Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:
"A", L.da" intentou, no Tribunal Judicial de Bragança, acção ordinária contra B e mulher C, peticionando a condenação dos réus a pagarem-lhe a quantia de 2.111.000$00 acrescida dos juros vincendos até integral pagamento.
Alegou para tanto, em síntese, que:
- se dedica à actividade de carpintaria e, nessa qualidade, executou trabalhos de carpintaria consistentes no fabrico de materiais e colocação em obra dos réus, reproduzidos nos orçamentos juntos;
- em 30 de Maio de 2001 foi notificada pelos réus da resolução do contrato de empreitada por estes, assim como para levantar todas as madeiras colocadas na obra sob pena de as levantarem à custa dela;
- os réus não quiseram manter o contrato e desistiram da empreitada, mas a autora havia executado trabalhos no valor de 2.111.000$00 que lhe não foram pagos, sendo credora dessa quantia.
Contestaram os réus e deduziram reconvenção, em que pediram a declaração de resolução do contrato de empreitada e a condenação da autora a pagar-lhes a quantia de 1.178.338$00 e juros legais até pagamento.
Alegaram, em suma, que:
- as madeiras a fornecer deviam ser de 1ª qualidade e secas e os tectos interiores e exteriores deveriam ser colocados com tratamento e acabamento de fábrica e as demais teriam verniz por conta dos réus;
- foi acordado o preço de 3.810.000$00 e a autora iniciaria os trabalhos logo que a obra estivesse pronta a recebê-los;
- a autora iniciou os trabalhos exteriores sem a obra estar pronta a recebê-los por falta de remate das varandas, tectos e beiral e a madeira colocada não correspondia à negociada;
- os tectos interiores foram mal colocados apresentando fissuras e empenos, desvios e desníveis, manchas e nós visíveis na madeira, que tornam a obra inaceitável;
- os réus reclamaram desses e de outros defeitos mas a autora insistiu na continuação da obra sem atender às reclamações;
- apesar disso iniciou a colocação do soalho, mas a madeira vinha com humidade e terra e eram notórias manchas amareladas, e nessas circunstâncias chamaram a atenção da autora para a madeira e informaram-na que caso não estivesse em condições não aceitariam aquele material;
- a autora colocou parte desse soalho, o qual apresentava empenos e manchas que atingiam a madeira em profundidade, e nem as ripas para suporte do soalho estavam bem colocadas pois estavam baixas e espaçadas demais, e calçadas;
- face a esses factos os réus reclamaram e disseram-lhe para não continuar os trabalhos até proceder à substituição das madeiras, o que a autora recusou;
- porque a autora continuava os trabalhos sem substituir os materiais estragados e depois de a avisarem de que não aceitariam a obra naquelas condições, em Dezembro informaram a autora que tinham perdido a confiança, que resolviam o contrato e devia proceder ao levantamento dos materiais colocados na obra que não aceitavam, o que incluía os tectos exteriores e os soalhos;
- a autora aceitou esse facto e procedeu ao levantamento do soalho e retirou da obra (nessa altura não eram ainda manifestos defeitos nas portas exteriores e nos tectos interiores que vieram a revelar-se) razão pela qual nessa altura quiseram acertar contas com a autora relativa às portas e aos tectos interiores do 1º andar desde que fossem eliminados alguns defeitos, o que a autora não quis;
- o resto da obra contratada não veio a ser executado;
- foi tentada a resolução amigável do litígio que não chegou a bom termo;
- por causa dessa actuação a obra atrasou de Janeiro a Julho de 2001, e os autores tiveram de suportar os juros com o empréstimo contraído para a sua construção e os encargos com a garantia bancária exigida pela Câmara Municipal, sem qualquer contrapartida no uso da moradia, e correspondente ainda a idêntico atraso na venda ou aluguer da casa onde habitavam e que contribuiria para amortização do financiamento e diminuição dos encargos bancários.
Respondeu a autora, aceitando alguns factos e impugnando outros em relação ao contrato e à reconvenção, sustentando não existir prazo para fazer a obra contratada e não ser responsável por compromissos com terceiros.
Exarado despacho saneador, condensados e instruídos os autos, procedeu-se a julgamento, com gravação da prova, vindo, depois, a ser proferida sentença em que se decidiu:
a) julgar improcedente a acção e, em consequência, absolver os réus do pedido;
b) julgar procedente a reconvenção e, em consequência, condenar a autora "A", L.da" a pagar aos réus B e mulher C, a quantia de 5.877,53 Euros (equivalente a 1.178.338$00) acrescida dos juros à taxa legal de 4%, deste a data da sentença até integral pagamento.
Inconformada apelou a autora, sem êxito embora porquanto o Tribunal da Relação do Porto, em acórdão de 25 de Novembro de 2004, julgou improcedente a apelação confirmando a sentença recorrida.
Interpôs, agora, a autora recurso de revista, pugnando pela revogação do acórdão recorrido e sua substituição por outro que julgue a acção procedente e improcedente a reconvenção.
Não houve contra-alegações.
Verificados os pressupostos de validade e de regularidade da instância, corridos os vistos, cumpre decidir.
Nas alegações do recurso a recorrente formulou as conclusões seguintes (sendo, em princípio, pelo seu teor que se delimitam as questões a apreciar - arts. 690º, nº 1 e 684º, nº 3, do C.Proc.Civil):
1. Resulta da matéria de facto provada, designadamente do ponto 29, que em inícios de Dezembro de 2000 os réus informaram a autora de que tinham perdido a confiança na realização dos trabalhos contratados pelo que resolviam o contrato.
2. A atitude dos réus, tomada em início de Dezembro de 2000 e posteriormente em Fevereiro e Março de 2001, é contrária à chamada hierarquização dos direitos do dono da obra, prevista no art. 1222º do C.Civil.
3. Com efeito, o dono da obra não pode, desde logo, lançar mão da redução do preço ou da resolução do contrato, sendo possível a rectificação da prestação imperfeita.
4. Deverá primeiramente exigir o cumprimento perfeito pela eliminação dos defeitos ou reconstrução da obra e só na hipótese de o empreiteiro, por impossibilidade, desproporcionalidade ou recusa, não renovar o cumprimento em conformidade com o contrato, nos termos devidos, é que o dono pode exigir uma redução adequada da sua contraprestação ou a resolução do contrato por incumprimento (nesse sentido, Ac. STJ de 02/12/93, in CJ 1993, III, pag. 157; Ac. RP de 25/05/92, in CJ 1992, III, pag. 291; e Ac. RL de 09/05/96, in CJ 1996, III, pag. 185).
5. No caso em apreço está assente nos pontos n°s 4 e 5 da matéria de facto dada como provada, que, por um lado, os réus comunicaram à autora a sua intenção de resolverem o contrato de empreitada e, ao mesmo tempo, aceitaram parte da obra, designadamente as madeiras colocadas nos tectos interiores do primeiro andar e a madeira das três portas colocadas na obra, isto é, a porta da entrada principal e as portas da cozinha regional e garagem, o que, de alguma forma, se revela contraditório e suscita a questão da possibilidade da resolução parcial do contrato e, por outro, que a autora, além de ter proposto a redução do preço da empreitada, o que, aliás, lhe não competia, mas sim aos réus, enquanto donos da obra, manteve sempre a intenção de dar cumprimento ao contrato de empreitada celebrado entre as partes, aceitando, expressamente, resolver os defeitos invocados por aqueles.
6. Não obstante tal atitude da autora os réus, conforme assente no ponto n° 7 da matéria de facto, referiram que não efectuaram qualquer proposta à autora e que não aceitavam que esta se dispusesse a resolver os defeitos da obra, inviabilizando, dessa forma, que a autora pudesse dar cumprimento à empreitada, como era sua vontade.
7. Ora, tendo a autora proposto a redução do preço e aceitado resolver os defeitos existentes na obra, não era lícito aos réus resolverem o contrato nos moldes em que o fizeram, antes, face à disponibilidade da autora para o efeito, estipularem um prazo para que esta pudesse ter resolvido os defeitos invocados por aqueles e dar cumprimento ao contrato de empreitada celebrado.
8. Nessa medida, não deve a presente resolução do contrato pelos réus, pelas razões aduzidas supra, ser enquadrada nos termos e com os efeitos julgados pelas Instâncias, porquanto os réus, contrariando a hierarquia dos direitos atribuídos pela lei ao dono da obra, lançaram, de imediato, mão da figura da resolução do contrato, quando o que deveriam ter feito era exigir, em primeiro lugar a reparação dos defeitos e, na impossibilidade de obterem tal desiderato, exigirem a reconstrução da obra, a redução do preço ou a resolução do contrato, tal como dispõe o art. 1222º do C. Civil.
9. Da matéria de facto dada como provada, resulta que com a sua supra referenciada actuação, a autora provocou atrasos na obra, de Janeiro a Julho de 2001.
10. O que se nos dá à apreciação no caso em apreço, é que os réus declararam à autora, em Dezembro de 2000, que resolviam o contrato de empreitada, sendo que, mais tarde, em Fevereiro e Março de 2001, reiteraram tal intenção, fazendo letra morta das intenções daquela, de obviar aos defeitos de que a obra padecia e de cumprir o contrato de empreitada, expressas em Fevereiro de 2001, nunca a interpelando com vista à correcção dos defeitos da obra, nem, tão pouco, lhe fixando prazo para o cumprimento da empreitada.
11. Com tais condutas dos réus, a autora viu-se impossibilitada de corrigir os defeitos da obra e, em consequência, de cumprir o contrato de empreitada que celebrou com aqueles, pelo que não pode ser responsabilizada pela frustração de rendimentos dos réus no período compreendido entre Janeiro e Junho de 2001.
Encontra-se assente, em definitivo, a seguinte matéria de facto:
i) - autora e réus outorgaram um contrato de empreitada, verbal, cujo objecto consistia no fornecimento de madeiras de castanho e execução de trabalhos de carpintaria, melhor discriminados nos documentos de fls. 5 e 6, numa moradia em construção, que os réus destinavam à sua habitação, sita no lote 152 do Bairro de S. Tiago, em Bragança, no valor global e final de 3.810.000$00;
ii) - as madeiras negociadas eram de 1ª qualidade e deveriam ser colocadas secas;
iii) - no âmbito desse contrato, foram aceites pelos réus os orçamentos nºs 0104 e 0112, que constituem os documentos de fls. 5 e 6, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
iv) - em 1 de Fevereiro de 2001, os réus enviaram à autora a carta que constitui o documento de fls. 70, com o seguinte teor:
" (...) Serve a presente carta para comunicar os vícios e defeitos na obra que essa sociedade está a executar na nossa vivenda sita no Bairro de S. Tiago, nesta cidade de Bragança, na sequência de contrato verbal de empreitada celebrado a 13 de Julho do ano 2000, a que se reportam os vossos orçamentos números 0104 e 0112, de 03/04/2000 e 13/07/2000, respectivamente. Vícios e defeitos estes que nos conferem o direito à resolução do referido contrato de empreitada, nos termos dos artigos 432º e seguintes do código civil, o que ora fazemos, porquanto foi inicialmente acordado que a totalidade da madeira a colocar na obra seria seca e de boa qualidade, porém, constatamos agora que:
- A madeira colocada nos tectos exteriores da entrada e varandas não é aceitável, é de qualidade inferior ao contratado, encontra-se mal colocada e apresenta empenas visíveis e acentuadas, foi colocada madeira simples quando deveria ter sido colocada madeira já tratada para exteriores;
- O trabalho executado no tecto do hall do r/c é inaceitável, pelo que devem V. Ex.as providenciar no sentido de retirar estes materiais (madeiras) no prazo de oito dias após a recepção desta comunicação;
- Aceitam-se as madeiras colocadas nos tectos interiores do primeiro andar e a madeira das três portas colocadas na obra, isto é, a porta da entrada principal e as portas da cozinha regional e garagem. Contudo, a madeira destas 3 portas apresenta manchas extensas e acentuadas, pelo que só se aceitam se, após retiradas para polimento, as manchas desaparecerem. As referidas portas deverão, após serem polidas, ser colocadas novamente com dobradiças e puxadores pelo preço inicialmente acordado de 300.000$00, em perfeitas condições, ou então, definitivamente retiradas.
- Quanto aos lambrins e tectos interiores, deverão V. Ex.as, de acordo com os orçamentos inicialmente apresentados, quantificar o custo destas madeiras a fim de procedermos ao respectivo pagamento.
- O chão (soalho) colocado em 3 quartos e um hall da obra já foi por essa sociedade integralmente levantado a pedido dos proprietários da citada obra em virtude de o mesmo ser de má qualidade e estar húmido e declinamos qualquer responsabilidade pelo seu pagamento.
- Declara-se, pois, resolvido expressamente o contrato de empreitada pelas razões acima apontadas, resolução que já vos foi comunicada, tendo procedido ao levantamento do soalho dos quartos, resolução com efeitos a partir da recepção desta comunicação.
- Deve essa sociedade proceder ao levantamento das madeiras que não aceitamos, e à apresentação da factura para regularização do custo das madeiras que estamos dispostos a aceitar nas condições que supra se deixaram definidas, no prazo de 8 dias, para o efeito a hora e dia exactos para se deslocarem à vivenda, deve-nos ser comunicada com antecedência necessária que nos permita estar presentes";
v) - a autora enviou aos réus a carta datada de 7 de Fevereiro de 2001, que constitui o documento de fls. 16 e seguintes, com o seguinte teor:
" (...) Fui mandatada pela minha cliente "A", L.da - Carpintaria ...." para lhe comunicar o seguinte:
1) - Acusa-se a recepção da missiva remetida por V.Exa, na qual invocou o direito a resolução do contrato de empreitada, nos termos do artigo 432º e seguintes do Código Civil, apresentando uma "proposta" a acordar com a minha cliente;
2) - Visualizados os cinco pontos da supra "proposta", entendeu a minha cliente apresentar uma "contra proposta", que se baseou nos orçamentos referenciados por V.Exa, e nos quais se discriminam o preço dos respectivos materiais a utilizar no presente contrato de empreitada, assim:
- Material já colocado na obra
a) 3 portas de entrada - 300.000$00;
b) Ripamento para o soalho - 100.000$00;
c) 3 placas de tabopan - 15.000$00;
d) Forro a rectificar as respectivas medidas - 630.000$00;
- Material já preparado para colocação na obra
a) 19 portas interiores - 950.000$00
b) 2 lances de escada - 513.000$00
Total: 2.508.000$00 (dois milhões quinhentos e oito mil escudos);
- A deduzir ao referido preço total
a) - Assentamento de colunas, balaústres e corrimão de escada - 207.000$00;
b)- Portas interiores a descontar, pilastras, puxadores e fechaduras e colocação no local - 190.000$00.
Total: 397.000$00 (Trezentos e noventa e sete mil escudos)
Assim:
Preço total: 1) 2.493.000$00 - Preço Total 2) 397.000$00 = 2.111.000$00.
Valor de 2.111.000$00 que é reclamado pela Firma "A", L.da", atendendo ao supra referido.
Contudo, sublinha-se que é intenção desta Firma dar cumprimento ao contrato de empreitada celebrado entre as partes, nomeadamente resolver os defeitos invocados por V.Exa.
Para futuros contactos e resolução da presente situação deverá contactar para o telefone 273322026, das 13h às 14h e a partir das 20:00 horas (...)";
vi) - os réus procederam à notificação judicial da autora, em 30 de Maio de 2001, com o seguinte teor:
" Que, até ao próximo dia 2 de Junho de 2001, a requerida "A", L.da" - Carpintaria..." proceda ao levantamento de todas as madeiras colocadas na obra dos requerentes, designadamente, dos tectos exteriores, dos dois tectos do 1º andar, do tecto do rés-do-chão, da ripagem colocada para assentar o soalho nos quartos, da porta da entrada principal, da porta da cozinha regional e da porta lateral de acesso à garagem, sob pena de terem os requerentes que contratar terceiros para efectuarem estes trabalhos a expensas da requerida";
vii) - os réus enviaram à autora a carta datada de 23 de Março de 2001, que constitui o documento de fls. 18/19, com o seguinte teor:
"Os N/clientes C e B comunicaram à V/cliente "A", L.da", em 1 de Fevereiro do corrente ano, a declaração de resolução do contrato de empreitada celebrado entre ambos a 13 de Julho de 2000, em virtude de incumprimento por parte da V/cliente, tanto pela ausência de qualidade dos materiais colocados na obra (madeiras), como pelo não cumprimento dos prazos acordados para a execução da mesma. Resolução que, de resto, a V/cliente aceitou antes da declaração expressa e escrita dos N/clientes nesse sentido, pois procedeu ao levantamento de alguns materiais (soalhos) e retirou definitivamente ferramentas e trabalhadores da obra.
A carta dos N/ clientes destinava-se, apenas, a reiterar formalmente a resolução do contrato de empreitada, e, atendendo a que os N/ clientes estavam dispostos a aceitar alguns dos materiais ainda colocados na obra, pelos preços constantes no orçamento e nas condições que nessa carta se explicaram, destinava-se igualmente a convidar os V/ clientes a apresentar o preço destes materiais, e retirar os restantes para, de facto e definitivamente, se resolver o assunto.
Não veiculava nessa carta qualquer proposta pelo que não se entende nem se aceita a "contra proposta" veiculada pela V/cliente, cujos montantes exorbitantes não têm cabimento nem conformidade com o orçamento apresentado.
Por outro lado, os N/clientes perderam totalmente o interesse em ficar com os materiais ainda colocados na obra, porquanto os mesmos também apresentam cada vez mais defeitos, empenas, fissuras e manchas de humidade, revelando-se inaceitáveis além de a colocação dos mesmos ser defeituosa.
Razões pelas quais, todos os materiais colocados na obra dos N/clientes deverão ser retirados pelos V/clientes no prazo máximo de 8 dias, sob pena de terem que se contratar terceiros para efectuar este trabalho a expensas da V/cliente.
A paralização da obra está a causar prejuízo aos N/clientes que pretendem resolver rapidamente o assunto, o que sem a colaboração da V/ cliente não se tem mostrado possível (...)";
viii) - as madeiras dos tectos interiores e exteriores deveriam ser colocadas, com tratamento e acabamento da fábrica e as demais levariam acabamento de verniz, este, por conta dos réus, conforme fora acordado entre as partes;
ix) - foi acordado entre a autora e os réus que aquela iniciaria os trabalhos assim que a obra estivesse apta a recebê-los;
x) a autora, aproveitando a existência de andaimes e antes de as varandas, tectos e beiral estarem completamente arrematados, colocou os tectos exteriores em madeira, sem previamente informar os réus, esclarecendo-se, todavia que os réus tiveram conhecimento dos trabalhos, após o início destes;
xi) - a madeira colocada em tais tectos não correspondia à qualidade da madeira acordada entre as partes - madeira de 1ª, com tratamento e acabamentos finais próprios para exteriores;
xii) - os réus, ainda durante a execução dos trabalhos dos tectos exteriores reclamaram dos materiais aplicados, referindo que não correspondiam ao contratado;
xiii) - posteriormente, os réus reclamaram, de novo, do resultado, do modo de execução e dos materiais aplicados, recusando-se a autora a substituir a madeira;
xiv) - na verdade, pouco após a colocação dos tectos exteriores, eram visíveis fissuras, empenos, desvios e desníveis significativos relativamente às paredes, que se foram acentuando e bem assim manchas e nós visíveis, o que evidenciava a colocação de madeira verde e deficiente execução da colocação e arremate das madeiras, sobretudo, nas uniões das juntas;
xv) - à medida da execução das obras, os réus reclamaram:
- da qualidade da madeira colocada, inferior à contratada;
- da existência de nós visíveis na madeira;
- da aplicação em bruto da madeira nos tectos exteriores;
- da existência de manchas de difícil ou impossível eliminação;
- dos maus acabamentos nos tectos exteriores e interiores;
- dos erros de colocação no nível dos tectos exteriores;
- dos desníveis, dos empenos, dos erros de colocação do remate lateral;
- das zonas de fendilhação ao nível das almofadas que foram colocadas nas portas de acesso à garagem e anexo e nós de desagregação que ameaçam soltar-se e caírem;
xvi) - na porta principal, foi colado um canto superior, as juntas do batente estão imperfeitas, as almofadas foram coladas e apresentam fendas visíveis e a madeira encontra-se manchada;
xvii) - não obstante as reclamações dos réus referenciadas em xv) e a sua insistência para eliminação dos defeitos apontados e substituição das madeiras, a autora nada fez;
xviii) - a madeira que foi colocada no soalho vinha em lotes revestidos de plástico, com gotículas visíveis de água no interior e com manchas amareladas;
xix) - os réus chamaram à atenção a autora para a qualidade da madeira que iria aplicar e manchas nela existente, insistindo a autora na colocação dos soalhos;
xx) - o soalho colocado apresentava manchas, que atingiam a madeira em profundidade, e mantinham-se após polimento, e empenos;
xxi) - a colocação das ripas para assentamento do soalho não foi correctamente realizada, encontrando-se as ripas do soalho baixas em relação ao nível do pavimento do r/c e mais espaçadas do que o aconselhável para o assentamento do soalho;
xxii) - junto à porta de entrada de uma divisão do r/c, as ripas ficaram "calçadas" e desniveladas em relação às restantes, para acompanhar o nível do restante pavimento em tijoleira;
xxiii) - o tecto da entrada foi parcialmente colocado com desnivelamento visível, junto à porta de entrada e abaixo do nível em relação à viga de cimento saliente numa das extremidades, ficando a moldura e remate salientes;
xxiv) - os réus apesar das reclamações efectuadas quanto à qualidade e execução dos trabalhos vieram a manifestar a vontade de aceitar os trabalhos relativos aos tectos interiores do 1º andar, e às portas exteriores estas se eliminados os defeitos que apresentavam à data e informaram a autora que teria que substituir as madeiras aplicadas nos soalhos e tectos por madeira de castanho de 1ª qualidade e que não continuasse a obra até tal substituição ser realizada, o que a autora recusou;
xxv) - a autora aceitou substituir o soalho desde que os réus fornecessem a nova madeira, a descontar no orçamento;
xxvi) - os réus, em inícios de Dezembro de 2000, informaram-na que tinham perdido a confiança na realização dos trabalhos contratados, pelo que, resolviam o contrato;
xxvii) - ...dado que a autora insistia em continuar a colocar os soalhos, não procedia à eliminação dos defeitos apontados ou substituição das madeiras, continuando os trabalhos a apresentar falta de qualidade de materiais e deficiente execução;
xxviii) - a avisaram que deveria proceder ao levantamento dos materiais colocados nos tectos exteriores e nos soalhos;
xxix) - em Dezembro, a autora procedeu ao levantamento do soalho que retirou da obra, mas não ao levantamento dos tectos exteriores, bem como retirou da obra as máquinas, ferramentas e outros materiais e trabalhadores;
xxx) - à data, as portas exteriores e tectos interiores colocados, com excepção do da entrada, apresentavam algumas imperfeições, mas não os defeitos supra referenciados, que depois se vieram a manifestar;
xxxi) - tendo-se então os réus disposto a pagá-los, se eliminados alguns defeitos mormente as manchas das portas;
xxxii) - em Dezembro de 2000, o técnico responsável pela obra, em inspecção, lançou no livro de obra, as observações que constam de fls. 67 e seguintes, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
xxxiii) - em Janeiro de 2001, de novo, a autora recusou-se a eliminar os defeitos supra apontados, quanto às portas exteriores e não procedeu ao levantamento dos tectos exteriores;
xxxiv) - na sequência da carta referenciada em v), a autora, não supriu os defeitos apontados;
xxxv) - em 16/05/2002, a autora deslocou-se à obra, aí insistindo no pagamento da quantia de 2.111.000$00 e não se disponibilizando a substituir materiais ou proceder à eliminação dos defeitos supra apontados, embora reconhecesse os mesmos;
xxxvi) - os réus não aceitaram o soalho, os tectos exteriores e interiores da entrada do r/c;
xxxvii) - com a sua supra referenciada actuação, a autora provocou atrasos na obra, de Janeiro a Julho de 2001, correspondendo tais atrasos a idêntico atraso na disponibilização do apartamento onde habitavam os réus para venda ou arrendamento, como era sua intenção, o que contribuiria para a amortização dos abaixo referenciados encargos bancários;
xxxviii) - e, em consequência de tais atrasos, os réus suportaram juros (correspondentes a 6 meses de Janeiro a Junho de 2001) decorrentes da concessão de empréstimo bancário para financiamento de construção de casa própria, no valor de 882.905$00 e 265.859$00 e suportaram ainda encargos bancários relativos a garantia bancária - caução de obra exigida pela C.M. de Bragança - correspondentes a 6 meses, de Janeiro a Junho de 2001, no valor de 29.574$00.
Cumpre, antes de mais, face à posição assumida pela recorrente, equacionar as questões de que, no âmbito do recurso, importa conhecer.
E que, a nosso ver, se resumem no seguinte:
I. Saber se foi ou não válida e eficaz, designadamente atento o preceituado no art. 1222º do C.Civil, a resolução do contrato de empreitada pelos réus recorridos.
II. Averiguar se os recorrentes se constituíram na obrigação de indemnizar aqueles recorridos dos prejuízos por eles alegadamente sofridos.
Segundo dispõe o art. 1208º do C.Civil (1) "o empreiteiro deve executar a obra em conformidade com o que foi convencionado, e sem vícios que excluam ou reduzam o valor dela, ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato".
Assim, "o comitente que celebra com o empreiteiro um contrato de empreitada tem direito a que, no prazo acordado, lhe seja entregue uma obra realizada nos moldes convencionados. No fundo, o dono da obra, por força do contrato de empreitada, tem o direito a exigir do empreiteiro a obtenção do resultado a que este se obrigou. Este é o principal direito do dono da obra". (2)
Sendo prerrogativa do dono da obra a fiscalização, à sua custa, da execução dela, desde que não perturbe o andamento ordinário da empreitada (art. 1209º, nº 1).
Ora, no que concerne à obra executada com defeitos (cumprimento defeituoso da empreitada) prescrevem os arts. 1220º, 1221º, 1222º e 1223º que "o dono da obra deve, sob pena de caducidade dos direitos conferidos nos artigos seguintes, denunciar ao empreiteiro os defeitos da obra dentro dos trinta dias seguintes ao seu aparecimento"; "se os defeitos puderem ser suprimidos, o dono da obra tem o direito de exigir do empreiteiro a sua eliminação; se não puderem ser eliminados, o dono pode exigir nova construção"; "não sendo eliminados os defeitos ou construída de novo a obra, o dono pode exigir a redução do preço ou a resolução do contrato, se os defeitos tornarem a obra inadequada ao fim a que se destina"; "o exercício dos direitos conferidos nos artigos antecedentes não exclui o direito a ser indemnizado nos termos gerais".
Todavia, "os direitos de redução do preço e de resolução do contrato não são atribuídos, em alternativa, com a eliminação dos defeitos ou reconstrução da obra, conferidos no artigo anterior. (...) O artigo 1222º, na verdade, torna o exercício daqueles dois direitos dependente do facto de não terem sido eliminados os defeitos ou construída de novo a obra. Dá-se, portanto, ao empreiteiro a possibilidade de, querendo, manter o contrato pelo preço estipulado, eliminando os defeitos da obra ou construindo outra de novo; só na hipótese de ele não fazer nem uma coisa nem a outra, se abre a possibilidade de redução do preço ou de resolução do contrato". (3)
De facto, o dono da obra só poderá exigir a resolução do contrato se, para além de não terem sido eliminados os defeitos ou realizada de novo a obra, tais defeitos tornaram a obra inadequada para o fim a que se destina.
Por isso, "sendo possível a eliminação dos defeitos ou a nova realização da obra, ao dono da obra só cabe a escolha entre resolver o contrato e reduzir o preço (o que depende da sua escolha) caso a contraparte tenha recusado qualquer das prestações de cumprimento ou depois de decorrido um prazo suplementar fixado, nos termos do artigo 808º, para a sua efectivação".(4)
Subsumindo ao exposto os factos provados, é indubitável concluir-se que o acórdão recorrido acertadamente apreciou esta questão.
Com efeito, segundo o contrato de empreitada celebrado, a autora obrigou-se a fornecer madeiras de castanho de 1ª qualidade, colocando-as secas e vinculou-se a executar trabalhos de carpintaria numa moradia dos réus.
Sucede que, não só não integrou na obra a madeira convencionada, como foi executando a obra com defeitos de que os réus - apenas quanto aos já visíveis - foram reclamando à medida da execução da obra (colocou os tectos exteriores em madeira que não correspondia à qualidade acordada entre as partes; pouco após a colocação dos tectos exteriores, eram visíveis fissuras, empenos, desvios e desníveis significativos relativamente às paredes, que se foram acentuando e bem assim manchas e nós visíveis, o que evidenciava a colocação de madeira verde e deficiente execução da colocação e arremate das madeiras, sobretudo, nas uniões das juntas; na porta principal, foi colado um canto superior, as juntas do batente estão imperfeitas, as almofadas foram coladas e apresentam fendas visíveis e a madeira encontra-se manchada; a madeira que foi colocada no soalho vinha em lotes revestidos de plástico, com gotículas visíveis de água no interior e com manchas amareladas; o soalho colocado apresentava manchas, que atingiam a madeira em profundidade, e mantinham-se após polimento, e empenos; a colocação das ripas para assentamento do soalho não foi correctamente realizada, encontrando-se as ripas do soalho baixas em relação ao nível do pavimento do r/c e mais espaçadas do que o aconselhável para o assentamento do soalho; junto à porta de entrada de uma divisão do r/c, as ripas ficaram "calçadas" e desniveladas em relação às restantes, para acompanhar o nível do restante pavimento em tijoleira; o tecto da entrada foi parcialmente colocado com desnivelamento visível, junto à porta de entrada e abaixo do nível em relação à viga de cimento saliente numa das extremidades, ficando a moldura e remate salientes; parte destes defeitos foi, aliás, detectada pelo técnico responsável da obra em Dezembro de 2000).
Apesar das várias reclamações apresentadas pelos réus e a sua insistência para eliminação dos defeitos apontados e substituição das madeiras, a autora nada fez, não supriu os defeitos apontados, não se disponibilizou a substituir materiais e a proceder à eliminação dos defeitos supra apontados, embora reconhecesse os mesmos, recusou substituir a madeira, insistiu na colocação dos soalhos, só aceitando substituí-los desde que os réus fornecessem a nova madeira, a descontar no orçamento.
Já em inícios de Dezembro de 2000, dado que a autora insistia em continuar a colocar os soalhos, não procedia à eliminação dos defeitos apontados ou substituição das madeiras, continuando os trabalhos a apresentar falta de qualidade de materiais e deficiente execução, os réus informaram-na que tinham perdido a confiança na realização dos trabalhos contratados, pelo que resolviam o contrato, avisando-a de que deveria proceder ao levantamento dos materiais colocados nos tectos exteriores e nos soalhos.
O que a autora fez, ainda em Dezembro, embora não tivesse procedido ao levantamento dos tectos exteriores, bem como retirou da obra as máquinas, ferramentas e outros materiais e trabalhadores.
Finalmente, em 1 de Fevereiro de 2001, os réus enviaram à autora a carta que constitui o documento de fls. 70, declarando resolvido o contrato de empreitada pelas razões acima apontadas, resolução essa com efeitos a partir da recepção desta comunicação.
É sabido que o credor só pode resolver o contrato quando a prestação, não tendo sido efectuada no tempo devido, já não é possível no contexto da obrigação, isto é, quando haja incumprimento definitivo.
E tal acontece, no caso concreto da obrigação do empreiteiro de eliminar os defeitos existentes na obra ou de proceder a nova reconstrução: só depois de tal obrigação se mostrar definitivamente incumprida é que o dono da obra tem, como vimos acima, a faculdade de passar à fase da resolução (art. 1222º).
No entanto, há que distinguir no âmbito do incumprimento aquele que se traduz, normalmente por força de circunstâncias incontroláveis, numa impossibilidade total de cumprir (incumprimento naturalístico) e aquele que resulta da perda do interesse do credor na prestação ou na persistência do não cumprimento após o decurso de um prazo razoável para tanto fixado (incumprimento normativo).
Sendo ainda que na espécie de incumprimento normativo se inclui a recusa, através de manifestação inequívoca, de cumprimento pelo devedor.
Ora, a obrigação de eliminar os defeitos ou de proceder a nova construção apenas releva para o efeito do cumprimento se efectuada em consonância com o inicialmente convencionado no contrato (salvo aceitação do dono da obra). Que o mesmo é dizer que não cumpre essa obrigação o empreiteiro que se dispõe a proceder à eliminação de defeitos de forma que não estava prevista na empreitada celebrada.
Perante isto é evidente que a autora, recusando a substituição da madeira, aceitando reparar alguns dos defeitos mas não todos, incorreu em incumprimento definitivo normativo da sua obrigação, justificando, dessa forma, a resolução do contrato de empreitada pelos réus.(5)
Dir-se-á, porém, que na altura em que os réus comunicaram à autora a resolução do contrato, manifestaram interesse em aceitar parte da obra, em determinadas condições, o que tornaria ineficaz a resolução.
Na verdade, os réus, na carta de 1 de Fevereiro de 2001, em que comunicam à autora a resolução do contrato, afirmam que "aceitam-se as madeiras colocadas nos tectos interiores do primeiro andar e a madeira das três portas colocadas na obra, isto é, a porta da entrada principal e as portas da cozinha regional e garagem; contudo, a madeira destas 3 portas apresenta manchas extensas e acentuadas, pelo que só se aceitam se, após retiradas para polimento, as manchas desaparecerem; as referidas portas deverão, após serem polidas, ser colocadas novamente com dobradiças e puxadores pelo preço inicialmente acordado de 300.000$00, em perfeitas condições, ou então, definitivamente retiradas; quanto aos lambrins e tectos interiores, deverão V. Ex.as, de acordo com os orçamentos inicialmente apresentados, quantificar o custo destas madeiras a fim de procedermos ao respectivo pagamento; (...) deve essa sociedade proceder ao levantamento das madeiras que não aceitamos, e à apresentação da factura para regularização do custo das madeiras que estamos dispostos a aceitar nas condições que supra se deixaram definidas, no prazo de 8 dias, para o efeito a hora e dia exactos para se deslocarem à vivenda, deve-nos ser comunicada com antecedência necessária que nos permita estar presentes".
Esta declaração não pode, porém, ser entendida, ainda que se defendesse essa possibilidade (6), como uma resolução parcial da empreitada, interpretada, por um lado, como declaração resolutória relativamente ao que pelos réus não é aceite e como declaração de manutenção do contrato em relação àquilo que se dispõe a aceitar.
Como bem se refere no acórdão recorrido, a mencionada aceitação de parte da obra feita pela empreiteira apenas constitui um aspecto complementar da resolução do contrato, quiçá uma proposta contratual destinada a regular os efeitos da resolução previstos no art. 433º (que sempre seria admissível por força do preceituado naquela mesma norma e no art. 405º).
Traduz mera concretização daquilo que os réus consideram defeituoso e do que, não obstante a resolução do contrato, poderá ser aproveitado, em futuras negociações tendentes a apurar eventuais compensações entre o adequadamente prestado e os preços correspondentes.
Não importa, pois, uma resolução meramente parcial da empreitada, sendo insusceptível, por isso, de nessa perspectiva produzir quaisquer efeitos, tanto quanto é certo que, mesmo no caso de incumprimento parcial não deixa o credor de poder resolver o negócio incumprido (art. 802º, nº 1).
Há, assim, que considerar válida e eficaz a resolução do contrato de empreitada declarada pelos réus à autora, improcedendo, nesta parte, o recurso.
Quanto à segunda questão, temos como óbvio que "resolvido o contrato, o dono da obra fica exonerado da obrigação de pagar o preço e, se já o tinha pago, pode exigir a sua restituição por inteiro (art. 289º)".(7)
Consequentemente, nada teriam os réus que pagar à autora a título de preço - prestação pecuniária - da empreitada resolvida.
Em contrapartida, por força do disposto no art. 1223º, a resolução do contrato não exclui o direito dos réus de serem indemnizados nos termos gerais, o que significa que os réus podem cumular um pedido de indemnização pelos danos sofridos em consequência dessa resolução (art. 801º, nº 1).
Isto é, "havendo resolução do contrato por incumprimento, a indemnização mede-se pelo dano contratual negativo" (8)
, tendente a colocar o dono da obra na situação em que estaria se não tivesse celebrado o negócio", devendo ser calculada de acordo com as regras gerais da obrigação de indemnização (arts. 562º ss).
E tal indemnização há-de apenas dizer respeito "a prejuízos outros que não sejam os derivados da eliminação de defeitos da obra ou de redução do preço".(9)
Com efeito, "o artigo 1223º, ao declarar que o exercício dos direitos conferidos nos artigos precedentes, entre os quais figuram os de obter a eliminação dos defeitos da obra e a redução do preço, não exclui o de ser indemnizado nos termos gerais, mostra que este último pode ser accionado conjuntamente com qualquer dos outros e, sendo assim, sob pena de a lei consentir um duplo ressarcimento pelo mesmo facto, aquela indemnização tem de respeitar a outros prejuízos que não sejam compensados com a simples eliminação dos defeitos ou com a simples redução do preço da empreitada".(10)
Sempre se diga, em todo o caso, que "parece que a orientação de conceber o direito de indemnização como um direito alternativo dos de resolução ou de redução do preço não é aceitável, pois, não obstante a resolução ou redução do preço, pode haver danos do comitente que com elas não são eliminados e susceptíveis de ser reparados por meio de indemnização. Nem a resolução, nem a redução do preço, eliminam todos os danos do comitente. Basta pensar no tempo que podem exigir a eliminação do defeito ou a nova construção e na necessidade em que esse facto pode colocar o dono da obra de realizar despesas com que razoavelmente não contava". (11)
No caso sub judice provou-se, a respeito de danos, que, com a sua supra referenciada actuação, a autora provocou atrasos na obra, de Janeiro a Julho de 2001, correspondendo tais atrasos a idêntico atraso na disponibilização do apartamento onde habitavam os réus para venda ou arrendamento, como era sua intenção, o que contribuiria para a amortização dos abaixo referenciados encargos bancários e, em consequência de tais atrasos, os réus suportaram juros (correspondentes a 6 meses de Janeiro a Junho de 2001) decorrentes da concessão de empréstimo bancário para financiamento de construção de casa própria, no valor de 882.905$00 e 265.859$00 e suportaram ainda encargos bancários relativos a garantia bancária - caução de obra exigida pela C.M. de Bragança - correspondentes a 6 meses, de Janeiro a Junho de 2001, no valor de 29.574$00.
Ora, foi naturalmente no pressuposto da construção da casa que pretendiam ver edificada que os réus assumiram os encargos decorrentes do pedido de financiamento para construção de casa própria, cujos juros não suportariam pelo atraso verificado se não houvessem celebrado o concreto contrato de empreitada aqui em apreço. E foi também em vista do mesmo contrato que prestaram a garantia bancária junto da Câmara Municipal de Bragança.
Se porventura não tivessem celebrado o contrato aqui referido, celebrando um outro que, adequadamente cumprido, não fosse resolvido, com certeza que não estariam sujeitos aos encargos acrescidos que foram obrigados a suportar.
Haverá, pois, que os colocar na situação em que se encontrariam se não houvessem celebrado o concerto contrato de empreitada com a autora, através da atribuição de uma indemnização correspondente à obrigação desta de ressarcir esses danos, calculada nos termos dos artigos 562º e seguintes do Código Civil.
O que nos permite considerar que o quantum indemnizatório - em dinheiro porquanto já não é possível a restauração natural (arts. 562º e 566º, nºs 1 e 2) - atinge precisamente o montante de 1.178.338$00, arbitrado pelo acórdão recorrido, e que corresponde à soma das diversas parcelas a atender (882.905$00 + 265.859$00 + 29.574$00).
Também nesta parte improcede, por conseguinte, o recurso.
Nestes termos, decide-se:
a - julgar improcedente o recurso de revista interposto pela autora "A", L.da";
b) - confirmar o acórdão recorrido;
c) - condenar a recorrente nas custas da revista.
Lisboa, 12 de Julho de 2005
Araújo Barros
Oliveira Barros
Salvador da Costa
---------------------------------
(1) Diploma a que pertencem as disposições adiante indicadas sem outra referência.
(2) Pedro Romano Martinez, "Contrato de Empreitada", in "Direito das Obrigações" sob a coordenação de António Menezes Cordeiro, vol. 3º, Lisboa, 1991, pag. 444.
(3) Pires de Lima e Antunes Varela, "Código Civil Anotado", vol. II, 3ª edição, Coimbra, 1986, pag. 821; Acs. STJ de 11/11/2003, no Proc. 3092/03 da 6ª secção (relator Silva Salazar); de 09/03/2004, no Proc. 67/04 da 7ª secção (relator Neves Ribeiro); e de 25/11/2004, no Proc. 3608/03 da 7ª secção (relator Oliveira Barros).
(4) Pedro Romano Martinez, "Cumprimento Defeituoso em Especial na Compra e Venda e na Empreitada", Coimbra, 1994, pag. 439.
(5) Cfr. Acs. STJ de 11/11/76, in BMJ nº 261, pag. 137 (relator João Moura); de 14/02/95, no Proc. 86065 da 1ª secção (relator Ramiro Vidigal); e de 04/12/2003, no Proc. 3968/03 da 7ª secção (relator Salvador da Costa).
(6) Cfr. em sentido contrário Pedro Romano Martinez , citado "Cumprimento Defeituoso...", pag. 345.
(7) Pedro Romano Martinez, citado "Contrato de Empreitada", pag. 543.
(8) Ac. STJ de 11/02/99, no Proc. 1029/98 da 2ª secção (relator Noronha Nascimento).
(9) Ac. STJ de 29/09/93, no Proc. 82586 da 2ª secção (relator Mário Cancela).
(10) Ac. STJ de 13/07/76, in BMJ nº 259, pag. 212 (relator Ferreira da Costa).
(11) Vaz Serra, "Empreitada", in BMJ nº 146, citado por Pires de Lima e Antunes Varela, no "Código Civil Anotado", vol. II, 3ª edição, Coimbra, 1986, pag. 823.