Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
273/08.0JELSB-B.E1-A.S1
Nº Convencional: 3.ª SECÇÃO
Relator: PIRES DA GRAÇA
Descritores: RECURSO PARA FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
OPOSIÇÃO DE JULGADOS
CRIME DE TRÁFICO DE ESTUPEFACIENTES
CRIME EXAURIDO
CRIMES DE EXECUÇÃO CONTINUADA
RECURSO PENAL
COMPETÊNCIA TERRITORIAL
CONFLITO DE COMPETÊNCIA
CONEXÃO DE PROCESSOS
Nº do Documento: SJ
Data do Acordão: 06/16/2010
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Decisão: REJEITADO
Doutrina: - GERMANO MARQUES DA SILVA, Curso de Processo Penal, I, p. 177.
Legislação Nacional: CÓDIGO DE PROCESSO PENAL (CPP): - ARTIGOS 14º°, N° 1, 19°, N.°S 1 E 3, 24° E SEGUINTES, 28.°, ALÍNEAS B) E C), 32.°, N.ºS 1 E 2 ALÍNEA B), 119.°, ALÍNEAS C) E E), 190.º N.º 3, E 441.º Nº 1.
DL N° 15/93, DE 15 DE JANEIRO: - ARTIGO 21.º .
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE 19-6-96, IN BMJ 458, 98.
Sumário : I - O recurso para fixação de jurisprudência é um recurso extraordinário e, neste sentido, excepcional, sendo entendimento comum deste Supremo Tribunal, que a interpretação das normas que o regem, deve fazer-se com as restrições e o rigor inerentes (ou exigidas) por essa excepcionalidade.

II - A lei processual penal faz depender a admissibilidade do recurso extraordinário para fixação de jurisprudência da existência de determinados pressupostos, uns de natureza formal e outros de natureza substancial - artsº 437º nºs 1, 2 e 3 e 438º nºs 1 e 2 do CPP.
Pressupostos legais formais:
- A interposição de recurso no prazo de 30 dias posteriores ao trânsito em julgado do acórdão recorrido; a identificação do acórdão com o qual o acórdão recorrido se encontre e oposição, e, se este estiver publicado, o lugar da publicação; o trânsito em julgado de ambas as decisões; os sujeitos processuais com legitimidade.
Pressupostos legais substanciais:
- A justificação da oposição entre os acórdãos que motiva o conflito de jurisprudência; a verificação de identidade de legislação à sombra da qual foram proferidas as decisões.

III - A estes requisitos legais, o Supremo Tribunal de Justiça aditou a necessidade de identidade de factos, não se restringindo à oposição entre as soluções de direito. v. Acº do STJ 10-01-2007 , Proc. n.º 4042/06 - 3.ª Secção.

IV - Situações fácticas diferentes, geradoras de soluções jurídicas diferenciadas, não integram o pressuposto de oposição de julgados.

V - A oposição de julgados, na verificação dos referidos pressupostos legais, ocorre quando, nos acórdãos em confronto, perante situação fáctica idêntica, sobre a mesma questão fundamental de direito, no domínio da mesma legislação, expressamente são proferidas decisões antagónicas.

VI – No caso concreto, inexiste situação fáctica idêntica ainda que integre o mesmo tipo legal de crime, e, inexiste solução diferente para a mesma questão de direito, ainda que no acórdão fundamento se diga que:
O crime de tráfico, como crime exaurido, consuma-se, pois, imediatamente no momento da ocorrência de um qualquer dos vários momentos ou das condutas implicados na ampla descrição típica do artigo 21 ° do Decreto-Lei n° 15/93, de 15 de Janeiro" sendo, por isso, indiferente a ocorrência e a adjunção, posterior ou sequente, de um ou outro dos vários momentos de tipicidade; qualquer deles determina, por si, a consumação do crime.”
E, no acórdão recorrido se refira que: “O facto de o crime de tráfico de estupefacientes ter a natureza de crime exaurido, obsta por natureza a que ele possa ter a natureza de crime continuado, no entanto, não impede que, por se tratar de um crime de actividade que ele possa ser igualmente um crime de execução continuada, em que são praticados vários actos de execução, que integram um só crime.
(…) Estamos, perante uma acção que se prolongou no tempo que consistiu na recolha, transporte e entrega da droga, pelo que é competente em razão do território o tribunal em cuja área foi praticado o último acto, ou onde cessou a consumação nos termos do art. 190 nº 3 do CPPenal, (…).”

VII - É que o cerne da questão para o acórdão recorrido com vista a decidir a questão posta em recurso penal, da suscitada incompetência territorial de um determinado tribunal, não colide com o acórdão fundamento, pois que este não teve por objecto a análise da questão concreta de integração jurídica do crime exaurido como crime de execução continuada, nem decidiu sobre essa questão, e a argumentação que desenvolveu a propósito do crime de tráfico como crime exaurido, era meramente instrumental em relação à decisão a proferir em conflito de competência, sobre um problema de conexão, não se fundamentando na interpretação e aplicação do artº 19º nºs 1 ou 3 do CPP.

VIII - As decisões de direito são diferentes e não se referem a idênticas situações fácticas, ou, de outro modo, na situação concreta, - o julgado pelo acórdão recorrido e o decidido pelo acórdão fundamento -, não há identidade de situações de facto, que gerassem decisões de direito diferentes.

IX - Inexistindo identidade de situações de facto, inexiste oposição de julgados.

X - Concluindo-se pela não oposição de julgados, o recurso é rejeitado. (artº 441º nº 1 do CPP)
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça
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No processo nº 273/08.0JELSB-B.E1 do Tribunal da Relação de Évora, o arguido AA, id. nos autos, interpôs o presente recurso de fixação de jurisprudência para o Plenário das Secções Criminais deste Supremo Tribunal, nos termos do artigo 437º nº 1 e nº 2 do C.P.P., apresentando as seguintes conclusões:

1- No douto acórdão de que agora se recorre, decidiu-se que o crime de tráfico de estupefacientes é um crime exaurido, mas, quando for integrado por vários actos de execução, pode ser um crime continuado, consumando-se com o último acto típico.
2- Esta decisão está em oposição com uma outra proferida pelo Tribunal da Relação do Porto, em 22 de Março de 2006, no processo 0544312 - acórdão publicado em www.dgsi.pt.
3- No acórdão agora fundamento, perfilhou-se o entendimento precisamente contrario.
4- Nestes dois doutos arestos decidiu-se a mesma questão fundamental de direito, sobre uma questão análoga de facto, sempre no âmbito da mesma legislação e assentando em soluções manifestamente opostas.
5- Saber se o crime de trafico de estupefacientes é um crime exaurido, se pode ser também de execução continuada e quando se consuma: com o primeiro ou ultimo acto de execução.
6• Entendemos que deve ser fixada jurisprudência de acordo com o acórdão fundamento, ou seja, de que o crime de trafico de estupefacientes p.p. pelo artigo 210 do DL 15/93 de 22/1 é um crime exaurido que se consuma imediatamente com o primeiro acto de execução, independentemente de se verificarem actos típicos posteriores.
Violaram-se as seguintes disposições legais:
Artigo 19º Código de Processo Penal;
Artigo 21º do DL 15/93 de 22/1
22.ABR.2010 17:18 00351217804161
Nestes termos e demais de direito, deverá o presente recurso obter provimento e em consonância fixar-se jurisprudência no sentido propugnado e de acordo com o acórdão fundamento
Junta-se:
• cópia do acórdão fundamento tal corno está publicado em www.dgssi.pt;
• Comprovativo do pagamento da multa relativa ao 10 dia após o termo do prazo - art. 107º- A do C.P.P.
V. EXAS FARÃO CONTUDO JUSTIÇA!
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O Ministério Público apresentou resposta, onde acaba por concluir que “como resulta da leitura dos acórdãos (fundamento e recorrido) inexiste identidade nas duas decisões proferidas.
Termos em que se entende ser de rejeitar o recurso, nos termos do artigo 441 ° nº1 do CPP”, e aponta o manifesto lapso do recorrente na referência ao acórdão fundamento, “porquanto o acórdão fundamento é o do STJ junto com a motivação e não o acórdão citado do Tribunal da Relação do Porto.
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Foi proferido despacho a admitir o recurso, cumprindo-se o disposto nos artigos 438º e 439º do CPP.
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Neste Supremo Tribunal, a Dig.ma Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto Parecer onde, além do mais, assinala:
A - enquanto no acórdão recorrido (o de 16.03.2010 da Relação de Évora) - prendendo-se a situação factual com a circunstância de, estando em causa vários actos de execução que, no seu conjunto, integram a prática do crime de tráfico de estupefacientes, cuja execução, começada com o transporte da droga a partir de Grândola, cessou na área da Comarca de Silves, onde - os arguidos foram interceptados pela Polícia e apreendida por esta a droga - concluiu-se no sentido de que, tratando-se o crime em referência de execução continuada em que a prática de um acto se prolonga no tempo (o transporte do estupefaciente), competente para conhecer da infracção é o tribunal da área em que “cessou a consumação” (o Tribunal de Silves), com a intercepção dos arguidos pela Polícia e bem assim com a apreensão da droga,

B - no acórdão fundamento (o de 06.10.2004 deste Supremo Tribunal) - consubstanciando-se a situação fáctica na circunstância de, estando em causa actuações delituosas, configurativas do crime de tráfico de estupefacientes, cuja responsabilidade vinha imputada a três grupos de indivíduos que as executaram: em Valença, um dos grupos; o segundo grupo, em Braga e em Viseu o último grupo - concluiu o tribunal, sem entrar na questão objecto de apreciação e decisão no acórdão recorrido, no sentido de deferir ao tribunal onde se encontrava o processo o encargo de observar os procedimentos necessários com vista á aplicação das regras gerais sobre competência funcional e territorial (arts. 14º, nº 1, 19º, nº 1 e 119º, alínea e) do C.P.P.). E isto porque tratava-se, não de um caso de competência determinada pela conexão (art. 28º do C.P.P.) mas, de um caso que, no momento processual indicado e por aplicação do princípio regra sobre competência, deveria ter determinado a organização de processos autónomos relativamente a cada série de factos e arguidos segundo as regras sobre a competência territorial.

2.2. - Quer-se com isto afinal dizer que, partindo de pressupostos factuais distintos, a soluções jurídicas diferentes por força chegaram uma e outra das decisões que, não abordando nem expressa nem implicitamente ao cabo e ao resto a mesma questão de direito, não se contradizem, como bem observa a Senhora Procuradora-Geral Adjunta na Relação de Évora.
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II.3. - Termos em que se entende que, não existindo a alegada oposição relevante de julgados, deve o recurso ser rejeitado (nº 1 do art. 441º do C.P.P.), o que se requer.”
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O requerente juntou cópia do acórdão fundamento e encontra-se junta certidão do acórdão recorrido
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

Nos termos do artigo 437º nº 1 do Código de Processo Penal, quando, no domínio da mesma legislação, o Supremo Tribunal de Justiça proferir dois acórdãos que relativamente à mesma questão de direito, assentem em soluções opostas, o Ministério Público, o arguido, o assistente ou as partes civis podem recorrer, para o pleno das secções criminais, do acórdão proferido em último lugar.
É também admissível recurso, nos termos do número anterior, quando um tribunal de relação proferir acórdão que esteja em oposição com outro, da mesma ou de diferente relação, ou do Supremo Tribunal de Justiça, e dele não for admissível recurso ordinário, salvo se a orientação perfilhada naquele acórdão estiver de acordo com a jurisprudência já anteriormente fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça.- nº 2 do preceito.

A lei processual faz depender a admissibilidade do recurso extraordinário para fixação de jurisprudência da existência de determinados pressupostos, uns de natureza formal e outros de natureza substancial.- artsº 437º nºs 1, 2 e 3 e 438º nºs 1 e 2 do CPP.
Entre os primeiros, a lei enumera:
- A interposição de recurso no prazo de 30 dias posteriores ao trânsito em julgado do acórdão recorrido;
- A identificação do acórdão com o qual o acórdão recorrido se encontre e oposição
- E, se este estiver publicado, o lugar da publicação.
- o trânsito em julgado de ambas as decisões.
- Os recorrentes com legitimidade.

Entre os segundos, conta-se:
- a justificação da oposição entre os acórdãos que motiva o conflito de jurisprudência;
- a verificação de identidade de legislação à sombra da qual foram proferidas as decisões.

A exigência de oposição de julgados, de que não se pode prescindir na verificação dos pressupostos legais de admissão do recurso extraordinário para fixação de jurisprudência, nos termos do art. 437.º, n.º 1, do CPP, é de considerar-se preenchida quando, nos acórdãos em confronto, manifestamente de modo expresso, sobre a mesma questão fundamental de direito, se acolhem soluções opostas, no domínio da mesma legislação.
A estes requisitos legais, o STJ, de forma pacífica, aditou a incontornável necessidade de identidade de factos, não se restringindo à oposição entre as soluções de direito. - Acº do STJ 10-01-2007 , Proc. n.º 4042/06 - 3.ª Secção

Sendo o recurso de fixação de jurisprudência um recurso extraordinário e, por isso, excepcional, é entendimento comum deste Supremo Tribunal (v. desde logo o Ac. de 23 de Janeiro de 2003, processo n. 1775/02-5ª), que a interpretação das regras jurídicas disciplinadoras tal recurso, deve fazer-se com as restrições e o rigor inerentes (ou exigidas) por essa excepcionalidade.

Tendo em conta a data da interposição do presente recurso em 22 de Abril de 2010, por fax, com carimbo de entrada no Supremo em 23 seguinte, e o trânsito em julgado do acórdão recorrido (v. certidão de fls 44), é tempestiva a sua interposição.
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Se ocorrer motivo de inadmissibilidade ou o tribunal concluir pela não oposição de julgados, o recurso é rejeitado; se concluir pela oposição, o recurso prossegue - artº 441º nº 1 do CPP.
Se, porém, a oposição de julgados já tiver sido reconhecida, os termos do recurso são suspensos até ao julgamento do recurso em que primeiro se tiver concluído pela oposição - Artº 441º nº2 do CPP.
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Com interesse para o presente recurso, consta do acórdão recorrido, supra referido:
“O teor dos despachos recorridos é o seguinte:
Fls 981 (perícia).
(…)
Fls 981(requisição de relatório de “eventual” acção encoberta):
(…)
Da incompetência territorial (fls. 975 a 977 e 997)
"AA, arguido nos presentes autos, veio invocar a "incompetência territorial do Tribunal de Sines", com o fundamento de que, tendo o crime de tráfico se consumado no local (Grândola) onde os arguidos tornaram posse da droga, é competente o Tribunal com jurisdição nessa área e não o Tribunal da área onde a droga foi apreendida.
Cumpre apreciar e decidir:
A douta acusação (assim como o despacho de pronúncia) imputa aos arguidos terem eles, ininterruptamente, detido substâncias estupefacientes, fazendo o respectivo transporte, desde Grândola até à área do Concelho e Comarca de Silves, altura em que, por os arguidos terem sido interceptados e a droga apreendida, cessou a execução do crime de que vêm acusados.
A factualidade imputada aos arguidos, na douta acusação, integra a prática, pelos mesmos, de um crime de tráfico de estupefacientes, pelo menos, na vertente de "transportar" (art. 21°, nº 1 da Lei da Droga).
Estamos, perante, um crime de execução continuada, em que, são praticados vários actos de execução e que, em conjunto, integrarão a prática de um só crime, mas cuja execução cessou na Comarca de Silves ( e não Sines, como o arguido, certamente, por lapso, refere), quando os arguidos aí foram interceptados pela polícia, momento em que lhes terá sido apreendida a droga.
Nos termos do art. 19°, n° 3 do CPPenal, " para conhecer de um crime que se consuma por actos sucessivos ou reiterados, ou por um só acto susceptível de se prolongar no tempo, é competente o Tribunal em cuja área se tiver praticado o último acto ou tiver cessado a consumação".
No caso que nos ocupa a ciência, estamos perante (segundo a factualidade imputada na acusação) a prática de um acto que se prolonga no tempo - transporte de estupefacientes ¬e assim, é competente o Tribunal Judicial da Comarca de Silves, pois foi na área desta Comarca que "cessou a consumação", no preciso momento em que os arguidos foram interceptados pelo polícia e lhe foi retirada a droga.
E se dúvidas houvesse, importaria perguntar se quererá o arguido, com a sua argumentação, concluir que os arguidos, ao longo do percurso, cometeram vários crimes de tráfico de estupefaciente, que se foram consumando uns a seguir aos outros? E, já agora, será que pretende defender que, os arguidos cometeram um crime de tráfico de estupefacientes, em cada uma das Comarcas por onde foram passando? É evidente que, assim não é, nem podia ser e, portanto nenhuma lógica ou racionalidade jurídicas tem a frágil construção jurídica do arguido.
Improcede, pois, de forma aliás manifesta a infundadamente suscitada incompetência territorial do Tribunal Judicial de Silves.
( ..... )
Notifique".

III- As conclusões do recurso destinam-se a habilitar o tribunal superior a conhecer as razões da discordância dos recorrentes em relação à decisão recorrida, a nível de facto e de direito, por isso, elas devem conter um resumo claro e preciso das razões do pedido (cfr. neste sentido, o Ac. STJ de 19-6-96, in BMJ 458, 98).
Perante as conclusões do recurso e o teor dos despachos recorridos, importa saber se o tribunal de Silves é competente ou não em razão do território, se deve ser ordenada a perícia médica e a junção do relato da acção encoberta.
(…)
Da questão da competência territorial do tribunal.
O arguido vem alegar que não concorda com a decisão recorrida, no que respeita à classificação do crime de tráfico de estupefacientes e, em consequência com as regras da competência e com o seu enquadramento no art. 19° n° 3 do CPPenal, com o fundamento de aquele ilícito é um crime exaurido, em que o legislador recua a sua protecção aos momentos iniciais, independentemente da produção de qualquer resultado" e por isso, se enquadram no nº 1 do daquele preceito.
O crime de tráfico de estupefacientes é um crime exaurido, designação que significa, aquele ilícito criminal que fica consumado com a prática do primeiro acto de execução, independentemente de se vir a praticar na sua totalidade o acto pretendido pelo agente.
O crime exaurido constitui uma figura criminal em que a incriminação da conduta do agente se esgota nos primeiros actos de execução, independentemente de os mesmos corresponderem a uma execução completa, e em que a repetição dos actos, com produção de sucessivos resultados é, ou pode ser, imputada a uma realização única. É desta forma, aquele em que o resultado típico se obtém logo pela realização inicial da conduta ilícita, de modo que a continuação da mesma, mesmo com propósitos diversos do originário, se não traduz necessariamente na comissão de novas violações do respectivo tipo legal.
Cada actuação do agente, no crime exaurido, traduz-se na comissão do tipo criminal, mas o conjunto das múltiplas actuações do mesmo agente reconduz-se à comissão do mesmo tipo de crime e é normalmente tratada unificadamente pela lei e pela jurisprudência como correspondente a um só crime.
O facto de o crime de tráfico de estupefacientes ter a natureza de crime exaurido, obsta por natureza a que ele possa ter a natureza de crime continuado, no entanto, não impede que, por se tratar de um crime de actividade que ele possa ser igualmente um crime de execução continuada, em que são praticados vários actos de execução, que integram um só crime.
No caso em apreço, a acusação imputa aos arguidos um crime de tráfico de estupefacientes, cuja consumação se iniciou logo que eles entraram na posse da droga, em Grândola, mas a sua execução só terminou em Silves, quando foram interceptados e lhes foi apreendida a droga.
Estamos, perante uma acção que se prolongou no tempo que consistiu na recolha, transporte e entrega da droga, pelo que é competente em razão do território o tribunal em cuja área foi praticado o último acto, ou onde cessou a consumação nos termos do art. 190 n.º 3 do CPPenal, que é o tribunal de Silves.
Não assiste, pois, razão ao recorrente quanto a esta questão que suscitou.
(…)
IV - Termos em que acordam os Juízes desta Relação em negar provimento aos recursos, mantendo os despachos recorridos.
(…)”
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Por sua vez consta do invocado acórdão fundamento, prolatado não pelo Tribunal da Relação do Porto, como por lapso indica o recorrente, mas pelo Supremo Tribunal de Justiça:
“Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça:

I. O magistrado do Ministério Público de Viseu deduziu acusação contra AA, pela autoria material de um crime de tráfico, na forma consumada, p. e p. no artigo 21º, n° 1, do Decreto-Lei nº l5/93, de 22 de Janeiro; BB, CC e DO, pela; autoria material de um crime de tráfico de menor gravidade, na forma consumada, previsto e punido o art 25°, alínea a), do DL 15/93; EE. pela autoria material, em concurso real efectivo. de um crime de tráfico agravado, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 21°, n° 1, e 24°. alíneas b) e c) do DL 15/93, e um crime de detenção ilegal de arma previsto e punido peio art. 6, n° 1, da Lei 22/97 de 27/6, na redacção dada pela Lei 98/2001 de 25 e Agosto; FF, pela autoria material de um crime de tráfico agravado, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 21°, n° 1, c 24, alíneas b) e c) do DL 15/93; GG, pela autoria material de um crime de tráfico agravado, na forma consumada, previsto e punido pelo art. 21°, nº1, e 24°, alíneas b) e c) do DL 15/93; HH, pela autoria material, em concurso real efectivo, de um crime de tráfico agravado, na forma consumada. previsto e punido pelo art. 21°, nº1, e 24°, alíneas b) e c) do DL 15/93, e um crime de detenção ilegal de arma, previsto e punido pelo art. 6°, n° 1, da Lei 22/97 de 27 de Junho, na redacção dada pela Lei 98/2001, de 25 de Agosto, e de um crime previsto e punido pelos artigos 275°, nºs 2 e 3 do Código Penal e 3°, alínea f) e nº2, alínea c) do DL 297/A/75, de 17 de Abril e art. 4° do DL 48/95 de 15 de Março.
A acusação deduzida foi recebida pelos factos e qualificação que dela constavam, tendo o juiz do processo declarado que não existiam «nulidades, excepções ou outras questões prévias ou incidentais de que cumpra conhecer e obstem ao conhecimento do mérito da causa». Foi determinado o cumprimento dos artigos 313°, n° 2 e 315° do Código de Processo Penal (CPP).
2. Posteriormente, em promoção autónoma, o magistrado do Ministério Público suscitou a questão relativa à competência do tribunal de Viseu, considerando que o processo deveria ser remetido ao tribunal de Valença, fundamentando-se nas regas relativas à conexão de processos.
Antes do início da audiência de julgamento, o tribunal colectivo decidiu atender a promoção do Ministério Público, uma vez que todos os crimes pelos quais os arguidos estão acusados se encontrariam em «estrita conexão», nos termos do artigo 24°, alíneas b), c) e d) do CPP.
Fundamentou a decisão pelo modo seguinte: «O artº 28° alínea a), do C.P.P. dispõe que" se os processos devessem ser da competência (de tribunais com jurisdição em diferentes áreas .... é competente para conhecer de todos o competente para conhecer do crime a que couber pena mais grave».
«Os arguidos EE, FF, GG e HH estão acusados do crime mais grave dos que vêm imputados na acusação-tráfico agravado (com uma moldura penal máxima de prisão até 16 anos)>>.
«O crime de tráfico consuma-se por actos sucessivos, pelo que somos remetidos para o disposto no artº 19°, n° 2 do C.P.P. que refere ser competente para conhecer deste tipo de crimes o tribunal em cuja área se tiver praticado o último acta».
«Ora, o último acta do crime referido imputado aos arguidos EE e FF consuma-se no dia 25/11/2002, por outro lado, o último acta do crime de tráfico agravado aos arguidos GG e HH consumou-se em Valença, em 26/11/2002».
«Deste modo, seria o Tribunal Judicial de Braga o competente para conhecer dos crimes de tráfico agravado imputados aos arguidos EE e FF e seria o de Valença o competente para conhecer dos crimes imputados a GG e HH - isto no âmbito das regras gerais». «Contudo, como está em causa a competência por conexão, temos de socorrer-nos agora do disposto na alínea b) do artº 28°; ou seja a competência, em caso de crimes de igual gravidade, é do tribunal a cuja ordem estiver preso o arguido ou, havendo vários arguidos presos (que é o caso dos autos), aquele à ordem do qual estiver preso o maior número».
«No que respeita aos crimes de tráfico agravado consumados em Braga apenas o arguido EE se encontra preso; quanto aos crimes de tráfico agravado consumados em Valença, estão presos os arguidos GG e HH - pelo que a competência recai no Tribunal Judicial de Valença».
«O citado art° 28° permite assim determinar a competência territorial quando as regras estabelecidas nos artºs anteriores entram em conflito. A alínea a) é a primeira norma a funcionar subsidiariamente e as alíneas. b) e c) funcionam sucessivamente para o caso de não poder ser aplicada a 1ª».
Assim, declarou o tribunal de Viseu incompetente para conhecer dos crimes imputados aos arguidos, considerando competente para o efeito o Tribunal Judicial de Valença (artºs 28° alínea b), 32°, nºs I e 2 alínea b) do C.P.P.), pelo que deu sem efeito a audiência designada.
3. Remetido o processo ao tribunal de Valença, o juiz, por seu lado, declarou o tribunal incompetente, por se não verificarem, no caso, os pressupostos formais (plural idade de processos) das regras da competência por conexão.

4. Cumprido o disposto no artigo 36°, n° 2 do CPP, os magistrados em conflito nada disseram.
Neste Supremo Tribunal, a Exma Procuradora-Geral Adjunta entende que «deverá ser remetido o processo ao Tribunal de Viseu e considerar-se o mesmo competente, porque já havia sido considerado competente por decisão transitada em julgado, e ainda que tal não seja considerado, foi o primeiro tribunal que teve a notícia do crime, por não se estar perante um caso de conexão».
Colhidos os vistos, o processo foi à conferência, cumprindo apreciar e decidir.
A competência em processo penal - a cada crime corresponde um processo para o qual é competente o tribunal predeterminado em função das regras sobre competência material, funcional e territorial - é, por princípio, unitária, respondendo a exigências precisas de determinação prévia do tribunal competente, para prevenir a manipulação avulsa ou arbitrária de competência em contrário do respeito pelo princípio do juiz natural.
O princípio, no entanto, e respeitando ainda exigências mínimas, pode sofrer adequações, previstas na lei e formadas segundo critérios objectivos, organizando-se um só processo para uma pluralidade de crimes, e assim afastando a competência primária relativamente a alguns dos crimes, desde que entre os vários crimes se verifique uma ligação que torne conveniente para melhor realização da justiça que todos os crimes sejam apreciados conjuntamente.
A ligação entre os crimes «que determina excepções à regra de que a cada crime corresponde um processo e às regras de competência material, funcional e territorial, definidas em função de um só crime, chama a lei conexão, e consequentemente a denominada competência por conexão»; representa um desvio às regras normais de competência em razão da organização de um único processo para uma pluralidade de crimes ou de apensação de vários processos que hão-de ser julgados conjuntamente (cfr., GERMANO MARQUES DA SILVA, "Curso de Processo Penal", I, p. 177).
A conexão de processos é, pois, determinada por conveniências de justiça. Deve existir entre os crimes que hão-de ser julgados conjuntamente uma tal ligação, que se presume que o esclarecimento de todos será mais fácil ou completo quando processados conjuntamente, evitando-se contradições de julgados e realizando-se consequentemente melhor justiça: é o que resulta das regras sobre conexão dos artigos 24° e seguintes do CPP.
A competência determinada por conexão - q. est - a modificação das regras de competência que resultam da intervenção do princípio de I que a cada crime corresponde um processo - supõe, pois. a verificação ele algum dos pressupostos fixados no artigo 24° do CPP.
Tais pressupostos de conexão são ou de natureza subjectiva (previstos em função do arguido - alíneas a), b)), ou de natureza objectiva (pela relação específica que intercede entre os factos (alíneas c), d) e e)).
5. As circunstâncias do caso sub specie, em que se manifestou o conflito dos tribunais sobre a competência, não permitem, porém, estabelecer as base da determinação da competência por conexão - e o estabelecimento dos elementos relevantes é pressuposto necessário para a determinação ela competência.
Com efeito, nos crimes de perigo, como é classificado o crime de tráfico de estupefacientes, a protecção é recuada a momentos iniciais da acção, independentemente da produção de qualquer resultado. Por isso, a acção do agente não se destina à produção de um resultado, mas tem de ser apenas determinada à execução de um facto que por si só constitui o elemento gerador do perigo típico para os bens jurídicos tutelados.
Nos casos em que o elemento típico em que se consume o crime pela criação do perigo se projecta em variadas e plurais (tanto no plano da conformação típica como no plano da execução) acções ou dimensões típicas, mesmo com autonomia material, a consumação do crime revela-se, logo no momento de integração de qualquer uma das projecções de tipicidade.
O crime de tráfico, como crime exaurido, consuma-se, pois, imediatamente no momento da ocorrência de um qualquer dos vários momentos ou das condutas implicados na ampla descrição típica do artigo 21 ° do Decreto-Lei n° 15/93, de 15 de Janeiro" sendo, por isso, indiferente a ocorrência e a adjunção, posterior ou sequente, de um ou outro dos vários momentos de tipicidade; qualquer deles determina, por si, a consumação do crime.
Mas, sendo assim, não se verifica, no presente caso, qualquer elemento de conexão subjectiva que determine o afastamento das regras comuns sobre competência territorial e funcional: nenhum dos arguidos cometeu, na descrição da acusação, vários crimes através da mesma acção ou omissão, ou vários crimes na mesma ocasião e lugar, sendo uns causa ou efeito dos outros, ou destinando-se uns a continuar ou ocultar os outros - alíneas a) e b) do artigo 24° do CPP. Mas também não concorrem elementos objectivos de conexão. Voltando à natureza e à construção típica e dogmática do crimes de tráfico (os crimes de tráfico são independentes, pelo perigo que as actividades criam, não sendo, nesta perspectiva, causa e efeito uns dos outros). os factos. como decorre da acusação, não foram praticados por vários agentes em comparticipação, na mesma ocasião ou lugar sendo uns causa ou efeito dos outros, ou destinando-se uns a continuar ou a ocultar os outros, nem vários agentes cometeram diversos crimes reciprocamente na mesma ocasião ou lugar - alíneas c), d) e e) da referida disposição.
Verdadeiramente, o que se descreve são três conjuntos factuais, com elementos objectivos e subjectivos próprios e independentes, com lugar em Valença (factos imputados aos arguidos GG e HH), Braga (factos que a acusação refere ao arguidos EE, FF, CC e, igualmente, AA [embora relativamente a este a imediata projecção processual da intervenção em flagrante possa também apontar, dada a equivalência dos momentos de tipicidade, para a competência referida ao território onde foi surpreendido no transporteJ), e Viseu (os restantes), que deveriam ter determinado, no momento processual adequado, e na aplicação do princípio-regra sobre competência, processos autónomos relativamente) cada série de factos e arguidos segundo as regras sobre competência territorial; os elementos de conexão que, nas circunstâncias do caso, podem existir, respeitam apenas à vertente subjectiva e intra-territorial relativamente a cada conjunto de factos ocorridos em cada um dos diversos locais.
Não tendo sido assim decidido, ficaram afectadas as regras sobre a competência, com as consequências que a lei determina - artigo 119°, alínea e) do CPP.

6. Perante tais elementos, o Supremo Tribunal ao qual foi deferida a resolução do conflito, tendo de decidir sobre a competência, não está limitado aos estritos termos do conflito quando, como no caso, as decisões em conflito se movem ambas cm pressupostos que divergem das construções legais.
Com efeito, sendo caso em que os termos do conflito assentam em divergência quanto ao funcionamento das regras sobre conexão, pressupondo que se verificam, quando não se verificam, elementos de conexão, a decisão do conflito não pode ratificar alguma das decisões, movendo-se, em registo de ficção, como se estivessem verificados os elementos pressupostos.
Também não poderá ter aplicação a regra residual do artigo 28°, alínea c), do CPP (o tribunal das área onde primeiro tiver havido notícia de qualquer dos crimes), que, como regra subsidiária de delimitação da competência territorial determinada pela conexão, supõe, previamente, a verificação de algum dos elementos que são pressupostos da conexão de processos.
7. Nestes termos, por se não verificar qualquer elemento de conexão que afaste as regras gerais sobre competência, e não existir, em tal perspectiva. a base ou pressuposto em que assenta o conflito. deve o tribunal onde se encontra o processo observar os procedimento" necessários para aplicação das regras gerais sobre competência funcional e territorial - artigos 14º°, n° 1. 19°, n° 1 e 119°, alínea c) do CPP."
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Como resulta evidente, as situações fácticas, são diferentes, pelo que necessariamente implicaram diferença, e não propriamente oposição, nas decisões que lhes corresponderam.
Na verdade, enquanto no acórdão recorrido se tratava de um recurso penal tendo por objecto várias questões fácticas de relevância jurídico-criminal: realização ou não de perícia médica, junção ou não de relato de acção encoberta, (in)competência territorial de determinado tribunal, o acórdão fundamento assentou numa situação fáctica plural motivadora de conexão de processos com relevância para determinação da competência territorial do tribunal de julgamento, situação fáctica essa concretizada em conflito negativo de competência entre diversos tribunais.

É certo que no acórdão fundamento se diz que:
Com efeito, nos crimes de perigo, como é classificado o crime de tráfico de estupefacientes, a protecção é recuada a momentos iniciais da acção, independentemente da produção de qualquer resultado. Por isso, a acção do agente não se destina à produção de um resultado, mas tem de ser apenas determinada à execução de um facto que por si só constitui o elemento gerador do perigo típico para os bens jurídicos tutelados.
Nos casos em que o elemento típico em que se consume o crime pela criação do perigo se projecta em variadas e plurais (tanto no plano da conformação típica como no plano da execução) acções ou dimensões típicas, mesmo com autonomia material, a consumação do crime revela-se, logo no momento de integração de qualquer uma das projecções de tipicidade.
O crime de tráfico, como crime exaurido, consuma-se, pois, imediatamente no momento da ocorrência de um qualquer dos vários momentos ou das condutas implicados na ampla descrição típica do artigo 21 ° do Decreto-Lei n° 15/93, de 15 de Janeiro" sendo, por isso, indiferente a ocorrência e a adjunção, posterior ou sequente, de um ou outro dos vários momentos de tipicidade; qualquer deles determina, por si, a consumação do crime.”

E, no acórdão recorrido se refere que:
O crime de tráfico de estupefacientes é um crime exaurido, designação que significa, aquele ilícito criminal que fica consumado com a prática do primeiro acto de execução, independentemente de se vir a praticar na sua totalidade o acto pretendido pelo agente.
O crime exaurido constitui uma figura criminal em que a incriminação da conduta do agente se esgota nos primeiros actos de execução, independentemente de os mesmos corresponderem a uma execução completa, e em que a repetição dos actos, com produção de sucessivos resultados é, ou pode ser, imputada a uma realização única. É desta forma, aquele em que o resultado típico se obtém logo pela realização inicial da conduta ilícita, de modo que a continuação da mesma, mesmo com propósitos diversos do originário, se não traduz necessariamente na comissão de novas violações do respectivo tipo legal.
Cada actuação do agente, no crime exaurido, traduz-se na comissão do tipo criminal, mas o conjunto das múltiplas actuações do mesmo agente reconduz-se à comissão do mesmo tipo de crime e é normalmente tratada unificadamente pela lei e pela jurisprudência como correspondente a um só crime.” e depois, vem a considerar que:
“O facto de o crime de tráfico de estupefacientes ter a natureza de crime exaurido, obsta por natureza a que ele possa ter a natureza de crime continuado, no entanto, não impede que, por se tratar de um crime de actividade que ele possa ser igualmente um crime de execução continuada, em que são praticados vários actos de execução, que integram um só crime.
No caso em apreço, a acusação imputa aos arguidos um crime de tráfico de estupefacientes, cuja consumação se iniciou logo que eles entraram na posse da droga, em Grândola, mas a sua execução só terminou em Silves, quando foram interceptados e lhes foi apreendida a droga.
Estamos, perante uma acção que se prolongou no tempo que consistiu na recolha, transporte e entrega da droga, pelo que é competente em razão do território o tribunal em cuja área foi praticado o último acto, ou onde cessou a consumação nos termos do art. 190 n.º 3 do CPPenal, que é o tribunal de Silves.”

Mas o desiderato transcrito que constituía o cerne da questão para o acórdão recorrido para decidir a questão posta da suscitada incompetência territorial de um tribunal (no caso o de Silves), não colide com o acórdão fundamento, pois que este não teve por objecto a análise da questão concreta de integração jurídica do crime exaurido como crime de execução continuada, nem decidiu sobre essa questão, e a argumentação que desenvolveu a propósito do crime de tráfico como crime exaurido, era meramente instrumental em relação à decisão a proferir sobre um problema de conexão, não se fundamentando na interpretação e aplicação do artº 19º nºs 1 ou 3 do CPP.

Enquanto no acórdão recorrido de decidiu confirmar a competência territorial de determinado tribunal, com fundamento no artº 19º nº 3 do CPP, impugnada em recurso, tendo sido negado provimento ao recurso, no acórdão fundamento que visou a resolução de um conflito, se disse que:” As circunstâncias do caso sub specie, em que se manifestou o conflito dos tribunais sobre a competência, não permitem, porém, estabelecer as base da determinação da competência por conexão - e o estabelecimento dos elementos relevantes é pressuposto necessário para a determinação ela competência
E, mais adiante:
Também não poderá ter aplicação a regra residual do artigo 28°, alínea c), do CPP (o tribunal das área onde primeiro tiver havido notícia de qualquer dos crimes), que, como regra subsidiária de delimitação da competência territorial determinada pela conexão, supõe, previamente, a verificação de algum dos elementos que são pressupostos da conexão de processos. “
E, decidiu: “por se não verificar qualquer elemento de conexão que afaste as regras gerais sobre competência, e não existir, em tal perspectiva. a base ou pressuposto em que assenta o conflito, deve o tribunal onde se encontra o processo observar os procedimentos necessários para aplicação das regras gerais sobre competência funcional e territorial - artigos 14º°, n° 1. 19°, n° 1 e 119°, alínea c) do CPP."

É pois evidente que as decisões de direito são diferentes e não se referem a idênticas situações fácticas, ou, de outro modo, na presente situação concreta, - o decidido pelo acórdão recorrido e o julgado pelo acórdão fundamento -, não há identidade de situações de facto, que gerassem decisões de direito diferentes.

Inexistindo identidade de situações de facto, conclui-se pela não oposição de julgados.
Concluindo-se pela não oposição de julgados, o recurso é rejeitado. (artº 441º nº 1 do CPP)
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Daí que, decidindo.

Acordam os da 3ª Secção deste Supremo Tribunal, em rejeitar, de harmonia com disposto no artigo 441º nº 1 do CPP o presente recurso de fixação de jurisprudência.

Tributam o recorrente em 4 Ucs de taxa de justiça, e condenam-no na importância de 5 UCs, nos termos do artº 420º nº 3 do CPP.


Supremo Tribunal de Justiça,
Lisboa, 16 de Junho de 2010.

Elaborado e revisto pelo relator.

Pires da Graça (Relator)
Raul Borges
Pereira Madeira