Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
02B011
Nº Convencional: JSTJ00000168
Relator: QUIRINO SOARES
Descritores: SEGURO AUTOMÓVEL
SUSPENSÃO DO CONTRATO
CARTA REGISTADA COM AVISO DE RECEPÇÃO
FORMALIDADES AD SUBSTANTIAM
FORMALIDADES AD PROBATIONEM
Nº do Documento: SJ200203190000117
Data do Acordão: 03/19/2002
Votação: MAIORIA COM 1 DEC VOT E 2 VOT VENC
Tribunal Recurso: T REL COIMBRA
Processo no Tribunal Recurso: 368/01
Data: 06/26/2001
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Decisão: CONCEDIDA A REVISTA.
Área Temática: DIR CIV - TEORIA GERAL.
Legislação Nacional: DL 162/84 DE 1984/05/18 ARTIGO 5 N1 N3.
CCIV66 ARTIGO 224 N1 ARTIGO 294 N2 ARTIGO 364 N2.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO STJ PROC80834 DE 1992/02/13.
ACÓRDÃO STJ DE 1999/04/20 IN BMJ N486 PAG287.
ACÓRDÃO STJ DE 1995/02/09 IN CJSTJ ANOIII TI PAG77.
ACÓRDÃO STJ PROC1205/99 2SEC DE 2000/03/09.
Sumário : I - A carta registada, sem aviso de recepção, na qual se informava sobre a suspensão da garantia, é um meio válido de realizar a comunicação prescrita no n. 1, do artigo 5 do DL n. 162/84, de 18 de Maio.
II - O aviso de recepção, é uma formalidade "ad substantiam", insubstituível, por outro meio de prova, ou por outro documento que não seja de força probatória superior, ao abrigo do artigo 364, n. 1, do C.C.
III - A entender-se que é formalidade ad probationem, a carta registada é meio válido para efectuar a comunicação mas a prova da recepção ou é feita através do aviso de recepção ou nos termos do art. 364 n. 2 CC.
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

1. Com fundamento no art. 19, e, DL 522/85, de 31/12, a Companhia de Seguros A, demandou B, Ldª, para reembolso do que pagara no âmbito de um contrato de seguro de responsabilidade civil cujos efeitos se encontravam suspensos, nos termos do art. 5, DL 162/84, de 18/5, por causa de a ré não ter pago em tempo o prémio respectivo.
A ré contestou, alegando que a autora pagou mal, visto que a culpa do evento danoso foi do terceiro, e que a garantia se não encontrava suspensa, visto que não recebera, da parte da autora, a comunicação a que se reporta o n. 1, do art. 5, do citado DL;
deduziu, ainda, reconvenção, na que pediu a condenação da seguradora a lhe pagar, a título de danos próprios, cuja cobertura também fora abrangida, o valor da reparação do seu veículo e o lucro cessante derivado da paralização do mesmo, enquanto era reparado.
Na 1ª instância, a acção foi julgada improcedente, mas a reconvenção procedeu em parte.
A Relação de Coimbra, em apelação da autora, revogou a sentença, dando total ganho de causa àquela, com base no entendimento, contrário ao da 1ª instância, de que a garantia se encontrava suspensa à data em que ocorreu o sinistro, visto que a comunicação sobre a suspensão fora efectiva e validamente realizada.
A ré pede, agora, revista, insistindo em que não está feita a prova de que recebera a comunicação, prova que, aliás, nem poderia ser feita, uma vez que o pertinente facto não foi alegado pela parte a quem interessa (a autora).
2. A Relacão de Coimbra, no âmbito dos seus poderes-deveres de 2ª instância em matéria de facto, deu como provado o seguinte:
· a Ré B, Ldª, realizou com a autora, Companhia de Seguros A, um contrato pelo qual segurou a sua responsabilidade civil por danos causados a terceiros pelo veículo SB, e, também, os danos sofridos por tal veículo, até ao montante de 14040000 escudos, nos termos da apólice n° 9280528, junta a fls. 10;
· no dia 8 de Maio de 1991, ocorreu um acidente de viação que consistiu na colisão do auto-pesado SB com o auto-pesado NQ e a galera que este rebocava L;
o SB, era propriedade da ré e era conduzido, na altura, pelo motorista ....
. o NQ e o L, eram propriedade de X e conduzidos pelo motorista .... ;
no referido dia 8 de Maio de 1991, cerca da 1 hora da manhã, o NQ, a que seguia atrelada a galera L, circulava pelo IP5, no sentido Viseu - Vilar Formoso;
· próximo do local onde se situa o cruzamento de Celorico da Beira, o IP5 desenvolve-se em recta e em subida acentuada, considerando o sentido referido;
· e a faixa de rodagem é composta por duas semi-faixas no sentido ascendente e de uma semi-faixa no sentido descendente;
· o NQ circulava pela semi-faixa junto à berma do lado direito, considerando o sentido aludido, a cerca de 40 Km/hora;
· quando o NQ se encontrava a meio da subida, surgiu, à sua retaguarda, e no mesmo sentido, o auto-pesado SB, que circulava também pela semi-faixa referida, e que foi colidir com a parte da frente na parte traseira da galera L;
· da colisão, resultaram danos na galera L, designadamente na retaguarda desta, cuja reparação foi estimada em 920000 escudos;
· o auto-pesado NQ sofreu também diversos danos, designadamente na caixa da carga e na cabine, que foram orçamentadas pelo Auto - Munique de Viseu em 215929 escudos;
· a carga transportada pelo NQ era composta de 8200 tijolos, dos quais 1600 ficaram danificados, o que se traduziu num prejuízo de 50560 escudos;
· o reboque para a oficina da galera L, importou em 30860 escudos;
· e a remoção do mesmo reboque e da carga por forma a que pudessem ser retirados do local do acidente importou em 65910 escudos;
· o veículo NQ sofreu, para reparação, uma imobilização de cinco dias, e o correspondente prejuízo foi contabilizado à razão de 11334 escudos diários;
· foi, ainda, despendida, em quatro cintas de amarro de carga, a quantia de 26000 escudos;
· a autora pagou directamente à oficina que realizou a reparação o montante orçamentado;
· o valor correspondente aos restantes danos pagou-o a autora directamente ao proprietário do NQ e da galera L;
· a ré solicitou à autora a peritagem ao veículo SB, vindo esta a proceder a uma vistoria condicional de tal veículo;
· a ré não pagou o prémio referente à anuidade que decorria entre 11 de Janeiro de 1991 e 10 de Janeiro de 1992, até 8 de Maio de 1991, não obstante para tal ter sido avisada;
· tal prémio só foi pago em 9 de Maio de 1991;
· na ocasião do acidente, o NQ, circulava com luzes acesas e a trás, quer no NQ quer na galera L, e o veículo SB, circulava a mais de 70 -Km/hora;
· com a colisão, o veículo SB projectou a galera do NQ para a berma do lado direito, atendendo ao sentido em que seguiam;
· enquanto o NQ ficou mobilizado na faixa de rodagem, a respectiva galera imobilizou-se na berma referida;
· em virtude da colisão, o SB sofreu destruição completa da cabine, tendo ficado com os vidros e os espelhos partidos, a pintura danificada, os faróis e farolins partidos, o tacógrafo destruído, a caixa de velocidades avariada, de tal forma que a reparação obriga à substituição das peças constantes do orçamento de fls. 67/70, efectuado por Cimpomóvel;
· o SB, esteve imobilizado desde 8 de Maio de 1991 até finais de Dezembro de 1992;
· um veículo tractor como o SB dá um lucro líquido mensal à Ré de 150000 escudos;
· em 27.3.91, a autora enviou à ré o documento junto a fls.11, por meio de carta registada.
3. Como se vê, a ré, ora recorrente, deixou cair a parte da sua defesa que assentava na culpa do terceiro. Provou-se claramente que o exclusivo culpado do acidente foi o condutor do veiculo da ré, seu funcionário.
O recurso, tal como na Relação, suscita dois problemas fundamentais que são:
- saber se a carta registada, sem aviso de recepção, que a autora enviou à ré, em 27.3.91, na que informava sobre a suspensão da garantia, é um meio válido de realizar a comunicação prescrita no n. 1, do art. 5, DL 162/84, de 18/5;
- (caso se entenda que constitui meio válido) saber se a carta foi efectivamente recebida pela destinatária, no que está envolvida a subquestão de saber se o aviso de recepção, enquanto prova da entrega da carta, pode ser substituído por outro meio de prova.
Antes de tudo, deve dizer-se que o regime jurídico a considerar é, com efeito, o instituído pelo DL 162/84, por ser o vigente à data em que os factos ocorreram.
Sobre aquele DL já caiu o DL 105/94, de 23/4, e, sobre este último, o DL 142/00, de 15/7, mas é o primeiro que, aqui, importa considerar, visto o disposto no art. 12, n. 1, CC (1) Código Civil.
O citado n. 1, do art. 5, daquele DL, determina que, na falta de pagamento do prémio na data indicada no aviso de pagamento, o tomador do seguro constitui-se em mora, e, decorridos 45 dias sobre aquela data (a indicada no aviso), a garantia fica suspensa, mediante comunicação da seguradora ao tomador, através de carta registada com aviso de recepção, a expedir dentro dos 30 dias imediatos ao final daquele prazo de 45 dias.
Não se discute que, à data do acidente, ocorrido em 8.5.91, a ré se encontrava em mora do pagamento do prémio correspondente à anuidade de 11 de Janeiro de 1991 a 10 de Janeiro de 1992, nem se discute, também, que foi oportunamente avisada para o pagamento.
Também é incontroverso que a seguradora, em 27 de Março de 1991, isto é, dentro dos 30 dias que se sucederam aos primeiros 45 dias de mora, como manda o citado artigo de lei, enviou à ré uma carta registada em que lhe comunicava a suspensão da garantia, citando o n. 1, do art. 5, DL 162/84 de 18/5.
Os problemas põem-se, como se disse, a propósito da recepção da carta.
É claro que a suspensão da garantia não se basta com a expedição da carta, sendo, indispensável a recepção pelo destinatário. Sem recepção não existe comunicação.
A comunicação prescrita naquela disposição legal é o que, em teoria jurídica, se designa por declaração unilateral receptícia.
E, naturalmente, a comunicação, feita nos termos e prazo prescritos no citado n. 1, do art. 5, DL 162/84, é facto constitutivo do direito invocado pela autora, e, por isso mesmo, seu ónus probatório (art. 342, n. 1, CC).
Ora, a este propósito, a recorrente argumenta assim:
a autora não alegou que a ré recebeu a carta, e, por isso, não poderá fazer prova de tal facto;
a carta foi registada, mas sem aviso de recepção, e, por isso, não pode valer como meio de comunicação, nos termos e para os efeitos daquele n. 1, do art. 5, DL 162/84.
O primeiro argumento já foi proficientemente contrariado no acórdão da Relação que mandou ampliar a matéria de facto. Aí, com recurso aos documentos que instruíram a petição inicial, foi entendido, e definitivamente entendido, que a autora alegou que efectuou a comunicação, através da carta-aviso cuja cópia juntou a fls. 11-13, e comunicação, para ser perfeita, compreende, obviamente, a recepção da mensagem.
Foi com este sentido inteiro que a Relação compreendeu o articulado da autora.
O segundo argumento tem, como pressuposto, a afirmação do carácter insubstituível do aviso de recepção, como prova da recepção da carta; o aviso de recepção constitui, na perspectiva da recorrente, uma formalidade ad substantiam da declaração unilateral receptícia que constitui a comunicação da seguradora sobre a suspensão da garantia.
Este Supremo Tribunal já decidiu, noutras ocasiões, (2) Acs. STJ, de 9.3.00, na Revista n. 1205/99, da 2ª secção, e de 20.4.99, in BMJ 486, pag.287, que o aviso de recepção é mera formalidade ad probationem, visto que a sua evidente função, no sistema montado pelo DL 162/84, é apenas a de tornar segura a prova sobre o recebimento da carta registada, evitando disputas sobre um elemento tão delicado e tão volátil.
A ser o aviso de recepção uma formalidade meramente ad probationem, uma exigência do legislador para a prova, não para a validade, da comunicação a que se reporta o citado art. 5, n. 1, DL 162/84, a carta registada simples será meio válido de efectuar a mesma comunicação, mas a prova de que a carta foi recebida, e de que a comunicação foi realizada, só poderá, então, ser feita ou através do aviso de recepção, devidamente assinado, ou, nos termos do n. 2, do art. 364, CC, por meio de "confissão expressa judicial ou extrajudicial, contanto que, neste último caso, a confissão conste de documento de igual ou superior valor probatório".
E é precisamente aqui que, nesta perspectiva das coisas, a recorrida encontra um obstáculo sério, e, pelo contrário, a recorrente um poderoso aliado.
É que, ainda que se valorizasse como confissão o silêncio da ré perante os documentos que acompanharam a petição inicial em suporte da alegação de que a garantia fora suspensa, isto na lógica decorrência do valor alegatório antes atribuído àquela simples junção do duplicado da carta e da fotocópia do registo, ainda assim não sairia reforçada a posição processual da autora, uma vez que o n. 2, do art. 364, CC, exige uma confissão judicial expressa, que poderá ser tudo menos a confissão ou simples admissão, a que se reporta o art. 490, CPC, a confissão ou admissão por efeito de não impugnação, à qual cabe, antes, o qualificativo de confissão tácita, ou até mais propriamente confissão ficta.
O acórdão impugnado não resistiu à força apelativa do documento (carta) encontrado nas pastas de correspondência da ré pelos peritos que procederam ao exame à escrita.
Entendeu, na linha do precedentemente citado acórdão deste Supremo tribunal, que o aviso de recepção constituía formalidade ad probationem, mas parece ter esquecido a natureza, as finalidades e as condicionantes deste tipo de prova, pois não deu importância ao dispositivo do n. 2, do art. 364, CC, fazendo perigosamente resvalar uma solução legal de prova relativamente vinculada para uma outra de prova mais ou menos livre.
Impressiona, é certo, que o tribunal tenha de ficar indiferente a uma prova aparentemente tão segura de recepção da carta.
Antes, porém, de ceder à tentação de recorrer às válvulas de escape do sistema jurídico (e nem isso a Relação tentou) importa entrar bem fundo nas razões das normas, para ter a certeza de que, sob a aparente injustiça da aplicação concreta de determinada regra legal, se não escondem as mesmas razões substantivas que determinaram a sua formulação geral e abstracta.
Neste sentido, e sempre no pressuposto de que o aviso de recepção constitui formalidade ad probationem, deve ponderar-se que, além de prova predilecta do legislador sobre a recepção da carta, o aviso (assinado) funciona, igualmente, como ficção legal do estabelecimento da comunicação, isto é, do conhecimento pelo destinatário do conteúdo da carta.
A lei presume juris et de jure aquele conhecimento, a partir da assinatura do aviso de recepção, a exemplo do que, a propósito da eficácia da declaração negocial, o n. 1, do art. 224, CC, estabelece quanto ao momento em que aquela "chega ao poder" do declaratário.
Mas, em se tratando, como é o caso, de uma sociedade, mais exactamente, de uma sociedade comercial por quotas, o destinatário de actos que, como o dos autos, implicam modificações nas relações jurídicas da sociedade com o exterior só pode ser um dos gerentes, tendo em conta que só os gerentes representam a sociedade para efeito de recebimento, por esta, de "notificações ou declarações de terceiros" (cfr. arts. 252, n. 1, 260, n. 1, e 261, n. 3, CSC) (3) Código das Sociedades Comerciais).
Se se pensar, então, que o documento encontrado nas pastas de arquivo dos escritórios da ré não diz os passos que deu dentro da empresa até ser ali guardado, designadamente, se foi, ou não, presente a algum gerente, ou representante com poderes semelhantes, logo se entenderá que, mesmo no caso dos autos, só a confissão expressa estaria em condições substantivas de substituir o aviso de recepção, enquanto conhecimento ficto da comunicação efectuada pela seguradora.
Atribuir o mesmo valor à prova pericial, como foi feito no acórdão recorrido, equivaleria a consagrar, via jurisprudencial, uma nova ficção legal de conhecimento pelo destinatário da carta.
Tudo para concluir que a referida prova pericial não é substituto à altura do aviso de recepção, como prova daquela tomada de conhecimento, e que, por isso, mesmo considerando o aviso como simples formalidade ad probationem, a garantia do seguro se encontrava em vigor à data do acidente.
· As considerações precedentes levaram como ponto de partida, como se disse, a qualificação do aviso de recepção como formalidade ad probationem, na linha do entendimento seguido nos citados acórdãos deste Supremo Tribunal de Justiça, e também sufragado na decisão sob recurso.
Acontece que não é assim tão claro que aquela formalidade tenha sido exigida pelo legislador "apenas para prova da declaração" de recepção (cfr. primeira parte do citado n. 2, do art. 364, CC).
Com efeito, na sequência do n. 1, do art. 5, DL 162/84, onde se prescreve o aviso de recepção, logo o n. 3, do mesmo artigo, estabelece, como termo inicial do prazo de 15 dias findo o que a comunicação da suspensão da garantia produz efeitos, precisamente a data em que foi registado o aviso.
Sendo isso assim, é claro que, para além de prova privilegiada da recepção da carta registada, o aviso constitui elemento estrutural do complexo de actos e factos jurídicos com que o legislador de 1984 entendeu disciplinar o pagamento dos prémios de seguro e as consequências da sua mora e do seu incumprimento.
Com efeito, sem aviso de recepção, e respectivo registo, não há meio de determinar o dies a quo do prazo peremptório a que se reporta o n. 3, do art. 5, DL 162/84.
E isso só pode querer dizer que o aviso de recepção é, na economia e estrutura deste último diploma, uma formalidade ad substantiam (4) Alguma jurisprudência deste Supremo Tribunal, embora sem tratar a questão ex professo, parece partir do entendimento do carácter ad substantiam do aviso de recepção; é o caso do acórdão de 9.2.95, in CJSTJ (Colectânea de Jurisprudência dos acórdãos do STJ) Ano III, Tomo I, pag.77, e o de 13.02.92, in recurso n. 80834, da 2ª secção, insubstituível "por outro meio de prova ou por outro documento que não seja de força probatória superior" (n. 1, do art. 364, CC).
No esquema do DL 162/84, o aviso de recepção satisfaz uma das necessidades que tradicionalmente levam o legislador a optar pelo formalismo negocial, em detrimento da consensualidade ou liberdade de forma: a de proporcionar um mais elevado grau de certeza sobre a celebração do negócio e dos seus termos.
E assume, em tal qualidade, um papel insubstituível na regulamentação dos direitos e deveres consignados e disciplinados naquele diploma: é a data do seu registo que fixa o dies a quo do prazo estabelecido no citado n. 3, do art. 5.
Assim, ainda que recebida a carta, a comunicação que ela continha sempre seria nula, nos termos dos arts. 364, n. 1, e 294, CC.
O que justificaria plenamente o silêncio da gerência da destinatária (mesmo que lhe devesse ser assacado a recepção da comunicação), segura, como poderia estar, de que, antes de assinar o aviso de recepção, não começaria a correr o prazo peremptório aludido.
4. Por todo o exposto, concedem a revista, para que, em consequência, passe a vigorar a decisão da 1ª instância.
Custas, aqui e nas instâncias, pela recorrida.
Lisboa, 19 de Março de 200
Quirino Soares,
Neves Ribeiro. (Vencido conforme declaração anexa),
Araújo Barros. (Junto declaração de voto),
Oliveira Barros. (Vencido como consta declaração no verso),
Miranda Gusmão.
(Votei vencido porquanto considero que o A/R comprova apenas a recepção da comunicação, e essa, portanto, somente a sua função, não parece que possa considerar-se formalidade "ad substantiam, isto é, de que dependa a validade da declaração emitida, ou, propriamente, até, meio de prova dessa declaração, uma vez que, como notador, o é apenas da recepção de comunicação feita por um dado sujeito de direito a outros em determinado dia, mês, e ano.
Daí que não resulte clara, sequer, a aplicabilidade, neste caso, do artigo 364, CCIV, e que seja, a meu ver, de aceitar a sua substituição pela prova documental de igual valor que é o recibo da conta registada).
Oliveira Barros.

Declaração de voto:
O artigo 5, n. 1, do De-Lei n. 162/84, de 18 de Maio, ao determinar que "decorridos que sejam 45 dias após aquela data (data em que o prémio deveria ter sido pago), a garantia concedida pelo seguro será obrigatoriamente suspensa, mediante comunicação feita pela seguradora ao tomador do seguro, através de correio registado com aviso de recepção, nos 30 dias imediatos ao termo daquele prazo".
Estabelece, pois, aquela norma, afastando-se do princípio da consensualidade, determinada forma para a referida comunicação da seguradora ao tomador do seguro.
Ora, a comunicação em causa, como é evidente, constitui uma declaração unilateral receptícia, em que a seguradora está consciente dos efeitos jurídicos que dela decorrem: trata-se, pois, de um acto jurídico, a que são aplicáveis, com as necessárias adaptações, as disposições relativas aos negócios jurídicos (artigo 295 do CCIV).
Determina o artigo 220 do mesmo código que "a declaração negocial que careça da forma legalmente prescrita é nula, quando outra não seja a sanção especialmente prevista na lei".
Assim, e independentemente da discussão acerca da natureza jurídica do aviso de recepção (formalidade ad substantiam ou ad probationem), terá que se considerar nula a comunicação feita pela seguradora por falta de observância do formalismo legalmente exigido.
Nulidade essa que acarreta a não produção de quaisquer efeitos, designadamente o de a seguradora poder considerar suspenso o seguro e, mais tarde, resolvê-lo.
Em consequência, embora pelas razões expostas, sufrago a solução constante do acórdão proferido.
Lisboa, 19 de Março de 2002.
Araújo Barros.