Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
06P4460
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: ARMÉNIO SOTTOMAYOR
Descritores: TRÁFICO DE ESTUPEFACIENTES
CONCURSO DE INFRACÇÕES
CRIME EXAURIDO
CRIME ÚNICO
DETENÇÃO
PRIMEIRO INTERROGATÓRIO JUDICIAL DE ARGUIDO DETIDO
Nº do Documento: SJ200702080044605
Data do Acordão: 02/08/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL.
Decisão: PROVIDO PARCIALMENTE.
Sumário : I - Apurando-se, além do mais, que:

- no dia 08-03-2005, o arguido PM trazia consigo, no interior de 1 saco de tecido, distribuídos em vários sacos de plásticos, 23,683 g de heroína, 604,093 g de cocaína, 94,14 g de canabis (resina), pesos líquidos, e 60 comprimidos de piracetam destinados à mistura com os demais produtos, para obtenção de maior quantidade de estupefaciente, sendo que o arguido destinava tais produtos a consumidores finais;

- no dia 05-08-2005, o arguido PR trazia consigo 50,012 g de canabis (resina), peso líquido, sendo que tal produto era, em parte não apurada, para seu consumo, e, na parte restante, para ceder a um amigo;

- no dia 14-09-2005, os arguidos PM e PR traziam consigo, no interior de 2 sacos de plástico, distribuídos em diversos sacos, e um embrulho, 347,9 g de heroína, 1942,55 de cocaína, pesos líquidos, 6242,85 g de procaína, 5212,05 g de fenacetina, 118,910 g de bicarbonato de sódio, pesos brutos, sendo que aquelas três últimas substâncias eram destinadas à mistura com os demais produtos para obtenção de maior quantidade de estupefaciente e os arguidos detinham tais substâncias para as distribuir por consumidores finais;

- ambos os arguidos, nos três indicados casos, agiram livre, voluntária e conscientemente, bem conhecendo as características estupefacientes e demais finalidades dos produtos que, do modo descrito, detinham, assim como igualmente sabiam que para tal detenção não estavam autorizados e que, por tudo isso, a sua conduta era ilícita e penalmente punível, tendo, ainda, no 3.º caso indicado, actuado em comunhão de vontades e de esforços;

- na sequência do indicado facto de 08-03-2005, o arguido PM foi então detido, sujeito a 1.º interrogatório judicial e nesse dia posto em liberdade;

- em virtude do referido facto de 05-08-2005, o arguido PR foi também detido nesse dia, sujeito a 1.º interrogatório judicial e nesse dia posto em liberdade;

- em consequência do citado facto de 14-09-2005, os arguidos foram detidos e sujeitos a 1.º interrogatório judicial no dia seguinte, sendo que desde então se encontram em prisão preventiva;

- cumpre entender que cada um dos arguidos cometeu 2 crimes p. e p. pelo art. 21.º, n.º 1, do DL 15/93, um em autoria material singular e outro em co-autoria.

II - O crime de tráfico de estupefacientes vem sendo considerado pela jurisprudência como um crime de trato sucessivo, desse modo se unificando o conjunto das múltiplas acções praticadas pelo agente, do mesmo modo que é concebido como um crime exaurido, isto é, aquele em que para a incriminação do agente é suficiente a prática de um qualquer acto de execução, independentemente de corresponder à execução completa do facto.

III - Todavia, no caso em apreço não pode deixar de ser valorada a circunstância de os arguidos terem sido detidos e sujeitos a interrogatório judicial, no sentido de “uma forçosa tomada de consciência da ilicitude e censurabilidade da actividade por si desenvolvida”, o que tem como consequência o afastamento da unificação da conduta.

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

Sob acusação do Ministério Público, foram julgados, no processo nº 321/05.6 P6PRT, pelo tribunal colectivo do 1º Juízo Criminal da comarca de Gondomar, AA e BB, tendo sido condenados, o primeiro, como autor de 2 crimes previstos no art. 21º nº1 do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, nas penas de 5 anos e de 7 anos de prisão, e, feito o cúmulo, na pena única de 10 anos de prisão; e o segundo, como autor de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, previsto no art. 25º do referido Decreto-Lei, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão e como autor de um crime do art. 21º do mesmo diploma legal na pena de 6 anos de prisão e, efectuado o cúmulo, na pena única de 6 anos e 10 meses de prisão.
Irresignados, recorreram para o Tribunal da Relação do Porto.
Considerando que o recurso se encontra limitado à questão da medida da pena, o relator do processo no Tribunal da Relação, concordando com a questão prévia da incompetência material do tribunal suscitada pelo Ministério Público, determinou o envio dos autos ao Supremo Tribunal de Justiça.
Neste Tribunal, o Ministério Público, apôs o seu visto.
Tendo os recorrentes declarado, na sua motivação, que pretendiam alegar por escrito e não tendo havido oposição do Ministério Público, foi fixado prazo para alegações e definida a questão a tratar como sendo a da medida da pena. Apenas o Ministério Público apresentou alegações escritas.
Para apreciação do recurso, os autos vêm agora à conferência (art. 419º nº 4 al. d) C.P.P.).

Na motivação conjuntamente apresentada pelos dois recorrentes, foram extraídas as seguintes conclusões, que se transcrevem ipsis verbis:
1. Deverá ser concedida, aos Arguidos, a aplicação de uma pena próxima do mínimo legal.
2. As penas devem ser fundamentadas e sobretudo, obedecer a critérios objectivos, nomeadamente quanto à sua fixação no caso concreto, para que sejam justa e entendida com a função preventiva e ressocializadora que tem.
3. Refere o arte 71º do C.Penal que a medida de prisão deve ter em atenção o princípio da suficiência para promover a reintegração social do agente, não submetendo a riscos que possam prejudicar a sua recuperação, por que este sim á que é o objectivo da pena.
4. O art. 72º do C.P refere que “ ...na determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, far-se-á em função da culpa do agente .. 2. .
5. Ora, remetendo-nos ao caso sub judice verificamos que não foi tido em conta qualquer aspecto essencial da culpa na determinação concreta da pena, o que nos parece é que os Tribunais de que ora se recorre não se suportou dos critérios legais dos art. 74º e 72º do CP.
6. Dai que seja inadequada, desproporcionada, injusta e exagerada a as penas de prisão aplicada aos arguidos AA e BB, sendo que, não tem em conta os fins de prevenção, de regeneração da pena, porquanto aqueles são primários, tem família, e tiverem trabalho estável e tem apoio familiar de retaguarda e emprego caso sejam colocados em liberdade.
7. Ora o tribunal recorrido deve cumprimento ao disposto no art. 72º do CP., e não o fez bem, como não se socorreu de outros instrumentos fornecidos pelo C.P.
8. Aliás, aplicando uma pena de prisão próximas do mínimo legais tanto ao arguido AA e ao arguido BB, a Tribunal recorrido estaria a respeitar plenamente os arts. 40º 1 e 2, art. 71º, e art. 50º do CPenal, que foram violados pelo douto acórdão ora em crise.

O Ministério Público no tribunal recorrido, conclui, do seguinte modo a resposta que elaborou, na parte respeitante à matéria do recurso:
2. O recurso deve ser rejeitado por ser manifesta a sua improcedência nos termos do art. 420° n° 1 do CPP, sem prescindir;
3. O acórdão recorrido não enumera, logo não verifica nem reconhece, a existência de quaisquer circunstâncias atenuantes, quer da ilicitude dos factos quer da culpa dos agentes;
4. As penas concretamente aplicadas aos arguidos são adequadas, proporcionais e não padecem de excesso;
5. Não foram violadas quaisquer normas legais pela decisão recorrida, designadamente, os artigos 40º nº 1 e nº 2, 50.° e 71.° do C. Penal.

Mas alegações escritas que apresentou, o Ministério Público neste Supremo Tribunal pronunciou-se no sentido do provimento de ambos os recursos, considerando, quanto ao recorrente AA, que a pena parcelar pelo apelidado Caso I não deve exceder 4 anos e 6 meses de prisão e que a pena parcelar referente ao caso III não deve ultrapassar 6 anos, não devendo a pena única ser superior a 7 anos de prisão. Quanto ao recorrente BB, pronunciou-se no sentido de que a pena a aplicar pelo caso II não deve ser superior a 1 ano de prisão e que a pena aplicada pelo caso III não deve passar dos 5 anos de prisão, devendo a pena única ser igualmente de 5 anos de prisão.

É a seguinte a matéria de facto que foi dada como provada e que os recorrentes não contestam:
Caso I
1. – No dia 08 de Março de 2005, cerca da 1,30 h., na Areosa-Porto, o arguido AA tomou lugar no Táxi de matrícula QF e solicitou ao motorista que o transportasse à Rotunda da Igreja Matriz de Rio Tinto (Gondomar).
2. – Quando percorriam a Estrada Interior da Circunvalação, ele apercebeu-se de que, no encalço do Táxi, seguia um veículo caracterizado da PSP, pelo que, já na passagem inferior do nó desnivelado de acesso a Rio Tinto, o arguido, através da janela do veículo, atirou fora um saco de tecido de cores azul e branca, no interior do qual se encontravam os seguintes produtos, distribuídos por vários sacos de plástico:
a) – Um pó, que veio a revelar-se heroína, com o peso líquido de 23,349 gr.;
b) – Um pó, que veio a revelar-se heroína, com o peso líquido de 0,334 gr.;
c) – Um produto pastoso, que veio a revelar-se cocaína, com o peso líquido de 551,900 gr., acondicionado num saco plástico;
d) – Um produto sólido, que veio a revelar-se cocaína, com o peso líquido de 6,359 gr., acondicionado em seis sacos de plástico;
e) – Um produto sólido que veio a revelar-se cocaína, com o peso líquido de 45,834 gr.;
f) – Um produto sólido que veio a revelar-se Canabis (Resina), com o peso líquido de 94,140 gramas;
g) – Sessenta (60) comprimidos de Piracetam.
3. – O produto referido em 2.2-g) era destinado à mistura com os demais produtos para obtenção de maior quantidade de estupefaciente (vulgarmente designado como “produto de corte”).
4. – Quando o condutor do Táxi imobilizou o veículo em obediência à ordem de paragem dos agentes da PSP, o arguido ainda tentou fugir a pé, vindo a ser detido alguns metros à frente.
5. – O arguido transportava com ele os produtos descritos em 2.2, que eram destinados a consumidores finais.

Caso II
6. – No dia 05 de Agosto de 2005, cerca das 00,05 horas, no entroncamento formado pela Rua Costa Cabral com a Rua da Igreja da Areosa, no Porto, o arguido BB foi abordado por uma patrulha da PSP, e, na sua posse, acondicionado no bolso direito das calças, foi encontrado um produto vegetal prensado que veio a revelar-se Canabis (Resina), com o peso líquido de 50,012 gramas.
7. – O arguido era consumidor de Canabis e destinava o produto que possuía em parte, não apurada, para seu consumo, e, a outra parte, para ceder a um amigo.
8. – Na sua posse, o mesmo arguido tinha ainda um aparelho de telemóvel marca Nokia, modelo 6600, com o IMEI 355683/00/898498/5.

Caso III
9. – No dia 14 de Setembro de 2005, cerca das 22 horas, os arguidos AA e BB dirigiram-se a uma mata localizada no lado esquerdo da Avenida Arquitecto Valentim Oliveira, atento o sentido descendente, em ..., Gondomar, tendo ingressado nela através de um caminho agrícola que foram percorrendo.
10. – A certa altura, pararam numa zona desse caminho onde não existe qualquer iluminação, junto a dois buracos escavados na berma e tapados com vegetação.
11. – Nesses buracos estavam enterrados dois sacos de plástico, contendo, distribuídos por ambos, outros diversos sacos e um embrulho, dentro dos quais, por sua vez, se encontravam:
a) – Uma embalagem de plástico contendo um produto sólido que veio a revelar-se heroína, com o peso líquido de 248,730 gramas;
b) – Uma embalagem de plástico contendo um produto sólido que veio a revelar-se heroína, com o peso líquido de 99,170 gramas;
c) – Catorze embalagens de plástico contendo um produto sólido que veio a revelar-se cocaína, com o peso líquido total de 1.063,230 gramas;
d) – Catorze embalagens de plástico contendo um produto sólido que veio a revelar-se cocaína, com o peso líquido total de 879,320 gramas;
e) – Várias embalagens de plástico contendo um pó que veio a revelar-se procaína, com o peso bruto total de 6.242,85 gramas;
f) – Várias embalagens de plástico contendo um pó que veio a revelar-se fenacetina, com o peso bruto total de 5.212,05 gramas;
g) – Um pó que veio a revelar-se bicarbonato de sódio, com o peso bruto de 118,910 gramas;
h) – Uma balança de precisão.
12. – Então, servindo-se da luz dos aparelhos de telemóvel que cada um trazia, o AA desenterrou, com as mãos, o primeiro dos dois sacos plásticos supra referidos e entregou-o ao BB, que, por sua vez, o sacudiu da terra nele pegada e o pousou ao lado.
13. – Nesse momento, foram surpreendidos pelos agentes da PSP, que os detiveram e apreenderam todos os sacos e respectivo conteúdo.
14. – As substâncias referidas em 2.11, alíneas e), f) e g), eram destinadas à mistura com os demais produtos para obtenção de maior quantidade de estupefaciente (vulgarmente designado como “produto de corte).
15. – A balança era destinada à pesagem dos restantes produtos.
16 – Os arguidos detinham a balança e os produtos referidos em 2.11, sendo estes destinados à distribuição por consumidores finais.
17 – Ambos os arguidos, nos três casos, agiram livre, voluntária e conscientemente, conhecendo bem as características estupefacientes e demais finalidades dos produtos que, do modo descrito, detinham, e bem sabendo que, para tal detenção, não estavam autorizados e que, por tudo isso, a sua conduta era ilícita e penalmente punível, tendo, ainda, no caso III, actuado em comunhão de vontades e de esforços.
18. – No Caso I, o arguido AA foi detido no dia 8/3/2005, sujeito a primeiro interrogatório judicial e nesse dia posto em liberdade.
19. – No Caso II, o arguido BB foi detido no dia 5/8/2005, sujeito a primeiro interrogatório judicial e nesse dia posto em liberdade.
20. – No caso III, os arguidos foram detidos em 14/09/2005, sujeitos a primeiro interrogatório judicial no dia 15 seguinte e, desde então, encontram-se em prisão preventiva à ordem destes autos.
21. – Do CRC do arguido BB consta que:
Por Sentença de 10/12/2003, proferida no Processo Sumário 829/03.8SLPRT, da 1ª. Secção do TPIC, Porto, por crime de condução sem habilitação legal, cometido em 9/12/2003, foi condenado em pena de 70 dias de multa que pagou.
22. – Do CRC do arguido AA consta que:
Por Sentença de 09/12/2002, proferida no Processo Sumário 384/02.6PQPRT, da 3ª. Secção do TPIC, Porto, por crime de condução sem habilitação legal, cometido em 17/05/2002, foi condenado em pena de 60 dias de multa que pagou.
23. – O arguido AA tem 3 irmãos, tendo o seu processo de crescimento decorrido com os pais e, depois, porque ambos foram condenados a penas de prisão, com os avós. O seu percurso escolar foi marcado por desinteresse e falta de assiduidade, tendo sido institucionalizado aos 13/14 anos no Centro Educativo de Santo António, aí registando fugas. Fez trabalhos durante algum tempo como servente de construção civil, numa fábrica e num bar. Consumiu haxixe. Antes de preso, vivia com a avó, estando a mãe em liberdade condicional. No EP frequenta a escola.
24. – O arguido BB é de origem familiar de reduzidos recursos sócio-económicos e desenvolveu-se em ambiente de conflitualidade decorrente de hábitos alcoólicos do progenitor com episódios de violência doméstica. Vivia com os pais, uma irmã e seu companheiro e dois filhos do casal. Ninguém auferia rendimentos, a não ser uma reforma do progenitor e o rendimento social de inserção. Esteve institucionalizado em diversos Centros Educativos. Aí fez o 4º. Ano de escolaridade, apesar de problemas internos e de ausências ilegítimas. Consumiu haxixe e cocaína. No EP frequenta o 6º.ano de escolaridade.

FACTOS NÃO PROVADOS DA ACUSAÇÃO:
Dos factos (artº. 283º., nº. 3, alínea b), CPP) com interesse para boa decisão da causa nada mais se provou, designadamente:
-Que, no caso I, o arguido tomou o táxi no Bairro S. João de Deus.
-Que, no caso I, o dito saco e respectivo conteúdo haviam sido entregues ao arguido, momentos antes, no Bairro S. João de Deus, para que os entregasse a um indivíduo cuja identidade não foi possível apurar, a troco de uma compensação cuja espécie ou valor não se provou.
-Que, em tal caso, fosse pela terceira vez que o arguido AA aceitava transportar produtos congéneres.
-Que, no caso II, o arguido BB destinasse o produto à venda.
-Que destinasse o telemóvel que nesse caso lhe foi apreendido a contactar e a ser contactado por indivíduos que o procuravam para adquirir aquele tipo de produto.
-Que, no caso III, o AA tenha desenterrado “vários sacos de plástico que sucessivamente entregou ao BB”.
-Que este os conferiu sumariamente, ao mesmo tempo que olhava em redor para se assegurar de que não eram surpreendidos por terceiros naquela operação.
-Que “os arguidos preparavam-se para entregar aqueles produtos a um ou mais destinatários, cujas identidades não se lograram apurar”.
-Que “em troca desse serviço, cada um dos arguidos, recebeu, também de pessoa não identificada, uma quantia em dinheiro não concretamente determinada”.
-Qual o concreto motivo, propósito ou finalidade com que os arguidos, no último caso, detinham os produtos.

A matéria de facto não apresenta nenhum dos vícios de que cumpra oficiosamente conhecer, pelo que se tem por definitivamente fixada.

Os factos revelam a prática, por cada um dos recorrentes, isoladamente, de acto enquadrável no tatbestand do art. 21º do Decreto-Lei n.º 15/93, e de um outro praticado pelos dois recorrentes, em co-autoria. Todas estas situações foram presenciadas pela polícia, que deteve os arguidos, em flagrante delito, tendo sido sujeitos a interrogatório judicial.
O crime de tráfico de estupefacientes vem sendo considerado pela jurisprudência como um crime de trato sucessivo, desse modo se unificando o conjunto das múltiplas acções praticadas pelo agente, do mesmo modo que é concebido como um crime exaurido, isto é, aquele em que para a incriminação do agente é suficiente a prática de um qualquer acto de execução, independentemente de corresponder à execução completa do facto.
Todavia, conforme acentua o Ministério Público nas suas alegações, no caso em apreço não pode deixar de ser valorada a circunstância de os arguidos terem sido detidos e sujeitos a interrogatório judicial, no sentido de “uma forçosa tomada de consciência da ilicitude e censurabilidade da actividade por si desenvolvida”, o que tem como consequência o afastamento da unificação da conduta.
Deste modo, a qualificação jurídico-criminal dos factos levada a efeito na decisão recorrida não é merecedora de reparo, quer quando qualifica os factos como integradores do crime do art. 21º do Decreto-Lei n.º 15/93, quer quando considera que a conduta praticada pelo recorrente BB, em 5 de Agosto de 2005 (caso II), como um crime de tráfico de menor gravidade, na previsão do art. 25º do mesmo diploma legal.

Será, pois, tendo em consideração as molduras penais abstractas dos dois referidos tipos legais de crime que haverá que apreciar o modo como as penas foram fixadas.
Para tanto haveremos de recordar, ainda que de modo breve, as finalidades das penas e os critérios para a sua fixação concreta.
As penas têm como finalidade primordial a prevenção, entendida como prevenção geral positiva ou de integração, isto é, de reforço da consciência jurídica comunitária e do seu sentimento de segurança face à violação da norma e como prevenção especial de socialização do delinquente.
O limite mínimo da pena é determinado pelas razões de prevenção geral que no caso se façam sentir; o limite máximo pela culpa do agente revelada no facto; e razões de prevenção especial servem para encontrar, dentro daqueles limites, o quantum de pena a aplicar (Cfr. Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal Português, II - As Consequências Jurídicas do Crime, págs. 227 e ss).
Ao fixar os princípios que o julgador deve ter em conta na aplicação da pena, o Código Penal, no art. 71º, começa por estatuir, no n.º 1, que a pena concreta deve ser fixada em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, sendo certo que, em caso algum, pode ser excedida a medida da culpa, de acordo com o princípio da inviolabilidade da dignidade pessoal. (art 40 nº 2 C.P.). E, no nº 2, quanto ao doseamento da pena, afirma-se que hão-de ser observados os critérios constantes do art. 71º nº 2 do Código Penal, designadamente: o grau de ilicitude do facto; o dolo do arguido; as condições pessoais, nomeadamente a imputabilidade diminuída; a situação económica do arguido; o arrependimento demonstrado pelo arguido; e a ausência de antecedentes criminais.

No caso I, o recorrente AA, quando, cerca da 1,30, viajava de táxi em direcção à Rotunda a Igreja matriz em Rio Tinto, ao verificar que estava a ser seguido por uma viatura da Policia de Segurança Pública lançou pela janela do veículo, um saco que continha, em diversos sacos plásticos, um total de 23,683 gr. de heroína, 604.093 gr. de cocaína e 94,140 gr. de canabis (resina), além de 60 comprimidos de Piracetam, vulgarmente utilizados como “produto de corte”. Deu-se como provado que o arguido transportava aquelas substâncias que eram destinadas a consumidores finais.
Face a esta factualidade, a decisão recorrida justificou do seguinte modo a a medida da pena, que graduou em 5 anos de prisão:
No primeiro caso, o grau de censura ético-jurídica merecida pelo arguido AA eleva-se visivelmente acima do patamar mais baixo da moldura.
É certo que ele é um jovem desafortunado, então com 21 anos apenas, de origem modesta e com condições de vida precárias, em que avulta a condenação de ambos os progenitores a penas de prisão e o seu percurso escolar negativamente marcado e que levou à institucionalização em Centro Educativo.
Não é menos verdade que já sofreu, em 2002, uma condenação em pena de multa, mas por crime que, sobretudo em termos relativos, não tem grande significado quanto ao seu modo de estar na vida e de encarar os valores e regras sociais fundamentais.
Mas, apesar de, dentro dos diversos segmentos típicos, a sua actividade se ter confinado àquele em que a relação de ilicitude é menos intensa, não podia deixar de conhecer bem a gravidade da sua conduta, pelos efeitos terríveis que ela consequência, nem pode queixar-se de falta de apoio e de oportunidades. Chegou a ter trabalho, tinha apoio dos avós, foi institucionalizado mas, mesmo assim, enveredou pela prática de um crime cuja severa punição é geralmente conhecida e que, precisamente por isso, motiva engenhosos esquemas para os seus agentes se furtarem ao controlo das autoridades.
Aliás, o facto de logo ter atirado o saco quando pressentiu a presença da Polícia é bem elucidativo de tal consciência.
No entanto, propôs-se logo transportar consigo uma pouco vulgar quantidade de cocaína (mais de 600 gramas) e uma porção importante de heroína (mais de 23 gramas), sabendo que tais produtos são dos mais perigosos, além de cerca de 94 gramas de Canabis.
Deixou-se seduzir pelo fascínio que a detenção destes produtos e actividades a eles associadas e respectivos benefícios podem proporcionar, sobretudo quando com a actividade já de si ilícita concorre a da adulteração do estupefaciente aumentando ainda mais a sua perigosidade para a saúde dos consumidores.
Apesar da evidência dos factos, não mostrou em relação a eles qualquer sinal de auto-censura, arrependimento ou de disposição em mudar de vida.
As necessidades de prevenção especial são fortes, na medida em que muito importantes os valores jurídico-penais postos em causa e para cujo respeito é necessário reorientá-lo e atendendo a que o apelo do “tráfico” é de muito difícil resistência.
As de prevenção geral não precisam de ser aqui encarecidas.
A ilicitude, traduzida na relação de contrariedade ou indiferença perante o dever-ser jurídico-penal, releva, sobretudo, do tipo de acção praticada e da quantidade e espécie de droga detida.

O Ministério Público, nas alegações, defende que a pena deve ser reduzida para 4 anos e 6 meses.
Todavia, a mesma não parece desproporcionada nem à ilicitude dos factos, nem à culpa do arguido.
Ora, conforme tem afirmado o Supremo Tribunal de Justiça seguindo os ensinamentos do Prof. Figueiredo Dias (Direito Penal Português, II - As Consequências Jurídicas do Crime, págs. 197), “no recurso de revista, pode sindicar-se a decisão de determinação da medida da pena, quer quanto à correcção das operações de determinação ou do procedimento, à indicação dos factores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis, à falta de indicação de factores relevantes, ao desconhecimento pelo tribunal ou à errada aplicação dos princípios gerais de determinação, quer quanto à questão do limite da moldura da culpa, bem como a forma de actuação dos fins das penas no quadro da prevenção, mas já não a determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exacto da pena, salvo perante a violação das regras da experiência, ou a sua desproporção da quantificação efectuada”, o que não sucede quanto à pena aplicada ao caso 1.

Relativamente ao caso 3, considerou o tribunal que a conduta dos arguidos merece pesada censura.
Na verdade, não obstante e para além de tudo quanto a respeito de cada um se disse a propósito dos crimes anteriores individualmente praticados, a verdade é que meio ano depois de um ter sido surpreendido com quantidade importante de droga (o AA) e pouco mais de um mês depois de o outro (BB) ter sido interceptado também possuindo haxixe, resolveram, agindo em co-autoria, de noite, nas circunstâncias descritas e cuja arquitectura aponta para esquema bem pensado e delineado, atentar, de forma muito ostensiva, contra os mesmos bens jurídico-penais.
A quantidade e qualidade da droga por eles detida não representa apenas uma repetição da conduta anterior nem mera indiferença reiterada aos valores postos em causa, mas antes uma afronta atrevida, um desafio ostensivo às normas e valores comunitários claramente desprezados.
O grau de culpa é, pois, muito elevado, maior o do AA por já antes ter cometido factos idênticos graves.
Em face da atitude descrita, as necessidades preventivas surgem claramente mais exigentes, na medida em que a personalidade e comportamento dos arguidos não dá deles uma imagem de permeabilidade aos bens jurídicos (pelo contrário) nem os mostra virados para qualquer readaptação. É ver, aliás, a sua postura perante os factos, em que tentam “tapar o sol com uma peneira” e de que só o BB, no final da audiência, balbuciou um tímido e pouco convincente pedido de “oportunidade” e promessa de que “não volta a cair”.
Perante casos como este, as necessidades de prevenção geral têm de ser também exemplarmente reforçadas.
A ilicitude do caso, traduzida na quantidade e qualidade da droga, nas misturas que seriam feitas e a que se destinavam os demais produtos encontrados e no fatal atingimento de imensa população consumidora, é das mais elevadas.
O dolo, reflectido na acção e atenta a sua modalidade, é muito intenso.
Considera-se, porém, mais censurável a conduta, neste caso, do arguido CC, dado o nível já atingido pela anterior e a que não se confinou.
Por isso, aplicou a pena de 7 anos de prisão.
Defende o Ministério Público neste Supremo Tribunal a redução da pena para 6 anos de prisão.
Para se aquilatar da proporcionalidade desta pena, quer à ilicitude dos factos, quer à culpa do(s) agente(s), importa ter em atenção alguns aspectos que o tribunal indicou, neste âmbito, como fundamento da matéria de facto:
É, … não obstante isso, incontornável (apesar de nada mais se ter apurado) que os arguidos se encontravam na detenção dos sacos, condição que resulta do facto de eles saberem, e saberem bem, onde os mesmos se encontravam (tendo, por isso, acesso aos mesmos e estando colocados na posição de lhes darem o destino que entendessem), de estarem a tratar de os desenterrar e levar (já que era o mínimo esperável da sua conduta, em face das regras da experiência). Naturalmente que tamanhas quantidades de estupefaciente (347,900 gramas de heroína e 1942,55 gramas de cocaína, que, sem contar com a “mistura” dava para dezenas de milhares de doses e valiam uma “fortuna”) nada tinham a ver com hipotético consumo pessoal (os arguidos, aliás, só admitiram o de haxixe) nem parecem tê-lo também com as suas capacidades económicas, muito embora fatalmente se destinassem à distribuição por muitos consumidores finais.
Do destino das demais substâncias (de “corte”) e da balança também não há qualquer dúvida, face ao que disseram as testemunhas e é das regras da experiência, o que bem revela o nível do “tráfico” em causa e, portanto, da intervenção dos arguidos e seu relevo, ainda que, como se referiu, não se tenham demonstrado outros factos ou conexões além ou aquém do pressuposto acesso que inevitavelmente tiveram aos produtos, da entrada destes na sua esfera de disponibilidade fáctica e do domínio que sobre os mesmos assumiram e se propunham exercitar. Embora, portanto, o âmbito dos seus propósitos não resultasse provado com a amplitude referida na acusação (que, por um lado, apontava para um transporte por conta de outrem mediante recebimento de uma compensação monetária), também não se pode concluir com segurança (como, por outro, contraditoriamente, faz a acusação ao dizer que “actuaram … com o propósito conseguido de deterem”) que a tal detenção se limitava o seu desígnio, pois que esta tinha por trás uma razão, contudo não apurada. Apesar disso, a consciência e vontade de com o produto se relacionarem pelo menos nos termos dados como provados e de que este era para ser distribuído por consumidores finais é inquestionável. Aliás, é em tal distribuição que a mistura com os produtos de “corte” ganha razão de ser e utilidade económica, embora com grandes riscos para eles.
De resto, as condições de vida dos arguidos, os episódios anteriores (casos I e II) e outras referências a propósito deles narradas pelos agentes da PSP a respeito do “tráfico”, conjugadas com as evidências por estes relatadas sobre as circunstâncias da intercepção, deitam por terra os argumentos (já de si muito pouco consistentes) dos arguidos, designadamente que no início pensavam que estavam a ser assaltados, que nem viram a droga, que os agentes é que surgiram com os sacos pela mão. Ao invés, a sua manifestação de alívio na altura espontaneamente deixada escapar e que os agentes notaram aponta para envolvimento e dependência, quiçá medo, da actividade organizada em que se inseriam, mas cujos contornos objectivos e subjectivos não se lograram descortinar, além do mais porque eles próprios (escudando-se no seu legítimo silêncio) os escondem.
Do trecho acabado de transcrever é lícito concluir que o tribunal inferiu, dos diversos elementos de prova perante si produzidos, que os arguidos, então com 21 anos, agiam integrados num grupo de que se desconhecem outros elementos, desempenhando o papel de detentores/transportadores, com risco elevado de serem descobertos e, consequentemente, sancionados.
Tal circunstancialismo, a que o tribunal da condenação chegou, não pode deixar de ter consequências na medida da pena. Sendo embora elementos de confiança dos eventuais donos da droga, já que tinham acesso à mesma, eles são meros detentores, conforme foi dado como provado. Por outro lado, é de relevar também a respectiva idade. Também não pode ser indiferente que o recorrente AA integra uma fratria de 3 irmãos, cujos progenitores foram condenados por crime de tráfico de estupefacientes, tendo, pois, sido criado num meio e num bairro onde o tráfico de droga constitui actividade económica por excelência.
Daí que haja que fazer reflectir na medida da pena todo este circunstancialismo, o que leva a que a reduzir a pena para 6 anos de prisão, conforme sugere o Ministério Público.

Condenado a duas penas de prisão, deve ser feito o cúmulo entre elas, fixando-se uma pena única, na qual, nos termos do disposto no art. 77º nº 1 do Código Penal, devem ser considerados, em conjunto, aos factos e a personalidade do agente.
A pena tem como limite máximo a soma das penas aplicadas – 11 anos – e como mínimo, a mais elevada das penas concretamente aplicadas – 6 anos.
Conforme acima se referiu, a conduta do recorrente, que consistiu na prática de dois actos de tráfico, só não foi unificada dada a circunstância de o recorrente, após o primeiro caso, ter sido detido e sujeito a interrogatório judicial, o qual devia ter causado nele uma maior consciência da ilicitude da sua conduta. Mas esse circunstancialismo deve ser tomado em consideração na fixação da pena única, que por isso se deve aproximar bastante mais do respectivo limite mínimo, do que o fez a decisão recorrida. Por isso, se fixa esta pena em 7 anos de prisão e 6 meses de prisão.

Recurso do arguido BB
O recorrente, que foi co-autor com o arguido AA na prática do caso III, foi condenado como autor de um crime de tráfico de menor gravidade, do art. 25º do Decreto-Lei n.º 15/93, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão, por, em 5 de Agosto de 2005, ter sido encontrado, por uma patrulha da Policia de Segurança Pública, na posse de canabis (resina) com o peso líquido de 50,012 gramas, sendo consumidor de tal produto que destinava em parte para seu consumo, em parte para ceder a um amigo.
O Ministério Público entende, quanto a este facto, que deveria ser aplicada uma pena de prisão de 1 ano, ou seja, defende que lhe deve ser aplicado o mínimo da pena.
Todavia, a pena que foi fixada pela decisão recorrida é proporcional à ilicitude da conduta e à culpa do agente. Nos crimes do art. 25º do Decreto-Lei n.º 15/93, a ilicitude está consideravelmente diminuída em relação ao crime-base do art. 21º. Mas, dentro do tipo legal de crime de tráfico de menor gravidade, há uma gradação da ilicitude à qual se torna necessário atender na fixação da medida da pena dentro da moldura penal abstracta do art. 25º - prisão de 1 a 5 anos.
Da matéria provada resulta que o arguido detinha 50,012 gramas de canabis (resina), o que excede, em muito, a dose média individual para 10 dias. Acresce que a detenção pelo arguido do estupefaciente se destinava em parte para consumo próprio, em parte para ceder a um amigo, sendo certo que a detenção para cedência é, indubitavelmente, um acto de tráfico.
Ao sancionar com uma pena de 1 ano e 6 meses de prisão o recorrente pela prática destes factos, o tribunal aplicou uma pena que é proporcional à ilicitude do facto e à culpa do agente, não havendo razões para proceder à sua alteração.

Relativamente ao caso 3, que ficou acima referido, o tribunal fixou ao recorrente BB a pena em 6 anos de prisão, pena mais branda do que a aplicada ao arguido AA, em virtude de, conforme acima se aludiu, o grau de culpa deste último arguido ser maior por já ter praticado factos idênticos graves. De facto, os autos não revelam que o recorrente BB, para além da situação em que é co-autor do AA, tenha levado à prática qualquer actividade de detenção ou transporte de drogas duras. É merecedora de concordância a decisão recorrida quando fez reflectir na medida das penas o menor grau de culpa do recorrente. Por consequência, diminui-se a pena que foi aplicada em 1ª instância ao arguido BB para 5 anos e 6 meses de prisão.
Havendo que proceder ao cúmulo das duas penas, a pena única, que deverá atender à globalidade dos factos e à personalidade do agente, terá de ser fixada dentro duma moldura penal que tem, como mínimo, 5 anos e 6 meses de prisão e, como máximo a soma das penas, ou seja, 7 anos prisão.
O recorrente BB é de origem familiar de reduzidos recurso sócio-económicos, tendo-se desenvolvido num ambiente de conflitualidade decorrente de hábitos alcoólicos do progenitor, com episódios de violência doméstica. Consumiu haxixe e cocaína. Como antecedentes criminais, tem uma condenação por crime de condução sem habilitação legal, tendo sido condenado em multa, que pagou.
Atendendo à globalidade do facto e à personalidade do arguido, fazendo reflectir na pena única a atenuação de que beneficiou numa das penas parcelares, fixa-se a pena única em 6 anos de prisão.

Termos em que acordam no Supremo Tribunal de Justiça em julgar parcialmente procedente o recurso interposto pelos arguidos e assim:
- em alterar a pena aplicada ao arguido AA no caso 3, qualificado como crime de tráfico de estupefacientes do art. 21º do Decreto-Lei n.º 15/93, reduzindo-a para 6 anos de prisão, e, consequentemente, reduzir também a pena única para 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de prisão;
- de igual modo, em alterar a pena aplicada por esses mesmos factos ao arguido BB para 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão e fixar a pena única em 6 (seis) anos de prisão,
- em manter no mais a decisão recorrida.
Custas pelos arguidos, com taxa de justiça que se fixa em 4 UC para cada um.

Lisboa, 8 de Fevereiro de 2007

Arménio Sottomayor (relator)

Carmona da Mota

Reino Pires