Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
04B2753
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: PEREIRA DA SILVA
Descritores: BANCOS
DEPÓSITO BANCÁRIO
SOLIDARIEDADE
CONTA CONJUNTA
CONTA SOLIDÁRIA
CONTA DE DEPÓSITO
CONTA BANCÁRIA
DOAÇÃO
ANIMUS DONANDI
TRADIÇÃO DA COISA
Nº do Documento: SJ200510060027532
Data do Acordão: 10/06/2005
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: T REL LISBOA
Processo no Tribunal Recurso: 2339/03
Data: 07/09/2003
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA.
Sumário : I. No depósito bancário colectivo e solidário, no concernente à propriedade da quantia depositada, importa ter presente o prescrito no art. 516º do CC.
II. Se o simples facto de se consentir na constituição de um depósito bancário, solidário, em nome, simultaneamente, do dono do dinheiro e de terceiro(s) não permite, sem mais, concluir no sentido ocorrência de "animus donandi", por banda do primeiro, deve ter-se como acontecida doação, acompanhada de tradição (simbólica) do bem doado (dinheiro), o que releva visto o disposto no art. 947º nº 2 do CC, escrito não havendo, se provar a existência de "animus donandi", que foi intenção do titular da conta solidária que depositou o numerário, que este passasse a ser propriedade do(s) outro(s) titular (es), este(s) podendo dele dispor como entendesse(m).
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:


I. a) A 95-10-30 (cfr.carimbo aposto a fls.2 e art.267º nº1 do CPC), A, intentou acção de restituição de posse, com processo especial, contra B, C, D e E, nos termos e com os fundamentos seguintes, em síntese:

Em 13-11-94, no estado de viúva e sem herdeiros legitimários, faleceu F à qual sobreviveram, como herdeiros legítimos, a autora (irmã), G e B (sobrinhos), filhos de H (irmão), pré-falecido, em 11-07-78, a herança de F ainda não partilhada estando, tal pessoa contitulando com os demandados di versos depósitos bancários, os réus se tendo apropriado de quantias desses depósitos.

Concluiu impetrando a condenação, na restituição à sua pessoa, da posse das seguintes quantias, por parte dos demandados:

O réu B: 2.114.238$00, a título de capital, e juros vincendos, à taxa anual de 10%, desde a citação até integral pagamento.

O demandado C: l.965.690$07 (capital) e juros legais sobre tal montante, à taxa anual predita, desde a citação até integral pagamento.

O réu D: 1.965.734$70 (capital) e juros legais sobre tal quantitativo, à taxa de 10% ao ano, desde a citação até integral pagamento.

E: 4.248.029$10 e juros, desde a citação até integral pagamento, à taxa anual supra-citada.

b) Contestaram os réus, concluindo no sentido da improcedência da acção.

c) Após réplica da autora, elaborado foi despacho saneador tabelar e organizados especificação e questionário, contra os quais, sem êxito, reclamou a autora.

d) Cumprido que foi o demais legal, veio a acção a ser julgada parcialmente procedente, com condenação:

1. Do réu B: a restituir à autora a posse da quantia de 2.114.238$00 (10.547,77 euros), acrescida de juros desde a citação (18.4.96), à taxa legal de 10%, "sendo de 7% desde 17.4.99 até integral pagamento";

2. Do réu C:" a restituir à autora a posse da quantia de 1.965.664$00 (9.804,69 eures) acrescida de juros desde a citação (4.12.95) à taxa legal de 10%, sendo de 7% desde 17.4.99 até integral pagamento;"

3. Do réu D: " a restituir à autora a quantia de 1.965.734$00 (9.805,04 euros) acrescida de jures desde a citação (11.12.95) à taxa legal de 10%, sendo de 7% desde 17.4.99 até integral pagamento;"

4. Da ré E:" a restituir à autora a quantia de 3.127.267$00

(15.598,74 euros) acrescida de juros desde a citação (5.12.95) ; à taxa legal de 10% sendo de 7% desde 17.4.99 até integral pagamento.

e) Com o sentenciado se não tendo conformado, apelaram os réus E, D, B e C.

Na alegação oferecida, em que propugna a bondade da revogação da sentença recorrida, com consequente absolvição sua de devolver qualquer quantia à apelada, tirou a ré as seguintes conclusões:

"I - O Meretíssimo Juiz do Tribunal "a quo" atribuiu ao presente recurso efeito meramente devolutivo, conforme art. 792º do Código de Processo Civil, contudo, porque o valor da acção é de 10.293.697$00, isto é , 51.344,74 euros, de harmonia com o disposto no art. 462º, a acção deve seguir a forma de processo ordinário, e, assim, quanto a recursos, salvo o devido respeito, não deverá ser atribuído ao mesmo o efeito meramente devolutivo, mas sim o efeito suspensivo, "ex vi" do artigo 463º Nº 3 alínea b) tendo em conta a reforma processual de 1995, operada pelo Decreto-Lei 329-A/95 de 12 de Dezembro.

II - A recorrente foi condenada no pagamento recorrida de 3.127.267$00.

III - Porém, a apelante nada deve à apelada.

IV - Na verdade, a sentença dá por provado, que o depósito "sub-judice" existiu pelo menos até 10.11.94 e não retira do facto qualquer consequência.

V - Contudo, à data do falecimento da F o depósito já não existia, pois a 11.11.94 foi dada ordem legitima e eficaz no sentido da liquidação dos depósitos e, assim, não existindo o depósito, o mesmo não integrava o acervo da herança da falecida.

VI - Por que assim se não entenda, subsistem razões que permitem fundar a inexistência de qualquer de restituir por parte da apelante.

VII - Pois, é verdade que o Tribunal "a quo" dá por provado que a parte da F era de 1.966.988$00 e não retira desse facto a única consequência possível, ou seja, que o restante seria "in totum" da E.

VIII- Mas nem essa quantia deve ser objecto de restituição, pois, provou-se que a referida importância de 1.966.988$00 foi. doada à ora apelante.

IX - Na sua fundamentação a sentença recorrida qualifica incorrectamente o "quid" doado, que se traduziu na outorga donatária de um direito de crédito e não na doação de coisa móvel.

X - Aliás, e novamente com o devido respeito, não se poderá concluir que um depósito consubstancie uma doação de coisa móvel.

XI - É que o depósito bancário teve um carácter instrumental face à inequívoca intenção da doadora doar à donatária o que doou, como forma de agradecimento pelo carinho e cuidado por esta prestados.

XII - A sentença recorrida dá por provado que a quantia de 1.966.988$00 foi doada a E pelo facto de esta ter cuidado da falecida F com todo o carinho nos últimos anos de vida desta, tendo inclusivamente diligenciado no sentido de proceder ao seu funeral.

XIII - O Meretíssimo Juiz do Tribunal "a quo" qualifica de inválida a aludida doação, mas, com o devido respeito, recorre a uma fundamentação meramente formal que desconsidera a relevância em relação ao caso concreto, indo contra a inequívoca intenção da doadora.

XIV - Mesmo que outro entendimento se perfilhe sempre se terá que entender que na esteira da doutrina expandida no acórdão do Venerando Tribunal da Relação do Porto, de 21.05.92, in BMJ 417-821, isto é, que existindo - como existiu de facto-tradição da coisa, a doação é válida.

XV - Desta forma, tendo a doação por objecto a outorga de um direito de crédito, a tal doação não se aplica o nº 2 do art. 947º, mas sim o princípio da liberdade de forma ínsito no art. 219º do Código Civil.

XVI - Pelo que é lícito concluir que os depósitos de que a apelante era titular com a F não existiam à data da sua morte, mesmo que assim se não entenda, à F só pertencia, como se provou, a quantia de 1.966.988$00, pelo que se a doação não existisse a E só teria que devolver essa quantia herança, pois o restante era seu, mas existindo, como existe, a doação, a E nada tem a restituir.

XVII - A "F", como já se disse sobejamente, faleceu em 13.11.94, e, nesta data os depósitos contitulados com a E já não existiam - assim ficou expresso na douta sentença onde se afirma

peremptoriamente que os mesmos existiram pelo menos até 10.11.94 - não tendo o Meretíssimo Juiz do Tribunal "a quo" valorado o documento junto com a contestação "doc. 1", mas o certo é que o especificado na alínea H encontra-se em nítida contradição com a resposta ao quesito 2º, daí que os fundamentos sentença estão, salvo o devido respeito, que é muito, em contradição com a decisão".

Eis as conclusões tiradas pelo réu D na sua alegação:

"I. - À presente apelação deverá ser atribuído efeito suspensivo e não meramente devolutivo, porquanto com a reforma processual de 1995, esta acção especial de restituição de posse, devido ao seu valor ( 10.293.697$00 ou 51.344,74 euros), passou a reger-se pelas regras do processo ordinário o regime dos recursos do processo ordinário, o que tem aplicação no caso concreto, nos termos do art. 463º, nº 3 do CPC.

II - As contas bancárias abertas em nome da autora da sucessão e do aqui apelante D foram constituídas em regime de solidariedade, pois só assim foi possível o aqui apelante proceder ao levantamento desses dinheiros após o óbito da autora da sucessão, mesmo sem a assinatura desta.

III - A abertura das contas bancárias em nome da autora da sucessão e do aqui apelante D ficou a dever-se a uma doação dos montantes nessas contas depositados que a falecida F quis fazer ao aqui apelante como forma de pagamento pelos serviços que lhe prestou, no entanto a referida F fez esta doação de forma condicional, visto ter reservado para si o usufruto dessas verbas, já que ela também era uma das titulares das contas e como tal podia-as movimentar livremente.

Todavia,

A doação dos montantes depositados, feita pela falecida F em favor do aqui apelante, operou-se logo com a constituição dos depósitos bancários, porque a partir desse momento o ora apelante passou a ser proprietário das verbas depositadas e como tal a poder movimentá-las livremente, sem a assinatura da autora da sucessão, atento o regime de solidariedade das contas bancárias.

Portanto,

IV - Tratou-se de doação remuneratória (a forma da doadora autora da sucessão recompensar o donatário aqui apelante pelos serviços que este lhe prestou), condicional (porque com reserva de usufruto para a doadora), de coisa móvel (dinheiro) e acompanhada de tradição do dinheiro doado da doadora para o donatário, operada no momento em que a autora da sucessão doadora constituiu os depósitos bancários com o aqui apelante D donatário, logo uma doação válida e legal, nos termos das disposições conjugadas dos arts. 513º, 940º, 941º, 947º, nº2, 954º, 958º, 959º, todos do Cód. Civil.

Tudo visto,

E sempre com vénia,

V - Conclui-se que a decisão do Meretíssimo Juiz "a quo", salvo o devido respeito, não aplicou justamente os vários preceitos legais antes citados (arts. 462º, 463º, nº3, alínea b), 692º, todos do CPC e arts. 513º, 940º, 941º, 947º, nº 2, 954º, 958º, 959º, todos do Cód.Civil), o que vale como fundamento de direito, para pedir-se e obter-se, enfim, a revogação da sentença, com absolvição do réu D a restituir à autora o citado em I. d) 3".

Conclusões na apelação de B:

1. O ora co-réu filho de H, falecido em 11/ 07/78, irmão de F que faleceu em 13-11-94 e da autora que faleceu em 03/06/98.

2. O processo de imposto sucessório nº 6743, instaurado em 19/09/95 por óbito de F encontra-se pendente de outras coisas, sendo uma delas este processo.

3. Em 23-03-01 foram julgados habilitados a suceder a A os requerentes I e J.

4. O ora co-réu contitulava com F as contas do nº 536.101-6 e DP nº 536.234-8 do Banco K, balcão da Rua de Ouro.

5. A conta DP n 536.234-8 do K, balcão da Rua do

Ouro, foi aberta simultaneamente pela falecida tia e pelo réu B no mês de Julho de 1997 com uma verba que significou o reconhecimento e admiração de F polo co-réu e para pagamento de acções e serviços realizados pelo co-réu no interesse e sob a responsabilidade da falecida.

6. Nunca se verificou qualquer falta ou violação do ora co-réu.

7. B é depositante das contas e quantias já referidas, e como tal tem um direito de crédito sobre a entidade bancária.

8. Diferentemente, não ficou provado qualquer direito de propriedade e muito menos de posse da autora sobre as referidas quantias.

9. A autora ou os seus habilitados herdeiros não requereu qualquer processo de inventário por óbito de F, nos termos do art. 1326º e seg. do CPC.

10. Bem como nunca assumiu o cargo de cabeça-de-casal.

11. Nem a autora, nem os seus habilitados herdeiros, poderiam assumir o cargo de cabeça-de-casal por óbito de F.

12. Não pode assim a autora beneficiar de um direito de que não dispõe na sua esfera jurídica, pelas razões supra referidas, razões pelas quais deve ser revogada a sentença recorrida, absolvendo-se o réu do pedido.

Conclusões da alegação da apelação do réu C, o qual se bate pelo acerto da declaração de improcedência da acção, como, decorrência do provimento do recurso:

1. À presente apelação deveria ter sido atribuído efeito suspensivo (art. 692º do CPC), já que tendo sido invocada a questão da propriedade das quantias depositadas nas contas objecto dos presentes autos, e tendo as mesmas valor superior à alçada da Relação forma de processo a seguir à forma ordinária - cfr. art. 1034º nº2 do CPC.

2. Não resultou provado nos autos que era a autora a quem competia o exercício do cargo de cabeça-de-casal, na herança deixada por óbito de F Fernandes.

3. Era à autora a quem competia o ónus da prova de tal situação.

4. As determinações legais sobre o cabeça-de-casal têm carácter supletivo-art. 2048º do CC-não se podendo inferir dos factos provados sob os nºs 1,2 e 3 da douta sentença que à autora coubesse o cargo de cabeça-de-casal por óbito da irmã, F.

5. A acção possessória de restituição de posse visa, a restituição contra o esbulho ou privação da posse.

6. Os direitos de crédito são insusceptíveis de posse, e sendo um direito de crédito, o que assiste aos contitulares das contas perante o Banco depositante, não podia a ora apelado ter lançado mão da acção possessória.

7. Não foi feita prova nos autos de que as contas constituídas pela ora apelante e pela falecida F tivessem sido constituídas com dinheiro desta.

8. Competia à autora o ónus de provar tal factualidade.

9. Constando do processo todos os elementos de prova que servira de base à decisão sobre este ponto da matéria de facto, deverá a mesma ser alterada, ao abrigo do disposto no nº1 al. a) -1ª parte-do art. 712º do CPC, sendo modificada a resposta ao quesito 3º, não se considerando provado que as contas contituladas com o ora apelante tinham sido constituídas com dinheiro pertencente à falecida F, sendo reconhecido ao ora apelante o direito a metade das verbas depositadas nas contas contituladas com a falecida.

10. Sem conceder, e apenas por mera cautela e dever de bom patrocínio, sempre se dirá que a haver restituição das quantias depositadas em instituições bancárias, a taxa de juros a aplicar terá de ser a taxa de juros praticada pelas instituições onde se encontravam depositadas as quantias.

11. Face ao exposto, não fez o Mmº Juiz "a quo" correcta interpretação e aplicação do disposto nos art.s 1033º e 1034º nº2 a) do CPC e art.s 1251º, 2084º e 2088º do CC.

f) Por despacho de 11-03-03, procedeu-se à correcção do efeito do recurso, este se decidindo ser o suspensivo.

g) Os habilitados como herdeiros do A, falecida, intestada, a 03-06-98, I e J, não contra-alegaram.

h) o TRL, por acórdão de 09-07-03, "visto o disposto no art. 713 n. 5 do CPC", negou provimento aos recursos, confirmando "na íntegra a sentença recorrida, para cujos fundamentos" remeteu cfr. 519 a 534.

i) De tal acórdão trazem revista a ré, bem como os demandados C e D.

1. Na alegação de demandada, em que se defende a justeza da revogação da "douta sentença recorrida, absolvendo-se a ré, ora recorrente, de devolver qualquer quantia à autora, ora recorrida", apresentadas foram estas conclusões:

"I - Trata-se de recurso de revista do douto acórdão da 7ª Secção do Venerando Tribunal da Relação de Lisboa a fls... dos presentes autos, acórdão que confirmou "in totum" a douta sentença proferida pelo Meretíssimo Juiz da lª Secção da 9ª Vara Cível de Lisboa de fls. 435 a 447, proferida na acção de restituição de posse, com processo especial, em que a A.,ora recorrida, pede a condenação da Ré, ora recorrente, no pagamento de 4.248.029$10, acrescida de juros vincendos, à taxa anual de 10%, desde a data da citação até integral pagamento, fundamentando a sua pretensão na invocação de que tal quantia pertencia ao acervo da herança aberta pelo falecimento de F, de que a ora recorrida é irmã e herdeira.

II. - O douto acórdão recorrido, de harmonia com o disposto no nº 5 do art. 713º do Código de Processo Civil, remeteu para os fundamentos da decisão impugnada.

III - A recorrente foi condenada no pagamento à recorrida de 3.127.267$00.

IV - Porém, a recorrente nada deve à recorrida.

V - Na verdade, a sentença recorrida dá por provado que o depósito "sub judice" existiu, pelo menos, até 10.11.94 e não retira do facto qualquer consequência.

VI - Contudo, à data do falecimento da F, o depósito já não existia, pois, a 11.11.94, foi dada ordem legítima e eficaz no sentido da liquidação dos depósitos e, assim, não existindo o depósito, o mesmo não integrava o acervo da herança da falecida.

VII - Porém mesmo, que assim se não entenda, subsistem razões que permitem fundar a inexistência de qualquer obrigação de restituir por parte da ora recorrente.

VIII - Pois, é verdade que o Tribunal "a quo" dá como provado que a parte da F era de 1.966.988$00 e não retira desse facto a única consequência possível, ou seja, que o restante seria "in totum" da E.

IX - Mas nem essa quantia deve ser objecto de restituição, pois, provou-se que a referida importância de 1.966.988$00 foi doada ora recorrente.

X - Na sua fundamentação a sentença recorrida qualifica incorrectamente o "quid" doado, que se traduziu na outorga donatária

de um direito de crédito e não na doação de coisa móvel.

XI - Aliás, e novamente com o devido respeito, não se poderá concluir que um depósito bancário consubstancie uma doação de coisa móvel.

XII - É que, o depósito bancário teve um carácter instrumental, face à inequívoca intenção da doadora doar à donatária o que doou, como forma de agradecimento pelo carinho e cuidados prestados por esta.

XIII - A sentença recorrida dá por provado que a quantia

de 1.966.988$00 foi doada a E pelo facto de esta ter cuidado da falecida F com todo o carinho nos últimos anos de vida desta, tendo inclusivamente diligenciado no sentido de proceder ao seu funeral.

XIV - O Meretíssimo Juiz do Tribunal "a quo" qualifica de inválida a aludida doação, mas, com o devido respeito, recorre a uma fundamentação meramente formal que desconsidera a relevância em relação ao caso concreto, indo contra a inequívoca intenção da doadora.

XV - Mesmo que outro entendimento se perfilhe, sempre se terá que entender que, na esteira da doutrina expandida no Acórdão do Venerando Tribunal da Relação do Porto, de 21.05.92, in BMJ nº 417, pág. 821 isto é, que existindo e como existiu de facto - tradição da coisa, a doação é válida.

XVI - Desta forma tendo a doação por objecto a outorga de um direito de crédito, a tal doação não se aplica o nº 2 do art. 947º, mas sim o princípio da liberdade de forma ínsito no art. 21º do Código Civil.

XVII - Pelo que é lícito concluir que os depósitos de que a ora recorrente era titular com a F não existiam à data da sua morte, e mesmo que assim se não entenda, à F só pertenceria a quantia de 1.966.988$00, pelo que, se a doação não existisse a E só teria que devolver essa quantia à herança, pois o restante era seu, mas, existindo, como existe doação, a E nada tem a restituir.

XVIII - A "F", como já se disse sobejamente, faleceu em 13.11.94, e nessa data, os depósitos contitulados coma E já não existiam - assim ficou expresso na douta sentença onde se afirma peremptoriamente que os mesmos existiram pelo menos até 10.11.94, não tendo o Meretíssimo Juiz do Tribunal "a quo" valorado o documento junto com a contestação "doc. l", mas o certo é que o especificado na alínea H, encontra-se em nítida contradição com a resposta ao quesito 2º que os fundamentos da sentença estão, salvo o devido respeito, que é muito, em contradição com a decisão.

XIX - Deste modo, tendo a F falecido em 13.11.94, já tais depósitos não existiam, pelo que nunca poderiam fazer parte do acervo da herança aberta após o seu falecimento, e, assim ter-se-à que concluir que o Tribunal "a quo" não retirou as consequências de facto que se consideram relevantes para a douta sentença, tendo sido violado o disposto nas als. c) e d) do nº 1 do art. 668º do CPC, podendo tal violação ser modificada por V. Ex.s Venerandos Conselheiros, de acordo com o disposto na alínea b) do nº 1 do art. 712º do mesmo diploma legal."

2. Conclusões da alegação da revista de C, defendendo o acerto da revogação do acórdão citado em I h) e da improcedência da acção:

I - As disposições legais sobre a determinação de cabeça-de-casal têm carácter supletivo - art. 2084º do Código Civil.-não se podendo inferir que pelo facto da Recorrida ser a parente com grau mais próximo da falecida F, a ela lhe coubesse o cargo de cabeça-de-casal.

II - Era à recorrida, a quem, atento o carácter supletivo das disposições referentes à determinação do cabeça-de-casal, competia o ónus da prova de tal situação.

III - A acção possessória de restituição de posse visa a restituição contra o esbulho ou privação da posse.

IV - Os direitos de crédito são insusceptíveis de posse e, sendo um direito de crédito, o que assiste aos contitulares das contas perante o Banco depositante, não podia a ora Recorrida ter lançado mão da acção possessória.

V - Não foi feita prova nos autos que as contas contituladas pelo ora Recorrente e pela falecida F tivessem sido constituídas com dinheiro desta.

VI - Competia à A. o ónus de provar tal factualidade.

VII - Constando do processo todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre este ponte da matéria, de facto, e tendo sido, a questão colocada no recurso de Apelação, deveria o mesmo ter apreciado a questão colocada - alteração da matéria de facto ao abrigo do disposto no nº 1 alínea A) (1ª parte) do art. 712º ‘do C.P.C.

VIII - Não o tendo feito, enferma, nessa medida, o Acórdão recorrido de nulidade - art. 668º alínea d) do C.P.C.

IX- Sem conceder, e apenas por mera cautela e dever de bom patrocínio, o já referido a respeito da conclusão 10. da apelação.

X - Face ao exposto, fez o douto Acórdão do Tribunal da Relação da correcta interpretação e aplicação do disposto nos arts. 1033º e 1034º nº 2 a) do CPC e art.s 1251º e 2084º e 20088ºdo Código Civil.

3. Revista instalada por D:

Na alegação de fls. 574 a 578, as conclusões, afora, naturalmente, a I tirada em sede de apelação, são em tudo idênticas ás já noticiadas, formuladas na apelação que interpôs.

j) Não foram contra-alegadas as revistas.

k) Por acórdão de 18-05-04, 0 TRL, vista a arguição de nulidade dita, por parte do recorrente C, na alegação da revista, atendendo a pretensão do aludido réu, suprir a invocada nulidade, sem alterar, todavia, "o sentido do acórdão em crise." - cfr. fls. 620 a 624.

1. Foram colhidos os vistos legais.

II. Eis como se configura a materialidade fáctica que vem dada como assente pelas instâncias:

"1. Em 13/11/94 faleceu F, no estado de viúva e sem herdeiros legitimários (A);

2. A A. irmã de F (B);

3. G e B são filhos de H, irmã de F e da Autora (doc. fls.9,31 e 32) - (C);

4. O referido H faleceu em 11/7/78 (cfr.doc. fls. 9) (D);

5. As contas referidas em a) e b) de 14. eram contituladas com B, o 1º Réu (E);

6. As contas referidas em c) e d) de 14. eram contituladas com C, o segundo Réu (F);

7. As contas referidas em e) e f) de 14. eram contituladas com D, o terceiro Réu (G);

8. As contas referidas em g) e h) de 14. eram contituladas pelo menos até 10/11/94 com E, a quarta R (H);

9. Em 14-11-94,o R. B debitou a conta nº 53234-8 (D.P.), do K, pela quantia de 1.850.000$00 e debitou a conta nº 5536101-6 do K, pela quantia de 264.238$10 (I);

10. O Réu C debitou a conta nº 0697538061900, da Caixa Geral de Depósitos pela quantia de 168.063$60 e debitou a conta nº 0697538061620 da Caixa Geral de Depósitos pela quantia de 1.797.627$10 (J);

11. O Réu D debitou a conta nº 0697538060000, da Caixa Geral de Depósitos pela quantia de 168.107$00 e debitou a conta nº 0697538060820 da Caixa Geral de Depósitos pela quantia de 1.797.627$10 (L);

12. A Ré E debitou a conta nº 0697527714100, da

Caixa Geral de Depósitos pela quantia de 1.375.673$00 e debitou a conta nº 0697527714920 da Caixa Geral de Depósitos pela quantia de 2.872.356$10 (M);

13. O processo de imposto sucessório nº 6743, instaurado por óbito de F encontra-se pendente de outras causas sendo uma delas este processo (1º);

14. À data do seu falecimento, a F titulava as seguintes contas bancárias

a) D.0. 536.101-6 do K, balcão da Rua do Ouro, no montante de 277.752$80.

b) D.P. 536.234-8 do K, balcão da Rua do Ouro, no montante de 1.850.000$00.

c) .Depósito nº 0697538061900 da CGD, no montante de 169.365$60.

d) Depósito nº 0697538061620 da CGD, no montante de 1.797.627$10.

e) Depósito nº 0697538060000 da CGD, no montante de 169.361$60.

f) Depósito nº 0697538060820 da CGD, no montante de 1.797.627$10.

g) Depósito nº 0697527714100 da CGD, no montante de 1.415.190$00.

h) Depósito n 0697527714920 da CGD, no montante de 2.872.356$10 (2º).

15. Os depósitos referidos em 14.,a1 a) a f) foram constituídos com dinheiro pertencente a F, sendo - pelo menos - 1.966.988$00 dos depósitos referidos em g) e h) de 14. provenientes de dinheiro (e respectivos juros) depositado pela "F". A "F" tinha rendimentos provenientes de uma participação social na sociedade por quotas "L, Ldª", bem como de prédios sitos em Vila Franca de Xira que tinha arrendados (3º);

16. A conta de depósito a prazo especificada em 5. foi aberta simultaneamente pela falecida tia e pelo réu B, no mês de Julho de 1987, uma verba que significou o reconhecimento e admiração da F pelo réu e para pagamento de acções e serviços realizados pelo réu no interesse e sob a responsabilidade da falecida (5º);

17. As contas especificadas em 7. foram abertas, em vida da autora da sucessão, na sequência de uma doação, por si feita, a favor do réu D;

18. Tal doação ficou a dever-se ao facto de a autora da doação sempre ter manifestado a intenção de remunerar e réu D peles serviços que este lhe prestou (15º);

19. O réu D tratou de documentação vária de e no interesse de F, acompanhou-a em deslocações a Bancos, levou-a a médicos, acompanhou-a ao Tribunal de Vila Franca de Xira e cuidou dela em sua casa (17º);

20. Pelo menos a quantia de 1.966.988$00 dos depósitos referidos em 8. e 14., alíneas g) e h), provêm de verba (e juros dela decorrentes) doada à ré E pela F (21º);

21. A doação referida em 20. foi motivada pelo facto de, sendo e ré sobrinha da falecida F, ter cuidado desta com carinho, acolhendo-a em sua casa nos últimos anos de vida (22º);

22. Foi a E quem tratou de todas as diligências inerentes ao funeral da falecida, tendo inclusivamente sido ela a suportar do seu bolso todas as respectivas despesas, no montante de 442.963$00 (23º).

III. a) Mantendo-se válida a doutrina do Assento nº 14/94, de

26-05-94, hoje com o valor assinalado no artº 17º nº 2 do DL nº 329-A/95, de 12 de Dezembro, dúvida não sofre que o STJ pode ser vir-se de qualquer facto que, apesar de não ter sido utilizado pela Relação, deva considerar-se adquirido desde a lª instância (cfr., neste sentido, acórdão deste Tribunal, de 23-01-01 - P. nº 3781/00-lª-"Sumários", 47º).

Por assim ser, encontrando-se, à data da prolação do despacho de condensação, incontrovertido que as contas bancárias referidas em II. 14. c) a h) podiam ser movimentadas com a assinatura de qualquer dos seus titulares, tal, ora, como provado se considera, pese embora não ter sido especificado, nem como provado tido na sentença apelada e no acórdão recurso.

b) N havendo lugar ao fazer jogar o disposto nos art.s 722º nº 2 e 729º, ambos do CPC, nem se estando ante qualquer das hipóteses contempladas no art. 729º nº 3 de tal Corpo de Leis ( é patente a inocorrência da contradição referida na conclusão XVIII da alegação da revista da ré), cumpre aplicar o vertido no art. 729º nº1 do CPC à factualidade elencada em II. e a) que antecede.

IV. Das arguidas nulidades:

1. A nulidade do acórdão de 09-07-03, invocada pelo réu C (conclusões V a VIII da alegação), essa, foi suprida, nos termos consentidos pelo art. 668º nº 4, aplicável por força dos art.s 716º e 726º, todos do CPC - cfr. I. k).

2. Das nulidades invocadas pela ré (conclusões XVIII e XIX da alegação apresentada):

o acórdão impugnado foi proferido por remissão, ao abrigo do art. 713° nº 5 do CPC.

Perfila-se patente que a decisão impugnada, para cujos fundamentos remete o acórdão sob recurso, não enferma da nulidade, a que se refere o art. 668º nº 1 c) do CPC, não se antolhando qualquer oposição entre os fundamentos a decisão, enfim, a construção viciosa consistente, nas palavras de Alberto dos Reis, em os fundamentos invocados conduzirem, logicamente, "não ao resultado expresso na decisão, mas a resultado oposto" (in "Código de Processo Civil Anotado", vol. V, pág. 141 ).

Na verdade:

Do especificado sob a al. h), não resulta, inexoravelmente, tal é apodíctico, que à data do decesso de F, já não existiam as contas bancárias referidas m II. 14. g) e h).

Do dar-se como provada a contitularidade, em contas bancárias, pelo menos até 10-11-94, não flui, sem mais, que aquela não era realidade a 13-11-94!...

Nem se divisa a bondade da arguição de nulidade a alude o art. 668º nº 1 d) do CPC (omissão de pronúncia e (ou) pronúncia indevida), esta por fonte tendo infracção ao dever consignado no art. 660º nº 2 do CPC, normativo este devidamente observado, diga-se.

Há que não confundir tal nulidade com, em substância, sustentado erro de julgamento 1 ...

Face ao provado, à resposta, em súmula, que mereceu o quesito 2º, como familiar o acerto da improcedência da acção, no tocante à ré, no não integrarem os "depósitos bancários" referidos em II. 8. e 14. g) e h) a herança aberta por óbito de F?

Continuando:

V. 1. Visto o que delimita o âmbito do recurso (art.s 684º nº 3 e 690º nº1 do CPC), dir-se-à, liminarmente:

a) Quanto à titularidade, as contas bancárias com os nºs ditos em II.14. c) a h) - de que os ora recorrentes e F eram titulares -, como colectivas (plurais) e solidárias se devem qualificar, atento, outros sim, provado, citado em III a) vide, v.g., J.G. Pinto Coelho (in RLJ, Ano 81º, pág. 225), Menezes Cordeiro ("Manual de Direito Bancário"- Almedina, Coimbra, 1998-, pág.461) e Paula Ponces Camanho ("Do Contrato de Depósito Bancário" - Almedida, Coimbra, 1998-, págs. 130 e segs.)

b) Como salienta J. G. P. Coelho, in RLJ, Ano 81º, págs. 227 e segs., outra não sendo a tese sustentada, entre outros, nos acórdãos deste Tribunal, de 20-01-99 e 17-06-99 (CJ/Acs. STJ - Ano VII-tomo I, págs. 48 a 50, e tomo III, págs. 152 e 153", o depositante como credor solidário, tem apenas um direito de crédito, isto é o direito de receber a prestação a que está adstrito o devedor, o direito a exigir a entrega do depósito", direito esse que não pode confundir-se com a propriedade da quantia depositada, no depósito bancário colectivo e solidário importando ter presente o prescrito no art. 516º do CC..

Regressando à hipótese vertente:

2. No concernente à revista instalada por C:

a) Conclusões I e II:

O "cabeça-de-casal tem existência jurídica desde a morte do autor da herança, e isto independentemente de ter havido inventário para a respectiva partilha", a qualidade de cabeça-de-casal tendo a pessoa"a quem pertencia tal encargo se o inventário fosse, efectivamente, distribuído em juízo"- cfr. Lopes Cardoso, in "Partilhas Judiciais"-Almedina, Coimbra 1979-,vol. I, págs. 264 e 265.

Por tal razão, sem embargo do prescrito no art. 2084º do CC, considerado o apurado (II. 1. a 4.) e o disposto nos art.s 2080º nºs 1. c) e 2. e 2133º nº1 do CC, infere-se, o que em crise não é posto por C, note-se, que cabeça- de-casal da herança aberta por óbito de F, à data da propositura da acção a autora, com legitimidade, consequentemente, para peticionar nos termos acontecidos (art. 2088º nº 1 do CC). Conclusões III. e IV:

Se os direitos de crédito não são susceptíveis de posse defensável através de acção possessória, acontece que A não lançou, patentemente, mão desta acção, visando a defesa de direitos de crédito dos titulares de depósitos bancários, colectivos e solidários sobre os bancos depositários, sim, é flagrante, a entrega de dinheiro (coisa móvel, qualidificável, como destacado na sentença apelada, enquanto espécie monetária, como coisa representativa - art.s 202º nº 1 e 205º nº 1 do CC-), alegadamente integrante da herança aberta por óbito de F, a qual a autora devia administrar (art. 2079º do CC), indevidamente em poder dos réus, ao abrigo, repete-se, do art. 2088º nº 1 do CC.

Falece, por via do dissecado, o à colação trazido nas quatro primeiras conclusões da alegação da revista interposta por C, em prol da bondade da sua pretensão recursória.

b) O mesmo sucede no que se refere às conclusões V,VI e IX.

Vejamos:

A autora, de tal tendo o ónus (art. 342º nº 1 do CC), logrou provar, ao arrepio do aduzido por C, que as contas bancárias referidas na conclusão V da sua alegação foram "constituídas" com dinheiro de F - cfr. resposta ao quesito 3º.

C, isso sim, é que não provou o que alegou, em prol do naufrágio da acção respeitante à sua pessoa, levado ao questionário - quesitos nºs 10 a 13 -, censura alguma, como decorrência de tal, merecendo a sua condenação no já noticiado, quanto a capital.

Acolhimento, igualmente, não merece o na conclusão IX sustentado.

Efectivamente:

o "quantum" de 9804,69 euros ficou, sim, em poder do réu, na sequência do provado -cfr. II. 10 -, imponde-se ter presente o disposto nos art.s 559º nº1, 804º n.s 1 e 2, 805º nº 1 e 806º n.s 1. e 2, todos do CC, Portaria nº 1171/95, de 25 de Setembro, e Portaria nº 263/99, de 12 de Abril.

Concluindo: não merece provilento a revista interposta por C.

3. Quanto às revistas interpostas por D e E:

a) Face à resposta que teve o quesito 2º, vítreo não ser lícito concluir nos termos explanados nas conclusões VI, XVII, XVIII e XIX da alegação da ré, isto é, que à data do óbito de F já não existiam os depósitos bancários referidos em II. 8. e 14 g) e h). Bem pelo contrário.

Da resposta a tal quesito e constante de III. a), resulta, antes, provado que tais contas bancárias e solidárias, colectivas e solidárias, de que eram titulares a ré e F, existiam à data da morte desta.

Considerada a significância das respostas restritivas e negativas a quesitos, atentando nas que mereceram os quesitos 2º, 3º, 20º, 21º a 24º, como, com acerto, concluir nos termos que as conclusões VIII e XVII da alegação da ré mostram, quanto à propriedade das quantias depositadas nas contas colectivas e solidárias citadas em II. 14. g) e h), no excedente a 1.966.988$00, sem esquecer, indevidamente, o disposto no art. 516º do CC (vide V. 1. b) )?

Não.

Contitulares solidários dos depósitos bancários referidos nesta alínea sendo a ré e F, quando esta faleceu, havendo presunção legal, na ilidida, de compropriedade, em partes iguais, dos valores depositados (art. 516º do CC), com justeza se condenou a recorrente a restituir à de mandante 1/2 da diferença entre a soma dos valores referidos em II. 14. g) e h) e ‘ 1.966.988$00, isto, isto, é 5.787,45 euros ( 1160.279$00) - vide fls. 460 e 461.

b) Os réus D e E foram condenados a restituir à autora, a título de capital, o montante citado em I d) 3. - 9.805,04 euros-, o primeiro, e a segunda, o excedente a 5.787,45 euros (= 9.811,29 euros), por se ter entendido serem nulas, por não efectuadas por escrito, ao contrário do imposto pelo art . 947º nº 2 do CC,"ex vi" de sustentada ausência de tradição do dinheiro doado, as doações e remuneratórias (art. 941º do CC) feitas a tais demandados, nos supracitados montantes, face ao apurado - cfr. II. 7,8,11,12,14,15 e 17 a 21- por F.

Com menos acerto se decidiu quanto a tal conspecto, em crise não se colocando, note-se, que não existe "animus donandi" pelo simples facto de se consentir na constituição de um depósito bancário, solidário, em nome, simultaneamente, do dono do dinheiro e de terceiro(s) - cfr. ac. deste Tribunal, de 08-05-73, in BMJ 227-133, nem que é nula (art. 220º do CC) a doação de coisa móvel, não feita por escrito, se desacompanhada de tradição daquela (vide Baptista Lopes, in "Das Doações, in " - Almedina, Coimbra, 1970-pag. 45).

No sentido da ocorrência de tradição, em hipótese em tudo idêntica à presente, em que o "animus donandi" é que conduziu à abertura de contas colectivas e solidárias (cfr. II. 17) ou acompanhou o depósito (vide II. 20), se pronunciou este Tribunal, por acórdão de 03/03/05, proferido nos autos de revista registados sob o nº 3711/04-2, com relato de Bettencourt de Faria, cuja doutrina, em absoluto, se perfilha e passa a transcrever:

"... 1. Os factos assentes indiciam que determinada pessoa manifestou a intenção de doar determinadas quantias, sendo que, para o efeito, constituiu contas conjuntas com os donatários.

A primeira questão que cumpre apreciar é a de saber se houve, ou não, tradição das quantias doadas, dado que, de acordo com o art. 947º do C. Civil, os requisitos formais da doação de móveis, dependem da existência da referida tradição.

A tradição é uma forma de conferir a alguém a posse de determinado bem, que se concretiza pela sua entrega feita pelo possuidor ao adquirente da posse e desdobra-se, por isso, na cessação da relação material com a coisa por parte do primeiro e no seu empossamento por parte do segundo: cf. o art 1263º alínea b) do C. Civil e Penha Gonçalves - Curso de Direitos Reais 2ª ed. 273-.

Diz este preceito que a tradição tanto pode ser material como simbólica. O que bem se compreende, uma vez que a disposição material de uma coisa - a sua posse - tanto pode resultar dum acto que confere de imediato essa disposição, como de um que apenas a torna possível.

Em qualquer das hipóteses o que releva é que o acto de entrega torna efectivo o apossamento da coisa.

No caso das contas conjuntas, que podem ser livremente movimentadas por qualquer dos seus titulares, o simples facto de existirem não significa que tenha havido a tradição das respectivas quantias entre os contitulares. O proprietário pode permitir que outrem disponha de coisa sua, sem que necessariamente queira com isso significar que lha dá. Pelo que a disponibilidade do contitular configura-se como mera detenção, por não ser a aparência de qualquer direito real.

Contudo, se também se provar que foi intenção do titular que depositou o numerário, que este passasse a ser propriedade do outro titular, podendo dele dispor como entendesse, então estamos face a uma doação acompanhada de tradição do bem doado.

E existe aqui tradição uma vez que o animus donandi é acompanhado duma entrega, aqui o depósito, ou seja um meio susceptível de tornar efectivo o apossamento, nos termos atrás consignados. Por outras palavras, a conta conjunta, que pode ser livremente movimentada por qualquer dos seus contitulares é um meio idóneo para operar a tradição entre eles das quantias depositadas." Sendo válidas as apuradas doações remuneratórias, por tradição do dinheiro doado se dever ter como acontecida, considerado o disposto no art. 940º nº 1 do CC, integral provimento merece a revista interposta pelo réu D e, em parte, o recurso da demandada.

VI. CONCLUSÃO:

Termos em que:

a) Se nega a revista interposta por C.

b) Se concede a revista instalada por D, tal demandado, consequentemente, se absolvendo de restituir o citado em I. d) 3.

c) Se concede, parcialmente, a revista da ré E tão só se condenando a restituir, a título de capital, 5.787,45 euros e juros de mora sobre tal montante, desde as datas é às taxas referidas em I. d) 4.

d) Quanto a custas:

1. O réu C, para além daquelas em que foi condenado nas instâncias, suportará as custas da revista que interpôs.

2. Da responsabilidade da ré, são as custas da revista que instalou e as atinentes e as atinentes às instâncias, na proporção do seu decaimento.

3. Todas as demais custas são da responsabilidade dos recorridos.

Lisboa, 6 de Outubro de 2005

Pereira da Silva,

Bettencourt de Faria,

Moitinho de Almeida.