Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
063231
Relator: JOSE FERNANDES
Descritores: CONTAGEM DOS PRAZOS
DELIBERAÇÃO SOCIAL
UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Nº do Documento: SJ197103160632312
Data do Acordão: 03/16/1971
Votação: UNANIMIDADE
Referência de Publicação: LIVRO 2 , F.241
DG IS DE 1971/04/15, PÁG. 525 - BMJ Nº 205, ANO 1971, PÁG. 115 -
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PARA O PLENO
Decisão: TIRADO ASSENTO.
Indicações Eventuais: ASSENTO DO STJ.
Área Temática: DIR CIV - TEORIA GERAL.
Legislação Nacional: LSQ ARTIGO 46 PAR1 PAR2.
CPC61 ARTIGO 396 N3.
CCIV867 ARTIGO 562.
LULL ARTIGO 73.
EJ62 ARTIGO 260.
Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃO STJ DE 1970/01/30 IN BMJ N193 PAG319.
ACÓRDÃO STJ DE 1967/05/19 IN BMJ N167 PAG444.
ASSENTO STJ DE 1966/11/04 IN RLJ ANO100 PAG86.
Sumário :
Por força do disposto na segunda parte do artigo 562 do Codigo Civil de 1867, o termo de prazo para pedir a anulação ou a suspensão de deliberações sociais transferia-se para o primeiro dia util seguinte ate ao encerramento da secretaria judicial.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

"A, Limitada", interpos recurso para Tribunal Pleno do acordão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 30 de Janeiro de 1970, proferido na acção de suspensão de deliberação social proposta por B com o fundamento de estar em oposição com o acordão deste mesmo Tribunal, de
19 de Maio de 1967, transitado em julgado e publicado no Boletim do Ministerio da Justiça, n. 167, pagina 444, sobre a mesma questão de direito, ambos proferidos no dominio da mesma legislação.
O recurso foi admitido pela Secção, tendo seguido os seus tramites normais.
Tudo visto e decidindo:
Estabelece o artigo 46 da Lei das Sociedades por Quotas, de 11 de Abril de 1901: "O socio que houver tomado parte em qualquer assembleia geral ou em qualquer deliberação escrita, nos termos da ultima parte do paragrafo 2 do artigo 36, podera protestar perante notario contra as resoluções contrarias a lei ou ao contrato de sociedade, no prazo de cinco dias a contar da assembleia geral, ou a da data em que tiver dado o seu voto escrito.
1 - A acção de anulação das deliberações tomadas deve ser distribuida no prazo de vinte dias a contar do protesto.
2 - A suspensão das deliberações deve ser requerida no prazo de cinco dias, a contar do protesto, devendo produzir-se o instrumento deste ou copia legal, e justificar-se a qualidade de socio".
O artigo 396 do Codigo de Processo Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n. 44129, de 28 de Dezembro de 1961, veio alterar aquele artigo, eliminando o protesto para a suspensão das deliberações sociais ou para a sua anulação ordenando que os prazos para a instauração das respectivas acções se contassem da data das deliberações sociais.
O artigo 562 do Codigo Civil de 1867 preceitua:
"O dia em que começa a correr a prescrição conta-se por inteiro, ainda que não seja completo, mas o dia em que a prescrição finda deve ser completo". E de notar, porem, que o artigo 260 do Estatuto Judiciario determina que as secretarias judiciais fechem as 17,30 ou as 17 horas, conforme se localizem em Lisboa ou Porto ou noutras localidades; aos sabados fecharão as 13 horas.
Foi no dominio desta legislação que foram proferidos os dois acordãos em oposição.
No de 19 de Maio de 1967 decidiu-se que a acção de anulação de uma deliberação social tomada em 14 de Abril de 1965 tinha caducado por a respectiva petição inicial ter entrado em juizo no dia 4 de Maio seguinte; devia ter entrado em 3 de Maio ate a hora do encerramento da secretaria judicial. No acordão de 30 de Janeiro de 1970 decidiu-se que foi proposta em tempo a acção de suspensão da deliberação social ai referida, tomada em 30 de Maio de 1966, se a petição respectiva foi apresentada em 4 de Junho seguinte; isto porque o artigo 562 do Codigo Civil de 1867 ordena que o ultimo dia do prazo seja completo.
Foi no dominio da legislação referida, a mesma, que os dois acordãos apresentaram soluções opostas relativamente a mesma questão fundamental de direito: como se contam os prazos de cinco e vinte dias para a propositura das acções de suspensão e anulação de deliberações sociais? Ambos se contam a partir das datas dessas deliberações; mas o ultimo dia tem de ser completo, como ordena a ultima parte do artigo 562 do Codigo Civil de 1867?; ou pode terminar antes das 24 horas do ultimo dia, isto e, o ultimo dia termina as 17,30 ou 17 horas, com o encerramento das secretarias judiciais?
O assento de 4 de Novembro de 1966 estabeleceu o seguinte: "no computo do prazo estabelecido no artigo
46, paragrafo 1, da Lei de 11 de Abril de 1901, deve observar-se o preceituado no artigo 562 do Codigo Civil".
Anotando-o, o Professor Vaz Serra concorda com a doutrina por ele estabelecida de que aos prazos de caducidade são aplicaveis as regras legais sobre o computo dos prazos de prescrição, entre elas o artigo 562 do Codigo Civil de 1867; dai que, "devendo ser completo o dia em que o prazo de caducidade finda, não se respeitara esta regra se se entender que o prazo para a acção de anulação de deliberações sociais,fixado no paragrafo 1, do artigo 46 da Lei de 11 de Abril de 1901 (com a alteração derivada do artigo 396, n. 3, do Codigo de Processo Civil), finda a hora a que, no ultimo dia, fecha a secretaria judicial" (Revista de Legislação e de Jurisprudencia, ano 100, pagina 86).
O assento estabelece a doutrina a seguir para a contagem do prazo dentro do qual devem ser propostas as acções de anulação de deliberações sociais, não se referindo as acções de suspensão. Como a suspensão e anulação são actos diferentes, podera dizer-se que não se verifica a oposição invocada dos dois acordãos do Supremo Tribunal de Justiça, acima referidos. Preferimos a solução contraria, porque, como sustenta Alberto dos Reis, " ha oposição susceptivel de servir de fundamento a recurso para o tribunal pleno, mesmo quando a questão final decidida nos acordãos seja diversa, se, para a decidirem, os acordãos tiverem de se pronunciar primeiro sobre a mesma questão de direito e se pronunciarem sobre ela em sentidos opostos" (Codigo de Processo Civil Anotado, volume VI, pagina 250).
Ora os acordãos em referencia tiveram de se pronunciar sobre o problema, para resolverem a questão final, o problema da contagem dos prazos fixados na lei para a propositura das respectivas acções - prazos que, sendo de caducidade, devem ser submetidos a mesma disciplina juridica.
Entende-se, pois, que existe a oposição justificativa do recurso para tribunal pleno, havendo lugar a proferir-se assento.
Aquele assento de 4 de Novembro de 1966 apreciou e decidiu apenas se a regra aplicavel, no computo do prazo estabelecido no artigo 46, paragrafo 1, da Lei 11 de Abril de 1901, era a do artigo 562 do Codigo Civil ou a do artigo 73 da Lei Uniforme, pois foi isso apenas o que nele se discutiu (ver Revista de Legislação e de Jurisprudencia, ano 100, pagina 367 - Professor Vaz Serra).
O artigo 562 do Codigo Civil, aplicavel a contagem dos prazos de caducidade das acções de suspensão e anulação das deliberações sociais a que se refere o artigo 46 da Lei das Sociedades por Quotas, alterado pelo artigo 396 do Codigo de Processo Civil de 1961, manda contar por inteiro o dia em que o prazo começa a correr, ainda que não seja completo; mas o dia em que o prazo termina deve ser completo.
Em obediencia a este preceito, o ultimo dia do prazo tem de ser completo, terminando portanto as 24 horas.
Mas, se o prazo para propor uma acção de anulação ou de suspensão de deliberação social termina as 24 horas do ultimo dia e as secretarias judiciais encerram normalmente as 17 ou 17,30 horas, ha que apresentar a respectiva petição inicial no dia seguinte ao termo do referido prazo, o que corresponde a dilatação do prazo legal. Mas, se se entender que o ultimo dia do prazo termina a hora do encerramento das secretarias judiciais, o prazo sera encurtado, não se cumprindo com o estabelecido na ultima parte do artigo 562.
O preceito que manda encerrar as secretarias judiciais as 17, 17,30 ou as 13 horas (aos sabados) e de caracter puramente burocratico, não pretendeu reduzir ou afectar os prazos marcados na lei civil para a propositura de acções. Deve, pois, dar-se inteiro cumprimento a ultima parte do artigo 562 do Codigo Civil de 1867, transferindo-se o ultimo dia do prazo para o dia seguinte.
Nestes termos, julgando-se existente o conflito de jurisprudencia entre os mencionados acordãos de 19 de Maio de 1967 e de 30 de Janeiro de 1970, profere-se o seguinte assento, com a seguinte redacção:
"Por força do disposto na segunda parte do artigo 562 do Codigo Civil de 1867, o termo do prazo para pedir a anulação ou a suspensão de deliberações sociais transferia-se para o primeiro dia util seguinte ate o encerramento da secretaria judicial".
Nega-se, portanto, provimento ao recurso interposto por "A, Limitada", que pagara as respectivas custas.

Lisboa, 16 de Março de 1971

Jose Antonio Fernandes (Relator) - Ludovico da Costa - Fernando Bernardes de Miranda - Antonio Acacio de Oliveira Carvalho - Eduardo Correia Guedes - Adriano Campos de Carvalho - Adriano Vera Jardim - Antonio Pedro Sameiro
- J. Santos Carvalho Junior - Alberto Fernandes Nogueira - João Moura - Eduardo Arala Chaves - Manuel Falcão Nunes Garcia - Albuquerque Rocha.