “sponte sua” pronunciar-se e retirar de forma excedentária consequências que o mesmo fixou em sentido diverso, constante da Decisão Arbitral e sequentemente da Decisão Singular e Acórdão em crise;

23. Considerando que o ponto 18 da Decisão Arbitral de 08.03.2023, nunca fundamentou a dupla subtracção de valores, ao montante apurado pelo Colégio Arbitral como o devido, assente no Relatório Pericial, é imperioso que, seja declarada a peticionada Anulação da Acção Arbitral, atentos os vícios evocados, mais precisamente na parte de falta de fundamentação, considerando o que dispõe o art.º 46.º, n.º 3, al. a), sub alínea v) e vi), tal como formalizado no art.º 32.º, do pedido de rectificação/reforma/esclarecimentos/sentença adicional de fls. e na Acção de Anulação, seja no ponto 37.º/38.º, seja na conclusão 3ª. a 8.ª., sem qualquer pronúncia ou fundamentação sequentes, assim se declarando em obediência ao disposto no art.º 662.º, n.º2, al., d), do CPC, com propósito, embora sem consequência, bem citado na Decisão Singular e Acórdão Recorrido em cotejo;

24. A Decisão Singular e Acórdão sub judice, mostram-se, violadores do princípio do acesso ao direito, constitucionalmente consagrado, uma vez que, não permitiram a apreciação da ostensiva violação do dever de fundamentação, por parte da Decisão Arbitral, passível de apreciação, à luz das diferentes soluções plausíveis de direito;

25. Ocorre omissão de pronúncia e sequente falta de fundamentação de facto e direito, conforme evocados no pedido de rectificação/reforma/esclarecimentos de fls. (doc.12), sem pronúncia da Decisão Arbitral e extensivos à Decisão Singular e Acórdão sub judice, e,

26. A Decisão Singular e Acórdão sub judice, não não se pronunciam, nem fundamentam a improcedência do evocado pelo Reclamante/Recorrente como, admitindo-se que o fazem, o que se considera por mera hipótese de raciocínio académico, sempre teriam incorrido em manifesto erro de julgamento, atentos os elementos probatórios existentes nos autos e bem assim, as alegações do Recorrente.

27. Ocorre falta de fundamentação de facto e direito na fixação do quantum de custas/decaimento de cada uma das partes, formulado no pedidode rectificação/reforma/esclarecimento de fls. (doc.12), na Decisão Arbitral em crise e sequente Decisão Singular e Acórdão sub judice, (a vingar a despida fixação de custas de fls., a parte que viu todos os seus pedidos declarados improcedentes e sem quantificação para se fazer o apuro em confronto com a Reconvenção da Recorrente, pagaria menos custas do que a parte que foi absolvida de todos os pedidos, e apenas teve vencimento parcial em um deles e o outro não foi apreciado, tudo sem qualquer quantificação reciproca e material dos pedidos para se apurar como se alcançaram tais singulares valores, a título de decaimento/condenação em custas;

28. Na esteira de Ph.D. BB e Parecer de fls., (ao qual o Tribunal “a quo” também não dedicou qualquer pronúncia, tão pouco expos alguma razão para a sua não valoração, sem prejuízo de consabido o efeito não vinculativo do mesmo), “A resposta a dar consiste em concluir que, para o legislador da LAV, os vícios da sentença constantes daquela subalínea V não integram o conceito de mérito das questões apreciadas pela sentença arbitral, estando assim a latere do disposto no citado número 9 do artigo 460 da LAV. Importa, ainda, alegar e formular um pedido na ação de anulação no sentido de a inoportuna sentença arbitral ser também por essa razão de, face à situação processual neste momento presente, o eventual decaimento da demandada ter de ser anulado ou, no mínimo, alterado, não só por ausência de fundamentação, mas também pelo facto de se revelarem erradas as proporções de decaimento decididas pelo tribunal arbitral.”.

29. Verifica-se omissão de pronúncia e falta de fundamentação de facto e direito para a condenação em quantidade superior ao pedido, da A. na Acção Arbitral, formulado no pedido de rectificação/reforma/esclarecimento de fls. (doc.12), incorrendo pelo menos no vício de falta de fundamentação, a Decisão Singular e Acórdão sub judice,

30. E, em momento algum, uma vez mais, a Decisão Arbitral, fundamenta a razão pela qual, tendo, a ali A., peticionado €321.896,09, acaba por beneficiar de um recebimento que não peticionou, uma vez que, descontou no devido ao aqui Recorrente, a quantia de € 29.346,83, o que correspondeu a mais um benefício injustificadamente atribuído à Recorrida, que assim paga menos do que deveria pagar. Conclui-se assim, que uma vez mais, a Acção Arbitral de 08.03.2023, não cuidou de fundamentar, como se impunha, o pedido de rectificação de fls. formulado, omissão que concomitantemente se estende à Decisão Singular e Acórdão ora proferido, que padecem do mesmo vício que expressamente se invoca.

(…)”

A R. Pauta Flores respondeu, sustentando que o recurso não deve ser admitido ou, sendo-o, deve o Acórdão recorrido ser mantido nos seus precisos termos.

Terminou a sua alegação com as seguintes conclusões:

“(…)

1. A ação de anulação de acórdão arbitral (recurso do acórdão do Tribunal Arbitral) não deveria ter sido admitida.

2. Com efeito, de acordo com a ata de instalação do Tribunal Arbitral, as partes renunciaram ao recurso e o Tribunal Arbitral julgou de acordo com a equidade.

3. Por esse motivo o Supremo não pode conhecer do recurso de revista.

4. O Despacho de indeferimento da junção de parecer aos autos foi prolatado pelo Exmo. Senhor Juiz Desembargador Relator em 19.09.2023 é irrecorrível em sede de revista, uma vez que não se enquadra nas decisões das quais cabe revista nos termos do artº 671º CPC.

5. Não deve ser conhecido o recurso da decisão singular datada de 19.09.2023 e não deve ocorrer a convolação do mesmo em impugnação para a conferência do Tribunal a quo.

6. A arguição de nulidades do acórdão recorrido não é admitida como fundamento exclusivo de recurso de revista.

7. No recurso de revista, o recorrente imputa ao acórdão recorrido os mesmos vícios de que diz padecer a sentença arbitral., o que está vedado ao Supremo conhecer – cfr artº 617º nº 1 CPC. E artº 665º nº 3 CPC.

8 As nulidades da ação arbitral não podem ser conhecidas pelo Supremo, pois o juiz estadual apenas tem poderes cassatórios e não substitutivos.

(…)”

Obtidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.

*

II – Fundamentação

A – Em termos factuais

Dá-se aqui como integralmente reproduzida a Sentença Arbitral de 08/03/2023, proferida no processo que correu termos entre a Pauta Flores, Lda. e o Sport C. e Salgueiros.

II – B de Direito

Estamos numa ação de anulação de sentença arbitral, ação esta, de anulação, prevista no art.46.º da LAV (Lei da Arbitragem Voluntária aprovada pela Lei nº 63/2011, de 14 de dezembro).

Entre as partes correu termos uma prévia ação arbitral – para dirimir um litígio emergente da execução de um contrato de consórcio celebrado entre as partes para a exploração do Bingo das instalações do antigo Cinema ..., na cidade do ... – sendo da sentença (arbitral) proferida em tal ação arbitral que é intentada, pelo S. C. e Salgueiros, a presente ação de anulação.

Ação esta, de anulação, para que é competente um Tribunal da Relação (cfr. art. 59.º/1/g) da LAV), o que aconteceu, no caso, com a Relação do Porto que, em 1.ª Instância, conheceu da ação de anulação em que nos encontramos, indeferindo-a liminarmente, sendo deste indeferimento – decidido singularmente primeiro e em Conferência depois – que vem interposto o presente recurso de apelação (na medida em que, embora o recurso seja para o Supremo, sendo a decisão recorrida proferida em 1.ª Instância, cabe dela apelação – cfr. art. 644.º/1/a) do CPC), nos termos do art. 59.º/8 da LAV.

E começamos por fazer notar o meio processual em que nos encontramos – ação anulatória de sentença arbitral – por estar aqui, nas regras de tal ação anulatória, o fulcro do desfecho do presente recurso de apelação (como antes esteve o fulcro da decisão do Acórdão da Relação sob recurso).

Como no despacho de admissão liminar deste recurso se disse, “é necessário distinguir, no que diz respeito às sentenças arbitrais, entre a recorribilidade e impugnabilidade: se, por força do art. 39.º/4 da LAV, não há recurso para o tribunal estadual competente, salvo quando as partes, em relação às sentenças arbitrais proferidas segundo o direito constituído, dispuserem diferentemente na convenção ou em acordo posterior a ela, outro tanto não acontece quanto à possibilidade de impugnação, mesmo das sentenças ex aequo et bono, faculdade esta, de impugnação, de que as partes não podem sequer renunciar (salvo no caso do art. 46.º/4da LAV), sob pena de nulidade da renúncia (cfr. art. 46.º/5 da LAV)”.

Efetivamente, no que diz respeito às sentenças arbitrais, a regra legal (supletiva), em matéria de recursos, é a irrecorribilidade, na medida em que, de acordo com o disposto no art. 39.º/4 da LAV, “[a] sentença que se pronuncie sobre o fundo da causa ou que, sem conhecer deste, ponha termo ao processo arbitral, só é suscetível de recurso para o tribunal estadual competente no caso de as partes terem expressamente previsto tal possibilidade na convenção de arbitragem e desde que a causa não haja sido decidida segundo a equidade ou mediante composição amigável.”

Sendo que, no caso, como resulta da cláusula 14.ª do Contrato de Consórcio, as partes acordaram sujeitar a “apreciação e decisão de qualquer litígio emergente deste contrato (…) ao Tribunal arbitral”, o qual “julgará de acordo com a equidade”, sendo que “as decisões proferidas pelo Tribunal Arbitral constituirão caso julgado, não sendo assim suscetíveis de recurso, ao qual cada uma das partes expressamente renuncia”, ou seja, as partes não só não previram expressamente a possibilidade de recurso (previram, isso sim, o seu contrário), como previram que a causa arbitral fosse decidida segundo a equidade, pelo que afastada ficou a possibilidade de interporem recurso da sentença arbitral que aprecie e decida qualquer litígio emergente do contrato de consórcio celebrado entre as partes.

Daí que – e bem – o S. C. e Salgueiros, em vez de interpor recurso da sentença arbitral (recurso esse que, repete-se, seria inadmissível), tenha vindo apresentar, diretamente na Relação do Porto, a presente ação de anulação da sentença arbitral proferida em 08/03/2023 (processada autonomamente e não nos próprios autos do processo arbitral).

Mas, claro, podendo impugnar a sentença arbitral pela presente ação anulatória – na medida em que a regra legal (supletiva), em matéria de impugnação, é a impugnabilidade (cfr. art. 46.º/1 e 5 da LAV) – tal não significa, sendo taxativos os fundamentos da impugnação fixados na LAV (como claramente resulta do advérbio “só”, constante do corpo do art. 46.º/3 da LAV), que possa aproveitar tal impugnação para invocar outros e diversos fundamentos, designadamente os respeitantes ao “mérito” da sentença arbitral.

Caso fosse admissível recurso da sentença arbitral, seria o próprio “mérito” da sentença arbitral, o seu sentido, que seria colocado em causa: perante um erro in judicando, um erro de julgamento (de facto ou de direito), cometido pelos árbitros, o recorrente pediria que a sentença fosse revogada ou modificada.

Mas, estando em causa “apenas” a impugnação da sentença arbitral, não se pode invocar/discutir o “mérito” e o sentido da sentença arbitral: estando em causa a impugnação da sentença arbitral, “apenas” se podem invocar/discutir os vícios do percurso, do processo arbitral, que levou os árbitros até à sentença, assim como, atento o disposto nas subalíneas v) e vi) da alínea a) do art. 46.º/3, se podem invocar os vícios da condenação por excesso ou defeito e a falta de fundamentação; sendo que, verificado o vício invocado, o tribunal estadual não procede à substituição da sentença arbitral por outra de sentido diferente, antes se limitando a decretar, como consequência, a supressão da sentença arbitral da ordem jurídica (cfr. art. 46.º/9 da LAV).

Enfim, sintetizando, não podendo haver recurso da sentença arbitral proferida e sendo o “mérito” duma sentença arbitral apenas suscetível de ser discutido por via do recurso, isso significa que não se podem colocar e decidir pela via da impugnação questões respeitantes ao “mérito” da sentença arbitral proferida, sob pena de, a ser de outro modo, se desrespeitar a inadmissibilidade do recurso.

Convindo neste ponto salientar que a regra da inadmissibilidade do recurso da sentença arbitral proferida foi, como já se referiu, estabelecida pelas próprias partes na cláusula 14.ª do Contrato de Consórcio, ou seja, foram as próprias partes – o S. C. e Salgueiros e a Pauta de Flores – que estabeleceram que aceitariam e não discutiriam nos Tribunais Estaduais o “mérito” de uma sentença arbitral que dirimisse um qualquer litígio emergente da execução do contrato de consórcio celebrado.

E, claro, estamos a insistir neste ponto (como acima referimos, reside aqui o fulcro do desfecho da presente ação anulatória) por o que o S. C e Salgueiros repetidamente invoca – no pedido de retificação da primitiva sentença arbitral, na PI da presente ação anulatória, na reclamação para a Conferência e nas alegações da presente apelação – ter a ver com o “mérito” da sentença arbitral e não com vícios da condenação por excesso ou por defeito ou com a falta de fundamentação da sentença arbitral, ou seja, por o S. C e Salgueiros invocar algo que não cabe nos fundamentos que podem ser suscitados/decididos na impugnação da sentença arbitral.

Os poderes de conhecimento e decisão do Tribunal Estadual, na ação de impugnação da sentença arbitral, restringem-se, repete-se, aos fundamentos elencados no art. 46.º/3 da LAV, nada mais lhe sendo permitido conhecer/decidir a propósito da sentença arbitral, nomeadamente reexaminar todo o processo, corrigir os erros e preencher as omissões de facto ou de direito de que a sentença arbitral padeça e passar a proferir uma sentença de mérito sã sobre a causa (sentença que as partes, insiste-se sempre, convencionaram não ser suscetível de recurso para os Tribunais Estaduais, o mesmo é dizer, que as partes convencionaram não ficar sujeita à apreciação de mérito pelos Tribunais Estaduais).

Aliás, continuando a dizer a mesma coisa por diferente modo, não será despiciendo chamar a atenção para o já referido art. 46.º/9 da LAV, em que se diz expressamente que “o tribunal estadual que anule a sentença arbitral não pode conhecer do mérito da questão ou questões por aquela decidas, devendo tais questões, se alguma das partes o pretender, ser submetida a outro tribunal arbitral para serem por este decididas”, isto é, que situa a impugnação da sentença arbitral no campo da mera revisão e não no domínio do reexame da causa/pedido, o que faz com que seja a própria sentença estadual anulatória, caso se pronuncie sobre o mérito da sentença arbitral, a incorrer em nulidade (por se pronunciar sobre questão de que não pode conhecer – art. 615.º/1/d)/2.ª parte do CPC).

E estamos com todos estes “rodeios” e explicações para que fique finalmente claro que, tendo o invocado pelo S. C. e Salgueiros a ver com o “mérito”, não podemos decidir sobre tal “mérito” e, em consequência, não podemos corrigir o erro de julgamento em que incorreu a sentença arbitral.

Tendo em vista mostrar que estava a respeitar os fundamentos taxativos de impugnação fixados na LAV (no já referido art. 46.º/3 da LAV), o S. C. e Salgueiros qualificou o que invocou como configurando vícios de condenação por excesso ou por defeito e como vício de falta de fundamentação, porém, o que invocou é claramente um erro do julgamento de facto da sentença arbitral.

Repare-se:

Começava por estar em causa, na ação arbitral, saber se o contrato de consórcio celebrado entre as partes havia ou não sido resolvido pela Pauta Flores e, a tal propósito, a sentença arbitral concluiu, primeiro, que a Pauta Flores resolveu o contrato e, depois, que o fez ilicitamente; após o que a sentença arbitral considerou, não obstante tal ilicitude, que a resolução produziu os seus efeitos (foi eficaz), passando então o S. C. e Salgueiros, de acordo com o decidido na sentença arbitral, a ter o “direito a ser indemnizado, equivalendo a indemnização ao que seria devido ao credor se o contrato continuasse a vigorar e a ser executado” ou, mais exatamente, segundo concretização também efetuada na sentença arbitral, a ser “devida ao S. C e Salgueiros a meação dos lucros auferidos pela Pauta Flores na atividade de exploração do Bingo levada a cabo por esta sociedade isoladamente nos anos de 2016 e 2017”.

Estabelecido/decidido tal aspeto jurídico do litígio, passava então a estar em causa a liquidação da participação do S. C e Salgueiros no resultado líquido do Consórcio – sabido que a cláusula 9.ª do Contrato de Consórcio fixava tal participação em 50% – mais exatamente o acerto da participação do S. C. e Salgueiros no período da execução contratual (entre 2012 e a produção dos efeitos resolutivos em meados de março de 2016) e o cálculo da indemnização ao S. C e Salgueiros (de meados de março de 2016 ao final de 2017), ou seja, no fundo e em termos práticos, passava a estar em causa o cálculo do resultado líquido do consórcio durante 6 anos, sendo que 50% de tal montante seria o direito do S. C. e Salgueiros, pelo que, caso já tivesse recebido quantia superior, seria a Paula Flores credora da diferença e, caso a quantia recebida fosse inferior, seria o S. C e Salgueiros credor da quantia necessária a perfazer os 50% a que tinha direito.

E foi sobre isto – sobre tal tarefa de liquidação – que se ocupou a maior parte da sentença arbitral, ou seja, sem que se possa dizer que a mesma padece de falta de fundamentação e/ou que haja incorrido em condenação por excesso ou por defeito.

O que claramente sucedeu foi que a sentença arbitral se equivocou em raciocínios que fez para estabelecer a liquidação da participação do S. C e Salgueiros no resultado líquido do contrato de consórcio e para, depois, estabelecer o crédito do S. C. e Salgueiros.

E este Supremo (como antes a Relação) não pode, como já se referiu, decidir/corrigir – se o fizesse, estaria a incorrer na nulidade do art. 615.º/1/d)/2.ª parte do CPC – um erro no julgamento da matéria de facto cometido pela sentença arbitral, porém, para melhor explicarmos ao A./recorrente o motivo por que a presente impugnação estava ab initio condenada ao fracasso, ousamos “no limite de tal nulidade” afirmar que a sentença arbitral se equivocou em vários dos raciocínios que fez para estabelecer a liquidação da participação do S. C e Salgueiros no resultado líquido do contrato de consórcio e para, depois, estabelecer o crédito do S. C. e Salgueiros; e podemos fazê-lo por ser a própria sentença arbitral a dizer, por várias vezes, que seguiu, na decisão de facto, o relatório subscrito pelo perito presidente (e pelo perito do S. C e Salgueiros) e tão só o fazemos com o objetivo, repete-se, de melhor explicar, ao justificar tal afirmação, que o que o recorrente invoca é um erro do julgamento de facto da sentença arbitral (e sendo um erro do julgamento de facto não configura vícios de condenação por excesso ou por defeito e/ou vício de falta de fundamentação).

Expliquemo-nos então:

É patente em toda a sentença arbitral – é referido por várias vezes – que a mesma seguiu, na decisão de facto, o relatório subscrito pelo perito presidente (e pelo perito do S. C e Salgueiros), com exceção das 4 verbas “desconsideradas” nos pontos 24, 25, 26 e 27 que, somadas, perfazem a quantia global de € 340.172,23, ou seja, um incremento da participação do S. C. e Salgueiros de € 170.063,62; e com exceção do que se refere no ponto 29, em que, de verbas controvertidos recebidas pelo S. C. e Salgueiros no montante de € 168.500,00, se decide e dá como recebida “apenas a quantia de € 84.250,00 e o restante como dívida da Paula Flores para com o S. C e Salgueiros”.

É por isto, dizendo a sentença arbitral que acompanha, na decisão da matéria de facto, o referido relatório pericial, que afirmamos que constitui um claro equívoco de raciocínio o que consta do parágrafo terceiro de fls. 48 da sentença arbitral (e é daqui, deste parágrafo, que irradia toda a impugnação do aqui recorrente S. C. e Salgueiros).

Repare-se:

Na folha imediatamente anterior da sentença arbitral, para se apurar “os valores a que o S. C. e Salgueiros tem direito”, “arrancou-se” e deu-se como boa a verba de € 359.118,25 constante do relatório pericial, verba esta a que se somaram (bem, a nosso ver) os € 170.063,62 e € 84.250,00 acabados de referir, atingindo-se o valor de € 613.431,87.

Após o que vem o “infeliz” parágrafo terceiro de fls. 48 da sentença arbitral em que se escreveu: “ (…) aos € 613.431,87 deverão, contudo, ser subtraídas as quantias que a R. (Salgueiros) terá, por seu turno, de pagar à A., a título quer de meação nos prejuízos incorridos pelo Consórcio no primeiro ano de exploração da atividade, quer de devolução dos adiantamentos recebidos por conta dos lucros futuros quantias cuja soma atinge um quantitativo global de € 351.242,92. Dessa subtração resulta um valor final, que o tribunal condena a Autora (Pauta de Flores) a pagar à Ré (Salgueiros), de € 262.188,95”.

Pois bem, a subtração da verba de € 351.242,92 configura um claro erro de raciocínio da sentença arbitral – um erro na decisão de facto (a sentença arbitral disse que, na decisão da matéria de facto, iria acompanhar o relatório pericial, mas transpôs erradamente o que resulta do relatório pericial para a decisão da matéria de facto da sentença arbitral) – uma vez que tais € 351.242,92 já estavam descontados/incorporados na verba de € 359.118,25, constante do relatório pericial, verba esta que, faz-se notar, era/foi o ponto de partida do raciocínio iniciado na folha anterior da sentença arbitral.

Tal verba de 351.242,92 corresponde, como se diz na sentença arbitral, à soma de duas verbas – ao resultado negativo de ano de 2012 imputável ao S. C. e Salgueiros (€ 99.739,98) somado ao que durante a execução contratual (entre 2012 e a eficácia da resolução) o S. C. e Salgueiros terá recebido a mais (€ 251.502,94) – porém, tais verbas já estavam incluídas/descontadas na conclusão do relatório pericial que fixou o valor total devido ao S. C. e Salgueiros nos € 359.118,25 (que foi, repete-se, o ponto de partida do raciocínio iniciado na folha anterior da sentença arbitral).

E o que vimos de dizer extrai-se claramente do quadro de fls. 6 do relatório pericial complementar de 25/10/2021: na linha 5 de tal quadro está incluída, como valor negativo, a verba de € 99.739,98 (respeitante aos resultados atribuídos ao Salgueiros em 2012) e na linha 6 de tal quadro estão incluídos todos os montantes recebidos pelo Salgueiros durante a execução contratual (perfazendo € 1.151.841,60) e não apenas os montantes respeitantes aos resultados que antes haviam sido atribuídos ao Salgueiros; e é diferença entre os valores totais de tais linhas 5 e 6 (que incluem, na linha 5, os valores corrigidos de resultados atribuíveis ao Salgueiros, num total de € 1.510.959,85; e, na linha 6, as verbas recebidas pelos Salgueiros, num total de € 1.151.941,60) que dá os € 359.118,25, que é/foi o ponto de partida, repete-se mais uma vez, do raciocínio iniciado na folha anterior da sentença arbitral, raciocínio que, após a correta soma de € 254.313,62 e a incorreta subtração dos € 351.242,92, deu o valor de € 262.188,95, que foi o valor em que o Tribunal Arbitral condenou a Autora/Pauta de Flores a pagar ao Réu/Salgueiros (em vez dos € 613.431,87 pretendidos pelo S. C. e Salgueiros e como parece que seria o correto).

Enfim, é este erro de julgamento da sentença arbitral – o ter-se dito que se iria acompanhar, na decisão da matéria de facto, o relatório pericial, transpondo-se, porém, erradamente o que resulta do relatório pericial para a decisão da matéria de facto – que o aqui A/recorrente imputa, de diversas maneiras, à sentença arbitral, procurando configurar tal erro por forma a “metê-lo” em algum dos vícios que constituem fundamento da impugnação da sentença arbitral.

Mas o que aconteceu, como acabámos de explicar, foi um claro e evidente erro quanto ao “mérito”, um erro in judicando da sentença arbitral, um erro que só poderá/ia ser corrigido em sede de recurso que pudesse decidir sobre o “mérito”, recurso esse que, como acima se referiu, as partes afastaram (estabeleceram que aceitariam e não discutiriam nos Tribunais Estaduais o “mérito” de uma sentença arbitral que dirimisse um qualquer litígio emergente da execução do contrato de consórcio celebrado).

Se uma sentença – seja arbitral ou estadual – decide mal os factos e/ou se equivoca em raciocínios que faz a partir de factos, não estamos perante uma sentença não fundamentada de facto e/ou de direito, estamos, isso sim, perante uma sentença que está “errada” (e não perante uma nulidade de sentença).

Aliás, a propósito do que o A/recorrente invoca ou, mais exatamente, a propósito da configuração que confere ao que invoca (como sendo nulidades de sentença), importa referir o seguinte:

Segundo a alínea b) do art. 615.º/1 do CPC, constitui causa de nulidade da sentença a falta de fundamentação, porém, quando se fala, a tal propósito, em “falta de fundamentação”, está-se a aludir à falta absoluta e não às situações em que a fundamentação é deficiente, incompleta ou não convincente.

Segundo a alínea d) do art. 615.º/1 do CPC, constitui causa de nulidade da sentença o juiz deixar de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento, porém, quando se fala, a tal propósito, em “omissão de conhecimento” ou de “conhecimento indevido”, está-se a aludir e remeter para as questões a resolver a que alude o art. 608.º do CPC.

Explicado o sentido de tais causas de nulidade de sentença (que correspondem na LAV aos invocados vícios, constantes das alíneas vi) e v) do art. 46.º/3/a)), é de todo evidente que não se verificam tais vícios quer na sentença arbitral quer no acórdão recorrido.

E o que muito sinteticamente acabamos de referir sobre o recorte conceitual das “nulidades de sentença” invocadas é dito na doutrina jurídico-processual, há muitas décadas, de forma pacífica e uniforme: desde Alberto dos Reis2 e Antunes Varela3 aos autores mais recentes, como é o caso do Juiz-Conselheiro Ferreira de Almeida que sobre o assunto diz4:

“ (…)

b) Falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (falta de fundamentação – art. 615.º/1/b)).

Traduz-se este vício na falta de motivação da sentença, ou seja, na falta de externação dos fundamentos de facto e de direito que os n.º 3 e 4 do art. 607.º impõem ao julgador. Só integra este vício, nos termos da doutrina e da jurisprudência correntes, a falta absoluta de fundamentação, que não uma fundamentação simplesmente escassa, deficiente, medíocre ou mesmo errada; esta última pode afetar a consistência doutrinal da sentença, sujeitando-a a ser revogada ou alterada pelo tribunal superior, não gerando contudo nulidade.

(…)

Quanto à fundamentação de direito, não tem também o juiz que analisar um por um todos os argumentos ou razões invocadas pelas partes, ainda que tenha de dar resposta (resolução) às questões por elas invocadas; não se lhe impõe, por outro lado, que indique, uma por uma, as disposições legais em que se baseia a decisão, bastando que faça alusão às regras e princípios gerais em que a ancora.

d) Omissão de pronúncia (art. 615.º/1/d) – 1.º segmento):

Em obediência ao comando do n.º 2 do art. 608.º, deve o juiz conhecer de todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, de todas as causas de pedir e exceções invocadas e de todas as exceções de que oficiosamente lhe cabe conhecer.

Integra esta causa de nulidade a omissão do conhecimento (total ou parcial) do pedido, causa de pedir ou exceção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão (não a fundamentação jurídica adrede invocada por qualquer das partes).

Não confundir, porém, questões com razões, argumentos ou motivos invocados pelas partes para sustentarem e fazerem vingar as suas posições (jurídico-processuais ou jurídico-substantivas); só a omissão da abordagem de uma qualquer questão temática central integra vício invalidante da sentença, que não a falta de consideração de um qualquer elemento da retórica argumentativa produzida pelas partes. (…)”

e) Excesso de pronúncia (pronúncia indevida) – art. 615.º/1/d), 2.º segmento:

Encontra-se vedado ao juiz conhecer de causas de pedir não invocadas ou de excepções que não sejam do seu conhecimento oficioso (art. 608.º/2/2.º segmento)”.

E é justamente por tudo isto que concordamos totalmente com o que foi exposto no Acórdão recorrido sobre as nulidades/vícios imputados pela A/recorrente à sentença arbitral; importando mais uma vez acentuar, na medida em que se trata de um equívoco em que o A/recorrente repetidamente incorre (nas peças que apresenta), que vale como fundamentação, para efeitos de afastar a nulidade/vício de sentença, a fundamentação que seja incorreta/errada (o A./recorrente raciocina, repetidamente, que não há fundamentação quando o que se expõe não está correto e isto – fundamentação incorreta/errada – é um erro de julgamento, não é uma nulidade de sentença).

Expôs-se no Acórdão recorrido:

“(…)

I. Da nulidade da decisão arbitral por excesso de pronúncia em virtude de ter tomado conhecimento de questões de que não podia conhecer por já terem sido apreciadas pelos peritos: (…)

(…) o indevido ou infundamentado afastamento das conclusões periciais por parte do tribunal na decisão da matéria de facto, não constituem qualquer excesso de pronúncia mas sim um erro de julgamento na decisão da matéria de facto ou uma insuficiência ou falta de motivação da decisão da matéria de facto (…).

II. Da nulidade da decisão arbitral por omissão de pronúncia sobre os pontos 8 a 37 do requerimento de retificação/reforma e prolação de sentença adicional da decisão arbitral proferida com data de 25 de outubro de 2022 (conclusões 6 a 8 da petição inicial).

(…)

Feito o confronto dos dois acórdãos, estamos agora em condições de apreciar se as questões que o autor integra em diversos fundamentos de anulação da decisão arbitral integram efetivamente tais fundamentos.

No que respeita aos pontos 8 a 10 do requerimento que a ora autora ofereceu para retificação da acórdão arbitral de 25 de outubro de 2022, a simples leitura do acórdão retificado de 08 de março de 2022 permite verificar que houve lapso na indicação da quantia de € 612.931,46, lapso que foi corrigido esclarecendo-se que a quantia correta era € 613.431,87.

Assim, não há qualquer omissão de pronúncia do tribunal arbitral no que respeita este ponto do referido requerimento do agora autor.

Também quanto aos pontos 11 a 13 do aludido requerimento o tribunal arbitral corrigiu o lapso cometido na decisão de 25 de outubro de 2022, fundamentando de forma mais detalhada os sucessivos cálculos que foi efetuando.

A discordância do ora autor quanto à decisão da matéria de facto e à sua motivação não tem guarida legal num requerimento de retificação do acórdão arbitral (…).

Debrucemo-nos agora sobre os pontos 14 a 37 do requerimento do ora autor de 25 de novembro de 2022.

Uma vez mais o autor discorda do juízo probatório do tribunal arbitral e da sua motivação, contrapondo-lhe a sua versão e apodando a decisão e a motivação que lhe não convêm de obscuras.

Importa sublinhar que é obscura a decisão sempre que um termo ou uma frase da decisão não têm um sentido que seja percetível, determinável, exigindo-se ainda no processo civil comum que essa obscuridade torne a decisão ininteligível. A obscuridade afere-se exclusivamente em face do texto da decisão a que se aponta essa patologia.

Porém, como já referimos anteriormente, em sede de processo arbitral, nenhuma das partes tinha a faculdade de recorrer do acórdão arbitral aí proferido, não sendo a ação de anulação um expediente processual para por via estadual impugnar o acórdão arbitral, mas antes um remédio para remover da ordem jurídica decisões arbitrais que não se coadunam com algumas regras essenciais do Estado de Direito.

Ora, se é verdade que o ponto 18 do acórdão de 25 de outubro de 2022 continha algumas incongruências e lapsos de escritas que dificultavam a compreensão da decisão do tribunal arbitral, essas patologias foram removidas com a nova redação que o tribunal arbitral deu ao ponto 38 do acórdão arbitral [referiu-se por lapso o ponto 38 quando se pretendia aludir ao ponto 18], eliminando as referidas incongruências e dissonâncias.

Deste modo, nem o novo ponto 18 do acórdão arbitral de 08 de março de 2023 enferma de obscuridade e, ao invés, procedendo a nova redação do referido ponto, o tribunal arbitral respondeu aos artigos 14 a 37 do requerimento para retificação do acórdão arbitral nos pontos que legalmente mereciam resposta.

Assim, também esta arguição do autor de nulidade do acórdão arbitral por omissão de pronúncia sobre os artigos 8 a 37 do seu requerimento para retificação do acórdão de 25 de outubro de 2022 é de todo e ostensivamente inexistente.

III. Da nulidade da decisão arbitral por excesso de pronúncia e por falta de fundamentação:

Debrucemo-nos agora sobre a alegada nulidade da decisão arbitral por excesso de pronúncia e por falta de fundamentação (conclusões 9 a 13), conclusão que o autor firma, em síntese, na alegação de que a ré foi condenada a pagar juros de mora a contar da citação quando o pedido por si formulado foi de condenação ao pagamento de juros de mora a contar do vencimento, achando-se esta decisão do tribunal também destituída de fundamentação.

De facto, o tribunal arbitral decidiu condenar a ré nestes autos, a pagar ao autor nestes mesmos autos a quantia de € 262.188,95, acrescida de juros de mora à taxa legal a contar da citação e até efetivo e integral pagamento.

Também é certo que o agora autor pediu na reconvenção que deduziu contra a ré nestes autos, além do mais, a condenação desta ao pagamento de juros de mora à taxa legal desde a data do vencimento até efetivo e integral pagamento.

(…)

Na realidade ao tribunal arbitral o agora autor formulou um pedido de condenação da ré nestes autos ao pagamento de juros de mora à taxa legal desde a data do vencimento, não curando de substanciar factualmente esta pretensão no que respeita à condenação ao pagamento de juros de mora. De facto, desconhece-se a que vencimento o ora autor se refere.

Neste circunstancialismo, fazendo uso dos poderes de livre qualificação jurídica da factualidade apurada, o tribunal arbitral recorreu às regras supletivas para determinação do termo inicial da obrigação de pagamento de juros de mora (artigo 805º, nº 1 do Código Civil), ou seja, a citação, rectius, a notificação da contestação-reconvenção à aqui ré, além do mais, desta pretensão indemnizatória. Assim agindo, o tribunal arbitral não cometeu qualquer excesso de pronúncia antes determinou concretamente o termo inicial da obrigação de pagamento de juros de mora aplicando norma legal supletiva.

Por outro lado, estando em causa a aplicação de norma supletiva do conhecimento geral dos juristas, afigura-se-nos que o teor da própria condenação permite por si só com segurança determinar o fundamento jurídico em que assenta.

Deste modo, também neste segmento a pretensão do autor de anulação parcial da decisão arbitral é de todo improcedente.

IV. Da nulidade da decisão arbitral por falta de fundamentação da questão da eficácia da resolução contratual ilícita ou, subsidiariamente, por excesso de pronúncia (conclusões 14 a 19 da petição inicial).

Debrucemo-nos agora sobre a alegada nulidade da decisão arbitral por falta de fundamentação da questão da eficácia da resolução contratual ilícita ou, subsidiariamente, por excesso de pronúncia (conclusões 14 a 19). O autor sustenta a falta de fundamentação da decisão arbitral no que respeita à questão da eficácia da resolução contratual ilícita em virtude de não ter fundamentado como chegou à conclusão que a posição que adotou é a dominante, abonando-se com um parecer que na realidade visto na sua integralidade contraria a passagem citada na decisão arbitral e ainda por não justificar de facto e de direito a opção por considerar eficaz a resolução contratual ilícita, tornando ininteligível como chegou a tal conclusão.

Para apreciar da pertinência destas patologias invocadas pelo autor para fundamentar a sua pretensão de anulação parcial do acórdão arbitral de 08 de março de 2023, importa rememorar o que nesta decisão se consignou sobre esta problemática nos seus pontos 38 e 39. (…)

A leitura dos pontos 38 e 39 do acórdão arbitral que se acabam de reproduzir evidencia à saciedade quão infundada é a afirmação do aqui autor de que o tribunal arbitral não fundamentou a sua opção pela declaração de eficácia da declaração de resolução ilícita e bem assim de que a mesma é por isso ininteligível.

Na realidade, a decisão do tribunal arbitral está fundamentada e de forma clara, não constituindo o acerto da mesma requisito positivo necessário ao preenchimento do dever geral de fundamentação das decisões dos tribunais.

De facto, existe fundamentação mesmo quando existe erro do tribunal na fundamentação aduzida, nomeadamente quando identifica uma doutrina como sendo a dominante e assim não é de facto ou quando erroneamente imputa a doutrinadores posições jurídicas que de facto não perfilham. Em tal caso, o que se verifica é uma fundamentação errada mas nunca uma ausência de fundamentação e muito menos uma ininteligibilidade da fundamentação.

Subsidiariamente, o autor refere ainda que a decisão arbitral enferma de excesso de pronúncia por assentar em parecer que aponta em sentido diverso do eleito pelo tribunal conhecendo assim de questão de que não podia conhecer por estar já resolvida em tal parecer.

Uma vez mais há nesta configuração desta patologia por parte do autor uma confusão de planos.

Um parecer jurídico, por maior que seja a sua valia do ponto de vista dogmático, nada decide, apenas podendo influir na mente do ou dos julgadores, convencendo-os da correção da posição jurídica aí explanada.

Por isso, é evidente que o julgador não comete qualquer excesso de pronúncia quando se afasta da orientação defendida num parecer jurídico ou ainda quando, erroneamente, lhe imputa um sentido que efetivamente não tem.

Pelo exposto, também esta alegada patologia ostensivamente não se verifica.

V. Da nulidade da decisão arbitral por omissão de pronúncia e por falta de fundamentação de facto e de direito:

Vejamos agora a invocada nulidade da decisão arbitral por omissão de pronúncia e por falta de fundamentação de facto e de direito (conclusões 20 a 22) e que na perspetiva do autor resultariam da total falta de fundamentação de facto e de direito da absolvição da aqui ré do pedido de condenação desta como litigante de má-fé, não tendo o tribunal arbitral conhecido das concretas questões suscitadas no requerimento para rectificação do acórdão arbitral.

O tribunal arbitral pronunciou-se sobre a arguida litigância de má-fé da autora no processo arbitral, escrevendo para o efeito o seguinte: (…)

A nosso ver, este trecho pronuncia-se suficientemente sobre a pretensão do aqui autor de condenação da ré nesta ação como litigante de má-fé indicando explicitamente as razões de facto e de direito de tal entendimento.

Porventura, essa decisão do tribunal arbitral pode ser juridicamente errada, mas isso constitui um erro na aplicação do direito, erro que o agora autor abdicou de sindicar ao não exigir que ficasse consignada na convenção de arbitragem a recorribilidade da decisão arbitral e ao não vedar a decisão segundo a equidade, como de facto veio a suceder.

Por isso, ainda que a aqui autor tivesse razão no erro que imputa ao tribunal arbitral na decisão da questão da litigância de má-fé da autora no processo arbitral isso nunca constitui falta de fundamentação de facto e de direito mas sim, se o autor nestes autos tiver razão, um erro de julgamento, sendo certo que não tendo o mesmo autor o direito a sindicar essa decisão por via de recurso, não tinha o tribunal arbitral de conhecer da fundamentação aduzida em sede de requerimento para retificação do acórdão arbitral para demonstrar o desacerto da decisão proferida em sede de litigância de má-fé.

Conclui-se assim que também no que respeita esta patologia é ostensivamente infundada a arguição do autor nestes autos.

VI. Da nulidade da decisão arbitral por falta de fundamentação:

Debrucemo-nos agora sobre a alegada nulidade da decisão arbitral por falta de fundamentação da condenação tributária (conclusões 23 a 26), referindo o aqui autor que o tribunal arbitral se absteve de indicar as razões que estão na base da fixação dessa proporção, proporção que afirma errada.

Que dizer?

Uma vez mais, o aqui autor imputa à decisão arbitral patologias formais passíveis de em abstrato se integrarem como fundamentos de ação de anulação de decisão arbitral para por essa forma ínvia manifestar a sua discordância quanto ao decidido e tentar desse modo obter ao menos a ineficácia desse segmento da decisão.

As razões de facto e de direito da condenação tributária do tribunal arbitral constam do que aí foi sendo decidido, sendo ostensivo que o valor global das pretensões formuladas pela agora autora em muito superava o valor das deduzidas pela agora ré e que a parcial procedência da reconvenção envolveu um decaimento muito superior ao decaimento da ação.

Quanto ao eventual desacerto da proporção fixada pelo tribunal arbitral, uma vez mais se reafirma que estava vedado ao aqui autor a impugnação dessa decisão e tendo o tribunal arbitral suprido a iliquidez da primitiva condenação tributária, sanou a deficiência apontada no requerimento para retificação do acórdão arbitral.

Pelo exposto, também neste ponto não se verifica a patologia imputada ao acórdão arbitral.

VII. Da nulidade da decisão arbitral por condenação em quantidade superior ao pedido (conclusões 27 a 29 da petição inicial).

Finalmente, debrucemo-nos sobre a nulidade da decisão arbitral por condenação em quantidade superior ao pedido (conclusões 27 a 29) e que na perspetiva do autor resultaria da circunstância de o tribunal arbitral ter liquidado a indemnização devida ao autor levando em conta a título de adiantamento por conta dos lucros futuros e de dedução de prejuízos no primeiro ano de exploração um valor superior (€ 351.242.92) ao que a ré nestes autos reclamava do autor nestes autos a esses mesmos títulos (€ 321.896.09).

Se porventura o autor tivesse razão nesta imputação ao acórdão arbitral de condenação em montante superior ao pedido, poder-se-ia questionar do seu interesse em agir na arguição de tal vício.

Na realidade, a condenação proferida pelo tribunal arbitral conteve-se dentro do pedido formulado pelo agora autor, apenas tendo sido relevado na liquidação do valor final devido um montante superior a título de prejuízos de exploração e de adiantamentos por conta dos lucros futuros ao que a ré nestes autos considerava terem existido.

Existiria condenação além do pedido se acaso o tribunal arbitral, ao apreciar o pedido de condenação do aqui autor, em vez de o condenar ao pagamento da quantia de € 321.896,09, o tivesse condenado ao pagamento da quantia de € 351.242,92. Ora, é evidente que isso não sucedeu pois que o pedido formulado pela aqui ré de condenação do agora autor ao pagamento da quantia de € 321.896,09 foi julgado improcedente.

(…)”

Enfim, o Acórdão recorrido não só conheceu de todas as nulidades/vícios apontadas pelo A., na PI, à sentença arbitral, como, além disso, é manifesto que as nulidades/vícios imputados à sentença arbitral não se verificam.

A questão, como começámos por evidenciar, é outra e bem diversa: a sentença arbitral cometeu erros de julgamento em vários passos do seu raciocínio – com maior expressão e significado no tal parágrafo terceiro que acima analisámos5 – mas os seus erros de julgamento e vícios de raciocínio não configuram nem falta de fundamentação, nem violação do princípio do pedido por excesso ou defeito de pronúncia (e os erros de julgamento e os vícios de raciocínio da sentença arbitral só podem/poderiam ser corrigidos em recurso que pudesse decidir sobre o “mérito”, mas a partes, como por mais de uma vez já se referiu, afastaram tal possibilidade no clausulado do Contrato de Consórcio, daí que, como também se referiu, estejamos numa ação de impugnação da sentença arbitral e não num recurso da sentença arbitral6).

E é também por tudo isto, por ser ab initio manifesto que não se verificavam as nulidades/vícios da sentença arbitral, que bem andou a decisão singular do T. da Relação do Porto e o posterior Acórdão da Conferência (de que é interposta a presente apelação) ao indeferir liminarmente a presente ação de anulação de sentença arbitral.

A ação/impugnação de anulação de sentença arbitral tem como fundamentos taxativos os elencados no art. 46.º/3 da LAV e nada do que o A./Sport Comércio e Salgueiros invocou (na PI da ação) se enquadra, como já repetidamente se explicou, em algum de tais fundamentos, pelo que, podendo a PI ser “indeferida quando o pedido seja manifesto improcedente” (cfr. art. 590.º/1 do CPC), bem andou a Relação ao logo indeferir liminarmente a presente ação de anulação de sentença arbitral; sem necessidade, no que diz respeito à decisão singular do relator, de ter que proceder à prévia audição do autor.

É certo que o art. 46.º/2/e) da LAV diz que a ação anulatória da sentença arbitral segue a tramitação do recurso de apelação, porém, “com as necessárias adaptações”, designadamente as que têm a ver com o momento inicial da ação (como se extrai das anteriores alíneas do art. 46.º/2 da LAV), momento esse em que não se inscreve, já se vê, a possível aplicação do disposto no art. 655.º do CPC.

E do mesmo modo bem andou o Exmo. Relator ao não ter admitido, por despacho de 19/09/23, a junção de Parecer de Jurisconsulto (junção que foi entretanto admitida neste Supremo), por tal junção haver sido solicitada quando o projeto de Acórdão (da Conferência) já tinha sido remetido aos Exmos. Juízes-adjuntos, ou seja, por a junção do Parecer haver sido solicitada num momento em que já se havia iniciado o prazo para a elaboração do projeto de Acórdão, o que, nos termos e de acordo com o art. 651.º/2 do CPC, não admitia que se deferisse a junção do Parecer7.

*

Em síntese final, uma sentença arbitral mal fundamentada ou erradamente fundamentada não padece de “nulidade de sentença” ou dos vícios referidos nas alíneas v) e vi) do art. 46.º/3/a) da LAV, na medida em que os seus erros de julgamento e os seus vícios de raciocínio não podem ser processualmente configurados como falta de fundamentação e/ou como violação do princípio do pedido por excesso ou defeito de pronúncia; sem que tal entendimento/interpretação sobre o conceito processual de “nulidades de sentença” e dos vícios referidos nas alíneas v) e vi) do art. 46.º/3/a) da LAV viole os incisos constitucionais respeitantes à fundamentação das decisões arbitrais proferidas no termo dum processo leal e fair, em que as partes exerceram, de forma efetiva, os seus direitos, podendo invocar todos os que entendiam assistir-lhe e contraditando todos os exercidos pela parte contrária.

Como acima se reconheceu, na análise feita sobre o parágrafo 3.º de fls. 48 da sentença arbitral, tem o S. C. e Salgueiros razão em substância no essencial do que vem sustentando (quer no pedido de retificação da sentença arbitral, quer na PI desta ação, quer na reclamação para a Conferência, quer na alegação do presente recurso), mas, como não nos cansamos de referir, trata-se de uma “razão” que se situa no âmbito do “mérito” da sentença arbitral e aqui – na presente impugnação de sentença arbitral – não se pode decidir sobre o “mérito” e corrigir os erros de julgamento em que a sentença arbitral incorreu (depois do que constava do Acórdão recorrido sobre a não verificação das nulidades imputadas à sentença arbitral, a análise feita sobre e a partir do parágrafo 3.º de fls. 48 da sentença arbitral teve apenas em vista melhor explicar, como já se referiu, o que é que verdadeiramente são as “nulidades/vícios” que o A. imputa à sentença arbitral e, sendo o que são – erros de julgamento – não podem ser “nulidades de sentença” ou vícios das alíneas v) e vi) do art. 46.º/3/a) da LAV), pelo que não será aqui que a pretendida correção pode ser feita8.

É quanto basta para julgar totalmente improcedente a apelação.

*

III - Decisão

Nos termos expostos, nega-se a apelação e confirma-se o Acórdão recorrido.

Custas pelo A./recorrente.

*

Lisboa, 22/02/2024

António Barateiro Martins (Relator)

Luís Espírito Santo

Leonel Serôdio

______________________________________________

1. Decisão/acórdão arbitral que foi proferido em 25/10/2022, tendo o S. C. Salgueiros requerido a sua retificação/reforma, vindo então a ser proferida a decisão/acórdão arbitral de 08/03/2023, sendo desta decisão/acórdão que é instaurada a presente ação de anulação.↩︎

2. CPC Anotado, Vol. V, pág. 136 e ss.↩︎

3. Manual, 1.ª ed., pág. 666 e ss.↩︎

4. Direito Processual Civil, 2015, pág. 369 a 371.↩︎

5. Por exemplo, o erro que se aponta na conclusão 30 do presente recurso (erro cometido nos raciocínios de fls. 20 e 21) acaba por não ter qualquer influência e não se repercute na liquidação da participação do S. C e Salgueiros (no resultado líquido do contrato de consórcio e, depois, do crédito do S. C. e Salgueiros), como se extrai do que consta das fls. 47 e 48 da sentença arbitral acima analisadas.↩︎

6. Para que não haja equívocos, estamos num recurso, não da sentença arbitral, mas sim do Acórdão da Relação que, em 1.ª Instância, conheceu da ação de impugnação da sentença arbitral.↩︎

7. Parecer que, com todo o respeito, não traz qualquer contributo para o desfecho da presente ação anulatória: pronuncia-se tal Parecer sobre o “mérito” das questões que se colocavam no litígio submetido à ação, não dizendo uma só palavra sobre o que pode ou não ser objeto de impugnação numa ação anulatória de sentença arbitral.↩︎

8. Correção que, aliás, ultrapassaria os efeitos meramente cassatórios do meio processual em que nos encontramos, isto é, nunca aqui se poderia substituir a sentença arbitral proferida por outra que não enfermasse dos vícios de que a mesma enfermava.↩︎