Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
Relator: | NEVES RIBEIRO | ||
Descritores: | EMPREITADA DONO DA OBRA ALTERAÇÃO DO CONTRATO OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAR DANOS PATRIMONIAIS LIQUIDAÇÃO EM EXECUÇÃO DE SENTENÇA EQUIDADE JUROS DE MORA | ||
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Nº do Documento: | SJ200406030014477 | ||
Data do Acordão: | 06/03/2004 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | T REL COIMBRA | ||
Processo no Tribunal Recurso: | 2210/03 | ||
Data: | 10/07/2003 | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA. | ||
Decisão: | CONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA. | ||
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Sumário : | 1. O dono da obra goza, a todo o tempo, do direito potestativo à livre desistência ou alteração da obra, extinguindo o contrato, ainda que a obra esteja em execução. 2. A obrigação de indemnizar emergente da desistência da obra, por parte do dono, é calculada em função dos gastos efectivos e do trabalho do empreiteiro por causa da extinção do contrato, e ainda dos reais proveitos que deixou de receber, em virtude de não proceder ou não continuar, a execução da obra que empreitara, tudo conforme ao que determina o artigo 1229º do Código Civil. 3. Estando judicialmente verificados danos decorrentes da desistência da obra por parte do dono, mas não sendo possível quantificá-los, na acção declarativa onde se opera a verificação, a condenação poderá fazer-se pela quantia que se liquidar em execução de sentença, com dispõe o artigo 661º-1, do Código de Processo Civil. 4.Todavia, se, na acção declarativa da verificação dos danos, estes houveram sido calculados, com recurso injustificado à equidade em determinada quantia, que o autor/credor (credor da indemnização a calcular) não houver impugnado a decisão - da qual recorreu a outra parte - então, a liquidação não poderá ultrapassar a quantia fixada, tendo em conta a regra do artigo 684º-4, do Código de Processo Civil. 5. São devidas ao autor as quantias a que o réu se vinculou entregar-lhe nas datas de vencimento (25/9/92 e 10/10/92), dado que cumpriu pontualmente até aí, como se havia também vinculado, e antes de ter sido forçado pelo réu, a desistir da obra, não operando a desistência, com efeitos retroactivos, por forma a legitimar o incumprimento, por parte do réu, da obrigação que assumira de entrega das quantias, correspondentes à parte da obra feita, no prazo combinado com o empreiteiro e que este observou. 6. Não tendo sido pagas nas datas dos respectivos vencimentos, porque se trata de prestações pecuniárias, com prazo certo, vencem juros de mora, a partir dessas datas, até integral satisfação, às taxas legais supletivas, sucessivamente em vigor. 7. Mas se o autor só tiver pedido juros de mora, até à propositura da acção, apenas nessa medida, o réu será condenado a pagá-los. 8. E vencem-se ainda juros sobre esta mesma quantia, a partir da citação, desde que o pedido assim tenha sido formulado. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I 1. "A", construtor, intentou a acção, com processo ordinário, contra B, advogado, alegando em resumo:Razão da revista Celebrou com o R. um contrato de empreitada, com vista à construção de duas vivendas geminadas, no tosco, fornecendo este os materiais, tendo ficado estabelecido o fraccionamento do pagamento do preço em função da evolução da obra. O A., para alem de outros trabalhos que foram pagos, concluiu os que condicionavam o pagamento de duas prestações de 750.000$00 cada uma, que o R se recusa a satisfazer; realizou trabalhos previstos nas cláusulas 2ª e 4ª do contrato; bem como trabalhos adicionais resultantes de alterações ao projecto exigidas pelo R, no valor de 500.000$00, que o R também recusa pagar; e pagou do seu bolso dois rolos de malha-sol, no valor de 16.400$00, pagamento que constituía obrigação do R, nos termos do contrato. O R proibiu o A de continuar a obra, dizendo-lhe para nunca mais lá aparecer, e contratou outro empreiteiro que concluiu a obra, ficando o A impedido de retirar o proveito que teria com a execução da obra, até final. 2. Na sequência, e no que agora interessa, pediu a condenação do R no pagamento das quantias de 1.500.000$00, relativa as duas prestações correspondentes a obra realizada, acrescida de 750.000$00, a titulo de juros vencidos, até à proposição da acção; de 500.000$00 relativa a alterações na obra realizada, de 14.400$00, relativa a materiais que incorporou na obra e de 333.000$00, relativa ao lucro que retiraria da execução da obra até final, quantias acrescidas de juros de mora, à taxa legal, sobre o montante em divida, desde a citação, até efectivo pagamento; e ainda no pagamento das quantias a liquidar em execução de sentença, relativas aos prejuízos invocados ainda não quantificados. 3. Para o que releva, mau grado as vicissitudes que o processo mostra (houve seis agravos), a sentença decidiu assim: A) Julgou a acção parcialmente procedente, condenando o réu a pagar ao autor: a) a quantia de €: 7.481,97 (setecentos mil, quatrocentos e oitenta e um Euros e noventa e sete cêntimos) - equivalente a 1.500.000$00; e ainda b) a quantia de €: 4.154,99 (quatro mil cento e cinquenta e quatro Euros e noventa e nove cêntimos) - equivalente a 833 contos. B) Condenou o réu no pagamento de juros, a taxa supletiva legal, vencidos e vincendos sobre €: 3.740,98, desde o dia 25.09.92, e sobre igual montante, desde o dia 15.10.1992, em ambos os casos até à propositura da acção, conforme fora pedido. C) Condenou ainda o réu no pagamento de juros, à mesma taxa legal, vencidos e vincendos, desde a citação para a presente acção, até efectivo pagamento sobre as quantias referidas no n.º1, a) - 1500.000$00; e b)- 833.000$00. D) Julgou a acção improcedente quanto ao mais que vem pedido, nessa parte absolvendo o réu. E) Julgou, por último, improcedente, por não provada, a reconvenção, absolvendo o autor do pedido reconvencional. E a Relação manteve o decidido (fls.755). 4. Daí a revista proposta pelo dono da obra - o réu. II As conclusões do recorrente traçam o objecto da revista.Objecto de revista Vamos mantê-las pela ordenação e texto que apresentou, com vista a, no mesmo alinhamento, as podermos ponderar, face ao acórdão recorrido, referenciando também, quando for caso, o parecer universitário que juntou, e cuja doutrina é assimilada, e reportada, em algumas passagens das alegações e conclusões. A) 1- O Tribunal da Relação apreciou a razoabilidade da convicção probatória do 1º grau de jurisdição e com base nela proferiu a decisão sobre a matéria de facto, isto, quando se impunha que procedesse, efectivamente, à reapreciação o da matéria de facto considerada incorrectamente julgada (quesitos 2º a 5º, 7º a 13º, 16º, 21º, 31º, 32º, 36º, 37º, 41º a 44º, 52º, 57º, 58º, 62º a 64º, 66º, 67º, 69º, 80º a 83º, 92º, 95º e 99º), valendo-se, para isso, da audição dos registos da prova gravada e, assim, proferir decisão; assegurando um verdadeiro e efectivo 2º grau de jurisdição, como prescreve o artº 712º, nº 1, alínea a), e n.º2 do C.P.C. Pelo que, o Tribunal da Relação, ao não reapreciar a matéria de facto decidida na 1ª instância, deixou de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar, o que tem como consequência a nulidade do acórdão, nos termos do artigo 668º, nº 1, alínea d), do C.P.C.) 2 - Os quesitos 13º e 16º são conclusivos, porquanto contêm um juízo de valor ou matéria de direito. Assim, devem ter-se por não escritas as respostas dadas a estes quesitos, conforme determina o artº 646º, nº 4, do C.P.C. As respostas dadas a estes quesitos não podem influir no julgamento de mérito, pelo que, tal consequência, conduz à improcedência dos pedidos de condenação do R no pagamento das quantias de 500.000$00 e de 333.000$00. C) 3 - Os pedidos de 750.000$00 + 750.000$00 e de 333 000$00 assentam na desistência da empreitada. Tendo o contrato sido celebrado por escrito e constando dele que a execução das obras se faria segundo o estabelecido no projecto - também este exarado por escrito, é inadmissível a prova testemunhal (a única que foi feita) para prova da desistência da empreitada por parte do dono da obra e, assim, condenar-se este ao pagamento das quantias de 750 000$00 + 750 000$00 e de 333 000$00, pois que, tendo o contrato de empreitada sido celebrado por escrito, qualquer facto extintivo de obrigações ou da própria relação obrigacional, nunca poderia ser provado por testemunhas - arts 395º e 394º, nº 1, do C.C. 4 - O pedido de 500.000$00 assenta na indemnização pedida a título de alterações executadas pelo empreiteiro a mando do dono da obra e, ainda, a titulo de prejuízos tidos pelo A. em virtude dessas alterações o terem impedido de concluir a obra no prazo acordado e, assim, o impossibilitarem de aceitar outras empreitadas que tinha em vista. Tendo sido o contrato de empreitada celebrado por escrito e constando dele que a execução das obras se faria segundo o estabelecido no projecto - também este exarado por escrito -, é inadmissível a prova testemunhal (a única que foi feita) para prova de convenções adicionais (quer as convenções sejam anteriores a formação do documento ou contemporâneas dele, quer sejam posteriores), a esse contrato de empreitada, como o caso das alterações ao projecto de obras executadas a mando do dono da obra - artº 394º, nº 1, do C.C. D) 5 - O R foi condenado a pagar as quantias de 750.000$00 + 750.000$00 relativas a duas parcelas do preço da obra, preço esse fraccionado, no contrato de empreitada, em parcelas. No entanto, as parcelas em que se pode fraccionar o preço da obra, não correspondem ao custo tido com cada uma delas. Face a desistência da empreitada por parte do dono da obra, cessa o contrato de empreitada e, aquilo a que o empreiteiro tem direito á indemnização estabelecida no artº 1229º do C.C., e que nunca pode reconduzir-se as prestações do preço vencidas antes da desistência da obra. E, o montante da indemnização prevista nesse citado dispositivo legal, tem de ser determinado em função dos efectivos valores correspondentes ao trabalho despendido ate ao momento da desistência. Mas, não se provaram quais as despesas e respectivo valor que o A. tenha despendido com a parte da obra realizada, como, nem sequer, tais factos foram alegados, estando-se numa situação de absoluta inexistência de matéria factual que possa suportar uma eventual condenação numa indemnização. E) 6 - O tribunal condenou, com recurso a equidade, o R. no pagamento de 333.000$00, relativo ao proveito que o empreiteiro retiraria da obra caso a tivesse concluído. O proveito do empreiteiro deve ser determinado pela subtracção, ao preço total fixado, (4 250 000$00), do custo total em trabalho aplicado na obra. Este último valor não foi fixado, nomeadamente por não ter sido, sequer, alegado ou peritado. Na falta destes elementos, cuja prova incumbia ao empreiteiro, não se pode fixar a indemnização prevista no artº 1229º do C.C., não sendo, pois, licito ficcionar, com base na equidade, tais montantes. F) 7 - O R. foi condenado a pagar, com base na equidade, a quantia, de 500.000$00, relativa ao valor dos trabalhos que o A., por forca de supostas alterações ao projecto exigidas pelo dono da obra teria pretensamente realizado. O Acórdão da Relação confirmou que "não se provou o valor desses trabalhos não previstos na execução do contrato", do que resulta, desde logo, a inexistência de prova factual para condenar o, ora recorrente, no mencionado pedido e, por este facto, o tribunal recorreu a juízos de equidade. Na verdade, o recurso a equidade para a determinação do valor de tais trabalhos, está vedado ao tribunal, desde logo, porque, o pedido apresenta-se determinado, mas não foram alegados factos constitutivos do mesmo, estando-se no campo da factos essenciais que não foram alegados. E, na falta de acordo das partes, só poderia ser fixado o aumento do preço previsto no artigo 1216º, nº 2, do C.C. com base na equidade, se a lei expressamente previsse essa possibilidade. Na falta de tal previsão legal, ter-se-á de concluir que não é admissível o recurso à fixação equitativa do valor do aumento de preço, em razão de trabalhos a mais. Por outro lado, esta quantia de 500.000$00, foi peticionada como sendo o somatório de dois prejuízos (indemnização pelas alterações na obra + indemnização por prejuízos tidos pelo facto dos trabalhos com essas alterações terem impedido o A. de concluir a obra no prazo acordado e, assim, o impossibilitarem de aceitar outras empreitadas que tinha em vista). Porém, o R foi condenado no pagamento dessa quantia total de 500.000$00, apenas a titulo de um desses dois prejuízos (indemnização pelas alterações na obra), pelo que não é licita a condenação do R nesse montante global. G) 8 - Não são devidos juros de mora sobre os montantes de 750.000$00 + 750.000$00, a partir de 25/9/92 e de 15/10/92, respectivamente, até à propositura da acção, porquanto, por um lado, o R não é devedor dessas quantias, pois que as prestações, por força da desistência do contrato de empreitada, foram substituídas pela indemnização prevista no artº 1229º do C.C. cujo montante não foi determinado e, por outro lado, as mesmas não são obrigações com prazo certo, pois que, como emerge do contrato de empreitada, essas parcelas não tinham, nem data, nem prazos fixados, para além de, o R, não ter sido nunca interpelado para proceder a tais pagamentos. Pelo que, o R, só ficaria constituído em mora, depois de ter sido judicial ou extrajudicial interpelado para cumprir, recaindo sobre o A. o ónus de provar que interpelou o R para o cumprimento da cada uma daquelas obrigações, o que aquele não provou, nem sequer alegou. Assim, não houve, nem mora, nem há lugar ao pagamento de juros, como dispõem os artigos 805º, nº 1 e 806º, nº 1, ambos do C.C. 9 - Relativamente ao pedido de juros de mora sobre a quantia de 1.500.000$00 (750 000$00 + 750.000$00), desde a citação, eles não são devidos, porquanto essas prestações, por força da desistência da empreitada, extinguiram-se e foram substituídas pela indemnização prevista no artigo 1229º do C.C. que não foi determinada. H) 10 - Não são devidos juros de mora relativos às importâncias de 333.000$00 e de 500.000$00, desde a citação, pois que, terão sido determinadas com recurso a juízos de equidade, o crédito é ilíquido e, sendo ilíquido, não há mora, enquanto se não tornar liquido. 11 - O acórdão recorrido violou, nomeadamente, por erro de aplicação ou interpretação, o disposto nos artigos: 394º, nº 1; 395º; 393º, nº 2; 342º, nº 1; 1229º; 1216º; 1216º,n 2; 1211º, nº 1 e nº 2; 883º; 805º, nº 1 e nº 3; 806º, nº 1; 566, nº 3; 569º a 934º - do C6d. Civil; 690º - A; 712º, nº 1, alínea a); 712º, nº 2; 655º, nº 2; 698º, nº 6; 653º, nº 2; 668º, nº 1, alínea d); 646º, nº 4; 498º e 264º, nº 1 - do Cod. Proc. Civil. E conclui: Deve dar-se provimento ao recurso, e anular-se o acórdão recorrido, com as consequências legais; e, quando assim não se decida, deve revogar-se o acórdão recorrido e, em consequência, julgar-se a acção improcedente, absolvendo-se o recorrente de todos os pedidos. III Como foi dito no começo da parte anterior ( Parte II), iremos trabalhar a matéria segundo a ordenação que vem estabelecida pelo recorrente, no pressuposto de que, assim, se melhora a inteligência de compreensão e tratamento das questões postas e relevantes de conhecimento do objecto da revista.Direito aplicável Deste modo: 1. Na conclusão A), o recorrente põe em causa o erro de apreciação das provas e a fixação material dos factos. Como se sabe, é uma questão que está fora da apreciação do objecto da revista, como preceitua o artigo 722º-2, do Código de Processo Civil. Pretende, como se mostra, reabrir a discussão da matéria de facto. Pretensão que não é sustentável, por força da regra processual mencionada. Nem o Tribunal, para além do que a este propósito, adiante se dirá, pode sindicar diferentemente o que no julgamento de facto foi feito, com recurso à livre, prudente e conscienciosa convicção julgadora - que agora não pode estar em causa, reabrindo novo julgamento dessa matéria - que já ocorreu, e foi devidamente motivado, com se vê de fls.426 e seguintes. Em causa estiveram vários aspectos da matéria, através de meia dúzia de agravos em vertentes de exame, que a decisão recorrida mostra, e que ficou consolidada, por forma que, não é altura, agora, de o Supremo poder censurar. (Fls.726 a fls.731). Pode não o ter sido no melhor sentido convocado pela posição do recorrente, mas não houve qualquer omissão relevante de pronúncia, como pretende fazer valer. De qualquer modo, é matéria que retomaremos ao longo do desenvolvimento, como está descrita a fls. 522 a 524, inserindo-a no discurso, na medida indispensável ao exercício judicativo que lhe corresponde. 2. Passemos à questão B). A questão, em síntese, é esta: O recorrente defende que os quesitos 13º e 16º são conclusivos, porquanto contêm um juízo de valor ou matéria de direito, devendo ter-se por não escritas as respostas dadas a estes quesitos, conforme determina o artigo 646º, nº 4, do C.P.C. Em tais quesitos perguntava-se se as alterações, impostas pelo réu, ao projecto inicial teriam custado 500.000$00; e se o proveito que o autor deixou de retirar da obra teria sido de 333.000$00 (fls. 84 verso, 1º volume). Sucede que as repostas foram dadas, a fls. 421, do 2º volume, dizendo-se, no que respeita ao artigo 13º que foi «provado apenas que o autor teve que suportar as despesas com a mão de obra necessária à reconstrução das escadas, de valor que não foi possível determinar»; e, no que respeita ao artigo 16º, que foi «provado apenas que o autor, se concluísse a obra, teria obtido lucro de valor que não foi possível determinar». Aspectos estes tidos em consideração na sentença, fls.532, e em que o acórdão recorrido se revê, fls.752, em termos que adiante serão apreciados. (Pontos: 4.4.1.; e 4.4.2.). 3. A alínea C) coloca a questão de, o facto dado como provado, da desistência da empreitada pelo réu, não admitir prova testemunhal, porque ele próprio - o contrato de empreitada - foi celebrado por escrito, «sendo que o artigo 394º do Código Civil impede semelhante admissibilidade». Diz, mais precisamente o recorrente: «os pedidos de 750.000$00 + 750.000$00 e de 333.000$00 (e de 500.000$00 pelas alterações da obra) assentam na desistência da empreitada. Tendo o contrato sido celebrado por escrito e constando dele que a execução das obras se faria segundo o estabelecido no projecto - também este exarado por escrito, é inadmissível a prova testemunhal (a única que foi feita) para prova da extinção de obrigações ou da própria relação obrigacional, nunca poderia ser provado por testemunhas - artigos 395º e 394º, n.º1 do CC». Não é correcto, nem parece justo este resultado jurídico. O artigo 393º-1, impede a prova testemunhal «se a declaração negocial, por disposição da lei, ou estipulação das partes, houver de ser reduzida a escrito, ou necessitar de ser provada por escrito.» Ora, as partes não estipularam forma especial para a declaração, de jeito que se presuma, agora que, não se quiseram vincular, senão pela forma convencionada, segundo o n.º 1, do artigo 223º do Código Civil; nem aqui, a lei exige para o contrato de empreitada qualquer forma negocial escrita. Estamos no âmbito da livre consensualidade (artigo 219º). E ainda que assim não fosse, não tinha nenhum sentido razoável de equilíbrio justo, ou de justiça comutativa, que o autor tivesse, sem necessidade convencional ou legal, usado forma escrita para a celebração da empreitada e invocasse agora, a seu benefício, a impossibilidade de prova de desistir da obra, só porque a sua própria desistência não foi reduzida a escrito...! 4. A alínea D) levanta a questão relativa às quantias de 750.000$00 + 750.000$00, respeitantes a duas parcelas do preço da obra, preço esse fraccionado, no contrato de empreitada, que o réu foi condenado a pagar ao autor. Face à desistência da empreitada, por parte do dono da obra - diz o recorrente - «cessa o contrato de empreitada e, aquilo a que o empreiteiro tem direito é só à indemnização estabelecida no artigo 1229º do C.C., o que nunca pode reconduzir-se as prestações do preço vencidas, antes da desistência da obra, sendo que o montante da indemnização prevista nesse dispositivo, tem de ser determinado em função dos efectivos valores correspondentes ao trabalho despendido, até ao momento da desistência». E sucede, conclui, no aspecto em consideração, que não se provaram quais as despesas e respectivo valor que o A. tenha despendido com a parte da obra realizada. 4.1. Poderá dizer-se, como pondera a sentença (fls. 533) na qual se apoia a decisão recorrida, que, neste caso, o direito do autor de receber as duas prestações, cada qual de 750.000$00, venceu-se - independentemente da obra estar concluída - com a conclusão da fase obra correspondente ao vencimento dessas prestações, porque assim resulta da cláusula 4ª do contrato de empreitada, cujo valor total era de 4.250.000$00. A cláusula estabelece: «O pagamento do preço será efectuado, nos termos definidos na cláusula n.º 4ª, als. a) a f) do contrato: a) após 15 dias ininterruptos de trabalhos - 500.000$00; b) após a conclusão das duas primeiras placas e escadas para o rés-do-chão - 750.000$00; c) após conclusão das segundas placas e escadas do rés-do-chão para o 1º andar - 750.000$00; d) após conclusão da terceira placa - 750.000$00; e após a conclusão do telhado - 750.000$00; f) após conclusão dos trabalhos - 750.000$00». E sucedeu o seguinte, como vem provado: Após 15 dias ininterruptos de trabalhos (condição da al. a) da clausula 4ª), o réu pagou ao autor a quantia de 500.000$00. Concluídas a duas primeiras placas e as escadas das caves para o rés-do-chão [al. b) da clausula 4.ª], foi paga a quantia de 750.000$00, o que somou, como entrega total, 1.250.000$00. (O custo total era de 4.250.000$00). O autor executou ainda as segundas placas e as escadas do rés-do-chão para o 1 º andar (al. c) da clausula 4ª - o que completou em 25.09.92. Executou e concluiu as terceiras placas (do tecto do 1º andar) - {al. d) da clausula 4ª - o que completou em 15.10.1992. Pela execução destas duas fases, conforme o clausulado, [al. c) e d) da clausula 4ª], o réu nunca pagou ao autor o valor estipulado - no total de 1.500.000$00. E, como reconhece, só mais tarde desistiu da obra. Todavia, verifica-se (fls.535), que os erros de execução não são imputáveis ao autor, pois, ou são da responsabilidade do próprio réu (eliminação de pilares e consequente necessidade de reforçar as placas) ou são violações de obrigações do próprio réu (fabrico do cimento na obra, em vez de mandar vir "betão pronto" de fábrica, estando o réu contratualmente obrigado a fornecer os materiais); ou, por último, são erros do próprio projecto (implantação de pilares e necessidade de alterar o local de implantação das portas de entrada das escadas e varandas fronteira). Na matéria de facto julgada, considerou-se ainda que, a segunda peritagem esclareceu estes aspectos, sendo que, a clausula n.º 2, do contrato, prescrevia que a execução da obra no tosco pelo autor, fosse efectuada "de acordo com o projecto e processo de licenciamento de obras da Câmara Municipal de Mangualde" - o que autor observou. 4.2.Vale isto por dizer que, quando se venceram, a primeira prestação, de 750.000$00, em 25 de Setembro de 1992, e a segunda prestação, de igual quantia, em 15 de Outubro seguinte, a prestação do autor estava pontualmente cumprida, segundo o que se tinha obrigado pela cláusula 4ª transposta acima. Quem não cumpriu foi o réu, ao não pagar, segundo o estipulado na dita clausula, no prazo aceite, não obstante o trabalho tempestivamente realizado, correspondente às duas primeiras fases de execução da obra em tosco. O fraccionamento do pagamento preço global, foi estabelecido em função do faseamento da obra. Cumprida a fase, há que pagá-la, conforme ao combinado e aceite pelas partes. Por outro lado, é bom dizer, não foi o autor quem abandonou a obra. Tudo isto vale para dizer que, estamos perante prestações pecuniárias (obrigações) com prazo certo, estabelecido e aceite pelas partes, finda a fase correspondente à execução da parcela equivalente da obra. É fácil de perceber. O recorrente acaba por pretender baralhar o que é claro. Vencem-se nas datas combinadas, como obrigações de capital, e dão lugar ao começo de vencimento de juros respectivos à taxa legal sucessivamente em vigor, se não forem satisfeitas nas datas de vencimento estabelecidas, cumpridas que estejam - e estavam - as fases correspondentes de execução da obra. (Artigos 804º-1 e 806º- 1 e 2, do Código Civil). 4.3. É certo que a tese do recorrente, sustentada por claro e bem elaborado parecer universitário, (1) não encara assim esta realidade, revendo-se na ideia de que a desistência do réu fez cessar todos os efeitos contratuais, além de que não está provado haver correspondência entre o trabalho efectuado e aquelas quantias de 750.000$00 + 750.000$00, reclamadas na petição e pelas quais houve condenação, como ficou transcrito. (Pontos 1 e 2, Parte I). Com o devido respeito, não se nos afigura que a desistência arrase (2) todo o passado contratual, mesmo o não cumprido por facto não imputável ao autor. Ao contrário, este cumpriu pontualmente a execução do tosco da obra, segundo o projecto e os materiais fornecidos pelo réu, até, finalmente, lhe ser dado conhecimento da desistência (impedido pelo réu de continuar na obra). Seria até, ir contra os mais elementares princípios da boa fé, lealdade e lisura de actuação contratual das partes, que o autor tivesse honrado a sua palavra escrita, efectuando, com era de sua arte, o trabalho, conforme ao projecto e com os materiais fornecidos pelo réu; o apresentasse cumprido nas datas estipuladas e calendarizadas (25 de Setembro de 1992 e 15 de Outubro de 1992); e, apesar dessa sua pontualidade, o réu, não lhe pagasse, invocando erros de execução da obra, não imputáveis ao cumpridor! Pela tese da cessação de todos os efeitos contratuais, mesmo os do passado, poder-se - ia chegar ao limite de, dar ao réu o direito de pedir a devolução da quantia de 1.250.000$00, entregue como contrapartida da execução dos primeiros quinze dias ininterruptos de trabalho do autor (clausula 4ª) e que este respeitou. 4.4. Analisemos os problema pelo lado da indemnização resultante da desistência da obra, por parte do réu. O problema é do quantum indemnizatório a que fica obrigado o desistente. Comecemos por transcrever e explicar o artigo 1229º do Código Civil, disposição cuja aproximação ao aspecto que acaba de salientar-se, é nuclear à economia de análise do objecto da revista. Dispõe o preceito, integrado na secção V - extinção do contrato de empreitada - «O dono da obra pode desistir da empreitada a todo o tempo, ainda que tenha sido iniciada a sua execução, contanto que indemnize o empreiteiro dos seus gastos e trabalho e do proveito que poderia tirar da obra». A regra transcrita explica-se pela possibilidade que dá ao dono da obra de, livremente, fazer extinguir o contrato (ou alterar a obra - artigo 1216º), desde que repare os prejuízos que cause ao empreiteiro, incluindo o proveito que este poderia tirar da obra, se a completasse. Trata-se do exercício de um direito potestativo, a benefício do dono da obra, porque se desinteressou de a realizar, porque perdeu a confiança no empreiteiro, porque estão reunidas condições diferentes que lhe apontam a adesão a outros interesses, porque pretende parar, porque pretende fazer executar a obra por outro, porque pensou outro projecto de vida, ou outro projecto de obra, porque pretende adiar o projecto, e por aí adiante...! Estamos em presença de uma norma imperativa, de ordem pública, que acolhe perfeitamente o direito ao arrependimento (e que encontramos, em regra, no chamado direito contratual de consumo - aqui até sem dar lugar a qualquer indemnização). Imperatividade que se traduz no impedimento das partes não puderem afastar este arrependimento do dono da obra, ficando como fica acautelado o interesse do empreiteiro, a salvo de qualquer prejuízo, ou não proveito que pudesse obter com a permanência do contrato e a execução completa do contratado. Cessou o dever de prestação de parte a parte, independentemente do dever das prestações contratuais recíprocas. Mas cessou, sem retroacção, a partir do conhecimento - expresso ou tácito - que o autor teve da vontade do réu de que ele abandonasse a execução da obra em curso. Já há pouco se focou este aspecto. Mas temos agora ocasião de ponderar mais o seguinte: O que, com a desistência do réu, nasce na esfera jurídica do autor, é um direito novo - o direito a ser indemnizado com fonte num facto lícito (a desistência da obra por parte do dono da obra) que o obriga a reparar o dano que, com isso, lhe vier a causar. Recorde-se (e nesta passagem é importante recordar) que a lei é precisa quando previne que o autor pode fazer cessar os efeitos contratuais, mas " contanto que indemnize o empreiteiro". E recorde-se ainda, no mesmo propósito, que o legislador disse o que queria, exprimiu o seu pensamento pelas palavras mais adequadas - artigo 9º-3 do Código Civil. O objecto da obrigação de indemnizar, agora constituída, tem como referências o valor do trabalho que o autor despendeu com as alterações do projecto da obra, impostas pelo réu - o que não foi orçado; ainda o trabalho realizado e aplicado na obra orçada; e o proveito que deixou de retirar, se tivesse concluído a obra, tudo nos termos acordados. (São «os gastos, o trabalho e o proveito que poderia tirar da obra» - diz o preceito). A fixação dos gastos e trabalho não está relacionada com o preço da empreitada. Este pode interessar para a fixação dos proveitos, mas não para a fixação do que se gastou em material e trabalho, por causa da desistência. A determinação dos proveitos que o empreiteiro poderia tirar da obra terá por base a obra completa e não apenas a que foi executado. Terá pois de se atender, para cálculo do "proveito", ao custo global da empreitada e ao preço fixado. Da subtracção destas duas verbas resultará o lucro. (Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil, Anotado, artigo 1229, notas n.º 5 e n.º 6). 4.4.1. Neste percurso de análise, interessa, então, verificar qual o quantitativo da indemnização que se busca encontrar e que prova sobre ele, se projecta no processo, para ser calculada a sua expressão numérica. Que montante indemnizatório, pergunta-se? A questão vem colocada pelo recorrente nas alíneas E), e F), há pouco transcritas, na Parte II - objecto da revista. Neste contexto observa, na alínea E), que o tribunal o condenou, socorrendo-se da equidade, por carência de elementos de prova, no pagamento de 333.000$00, relativo ao proveito que o empreiteiro retiraria da obra, se caso a tivesse concluído. E na alínea F), que o tribunal o condenou a pagar, também com base na equidade, a quantia de 500.000$00, relativa ao valor dos trabalhos que, por força das alterações ao projecto exigidas por ele recorrente, dono da obra. Quanto a este aspecto, a Relação (fls.752), confirmando o que havia dito a sentença (fls. 532), esclareceu que "não se provou o valor desses trabalhos não previstos na execução do contrato", por aí aceitando a fixação equitativa da indemnização. 4.4.2. A equidade só é fonte (mediata) de direito, no Direito Português, quando a lei expressamente o disser, ou as partes a convencionarem no âmbito das suas relações disponíveis (artigo 4º do Código Civil). Claro que, no caso em apreço, as partes não convencionaram o recurso à equidade. E a fonte possível do seu uso aqui, residiria no artigo 566º - 3 do Código Civil, preceito invocado, para tanto, pelas instâncias. (Fls.531 e 753). Diz o n.º3 aludido que «se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados». Este preceito está contido na norma do dito artigo 566º, que respeita à indemnização fixável em dinheiro, a qual «tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal, e a que teria nessa data se não existissem os danos». (N.º2). Como é reconhecido, trata-se da consagração da teoria da diferença da situação patrimonial do lesado (credor da indemnização), antes e depois, da produção do efeito danoso, decorrente de facto lícito ou ilícito, ou causado pelo risco de certa actividade, e que obrigue a indemnizar. Independentemente de estarmos perante um efeito danoso, cuja fonte é proveniente do exercício de um direito potestativo do réu (direito de desistir livremente da obra ou alterá-la), e não uma violação ilícita (contratual ou extracontratual), a verdade é que não é configurável, nem necessário, o recurso à equidade, quando há elementos objectivos determináveis para averiguar o valor exacto dos danos, empregando palavras do preceito reproduzido acima. A diferença patrimonial há pouco falada, é susceptível de determinação exacta, sem necessidade de recurso ao critério, mais aleatório e menos objectivo, do cálculo equitativo da indemnização devida ao lesado. Não tem que ser necessariamente no valor estimado de 333.000$000, ou de 500.000$00. Pode ser mais ou menos, dentro de limites que, uma avaliação objectiva e criteriosa, possa fornecer em processo de liquidação adequado. Ora, é inquestionável que existe prejuízo do empreiteiro, pois que trabalhou nas alterações do projecto impostas pelo réu, sem nenhuma contrapartida; deixou de ter proveitos que retiraria se tivesse concluído a obra, dela sendo forçado a desistir pelo autor, que, já se disse, também lhe impôs aquelas alterações. Lá que há danos, reais e efectivos, produzidos na esfera jurídica do autor, por facto imputável ao réu, isso há! Outro tanto reconheceram a instâncias ao legitimar o seu cálculo através da equidade! Não se pode dizer que houve um fracasso da prova da sua existência, obstando por isso a que ela (a prova) se reabra em futuro processo. O que se pode dizer é que, verificada a existência desses danos, podem surgir melhores elementos de prova relativamente à sua quantificação, não devendo ser fechada essa possibilidade ao autor, como resulta da solução dada pelas instâncias (fls. 532). O que vale por dizer que, verificado o dano, não havendo entretanto quantitativo que se possa considerar seguramente provado, e podendo ser averiguado o seu valor exacto, o tribunal poderá condenar o réu, no que se vier a liquidar em execução de sentença (artigo 661º-1, do Código de Processo Civil), incluindo juros, sendo caso, conforme se vai explicar, de seguida. (3) 5. Finalmente, a questão colocada pelas alíneas G) e H). Respeita à existência, ou não, de obrigação de juros, e a existir, ou, na medida que exista, qual a data de inicio do respectivo vencimento. Em resumo, nesta parte diz o recorrente: a) Não são devidos juros pelo créditos de 750.000$00 + 750.000$00, a partir, respectivamente, de 25/9/92, e de 15/10/92, porque foram substituídos pela obrigação de indemnização, por força da desistência do contrato; além de que não têm prazo certo, nem ele, réu, foi alguma vez interpelado para cumprir. Já nos referimos a este aspecto no ponto 4.2, quer quanto à obrigação de prestar o pagamento pelo réu como determinou a sentença e o acórdão recorrido, quer quanto à obrigação de juros, às taxas sucessivamente em vigor, desde as datas estipuladas para cumprir (25 de Setembro e 10 de Outubro de 1992). Aí se concluiu que são devidas as prestações pecuniárias a partir do vencimento. O autor cumpriu pontualmente a prestação de execução da fase (as duas fases) da obra, conforme se obrigara (veja-se a referenciada várias vezes, clausula 4ª). A desistência da obra, por parte do dono/réu, não pode legitimar o incumprimento da prestação que combinou, atingidos os prazos, e cumpridas dentro deles, pelo autor/empreiteiro, as fases correspondentes da obra que, para com ele, réu, se obrigara executar, com ficou explicado. b) Não são devidos juros de mora relativos às importâncias de 333.000$00 e de 500.000$00, desde a citação, pois que, terão sido determinadas com recurso a juízos de equidade, o crédito é ilíquido e, sendo ilíquido, não há mora, enquanto se não tornar liquido. É a tese do recorrente, suportado pelo parecer, várias vezes referido. Vejamos, por fim, este aspecto: 5.1. A obrigação de juros supõe uma obrigação de capital. Os juros que são indicados na alínea b), anterior, decorrem da obrigação de capital indemnizatório, obrigação originada pela cessação do contrato de empreitada, em virtude da desistência do dono, no exercício de um direito potestativo, como também foi explicado. A obrigação de indemnizar é uma divida de valor, tem cariz pecuniária. Precisando as palavras, é uma divida de capital. Ora, também já ficou sublinhado que, afastado que foi o critério da equidade para calcular a medida da indemnização, relativamente ao valor dos trabalhos que o autor realizou por força das alterações ao projecto, alterações solicitadas pelo réu, e ao proveito que deixou de receber por ter sido impedido pelo réu de completar a obra, então significa que a obrigação de capital está por liquidar, é incerta no quantum e, como tal, ainda não se tornou definitivamente exigível. Não surpreende que não tenha ainda originado, a partir de data certa, a obrigação paralela de juros. Aspecto que dá razão ao recorrente. Com uma observação ainda: A decisão recorrida, socorrendo-se indevidamente da equidade, fixou a indemnização em 833.000$00 (500.000$00 + 333.000$00), não tendo este valor sido impugnado pelo recorrido. O que releva para efeitos da liquidação que não poderá ultrapassar aquele montante, já que o réu não recorreu para ficar prejudicado. (Artigo 684º- 4, do Código de Processo Civil). 6. Sintetizando tudo quanto se expôs, e tentando responder, com o alinhamento possível, pelas conclusões do recorrente: a) A matéria de facto ficou definitivamente julgada pelas instâncias. b) São devidas ao autor as quantias de 750.000$00 + 750.000$00 a que o réu se vinculou entregar-lhe nas datas de vencimento (25/9/92 e 10/10/92), dado que cumpriu pontualmente até aí, como se havia também vinculado, e antes de ter sido forçado pelo réu, a desistir da obra, não operando a desistência, com efeitos retroactivos, por forma a legitimar o incumprimento, por parte do réu, da obrigação que assumira em relação à entrega das ditas quantias, correspondentes a parte da obra feita, no prazo combinado com o empreiteiro. c) Não tendo sido pagas nas datas dos respectivos vencimentos, porque se trata de prestações pecuniárias, com prazo certo, vencem juros de mora, a partir dessas datas, até integral satisfação, às taxas legais supletivas, sucessivamente em vigor. d) O autor, porém, só pediu juros até à propositura da acção, e assim, só por essa medida, o réu foi condenado a pagá-los, ou seja, conforme ao pedido [ pontos 2, e 3; e alínea B), todos da Parte I]. e) E vencem-se ainda juros sobre esta mesma quantia de 1.500.000$00, (750.000$00 + 750.000$00), desde a citação, conforme ao pedido e à decisão recorrida [fls.755, ponto 3, e alínea C), ambos da Parte I]. f) O dono da obra goza do direito potestativo à livre desistência ou alteração da obra, a todo o tempo, extinguindo o contrato, ainda que iniciada a obra. g) A obrigação de indemnizar emergente da desistência da obra, por parte do dono, é calculada em função dos gastos efectivos e do trabalho do empreiteiro por causa da extinção do contrato, e ainda dos reais proveitos que deixou de receber, em virtude de não proceder ou não continuar a execução da obra que empreitara, tudo conforme ao que determina o artigo 1229º do Código Civil. h) Estando judicialmente verificados danos decorrentes da desistência da obra por parte do dono, mas não sendo possível quantificá-los, na acção declarativa onde se opera a verificação, a condenação poderá fazer-se pela quantia que se liquidar em execução de sentença. i) Todavia, se, na acção declarativa da verificação dos danos, estes houveram sido calculados, em razão da equidade na quantia de 833.000$00 (500.000$00 + 333.000$00), e o autor (credor da indemnização a calcular) não houver impugnado a decisão recorrida, e houver recurso de devedor - como é o caso - então, a liquidação não poderá ultrapassar a quantia fixada, tendo em conta a regra do artigo 684º-4, do Código de Processo Civil. V Termos em que, acordam no Supremo Tribunal de Justiça, em revogar a decisão recorrida, na parte que fixou a indemnização de 833.000$00, com base num calculo equitativo, e com juros desde a citação.Decisão A indicada indemnização fica substituída pelo quantitativo que vier a ser calculado como valor exacto dos danos, em liquidação de sentença, valor que não poderá ultrapassar, aquela indemnização, embora sem contar com o valor dos juros moratórios, à taxa legal, que se vencerem, e, eventualmente, não forem pagos, após a liquidação. Nesta medida, dá-se parcial provimento à revista. Custas pelo recorrente, sendo 1/10, a cargo do autor. Lisboa, 3 de Junho de 2004 Neves Ribeiro Araújo Barros Oliveira Barros ---------------------------------- (1) Autor, aliás, de uma monografia sobre a matéria, que várias vezes cita ao longo do parecer. (2) O douto parecer reconhece (fls.795) que a destruição retroactiva é discutível. E cita, no contexto, a obra do autor, também autor do parecer, Pedro Romano Martinez, Direito das Obrigações, Parte Especial. Contratos de Compra e Venda, Locação e Empreitada, 2ª edição 2003, Almedina, páginas 456. (3) Ou ainda que não condene, eles sempre poderão resultar do que dispõe a nova redacção do n.º2 do artigo 46ºdo Código de Processo Civil. |