Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ00012198 | ||
Relator: | E. SANTOS | ||
Descritores: | ACÇÃO CAMBIARIA PRESCRIÇÃO AMBITO OBRIGAÇÃO CAMBIARIA UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA | ||
Nº do Documento: | SJ19360508048655 | ||
Data do Acordão: | 05/08/1936 | ||
Votação: | MAIORIA COM 2 VOT VENC | ||
Referência de Publicação: | DG IªS 22-05-1936; COL OF ANO35,131; RLJ ANO69,13 | ||
Tribunal Recurso: | |||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | RECURSO PARA O PLENO. | ||
Decisão: | UNIFORMIZADA JURISPRUDÊNCIA | ||
Indicações Eventuais: | ASSENTO 5/1936 | ||
Área Temática: | DIR COM - TIT CREDITO. | ||
Legislação Nacional: | D 18552 DE 1930/07/03. D 18972 DE 1930/10/28 ARTIGO 1. CCOM888 ARTIGO 3 ARTIGO 284 PAR1 ARTIGO 339. CCIV867 ARTIGO 549 ARTIGO 550. CPC876 ARTIGO 1. LULL ARTIGO 25. | ||
Legislação Estrangeira: | CCIV ITALIA ART326. | ||
Jurisprudência Nacional: | ACÓRDÃO STJ DE 1906/12/18 IN COL OF ANO7 PAG88. ACÓRDÃO STJ PROC32374 DE 1908/05/22. ACÓRDÃO STJ DE 1911/04/04 IN COL OF ANO10 PAG135. | ||
Sumário : | A prescrição a que se refere o artigo 339 do Codigo Comercial não abrange a da obrigação constante da letra. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam os do Conselho no Supremo Tribunal de Justiça em sessão plenaria: A, na qualidade de inventariante e cabeça de casal no inventario a que se procedeu por obito do seu marido, B, instaurou, nos termos do decreto n. 18552 e alteração feita pelo artigo 1 do decreto n. 18972, execução pela quantia de 9230 escudos, constante de uma letra, contra C um dos avalistas da mesma letra, que o marido da exequente sacou em 3 de Novembro de 1921 contra a firma C. B. Anão Limitada, e esta aceitou, a vencer-se a sessenta dias da data. A letra foi arrolada e partilhada no respectivo inventario, julgado por sentença de 14 de Janeiro de 1929, ficando a pertencer esse pagamento aos menores D e E. O executado alegou, alem da ilegitimidade da exequente, que não vingou, a prescrição da obrigação e do direito de accionar a letra. Este Supremo Tribunal, pelo seu acordão de folha..., julgou, ut folha..., procedentes os embargos com relação a prescrição da acção cambiaria e improcedentes quanto a prescrição da obrigação, representada pela letra. A folha.... interpos o executado C recurso para tribunal pleno, alegando contradição com os acordãos de 18 de Dezembro de 1906, na Colecção Oficial, ano 7, pagina 88; de 22 de Maio de 1908, na revista n. 32374; e de 4 de Abril de 1911, na Colecção Oficial, ano 10, pagina 135. O recurso foi admitido e seguiu seus termos, devidamente minutado e contraminutado pelas partes. Tudo visto, relatado e discutido; Diz o artigo 339 do Codigo Comercial: "Todas as acções relativas a letras prescrevem em cinco anos, a contar do seu vencimento ou do ultimo acto judicial, se a respeito dela não houver sentença condenatoria ou se a divida não foi reconhecida por documento autentico ou autenticado feito em separado". So por si, a letra deste texto da lei repele a pretensão de se tornar extensiva a prescrição a obrigação causal, fundamental ou subjacente. Ao fim de cinco anos a simplicidade e garantia concedidas pelo processo especial de letra caducam, a obrigação formal ou cartelar deixa de ter os privilegios da acção cambiaria, os titulos passam a ter natureza de simples titulos particulares, necessitando de ser apoiados em acção ordinaria, sumaria ou sumarissima, por outros meios de prova, atinentes a verificação da obrigação subjacente do de não locupletamento. A letra da lei e a moral apoiam este modo de ver, e em tal caso a prescrição da obrigação fundamental ha-de regular-se pelos preceitos da lei geral, a civil, subsidiaria do direito comercial (artigo 3 do Codigo Comercial). As excepções mencionadas pelo citado artigo 339 do Codigo Comercial não as aplicou o acordão recorrido, nem são de aplicar a hipotese vertente. Fez-se pois justiça naquele acordão, que fica de pe. Negam por tal motivo provimento ao recurso e proferem o seguinte assento: A prescrição a que se refere o artigo 339 do Codigo Comercial não abrange a da obrigação constante da letra. Lisboa; 08 de Maio de 1936 E. Santos - Ramiro Ferreira - Arnaldo Vidal - Pires Soares - Alexandre de Aragão - Mendes Arnaut - (Tem voto de conformidade dos Excelentissimos Conselheiros Osorio de Castro, A. Campos, Pedro de Castro, J. Soares e Ponces de Carvalho, que não assinam por não estarem presentes. - E. Santos) - Carlos Alves (vencido pelos fundamentos do projecto do acordão que apresentei a discussão e que agora vão mais resumidos nas folhas a seguir) - Sampaio Duarte (vencido pelas razões que constam do voto antecedente ) - Arez (vencido pelos mesmos fundamentos). Julgou-se no acordão recorrido: a) A prescrição de cinco anos do artigo 339 do Codigo Comercial aplica-se as acções cambiarias, não abrangendo a prescrição da obrigação representada, que prescreve nos termos gerais; b) A mesma prescrição so se interrompe dadas as circunstancias do mesmo artigo e não se suspende a favor de menores, sendo inaplicaveis os artigos 549 e 550 do Codigo Civil. A segunda decisão harmoniza-se com a doutrina dos acordãos opostos, pois neles se julgou que a prescrição cambiaria, sendo especial, so se interrompe pelas causas taxativamente enumeradas no artigo 339, e que a menoridade não impede de se locupletar, decorridos os cinco anos desde o vencimento da letra ate a proprositura da acção. A primeira decisão, porem, esta em oposição com a tomada nos mesmos acordãos visto neles se decidir que a prescrição abrange a obrigação expressa no titulo. O recurso e, por isso, restrito a esta parte de direito, que se reduz a determinar a amplitude da prescrição cambiaria. Todas as acções relativas a letras, diz o artigo, prescrevem em cinco anos, e são emergentes da letra os do artigo 335 e seguintes, e por isso as do portador e regresso, e, porque estabelece uma prescrição negativa, deve entender-se de harmonia com o Codigo Civil, onde o instituto vem organizado, e porque o assento de 18 de Abril de 1933 não admite prazo de outra natureza, como e o da propositura de acções. As leis dizem que prescreve a acção para significar que prescreve o direito, pois a prescrição e instituto de extinção de direitos e obrigações (Codigo Civil, 505). A explicação da tecnica estara em que pelos Codigo Civil e Codigo de Processo Civil a acção e o meio de exercer o direito, de o efectivar, e, perdida a acção, pelo decurso de um prazo, o direito torna-se inerte e morto. Neste sentido a acção e um elemento de direito, confunde-se com ele: e o chamado sentido civilistico, em que o direito não vive sem a acção, e por isso as formulas "prescrição da acção" e "prescrição da obrigação" são equivalentes (Dias Ferreira, Codigo Civil, 1, pagina 3, e Covielo Mars, pagina 453). No sentido processual, e conceito moderno, a acção e o direito de provocar a actividade jurisdicional do Estado, por intermedio dos seus orgãos, independentemente da existencia de um direito a fazer valer, e a autonomia da acção. Mas então e um poder legal, um poder objectivo, a que não se aplica a prescrição, que supõe direitos subjectivados pelo exercicio. E, concretizado no processo, não e este que prescreve, porque a instancia se interrompe, suspende e extingue por outras razões. Do artigo 1 do Codigo de Processo Civil infere-se que a acção e o modo de exercer os direitos, e o processo e apenas a sua forma, e o artigo 339 do Codigo Comercial fala em prescrição da acção. De forma que, sendo imprescritivel como poder legal, não prescrevendo o processo, subjectivação deste poder, tendo na causa a formula legal no sentido civilistico, equivalente a da prescrição da obrigação. Não se ignora a corrente doutrinaria que restringe a prescrição de cinco anos do citado artigo 339 a acção, mas e baseado no conceito de que a prescrição não extingue as obrigações, pois subsiste um vinculo impeditivo da repetição da prestação, apesar de se fazer o pagamento depois de ela se completar, o que não sendo inteiramente exacto, pois pode ser alegado pelos credores prejudicados, contraria a doutrina do Codigo Civil, que expressamente classifica a prescrição como um modo de extinção das obrigações. E o impedimento a repetição pode explicar-se pela renuncia a prescrição adquirida. O fundamento da doutrina e o das obrigações naturais e e, pelo menos, muito discutivel se o nosso direito, a falta de disposição semelhante a do artigo 1235 do codigo frances, as admite de uma forma generica. E querer resolver uma questão com outra e, no dizer de Covielo, uma petição de principio. A analise do artigo corrobora que estabele uma prescrição propriamente dita, isto e, da obrigação cambiaria. Com efeito, a acção cambiaria prescreve em cinco anos, a contar do vencimento, mas, se ha sentença condenatoria, certamente não e a acção que prescreve, mas sim a divida, e a execução instaura-se no prazo da prescrição desta; se ha titulo autentico ou autenticado a reconhecer a divida, e esta que prescreve e não a acção (Dr. Sa Carneiro, Letras). E o argumento historico reforça esta opinião, como resulta das discussões legislativas sobre o artigo em causa. Concordando ser este o entendimento da questão, outras correntes doutrinarias introduzem-lhe a restrição no sentido de excluir da prescrição cambiaria de cinco anos a obrigação causal, para o que se parte da subsistencia desta ao lado da cambiaria (Revista de Legislação e Jurisprudencia, 65, pagina 20). E uma questão diferente, embora conexa, da ventilada nos autos, porque o acordão recorrido deixa que subsista a obrigação representada na letra e por isso a cambiaria. Ainda assim ao provabilismo de obrigações pode opor-se que a relação fundamental originaria da letra, se encorporou nesta, e tanto que nas relações imediatas constitui excepção ou meio de defesa, o que não sucederia se vivesse fora dela, e o artigo 284, paragrafo 1, mostra que se não e devedor simultaneamente pelas duas causas. Certamente a letra não e de geração espontanea, mas, criado o credito por outra causa, integrou-se nela, transformou-se em cambiario, vive nela e com ela se extingue quanto a letra perde os efeitos como tal. O paralelismo das obrigações daria o das acções e dos pagamentos, o que seria simplesmente injusto. Pode argumentar-se ainda com as legislações que, para o caso de se extinguir a acção cambiaria, estatuem, em determinadas condições, a acção de locupletamento, que algumas correntes doutrinarias entre nos tambem admitem, e que seria inutil se a obrigação fundamental subsistisse, e outro tanto permite a lei uniforme (vide Codigo italiano , artigo 3-6, e lei uniforme, artigo 25, anexo 2). E subsistindo, superflua e a de locupletamento, pois os fundamentos delas se contradizem ou, pelo menos, se excluem. O acordão recorrido e assento formulado não se integram na doutrina das obrigações naturais porque elas não tem acção, mas, se prescrevem nos termos gerais, podem ser exigidas enquanto a prescrição não se completa, o que lhe tira aquela natureza, e não se integram tambem nas outras correntes doutrinarias, porque o que subsiste e a obrigação representada na letra, a cambiaria; inutilizam a prescrição cambiaria, instituida por necessidade de comercio, encurtada pela lei uniforme para estabilização das situações e credito; e o instituto da letra a sofrer um golpe na sua estrutura e função. Por isso votei o provimento do recurso, a procedencia dos embargos e recusei adesão a doutrina do acordão e assento. |