Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ00035797 | ||
Relator: | MARTINS DA COSTA | ||
Descritores: | NULIDADE DA DECISÃO FUNDAMENTAÇÃO VENDA JUDICIAL BENS COMUNS PROTESTO REIVINDICAÇÃO | ||
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Nº do Documento: | SJ199902090012281 | ||
Data do Acordão: | 02/09/1999 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | T REL PORTO | ||
Processo no Tribunal Recurso: | 471/98 | ||
Data: | 05/11/1998 | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | AGRAVO. | ||
Decisão: | NEGADO PROVIMENTO. | ||
Área Temática: | DIR PROC CIV - PROC EXEC. DIR CIV - DIR FAM. | ||
Legislação Nacional: | DL 329-A/95 DE 1995/12/12 ARTIGO 16 ARTIGO 25 ARTIGO 26. CPC95 ARTIGO 351 ARTIGO 668 N1 B D ARTIGO 749 ARTIGO 751 N1 ARTIGO 910. CPC67 ARTIGO 825 N1 N2 N3 ARTIGO 1037 N2 ARTIGO 1038 N2 C. | ||
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Sumário : | I- Só padece da nulidade prevista na alínea b) do n. 1 do artigo 668, do CPC, a falta absoluta de fundamentação da decisão; tratando-se de despacho inserto em acta, a fundamentação pode não ser explícita e basta que ela resulte do seu contexto. II- O cônjuge executado que citado para a execução nos termos do artigo 825 do CPC, depois de penhorado bem comum do casal, não tiver deduzido oposição de modo oportuno e eficaz, não goza de legitimidade, na altura da venda, para o acidente de protesto pela reivindicação, previsto no artigo 910, n. 1, do citado Código. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça: I- "A" instaurou execução para pagamento de quantia certa, na forma ordinária, contra B e C e outros, com base em letras de câmbio aceites pela 1ª executada e avalisadas pelos demais executados. No acto de abertura das propostas em carta fechada, relativas à venda do prédio penhorado, a mulher do executado C, D, requereu "que seja lavrado termo de protesto nos termos e para os efeitos do disposto no artº 910º do C.P.C., reivindicando para si a propriedade do imóvel ...", o que foi indeferido por despacho de fls. 135. O recurso de agravo desse despacho veio a ser confirmado pelo acórdão de fls. 181 e segtes. Neste novo recurso de agravo, a D pretende a revogação daquele acórdão e formula, em resumo, as seguintes conclusões: - a penhora efectuada é ilegal, porque a dívida exequenda é da exclusiva responsabilidade do cônjuge executado e não tem natureza comercial, só podendo ser penhorado o direito à meação do devedor nos bens do casal; - os meios de reacção da recorrente contra tal penhora eram os embargos de terceiro ou a acção de reivindicação do imóvel, tendo ela sempre a qualidade de terceiro, pelo que lhe era legítimo invocar essa qualidade e lavrar o protesto em causa; - o despacho da 1ª instância, que indeferiu o protesto, é nulo, por falta de fundamentação de facto e de direito, nos termos do artº 668º nº1 b) do Cód.P.Civil; - o acórdão da Relação, ao concretizar os fundamentos de facto daquele despacho, em substituição do juiz da 1ª instância, cometeu a nulidade prevista na al. d) do cit. artº 668 nº1; - esse acórdão, ao considerar que tal despacho não era nulo, violou o disposto nos artºs 158, 659 e 660 nº3 do cit. Código; - o conceito de terceiro, previsto no artº 910 do cit. Código, é idêntico ao que consta do seu artº 351 nº1, sendo a pessoa que não seja exequente nem executado; - mesmo no caso de rejeição dos embargos, tinha a possibilidade de reivindicar a coisa penhorada; - a penhora do imóvel é ilegal, por ter ofendido o seu direito de propriedade, anterior ao registo da penhora; - ao não se entender assim, violou-se o disposto nos artºs 351, 355º e 910 do cit. Código e 1404, 1405 nº2 e 1311 do Cód. Civil; - de outro modo, ter-se-ia violado o disposto nos artºs 13 nº2 e 18 nº2 da Constituição, por se não permitir aos cônjuges dos executados o protesto pela reivindicação de bens comuns, "apesar de poderem ... embargar de terceiro" e por se configurar "uma dualidade de critérios para idênticas situações" em relação aos "terceiros proprietários que não sejam cônjuges dos executados". A exequente, em contra-alegações, sustentou a improcedência do recurso. II - Factos dados como provados: A presente execução não foi movida contra a agravante, mas contra o seu marido, o executado C, e outros.No decurso da execução, que teve como fundamento títulos executivos (letras de câmbio) em que o C foi avalista, foi penhorado o prédio urbano composto de casa de rés-do-chão, primeiro andar e quintal, com as áreas, respectivamente, de 77 m2 e 193,30 m2, descrito na Conservatória do Registo Predial de Santo Tirso sob o nº 49513. A agravante foi citada em 29-3-1996 para os fins do disposto no artº 825 do CPC a fim de no prazo de 10 dias requerer a separação de bens ou juntar aos autos certidão da pendência de outro processo em que a separação já tenha sido requerida. A D propôs, em 26-4-96, acção de separação de bens contra seu marido, o executado C. O C e a D eram casados, ao tempo da penhora, no regime de comunhão geral de bens. A acção de separação de bens foi autuada por apenso à execução, mas o Mmº Juiz julgou-se incompetente para o prosseguimento daquela acção, sendo competente o Tribunal de Círculo. Em requerimento de 14-2-97 a D veio peticionar a suspensão da execução, o que foi deferido por despacho de fls. 79. A exequente interpôs recurso, que foi recebido. Apresentadas alegações, não houve contra-alegações e o Mmº Juiz, por despacho de 25-6-97, reparou o agravo e declarou sem efeito o despacho que ordenara a suspensão da execução. Designado o dia 21-11-97 para a abertura das propostas veio a D lavrar protesto a que se refere o art. 910 do CPC, reivindicando para si a propriedade do imóvel. Tal requerimento foi indeferido com fundamento em que a requerente não era terceiro. O prédio foi adjudicado a E pelo preço de 10000000 escudos. Consigna-se ainda que: o referido despacho de 25-6-97 transitou em julgado, por não ter sido requerido o prosseguimento do agravo; a penhora foi efectuada por termo de 12-1-1995 (fls. 25) e inscrita no registo predial em 13-4-95 (fls. 36); a exequente, ao nomear o prédio à penhora, requereu a notificação do cônjuge, a D, para requerer a separação de bens. III- Quanto ao mérito do recurso: Da conjugação do disposto nos artºs 16º, 25º e 26º do Dec-Lei nº 329-A/95, de 12-12, e tendo-se em conta que, em 1-1-97, a execução se encontrava na fase de reclamação de crédito, resulta que o Cod. Proc. Civ., com as alterações de 1995/96, só é aqui aplicável quanto à tramitação do recurso e ao incidente do protesto pela reivindicação do prédio penhorado e vendido; quanto à penhora, designadamente em relação à legalidade e aos meios de reacção, não são aplicáveis aquelas alterações; isto será tido em conta na menção que se fizer das normas processuais. São suscitadas, no essencial, três questões: nulidade do despacho da 1ª instância; nulidade do acórdão recorrido; e admissibilidade do protesto pela reivindicação. Desde já se nota que o recurso não merece provimento, não se justificando sequer longas considerações. Ao despacho da 1ª instância é imputada a nulidade de falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito, prevista no artº 668º nº1 b) do cit. Cód.P.Civil. Como se tem entendido na doutrina e na jurisprudência, só é relevante, para este efeito, a falta absoluta de fundamentação (cfr. A.Varela, na Rev. Leg. J., 121º, p. 311), o que aqui se não verifica. De resto, tratando-se de despacho inserto em acta, a fundamentação pode não ser explícita e basta que ela resulte do seu contexto (cfr. acórdão deste tribunal de 14-12-94, no Bol. 442, p. 139). Acresce que, a ter havido nulidade, ela estaria suprida pelo acórdão da Relação, onde se fez desenvolvida fundamentação da mesma questão que tinha sido apreciada na 1ª instância. Alega a recorrente que o acórdão recorrido enferma da nulidade de excesso de pronúncia (alínea d) do cit. artº 668º nº1), por se ter substituído ao juíz da 1ª instância na aludida fundamentação. Porém, mesmo que o despacho da 1ª instância fosse nulo, cabia à Relação o suprimento dessa nulidade, nos termos do artº 715º nº1 do cit. Cod.P.Civil, aplicável ao recurso de agravo pelo seu artº 749º. De harmonia com o disposto nos artºs 825º e 1038º e segtes do cit. Cod.P.Civil (na redacção anterior a 1995/96), efectuada a penhora de bem comum do casal, o cônjuge do executado, que tivesse sido citado, a pedido do exequente, para requerer a separação de bens, podia, no prazo de 10 dias, requerer essa separação ou juntar documento comprovativo da pendência de acção intentada com esse objectivo, sob pena de a execução prosseguir no bem penhorado (artº 825º nºs 2 e 3), mas essa não era a única reacção que lhe estava permitida. Não podia deduzir embargos de terceiro, no caso de não haver lugar à moratória prevista no nº1 do artº 825º (al. c) do artº 1038º nº2), e daqui resulta que poderia deduzir esses embargos, no prazo de 20 dias, com o fundamento de a dívida exequenda estar sujeita a tal moratória. Aliás, a generalidade da doutrina e da jurisprudência reconhecia essa faculdade ao cônjuge do executado e atribuía ao exequente o ónus da prova do fundamento da exclusão da moratória, designadamente pela comercialidade substancial da dívida (cfr. Vaz Serra, na Rev. Leg. J., 114º, p. 192, e acórdão deste tribunal de 4-11-93, no Bol. 431, p.488). Na hipótese em causa, e em face do apontado regime legal, não se admitia, porém, o uso da acção de reivindicação, tanto mais que, nos embargos deduzidos pelo cônjuge do executado, o que está geralmente em discussão, além da origem da dívida, não é a posse mas a natureza dos bens penhorados, dada até "a equivocidade de toda a posse na sociedade conjugal, pela impossibilidade de distinguir os actos de posse individuais dos cônjuges sobre os bens que formam cada um dos patrimónios" (Ans. Castro, na Acção Executiva ..., p. 353). Aquela acção de reivindicação apenas poderá porventura justificar-se no caso de penhora de bem próprio do cônjuge do executado. No caso presente, a mulher do executado C não usou, oportunamente ou de modo eficaz, de algum dos meios de reacção que a lei lhe facultava contra a penhora de bem comum do casal. Ficou assim excluída a possibilidade de discussão sobre a natureza da dívida exequenda ou a legalidade da penhora e, além disso, tratando-se de bem comum, não havia lugar à acção de reivindicação, o que, aliás, seria incompatível com o prosseguimento da execução previsto no nº3 do cit. artº 825º. Isto implicava, desde logo, o indeferimento do protesto pela reivindicação, uma vez que ele pressupunha, necessariamente, a possibilidade da respectiva acção. Acresce que a recorrente, cônjuge do executado, era "terceiro", em relação à penhora, tal como se prevê no artº 1037º nº2 do Cod.P.Civil (na redacção anterior a 1995/6) ou nos seus artºs 351º e segtes (na redacção actual), mas já não assumia essa qualidade na data em que pretendeu lavrar o protesto. Na verdade, com a sua citação para a execução e possível intervenção nesta para defesa dos seus interesses, ela passou a poder interferir, directa e pessoalmente, na relação jurídica processual, adquirindo assim a qualidade de "parte" em relação aos actos posteriores ao seu chamamento (cfr. A. Reis, no Comentário ..., 1º, p. 91, e A. Varela e outros, no Manual ..., p. 108). Finalmente, os preceitos constitucionais invocados pela recorrente (artºs 13º nº2 e 18º nº2 da Constituição) em nada colidem com as normas processuais que aqui são apreciadas e aplicadas. Em conclusão: O cônjuge do executado que, citado para a execução nos termos do artº 825º do Cod.P.Civil, depois de penhorado bem comum do casal, não tiver deduzido qualquer oposição de modo oportuno e eficaz, não goza de legitimidade, na altura da venda, para o incidente de protesto pela reivindicação, previsto no artº 910º nº1 do cit. Código. Pelo exposto: Nega-se provimento ao recurso. Custas pela recorrente. Lisboa, 9 de Fevereiro de 1999. Martins da Costa, Pais de Sousa, Afonso de Melo. |