Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
847/10.0TTVCT.P1.S1
Nº Convencional: 4ª SECÇÃO
Relator: GONÇALVES ROCHA
Descritores: COMPLEMENTO DE REFORMA
ACORDO DE EMPRESA
Data do Acordão: 01/21/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO DO TRABALHO - DIREITO COLECTIVO / INSTRUMENTOS DE REGULAMENTAÇÃO COLECTIVA DE TRABALHO / ACORDO DE EMPRESA.
Legislação Nacional:
ACORDO DE EMPRESA / 1999 (BTE Nº 7/99, DE 22-2).
ACORDO DE EMPRESA / 2002, (BTE Nº 1, DE 8 DE JANEIRO DE 2002).
CONTRATO, PUBLICADO NO D.R. DE 31.12.2004, III SÉRIE, E ANEXO I - REGULAMENTO DE REGALIAS SOCIAIS: - ARTIGOS 1.º, 7.º E 13.º.
D.L. N.º 12/2006, DE 20 DE JANEIRO: - ARTIGOS 9.º, 24.º, N.º2.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 14/9/2011, PROCESSOS NºS 474/08.0TTVCT.P1.S1, 468/09.0TTVCT.P1.S1 E 791/08.0TTVCT.P1.S1;.
-DE 26/10/2011, PROCESSO Nº 255/08.2TTVCT.P1.S1;
-DE 19/9/2012, PROCESSO N.º 524/10.1TTVCT.P1.S1.
Sumário :
I - Estando estabelecido no Acordo de empresa que a ré garantirá a todos os seus trabalhadores, nas condições dos instrumentos que se obriga a criar e a divulgar, as seguintes regalias: … c) complemento de reforma de invalidez, resulta claro que a ré outorgante ficou não só com a liberdade de estabelecer, unilateralmente, as condições respectivas, a consignar nos instrumentos que se obrigou a criar, mas também com a de promover eventuais alterações.

II - A aquisição do direito ao complemento de pensão de reforma apenas acontece quando o trabalhador passe à situação de reforma atribuída pela Segurança Social, sendo o complemento atribuível apenas a partir dessa data, pelo que os participantes dum fundo de pensões criado para assumir o seu pagamento não são titulares de qualquer direito adquirido daquele benefício antes da verificação daquele facto.

Decisão Texto Integral:

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:

1----

AA veio intentar uma acção com processo comum emergente de contrato de trabalho

contra:

"BB - ..., S.A."; e

CC - ..., S.A.", pedindo a condenação das RR:

A) - a reconhecerem ao A. o direito a receber:

- um complemento de reforma por invalidez que lhe é paga pela Segurança Social, desde 17/11/2008, no montante mensal de € 463,29, sem prejuízo da sua actualização de acordo com as tabelas salariais em vigor na R;

- a quantia de € 11.118,96, a título de complementos de pensão de reforma por invalidez já vencidos, sem prejuízo das prestações vincendas e das actualizações devidas, de acordo com as alterações salariais anuais que vierem a ser acordadas e que vierem a vigorar na R;

- no mês de Novembro de cada ano, para além do complemento mensal da pensão de reforma por invalidez, um quantitativo igual a esse complemento, incluindo os já vencidos;

- juros de mora sobre estas quantias, vencidos e vincendos, até integral pagamento;

B) - a condenação das RR. a assegurarem o pagamento das quantias supra referidas, acrescidas das que entretanto se vencerem, e da mesma proveniência, através do Fundo de Pensões G... ou outro que lhe venha a suceder, sob pena de responder a 1 ª R. com o seu património pelo pagamento das ditas quantias.

Alegou, para tanto que exerceu, desde 16/1/74, a sua actividade profissional para a 1ª R. e as sociedades que a antecederam; que em 17/11/2008 passou à situação de reformado por invalidez; que por força do disposto no AE e do Regulamento das Regalias Sociais que dele decorre, tem direito a um complemento de reforma, cujo pagamento as RR não têm assegurado com a justificação de que procederam a uma alteração ao Plano de Pensões em 13/7/07; no entanto, esse complemento de reforma fazia parte integrante do seu contrato de trabalho e, como tal, não podia ser alterado sem o seu acordo.

E não tendo a audiência de partes derivado na sua conciliação, vieram as RR contestar, tendo a R, CC, pugnado pela licitude da alteração ao Fundo de Pensões.

Por seu lado, a R "BB" alegou que quem está obrigado a proceder ao pagamento daquele complemento de reforma é o Fundo e não ela; que de acordo com o AE publicado no BTE nº.1, de 18/1/2002, a empresa podia negociar alterações ao contrato constitutivo do Fundo de Pensões, sendo a alteração a que se procedeu absolutamente lícita; que as condições referentes ao complemento de reforma não faziam parte do contrato individual de trabalho, não assumindo a natureza de direitos individuais do A; por outro lado, as alterações por si promovidas, para além de lícitas, eram necessárias para salvaguardar a sustentabilidade do Fundo.

E tendo-se procedido à realização de audiência de discussão e julgamento foi depois proferida sentença a absolver a R. "CC" dos pedidos contra si formulados;

E a condenar a R. "BB" a reconhecer o direito do A. a receber:

- um complemento mensal da pensão de reforma por invalidez que lhe é paga pela Segurança Social, desde 6/5/2010, no montante mensal de € 467,27, sem prejuízo da sua actualização de acordo com as tabelas salariais em vigor nesta R.;

- a quantia de € 6.541,78, a título de complementos de pensão de reforma por invalidez já vencidos e dos que entretanto se venceram, sem prejuízo das prestações vincendas e das actualizações devidas, de acordo com as alterações salariais anuais que vierem a ser acordadas e que vierem a vigorar na mesma R;

- no mês de Novembro de cada ano, para além do complemento mensal da pensão de reforma por invalidez, um quantitativo igual a esse complemento;

a condenar ainda a R. "BB" a assegurar o pagamento das quantias supra referidas, através do actual "Fundo" ou outro que lhe venha a suceder.

            Inconformada, veio a R, BB, recorrer de revista, “per saltum”, tendo rematado a sua alegação com as seguintes conclusões:  

 A) Pretende a Recorrente como presente recurso ver revogada a douta decisão recorrida, sendo proferido douto Acórdão que absolva a Recorrente dos pedidos formulados pelo Recorrido.

B) Por se encontrarem preenchidos os pressupostos legais os pressupostos legais enunciados no artigo 725º do C.P.C., aprovado pelo Dec. Lei 44129, de 28 de Dezembro de 1961, na sua redacção em vigor à data da prolação da sentença recorrida (cujos termos, são, aliás, reproduzidos no artigo 678º do C.P.C., aprovado pela Lei 41/2013 de 26 de Junho), porquanto, o valor da causa é superior à alçada do Tribunal da Relação, (sendo este o valor a considerar, uma vez que o valor da sucumbência não é, facilmente, determinável (nº 1 do art." 678º do "velho" CPC, reproduzido, nos seus termos, pelo na 1 do art.629º do "novo" C.P.C.) não pretendendo a Recorrente discutir a matéria de facto, suscitando, apenas, questões de direito, não pretendendo, finalmente, ver reapreciadas quaisquer questões interlocutórias, requer, seja este admitido na modalidade de RECURSO PER SALTUM para o SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA.

C) Como bem define a douta sentença recorrida "A questão a decidir na presente acção é, de forma singela, a seguinte: saber se o complemento de reforma a que o A. tem direito é aquele que decorre do contrato constitutivo do Fundo de Pensões que vigorava na 1a R., ou se, pelo contrário, esse direito é aquele que decorre das alterações a esse contrato assinadas em 13/7/07 e referidas no ponto 9) da matéria de facto provada."

O) Considerou a douta decisão recorrida inaplicável ao contrato de trabalho com o Recorrido o Plano de Pensões resultante da alteração do título constitutivo do Fundo de Pensões verificado em 13/07/2007 e suficientemente tratado nos autos.

E) Funda o seu douto entendimento, por um lado, no recurso à teoria de "incorporação" dos direitos resultantes da negociação colectiva nos contratos individuais de trabalho, sustentado, tal incorporação, na recusa do que entende ser a distinção entre a relação colectiva e a "relação individual de trabalho, quer por uma ter consequências na outra, quer por a regulamentação interna da empresa ter de ser integrada na relação laboral de cada trabalhador.

F) Pretende, finalmente, a douta decisão recorrida, configurar as condições do regulamento de regalias sociais, como um elemento fundamental na formação da vontade, não só de contratar, mas de manter a relação do trabalho pelo trabalhador, constituindo, assim, uma proposta irrevogável da empresa, que a vincula perante cada trabalhador, não podendo ser alterada.

G) Desta decisão constitui pressuposto a convicção de que o direito ao complemento de reforma, nos termos definidos no plano descrito na douta p.i., teria passado a integrar o contrato de trabalho do recorrido, sendo, as suas expectativas reforçadas em 2004, com a publicação do Contrato Constitutivo do Fundo de Pensões.

H) Como dizem Bernardo Lobo Xavier, Furtado Martins e António Nunes de Carvalho, in "Pensões Complementares de Reforma- Inconstitucionalidade"(pág 159) " as normas da organização, previsão e maturação de benefícios complementares pensionísticos não pertencem ao estatuto do contrato individual", tendo, apenas, a característica vulgarmente designada por "regalia", a qual não tem essência retributiva, não se prendendo, sinalagmaticamente a quaisquer obrigações dos trabalhadores e, por isso, não assumindo, necessariamente, carácter contratual laboral, apesar de terem, com o contrato individual de trabalho ligações relevantes, não o integram, não sendo sustentável a criação de um sistema complementar de segurança social por mera contratação individual.

I) Como escreve Tursi (in "Il regime giuridico delle prestazioni do provindenza complemantare, pág. 1743 (22 parecer) "a prestação de previdência complementar, na verdade, é funcionalmente autónoma da relação de trabalho, substituindo à "correspectividade contratual-laboral" uma outra, "contratual previdencial", entre contribuição e prestação", negocial, não laboral (e, a fortiori, não retributiva), concluindo o mesmo autor que "devem ter-se, em princípio, como não reportáveis às obrigações que tenham por objecto a prestação de providência complementar, as normas que disciplinam a obrigação retributiva. "

J) Não é assim, admissível, atenta a natureza das prestações em causa na regalia do complemento de reforma, defender-se que esta integra um contrato individual de trabalho (no caso em apreço o do Recorrido), não só por tal se revelar, desde logo, estranho ao núcleo essencial do sinalagma de tal contrato, mas, também, por tal constituir a única forma de prescrever a autonomia respectiva de vínculos totalmente distintos e reveladores de fortes assimetrias no seu desenvolvimento.

K) A criação de um mecanismo de segurança social complementar - que deve respeitar as exigências legais interactivas, nomeadamente a criação de um fundo de pensões, isto é, de um património autónomo estranho à empresa e afecto a realização de um plano de pensões - por via contratual, estará, assim, limitada à convenção colectiva, sendo inadmissível por contratação individual, por, manifestamente, não poder, atenta a sua natureza, integrar um contrato de trabalho.

L} A admissibilidade de estabelecimento desse mecanismo complementar por convenção colectiva, deve, mesmo assim, considerar-se limitada ao estabelecimento dos princípios do mecanismo, não sendo tolerável que o conteúdo concreto do plano de pensões não seja deixado à disponibilidade da empresa, enquanto outorgante do contrato constitutivo do Fundo de Pensões, que os trabalhadores, ou os seus representantes, não integram.

M) Admitir a integração, no contrato individual de trabalho do Recorrido, de um direito a um concreto plano de pensões, como aquele pretende, seria subverter a posição da empresa na contratação desse plano e na contribuição do Fundo de Pensões, facilmente daí decorrendo - como necessariamente teria decorrido - a insolvência desse mesmo património autónomo.

N) A Recorrente não promoveu a alteração do plano de pensões por qualquer capricho, mas apenas por que tal lhe era exigido para assegurar, como pensa ter feito, a sobrevivência desse património e, desse modo, a satisfação das expectativas, dos trabalhadores, embora estes não sejam, no momento anterior à reforma, juridicamente tuteladas nos termos em que o pretende o Recorrido.

O) lnexiste, assim, enquanto direito constituído na esfera do contrato individual de trabalho, o direito ao plano de pensões reivindicado pelo Recorrido, tratando-se, apenas, de um direito em formação, cujo conteúdo, em concreto, só será definido pelos termos em vigor na data em que ocorreu o facto que converteu o direito em formação num verdadeiro direito - a passagem à reforma do Recorrido.

P) A própria douta sentença recorrida enferma, nesta matéria de profundíssima e insanável contradição, ao considerar "A partir deste momento (momento em que, nos termos daquela decisão, em 2002, a fórmula de cálculo passou igualmente a constar do regulamento interno de Regalias Sociais) o direito ao complemento da reforma assim instituído passou a ser um direito efectivo dos trabalhadores, embora sujeito, continuamos a dizê-lo, à condição suspensiva de um facto futuro. Passava a fazer parte do contrato individual de trabalho ... " o que significa, inequivocamente, que a douta sentença recorrida considerou ter "nascido" este direito, com estes contornos, no momento da publicitação do texto daquele texto classificado pela douta sentença recorrida como "regulamento", na sequência, reconhecida naquela peça, da outorga de Acordo de Empresa em 2002.

Q) Não podia, assim, transmitir-se para o seu contrato de trabalho qualquer regalia resultante da referida convenção, e, assim sendo, não poderia o Recorrido ver, à data da sua reforma, reconhecido qualquer direito que, pura e simplesmente, não existia no seu contrato individual de trabalho.

R) Do mesmo modo, não se poderá suportar a procedência do pedido do Recorrido num alegado regulamento, porquanto, claramente, não reveste a natureza de regulamento da empresa, pretendendo, assim, estar-se perante um acto de criação de planos de pensões privados como manifestação do poder regulamentar patronal.

S) Ao contrário do que parece sustentar a decisão do Tribunal a quo, o Regulamento de Regalias Sociais não constitui - por patente falta de características - um regulamento interno da empresa, que sempre seria elaborado em matéria de organização e disciplina no trabalho e que, depois de publicitado - e aceites os seus termos por ambas as partes na relação laboral (o que pode não suceder, nos termos legais!) constituí uma verdadeira fonte de obrigações,

T) Bem pelo contrário, o Regulamento em causa constitui um mero anexo ao Contrato Constitutivo do Plano de Pensões, contrato esse que, como é evidente, tem um regime legal próprio (ao tempo em que foi elaborado, o D.L. nº 12/2006, de 20 de Janeiro), não se confundindo com o regime da contratação colectiva.

U) Neste enquadramento, as alterações ao referido contrato regem-se quanto à sua admissibilidade, termos, condições e demais aspectos conexos, pelo disposto no Decreto-lei nº 12/2006, de 20 de Janeiro.

V) É precisamente pelo facto de este plano de pensões não resultar, quanto aos seus termos, da negociação colectiva, que a legitimidade para promover quaisquer alterações ao seu conteúdo pertence aos Outorgantes desse Fundo, no caso concreto as empresas associadas e as entidades financeiras intervenientes, nem, tampouco, das Ordens de Serviço referidas na douta decisão emergira, em algum momento, para os trabalhadores da Recorrente, quaisquer direitos que viessem a integrar a relação individual de trabalho.

W) Na verdade, como defendem inúmeros autores, as cláusulas de uma convenção colectiva, seja ela um contrato colectivo, um acordo colectivo ou um acordo de empresa, não integram o conteúdo dos contratos individuais de trabalho, mantendo-se num outro plano normativo.

X) E dúvidas não podem subsistir quanto ao facto de se estar perante um direito (ou aparência dele) de génese colectiva e, em momento algum, de natureza individual.

Y) Como bem referem os Subscritores do Parecer referido nos autos "Por outro lado, não pode ver-se no acto empresarial de instituição de um esquema de pensões um regulamento de empresa, já que se reporta a um âmbito que exorbita do contrato de trabalho. Esse acto empresarial é estritamente unilateral, no sentido de que não requer ou envolve aceitação pelo trabalhador: os efeitos que produz não dependem nem requerem de uma manifestação, expressa ou tácita, de adesão, pelo que não pode, ser perspectivado como proposta negocial".

Z) Não se afigura, assim, como se possa defender, como subjaz à douta decisão recorrida, que se estava perante uma situação regulamentar, em sentido técnico jurídico, da qual emergiam direitos para os trabalhadores, no âmbito do seu contrato individual de trabalho e que, assim, se converteriam em direitos adquiridos por cada trabalhador da Recorrente, ainda que cada trabalhador não passasse - como reconhece aquela decisão - de um mero destinatário, passivo, porque sem qualquer intervenção ou interferência no acto que o afecta tão seriamente (neste caso, positivamente) ou no seu conteúdo.

AA)Pressupõe, ainda, o douta decisão recorrida, que esse regulamento sempre configuraria uma proposta negocial que, uma vez publicitada, sem contestação, junto dos trabalhadores, se converteria numa direito dos seus destinatários, sendo assim, vedado à empresa o direito de alterar o seu conteúdo.

BB) Tal entendimento do Tribunal a quo carece manifestamente de suporte na matéria assente, contradizendo mesmo os pressupostos de que parte uma vez que, como é reconhecido naquela peça e consta dos documentos juntos aos autos, a empresa se reservou o direito de conformar, de modo não condicionado o teor do pano de pensões.

CC) Vinculando, o contrato constitutivo, como resulta dos autos, apenas a Recorrente e as entidades subscritoras do mesmo - que não são integradas pelos representantes dos trabalhadores - necessário se torna concluir que nenhuma convenção existiu entre a Recorrente e os Sindicatos representativos dos seus trabalhadores que permita considerar, que as condições do complemento de reforma foram acordadas com os trabalhadores ou com os seus representantes, que à empresa, Recorrente, tenham sido impostos os termos dessa fórmula de cálculo, ou que, igualmente, e por maioria da razão, à empresa tenham sido imposto limites - que não os plasmados no Contrato Constitutivo e os formais, decorrentes do nº 2 de cálculo 87° do AE – para promover qualquer alteração ao contrato Constitutivo.

DO) Não é, assim admissível defender a necessidade de concordância dos trabalhadores para que fossem alteradas determinadas condições de cálculo de pensão de reforma, quando essas mesmas condições haviam sido estabelecidas sem que os trabalhadores ou seus representantes fossem ouvidos.

EE) A inscrição do direito a um concreto plano de pensões, nas relações colectivas de trabalho, radica, de acordo com o acórdão recorrido, na cláusula 87° do A.E. publicado no BTE nº 1 de 8 de Janeiro de 2002 (transcrita nas alegações) da qual resulta, bem ao contrário do que conclui o Tribunal a quo, inequívoco que a empresa deveria, apenas, criar instrumentos de regulamentação de regalias sociais, nomeadamente complemento de reforma, sendo as condições dessas regalias, as que a empresa entendesse adequadas e, sobretudo, exequíveis, não tendo, em qualquer momento do texto acordado, as partes outorgantes, pretendido fixar os termos dessas regalias, que, aliás, expressamente foram afastados, pelos Outorgantes, do conteúdo do Acordo da Empresa.

FF) A evidente diferença entre o texto desta cláusula e o da cláusula 90° do anterior AE (igualmente transcrita nas alegações) demonstra inequivocamente que as partes outorgantes do AE de 2002 eliminaram o carácter contratual das condições do Regulamento do complemento de reforma expressamente deixando de o considerar parte integrante do Acordo como previa o anterior AE.

GG) É, precisamente, por ter sido cometida à empresa a tarefa de criação do instrumento regulador das regalias sociais, que o dito "Regulamento de Regalias Sociais" veio a constar do Contrato Constitutivo do Fundo de Pensões G... (anexo I do Contrato, cfr. Doc. junto aos autos).

HH) A convenção constante da cláusula 87° do AE de 2002 não cria qualquer direito de o trabalhador reclamar uma concreta pensão complementar à sua reforma, não lhe conferindo sequer uma expectativa quanto ao seu montante.

II) A concretização dos termos do cálculo do complemento de reforma foi negociado entre a Recorrente e as estruturas financeiras outorgantes do contrato constitutivo, no qual não intervieram os representantes dos trabalhadores, no que constitui um óbvio reconhecimento de que tal matéria fora expurgada da contratação colectiva.

JJ) Não assistindo aos Sindicatos - por exclusão expressa desse direito em sede de negociação colectiva - a prerrogativa de negociar os termos do cálculo dos complementos de reforma, não assistirá a qualquer trabalhador o direito de negociar tais condições concretas de cálculo da sua pensão, não sendo, assim, susceptível de integrar o quadro dos direitos do trabalhador, individualmente considerado.

KK) A noção de direitos adquiridos a ter em consideração na análise da questão controvertida não pode deixar de ser, atenta a matéria em apreço, a que resulta do contrato Constitutivo e da lei aplicável - o artigo 9° do D.L. nº 12/2006 -, segundo o qual: "1- Considera-se que existem direitos adquiridos sempre que os participantes mantenham o direito aos benefícios consignados no plano de pensões de acordo com as regras neste definidas, independentemente da manutenção ou da cessação do vínculo existente com o associado".

LL) .Conforme consta do Anexo I ao Contrato Constitutivo do "Regulamento de regalias sociais" encontra-se consagrada, no seu artigo 4°, que, precisamente regula a matéria da ''Aquisição do Direito" l a seguinte solução: Só terão direito ao complemento de pensão de reforma os trabalhadores do quadro permanente da empresa que tenham sido reformados por velhice ou passado à situação de invalidez”: o que exclui do beneficio criado pelo regulamento qualquer trabalhador cujo contrato de trabalho viesse a cessar por motivo diverso da reforma

MM) Necessário se torna concluir, deste texto e no que à aquisição do direito respeita que no âmbito do plano de pensões constante do Anexo I do Título Constitutivo de 31 de Dezembro de 2004, o direito ao complemento de pensão de reforma, para a generalidade dos trabalhadores, como o Recorrido, se adquire com a passagem à reforma, não havendo, assim, antes dessa reforma, qualquer direito adquirido.

NN)Tendo em conta o acima referido, dúvidas não podem restar de que os termos da atribuição de um Plano de Pensões resultam, na relação da Recorrente com os seus trabalhadores, do que vem plasmado no Acordo da Empresa em apreciação nos autos, e da liberdade de conformação dos termos desse plano que à empresa é conferido por aquele Instrumento de Regulamentação Colectiva.

OO) Tendo sido outorgada em 13 de Julho de 2007, alteração do contrato constitutivo do Fundo de Pensões G... e definidos como participantes todos os trabalhadores que cumprissem as condições de elegibilidade definidas nos Planos de Pensão aí melhor descritos, e sendo o Recorrido, em 13 de Julho de 2007 um trabalhador que reunia as características próprias para integrar o novo plano de pensões, criado por aquela alteração, não poderá deixar de se concluir pela aplicação ao Recorrido, do plano de pensões resultante das alterações introduzidas em 2007 - como, aliás, entendeu este Supremo Tribunal nos acórdãos proferidos nos processos 791/08.0TTVCT.P1.S1, 468/09.0TTVCT.P1.S1 e 524/10.1TTVCT.P1.S1 todos da 4a Secção, - e não, como erradamente fez o Mº Juiz a quo, o plano de pensões constante do Anexo ao contrato constitutivo de 31 de Dezembro de 2004, revogado por aquela alteração.

PP) A douta sentença recorrida fez errada interpretação da cláusula 87a do A.E. aplicável às relações de trabalho entre Recorrente e Recorrido e do art. 12° do Dec. Lei 12/2006 de 20 de Janeiro, e dos art.s 387°, alínea c) e 392°, nº 1 ambos do Código do Trabalho aprovado pela Lei nº 99/2003 de 27 de Agosto, interpretando incorrectamente os documentos constantes nos autos devendo ser revogada.

Pede-se assim que, admitido o recurso na modalidade de recurso PER SALTUM, se revogue a decisão recorrida com a consequente absolvição da Recorrente.

            O A também alegou, rematando com as seguintes conclusões:

1 - Tendo em conta o supra explanado, dúvidas não devem restar de que a obrigação assumida pela Recorrente, porque prevista quer no Regulamento interno por ela criado e divulgado junto dos seus trabalhadores, quer no Acordo de Empresa, fazia parte do contrato individual de trabalho do Autor;

2- O complemento de reforma nos termos em que foi assumido pela empresa que o concedia aos seus trabalhadores não podia unilateralmente ser alterado;

3 - As alterações ao Contrato Constitutivo do Fundo de Pensões porque, não tiveram o acordo do Recorrido, nem dos representantes dos trabalhadores não podem produzir efeitos na sua esfera jurídica.

4- A decisão vertida na douta sentença proferida não viola por isso as normas referidas pela Recorrente.

            Subidos os autos a este Supremo Tribunal e admitida a revista, deu-se cumprimento ao disposto no artigo 87º, nº 3 do CPT, tendo o Ex.mº Procurador Geral Adjunto emitido parecer no sentido da procedência do recurso, vindo a concluir que o sistema privado de complemento de reforma não integra o contrato individual de trabalho, constituindo apenas um direito em formação que só se efectiva quando o trabalhador passa à situação de reforma. Por isso, e vigorando nesta data o AE/2002, ao abrigo do qual a R subscreveu uma alteração ao contrato constitutivo do Fundo de Pensões, será o regime por este consagrado o aplicável ao caso.

            Notificado este parecer às partes, nenhuma delas se pronunciou sobre o mesmo.

            E tendo-se procedido à distribuição do projecto pelos Ex.mºs Adjuntos, é altura de decidir.

2----

            Para tanto, deu-se como provada a seguinte matéria de facto:

1 - O A. foi admitido, em 16/1/74, ao serviço da "BB - …, EP", para, sob as suas ordens, direcção e fiscalização, exercer a sua actividade profissional.

2 - Em Dezembro de 1990, essa empresa foi transformada em sociedade anónima, com a denominação de "A BB - …, S.A.".

3 - Na sequência do desmembramento desta sociedade anónima, em Junho de 1993, o A. passou a desempenhar a sua actividade para a 1 ª R., a qual, até Janeiro de 2011, tinha a designação de "BB - ..., S.A.".

4 - O A. tinha ultimamente a categoria profissional de técnico de manutenção mecânica de nível IV, auferindo o vencimento base de €1.136,92, acrescido de €260,75 de diuturnidades.

5 - Por carta datada de 10/11/2009, o Centro Nacional de Pensões comunicou que o A. passava à situação de reforma por invalidez fazendo reportar o início da pensão a 17/11/2008.

6 - Em 2002, a 1 ª R. e as associações sindicais representativas dos trabalhadores, na qual se encontrava filiado o A., subscreveram um Acordo de Empresa (BTE, 1 ª, nº.1, de 8/1/02).

7 - Na 1ª R. vigorava o "Regulamento de Regalias Sociais" de fls. 17 a 47 (cujo teor se dá aqui por reproduzido).

8 - Na sequência do que constava do art", 87, nº. 1, c), desse AE, a 1 ª R. subscreveu o contrato constitutivo do Fundo de Pensões G... com PensõesGere - ..., S.A., (D.R., III série, 31/12/04

9 - Em 13/7107, a 1 ª R. subscreveu juntamente com G... e CC (entidade que geria o fundo de pensões desde 1/0106), uma alteração ao referido contrato constitutivo com efeitos reportados a 1/1/07 (documento de fls. 91 a 113, cujo teor se dá aqui por reproduzido).

10 - O A. nunca deu o seu acordo expresso ou tácito à alteração referida em 9).

3----

            A questão que se discute no recurso consiste em saber se o complemento de reforma a que o A. tem direito é o que decorre do contrato constitutivo do Fundo de Pensões que vigorava na 1a R, ora recorrente, ou se o mesmo está abrangido pelas alterações a esse contrato que foram operadas em 13/7/07.

Sustentando que a "BB" não podia proceder unilateralmente à alteração do regime de regalias sociais vigente na empresa, a decisão recorrida, considerando que o A tinha direito a um complemento de pensão de reforma de acordo com o contrato constitutivo do fundo de pensões que vigorava antes de 13/7/2007, acabou por condenar a recorrente no pagamento dum complemento mensal da pensão de reforma por invalidez que lhe é paga pela Segurança Social, desde 6/5/2010, no montante mensal de € 467,27, sem prejuízo da sua actualização de acordo com as tabelas salariais em vigor na empresa; no pagamento da quantia de € 6.541,78 de complementos de pensão de reforma já vencidos e dos que entretanto se venceram, sem prejuízo das prestações vincendas e das actualizações devidas, de acordo com as alterações salariais anuais que vierem a ser acordadas e que vierem a vigorar na mesma R; a pagar-lhe no mês de Novembro de cada ano, para além do complemento mensal da pensão de reforma por invalidez, um quantitativo igual a esse complemento; e condenou-se ainda a R. "BB" a assegurar o pagamento destas quantias através do actual "Fundo" ou outro que lhe venha a suceder.

Para tanto argumentou-se:

“Esta R. e as associações sindicais representativas dos trabalhadores, na qual se encontrava filiado o A., subscreveram um Acordo de Empresa (que se encontra publicado no BTE, 1ª, nº.1, de 8/1/02), na qual se consagrava a obrigação da R. de instituir um complemento de reforma. É na sequência do que constava do art", 87, nº. 1, c), desse AE, que a R. vem a subscrever o contrato constitutivo do Fundo de Pensões G... com PensõesGere ­..., S.A., (D.R., III série, 31/12/04).

Daí que não se possa concordar, com todo o profundo respeito, com o que se lê no Ac. do STJ de 19/9/2012 (ín www.dgsi.pt) e que agora se transcreve:

"Da cláusula do AE de 2002, decorre, pois, apenas um comando dirigido à Ré, no sentido de implementar as medidas de protecção previstas naquelas alíneas, nada se especificando sobre a conformação concreta das mesmas.

Deste modo, aquela cláusula e os instrumentos de execução da mesma que vieram a ser implementados pela Ré não integram um conteúdo normativo que se tenha enquadrado nos contratos de trabalho dos trabalhadores ao seu serviço, cuja alteração careça da adesão destes."

Só que há um ponto que se nos afigura absolutamente essencial: a partir do momento em que aquele direito a um complemento de reforma, de acordo com aquela fórmula de cálculo, ficou a constar de um Regulamento Interno da empresa, ele passou ipso facto a fazer parte integrante do contrato individual de cada um dos trabalhadores por ele abrangidos.

Na realidade, vamos aceitar, para simples efeitos de raciocínio, que este Regulamento Interno não fazia parte do acordo de empresa, ou seja, que não tinha o valor de fonte de direito como regulamentação colectiva daquelas relações laborais.

Nem por isso este acto unilateral da empresa deixava de ser constitutivo de direitos e obrigações; passava a consubstanciar uma proposta de trabalho relativamente aos trabalhadores a partir de então admitidos ou uma alteração do contrato individual de trabalho relativamente aos restantes, por força do disposto no artº. 104º do C. Trabalho, não sendo necessária qualquer adesão expressa destes.

A partir deste momento, o direito ao complemento de reforma assim instituído passava a ser um direito efectivo dos trabalhadores, embora sujeito, continuamos a dizê-lo, à condição suspensiva de verificação de um facto futuro. Passava a fazer parte do contrato individual de trabalho - era uma das condicionantes que o trabalhador tinha em consideração quando se decidia pela manutenção ou não daquela relação laboral, pois que tinha a legitima expectativa de que essa contrapartida da sua prestação se iria efectivar no futuro.”

            No entanto, e conforme jurisprudência consolidada deste Supremo Tribunal, não podemos manter este entendimento.

Efectivamente, a relação de trabalho que existiu entre o A e a R, recorrente, era regulada pelo AE/2002, publicado no BTE nº 1 de 8 de Janeiro de 2002, resultando do nº 1 da cl.ª 87.ª que a empresa garantirá a todos os seus trabalhadores, nas condições dos instrumentos que se obriga a criar e a divulgar, dentre outras regalias, um complemento de reforma de invalidez.

Foi na sequência do compromisso assim assumido que foi criado o Fundo de Pensões ‘G...’, através do contrato constitutivo publicado no D.R. de 31.12.2004, III Série, que contém um Anexo I, chamado de Regulamento de Regalias Sociais, nele se prevendo, além do mais (arts. 1.º, 7.º e 13.º, respectivamente), que a empresa atribuirá aos trabalhadores do seu quadro permanente, que se reformem ou passem à situação de invalidez, um complemento da pensão conferida pela Segurança Social e cujo pagamento será assegurado pelo Fundo de Pensões, cuja atribuição será proposta à administração através do departamento de pessoal, devendo ser prestada informação sobre o seu valor mensal e a data prevista ou previsível do início do respectivo pagamento.

É assim nesta cláusula 87.ª do Acordo de Empresa de 2002 que se encontra estabelecida a regalia em causa, assumindo a empresa a obrigação de garantir a todos os seus trabalhadores, nas condições dos instrumentos que se obriga a criar e a divulgar, o complemento de reforma de invalidez.

Diferente era a versão do anterior Acordo de Empresa (BTE nº 7/99 de 22/2) que na sua cláusula 90.ª/1 dispunha que a empresa garantia a todos os seus trabalhadores, nas condições das normas constantes de regulamento próprio, que faz parte integrante deste acordo, várias regalias, entre elas se contando o complemento de reforma.

Do cotejo das referidas cláusulas resulta inequivocamente que a alteração acordada em 2002 é significativa, pois enquanto no AE/99 tal direito estava definido num regulamento, a partir daquela data a empresa assumiu apenas a obrigação de garantir o complemento de reforma de invalidez a todos os seus trabalhadores, mas apenas nas condições dos instrumentos que se obrigava a criar e a divulgar.

Face a esta evolução pode-se discutir se a R. podia, unilateralmente, introduzir alterações no contrato constitutivo do Fundo de Pensões, como veio a fazer em 13/7/2007.

Esta questão foi apreciada em vários arestos desta Secção Social, em todos se tendo concluído que tal era permitido à empresa.

Assim, no acórdão de 26/10/2011 proferido no processo nº 255/08.2TTVCT.P1.S1, justificou-se desta forma tal posição:

“Ora, analisado o texto do negociado clausulado, o que dele resulta inequivocamente é que a empresa Ré assumiu garantir aos seus trabalhadores as várias regalias nele aludidas, designadamente o complemento de reforma por invalidez, «[n]as condições dos instrumentos que se obriga a criar e a divulgar», nada ficando  pré-definido quanto a montantes, regras de cálculo, intervenção dos trabalhadores, modo de negociação, etc.

Por outro lado, conforme previsto no n.º 2 da mesma cláusula 87.ª, em caso de alteração nas regalias estabelecidas até então, apenas se estabeleceu que deveria ser solicitado parecer aos representantes dos trabalhadores, cujo carácter, alcance ou efeito não foram definidos.

Do que se depreende que, ressalvados os direitos adquiridos pelos trabalhadores ao abrigo de instrumentos anteriormente vigentes e reguladores destas matérias, conforme se previne no n.º 3 da cláusula 87.ª, se afastou o carácter contratual das condições reportadas no Regulamento próprio, que expressamente deixou de ser considerado parte integrante do Acordo de Empresa.

Parece, pois, inequívoco que a R. outorgante ficou, não só com a liberdade de estabelecer, unilateralmente, as condições respectivas, a consignar nos instrumentos que se obrigou a criar, mas também com a de promover eventuais alterações.

Deste modo excluída se mostra a reclamada intervenção, directa ou mediata, do trabalhador beneficiário na implementada alteração, como condição da sua validade.”

E nesta lógica concluiu-se pela licitude das alterações introduzidas pela empresa Ré, a 13 de Julho de 2007, no contrato constitutivo do Fundo de Pensões “G....

Igualmente nos acórdãos desta Secção Social de 14/9/2011, proferidos nos processos nº 474/08.0TTVCT.P1.S1, 468/09.0TTVCT.P1.S1 e 791/08.0TTVCT.P1.S1 se chegou a idêntica conclusão, argumentando-se para tanto:

“Conferido o texto do negociado clausulado (ponto de partida de qualquer operação hermenêutica), o que dele resulta inequivocamente é que a empresa/R. assumiu garantir aos seus trabalhadores as várias regalias elencadas (v.g. o complemento de reforma por invalidez).

Em que termos? …’Nas condições dos instrumentos que se obriga a criar e a divulgar’.

Nada ficou pré-definido relativamente a montantes, regras de cálculo, intervenção dos trabalhadores, modo de negociação, etc.

E – conforme previsto no n.º 2 da mesma cláusula 87.ª – em caso de alteração nas regalias estabelecidas até então, apenas de estabeleceu que deveria ser solicitado parecer (cujo carácter, alcance ou efeito não foi definido) aos representantes dos trabalhadores.

Donde se retira que, ressalvados os direitos adquiridos pelos trabalhadores ao abrigo de instrumentos anteriormente vigentes e reguladores destas matérias, conforme n.º 3 da cláusula – e nisso acompanhamos o entendimento sustentado pela recorrida –, se afastou o carácter contratual das condições reportadas no Regulamento próprio, que expressamente deixou de ser considerado parte integrante do Acordo de Empresa.

Apresenta-se-nos, pois, clara a ideia de que, ante o novo clausulado, a R. outorgante ficou não só com a liberdade de estabelecer, unilateralmente, as condições respectivas, a consignar nos instrumentos que se obrigou a criar, (…neles se integrando, a partir de então, logicamente, o ‘regulamento de regalias sociais’ existente – instrumento este diverso do regulamento interno da empresa, em sentido próprio, normalmente vocacionado para outros fins, v.g. organizacionais e de disciplina no trabalho, como é sabido, e resulta do constante no art. 153.º/1 do Código do Trabalho/2003), mas também com a de promover eventuais alterações.

E daí que – também em nosso juízo – tenha ficado para trás a sua natureza contratual e, excluída, por isso, a reclamada intervenção, directa ou mediata, do trabalhador beneficiário na implementada alteração, como condição da sua validade.

Se por esta via fica afastada – como se deixou explicitado – a oponibilidade das alterações ao Plano, não é a formulação genérica da garantia da regalia em causa que confere ao trabalhador um direito efectivo apenas sujeito a condição suspensiva de verificação de um facto futuro. (Sic).

Não só a mesma regalia não constitui, neste conspecto e âmbito, um ‘direito adquirido’, (cfr. noção constante do art. 9.º do Decreto-Lei n.º 12/2006, de 20 de Janeiro), integrante do acervo da relação juslaboral, como a ‘aquisição do direito’ ao complemento de pensão de reforma, nos termos e para os efeitos do Regulamento que consta do Anexo I ao Contrato Constitutivo, só acontece quando, além da verificação do mais, o trabalhador tenha passado à situação de invalidez …pela Segurança Social, sendo o complemento atribuível apenas a partir dessa data – cfr. respectivo art. 4.º.”

Por outro lado, e enfrentando esta questão dos direitos adquiridos que a decisão recorrida também invoca, escreveu-se no acórdão desta Secção Social de 19/9/2012, proferido no processo n.º 524/10.1TTVCT.P1.S1:

 O Fundo de Pensões – G... foi constituído na vigência do Decreto-Lei n.º 475/99, de 9 de Novembro, ou seja antes da entrada em vigor do Decreto-lei n.º 12/2006, de 20 de Janeiro, diploma que estabelece a disciplina em vigor da «constituição e funcionamento dos fundos de pensões e das entidades gestoras de fundos de pensões».

À data em que este diploma entrou em vigor aquele fundo já tinha existência legal colocando-se por tal motivo uma questão de definição do regime que lhe é aplicável.

É efectivamente esse o âmbito do n.º 2 do artigo 100.º do Decreto-Lei n.º 12/2006, de 20 de Janeiro, que determinou que este diploma se aplique também aos fundos existentes na data da sua entrada em vigor, «salvo na medida em que da sua aplicação resulte diminuição de direitos ou de expectativas adquiridas ao abrigo da legislação anterior».

Esta norma visa apenas resolver as questões derivadas da sucessão no tempo de regimes legais, impondo a preservação dos direitos ou expectativas jurídicas que existissem ao abrigo da legislação anterior e que pudessem ser afectados pela aplicação do novo regime aos fundos já existentes, decorrente da primeira parte daquele dispositivo.

Este dispositivo é inoperante relativamente à determinação de quais sejam os direitos ou as expectativas que poderiam ser afectadas, questão que deverá procurar-se nos vários dispositivos de ambos os diplomas.

Só perante situações onde a sujeição dos fundos ao novo regime possa afectar direitos ou meras expectativas surgidas na vigência da legislação anterior é que surge o espaço de intervenção desta norma mantendo essas situações reguladas pela legislação anterior.

Por outro lado, a norma do n.º 1 da cláusula 8.ª do Contrato Constitutivo do Fundo de Pensões G..., que, sob a epígrafe «expectativas», estabelece «os participantes do plano de pensões G... que cessem o vínculo laboral com um dos associados por motivos que não sejam a reforma ou o falecimento ficam automaticamente excluídos do Fundo de Pensões, revertendo para este a medida do benefício que lhe caberia se aquele vínculo se mantivesse até à ocorrência de um facto gerador do direito às pensões» também é completamente inócua no sentido da definição dos direitos e expectativas dos beneficiários dos referidos fundos de pensões.

De facto, o que daquela norma decorre é que os beneficiários do fundo que cessem o vínculo laboral com um dos associados, salvo se tal cessação decorrer da reforma ou do falecimento são automaticamente excluídos do Fundo, perdendo quaisquer direitos em relação ao mesmo. O benefício que lhes caberia se o vínculo se mantivesse até à ocorrência do facto gerador do direito às pensões reverte para o Fundo.

A comparação desta cláusula com o regime dos direitos adquiridos previsto no artigo 9.º daquele Decreto-Lei n.º 12/2006, é esclarecedora sobre a falta de fundamento das considerações tecidas na decisão recorrida.

Na verdade, decorre do n.º 1 daquele artigo 9.º que «existem direitos adquiridos», realidade que na semântica do diploma não tem o mesmo conteúdo que “direitos aos benefícios” derivados dos Fundos, «sempre os participantes mantenham o direito aos benefícios consignados no plano de pensões (…) independentemente da cessação do vínculo existente com o associado».

O artigo esclarece os casos em que a situação jurídica dos participantes no fundo derivada dessa participação no fundo, e antes de ocorrer o facto que fundamenta a atribuição dos benefícios previstos, se mantém, independentemente da manutenção do vínculo com o associado.

Nestas situações, aquela específica situação jurídica não se extingue com a cessação do vínculo, podendo a situação jurídica em causa ser transmissível, nomeadamente, nos casos referidos no n.º 2 daquele artigo.

É para estas situações que o diploma reserva o conceito de “direitos adquiridos”, inerente ao facto de os participantes, verem a sua expectativa titulada, independentemente da manutenção do vínculo com o associado inicial do fundo, o que não ocorre nas situações de mera participação no fundo.

De facto, quer no âmbito do Decreto-Lei n.º 12/2006, de 20 de Janeiro, quer no âmbito da legislação anterior, os factos que constituem o direito aos benefícios que derivam de um plano de pensões são claramente referenciados na lei.

Na verdade, decorre do disposto no artigo 6.º, n.º 1, deste diploma, que «as contingências que podem conferir direito ao recebimento de uma pensão são a pré-reforma, a reforma antecipada, a reforma por velhice, a reforma por invalidez e a sobrevivência», devendo estes conceitos ser definidos no respectivo plano de pensões.

Um plano de pensões, por força do disposto na alínea a) do artigo 2.º daquele diploma, é o «programa que define as condições em que se constitui o direito ao recebimento de uma pensão a título de reforma por invalidez, por velhice ou ainda em caso de sobrevivência ou de qualquer outra contingência equiparável».

Por outro lado, na dinâmica dos fundos de pensões é igualmente clara a distinção entre participante, que nos termos da alínea e) do artigo 2.º do referido Decreto-Lei é «a pessoa singular em função de cujas circunstâncias pessoais e profissionais se definem os direitos consignados no plano de pensões (…) independentemente de contribuir ou não para o seu financiamento» e do beneficiário, que é a pessoa singular «com direito aos benefícios estabelecidos no plano de pensões (…) tenha ou não sido participante».

Deste modo, o direito aos benefícios previstos no plano deriva claramente da ocorrência do facto – as contingências – que geram o direito e não da obtenção da mera qualidade de participante.

É neste contexto que tem de ser lida a norma do n.º 2 do artigo 24.º do mesmo diploma quando estabelece que as alterações aos contratos constitutivos e dos regulamentos de gestão dos fundos «não podem reduzir as pensões que se encontrem em pagamento nem os direitos adquiridos à data da alteração, se existirem».

Direitos adquiridos para os efeitos desta norma são os previstos no artigo 9.º acima referido.

Para além das pensões que se encontrem em pagamento, são esses os únicos direitos que deverão ser respeitados pelas alterações que sejam introduzidas aos contratos constitutivos.”

Sufragamos por inteiro as considerações dos acórdãos supra identificados que consideraram legais as alterações ao contrato constitutivo do Fundo de Pensões a que se procedeu em 13/7/2007, pois, face ao teor do nº 1 da cláusula 87ª do AE/2002, a empresa limitou-se a garantir a todos os seus trabalhadores, nas condições dos instrumentos que se obrigava a criar e a divulgar, dentre outras regalias, um complemento de reforma de invalidez, nada tendo ficado pré-definido relativamente aos seus montantes e regras de cálculo.

E quanto à intervenção dos trabalhadores, apenas se estabeleceu no n.º 2 da mesma cláusula 87.ª que em caso de alteração nas regalias estabelecidas até então, deveria ser solicitado parecer aos representantes dos trabalhadores.

E embora o nº 3 da cláusula tivesse ressalvado que a empresa reconhece os direitos adquiridos ao abrigo dos instrumentos anteriormente vigentes, só se pode considerar nesta situação aqueles que haviam conquistado o direito aos benefícios previstos no plano de pensões em virtude da ocorrência do facto que o gera, ou seja, a passagem do trabalhador à situação de reforma (para o caso de pensão complementar da reforma), ou a morte (para as pensões de sobrevivência), não bastando por isso a mera detenção da qualidade de participante.

Assim sendo, tendo o A passado à situação de reforma em 17/11/2008, temos de aplicar-lhe o regime que vigorava nesta data, não tendo adquirido quaisquer direitos ao abrigo dos regimes anteriormente vigentes, pois não foi no seu domínio de vigência que se reformou. Por isso, e não vindo invocada a situação prevista no artigo 9º do DL nº 12/2006 de 20 de Janeiro, não está abrangido pela previsão do nº 2 do artigo 24º deste diploma, pois este preceito só proíbe que as alterações aos contratos constitutivos e dos regulamentos de gestão dos fundos venham reduzir pensões em pagamento ou os direitos adquiridos nos termos do seu artigo 9º.

Atento o exposto, temos de dar razão à recorrente, pelo que só nos resta revogar a decisão recorrida.

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            Termos em que se acorda nesta Secção Social em conceder a revista, com a consequente revogação da sentença recorrida na parte em que condenou a Ré recorrente, que vai assim absolvida dos pedidos contra ela formulados na presente acção.

As custas da acção e do recurso ficam a cargo do A.

Anexa-se sumário do acórdão.

Lisboa, 21 de Janeiro de 2014

Gonçalves Rocha (Relator)

Leones Dantas

Melo Lima