Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
73/16.4YFLSB
Nº Convencional: SECÇÃO DE CONTENCIOSO
Relator: TAVARES DE PAIVA
Descritores: DELIBERAÇÃO DO CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA
DELIBERAÇÃO DO PLENÁRIO
ANULAÇÃO DA DECISÃO
EFEITOS DA SENTENÇA
CASO JULGADO MATERIAL
LIMITES DO CASO JULGADO
NULIDADE
EXECUÇÃO DE SENTENÇA
PRINCÍPIO DA IMPARCIALIDADE
IMPEDIMENTOS
VOTAÇÃO
CLASSIFICAÇÃO DE SERVIÇO
PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
JUIZ
RECURSO CONTENCIOSO
ÓNUS DE ALEGAÇÃO
ÓNUS DA PROVA
Data do Acordão: 03/30/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO CONTENCIOSO
Decisão: IMPROCEDENTE
Área Temática:
DIREITO ADMINISTRATIVO - ACTO ADMINISTRATIVO ( ATO ADMINISTRATIVO ) - CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO.
ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA - ESTATUTOS PROFISSIONAIS / MAGISTRADOS JUDICIAIS.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - PROCESSO DE DECLARAÇÃO / SENTENÇA ( EFEITOS ) / RECURSOS.
Doutrina:
- ALBERTO DOS REIS, “Código de Processo Civil” Anotado, Coimbra, vol. III, 94; Processo de Execução, vol. I, 2.ª Edição, 17.
- FREITAS DO AMARAL, A Execução das Sentenças do Tribunais Administrativos, Almedina, 2.ª Edição, 36-38, 41, 53, 57, 92 a 94.
- FREITAS DO AMARAL, com a colaboração de LINO TORGAL, Curso de Direito Administrativo, Vol. II, Almedina, 390 e 391.
- J. PACHECO DE AMORIM, «Os princípios gerais da atividade administrativa no projeto de revisão do Código do Procedimento Administrativo (CPA)», in C.J.A. n.º 100, 24-25.
- JORGE MIRANDA e RUI MEDEIROS, “Constituição da República Portuguesa” Anotada, tomo III, Coimbra, 566, 616.
- LUIZ CABRAL de MONCADA, “Código do Procedimento Administrativo” Anotado, Coimbra, 100.
- MANUEL DE ANDRADE, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra, 305 e 306.
- MARCELO CAETANO, Manual de Direito Administrativo, Vol. I, Almedina, 502 e ss..
- MÁRIO AROSO DE ALMEIDA e CARLOS ALBERTO FERNANDES CADILHA, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, 790, 860.
- MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, Anulação de actos administrativos e relações jurídicas emergentes, 41, 682 a 689; «Sobre a autoridade do caso julgado das sentenças de anulação de actos administrativos», Almedina, 52, 127, 128 e 136; in Scientia Iuridica, tomo LXII, 2013, 122, 128, 165, 166, 390 e 391.
- MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO COSTA GONÇALVES e J. PACHECO DE AMORIM, “Código do Procedimento Administrativo” Comentado, 2.ª Edição, Almedina, 178, 255, 647, 649.
- VIEIRA DE ANDRADE, A Justiça Administrativa (Lições), 9.ª Edição, Almedina, 372-374, 376.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 236.º A 238.º.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGO 581.º, N.º 4.
CÓDIGO DE PROCESSO NOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS (CPTA): - ARTIGOS 3.º, N.º 1, 50.º, N.º 1, 95.º, N.º 3, 158.º, N.ºS 1 E 2, 173.º, N.º 1, 176.º A 179.º, 192.º.
CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO (CPA): - ARTIGOS 9.º, 31.º, N.º 4, 69.º E SS., 72.º, N.º 2, 162.º, N.º 2, AL. I).
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGOS 2.º, 20.º, N.ºS 1 E 4, 205.º, N.º 2, 217.º, N.º 1, 218.º, N.º 1, 266.º, N.º 2, 268.º, N.º 4.
ESTATUTO DOS MAGISTRADOS JUDICIAIS (EMJ): - ARTIGOS 137.º, N.º 1, 142.º, 149.º, N.º 1, 150.º, N.º 2, 156.º, N.º 2, 176.º, N.º 1, 178.º,
REGULAMENTO DAS INSPECÇÕES JUDICIAIS (RIJ), APROVADO PELA DELIBERAÇÃO N.º 55/2003, DO CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA – PUBLICADA NO DIÁRIO DA REPÚBLICA, 2.ª SÉRIE, N.º 12, DE 15 DE JANEIRO DE 2003 E SUCESSIVAMENTE ALTERADO: - ARTIGO 16.º, N.º 1, ALÍNEAS A) E B).
Referências Internacionais:
CONVENÇÃO EUROPEIA DOS DIREITOS (CEDH): - ARTIGO 6.º.
Jurisprudência Nacional:

ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO:

-DE 08 DE JANEIRO DE 1965, AD N.º 39, 465; DE 07 DE ABRIL DE 1987, AD N.º 315, 323.
-DE 17 DE JUNHO DE 2003, PROCESSO N.º 0666/03, AMBOS ACESSÍVEIS EM WWW.DGSI.PT
-DE 24 DE NOVEMBRO DE 2004, PROCESSO N.º 0565/04.
-DE 7 DE DEZEMBRO DE 2011, PROCESSO N.º 0419/11, ACESSÍVEIS EM WWW.DGSI.PT .
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ACÓRDÃOS DO PLENO DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO:

-DE 23 DE JANEIRO DE 2003, PROCESSO N.º 048079.
-DE 21 DE MARÇO DE 1991, PROCESSO N.º 019760, E DE 29 DE JANEIRO DE 1997, PROCESSO N.º 027517, AMBOS ACESSÍVEIS EM WWW.DGSI.PT .
-DE 27 DE OUTUBRO DE 2005, PROCESSO N.º 0408/05, ACESSÍVEL EM WWW.DGSI.PT .
-DE 2 DE JULHO DE 2008, PROCESSO N.º 01328A/03, ACESSÍVEL EM WWW.DGSI.PT .
-DE 15 DE OUTUBRO DE 2008, PROCESSO N.º 028055ª, ACESSÍVEL EM WWW.DGSI.PT .

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ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

-PROCESSOS N.º 126/13.0YFLSB – EM 20 DE MARÇO DE 2014 - E N.º 4/14.6YFLSB - EM 25 DE SETEMBRO DE 2014 –, AMBOS ACESSÍVEIS EM WWW.DGSI.PT , BEM COMO OS PROFERIDOS NOS PROCESSOS N.º 5/13.1YFLSB – EM 8 DE MAIO DE 2013 –, N.º 8/14.9YFLSB – EM 14 DE OUTUBRO DE 2015 – E N.º 80/15.4YFLSB – EM 17 DE DEZEMBRO DE 2015, SUMARIADOS, RESPECTIVAMENTE, EM HTTP://WWW.STJ.PT/FICHEIROS/JURISP-SUMARIOS/CONTENCIOSO/CONTENCIOSO-2013.PDF E EM HTTP://WWW.STJ.PT/FICHEIROS/JURISP-SUMARIOS/CONTENCIOSO/CONTENCIOSO-2015.PDF .
-DE 28 DE JANEIRO DE 1997, CJSTJ, TOMO I, 8.
-DE 8 DE NOVEMBRO DE 2007, PROCESSO N.º 4674/07, ACESSÍVEL EM WWW.DGSI.PT .
-DE 15 DE OUTUBRO DE 2013, PROFERIDO NO PROCESSO N.º 64/13.7YFLSB E SUMARIADO EM HTTP://WWW.STJ.PT/FICHEIROS/JURISP-SUMARIOS/CONTENCIOSO/CONTENCIOSO-2013.PDF .
-DE 9 DE JULHO DE 2014, PROFERIDO NO PROCESSO N.º 1/14.1YFLSB E SUMARIADO EM HTTP://WWW.STJ.PT/FICHEIROS/JURISP-SUMARIOS/CONTENCIOSO/CONTENCIOSO-2014.PDF .
-DE 24 DE FEVEREIRO DE 2015, PROCESSO N.º 50/14.0YFLSB, ACESSÍVEL EM WWW.DGSI.PT .
-DE 9 DE JULHO DE 2015, PROCESSO N.º 51/14.8YFLSB.
-DE 24 DE NOVEMBRO DE 2015, PROCESSO N.º 125/14.5YFLSB.
Sumário :

I - As decisões judiciais que anulam actos administrativos produzem, ademais, um efeito preclusivo, o qual se reconduz à imposição à administração, em sede de renovação do acto anulado, da proibição de reincidir nos vícios que determinaram a anulação. Por isso, a invalidade do acto reincidente será sempre primeiramente aferida por referência à sentença que declarou a invalidação do acto anterior.
II - O alcance negativo do efeito preclusivo do caso julgado não impõe, em regra, à administração o conteúdo de determinados actos mas apenas a observância de uma regra de não contrariedade ao decidido, cuja geometria depende do concreto conteúdo do acertamento judicial e, em particular, dos vícios determinantes da anulação, os quais integram o caso julgado.
III - A execução da decisão anulatória – aqui entendida como o cumprimento voluntário da mesma pelo ente administrativo – importa que a administração adopte as medidas necessárias à adequação do plano factual à realidade jurídica definitivamente estabelecida pela sentença anulatória, sempre em homenagem ao princípio da reconstituição da situação hipotética actual. (n.º 1 do art. 173.º do CPTA).
IV - A sanção da nulidade a que se referem a al. i) do n.º 2 do artigo 162.º do CPA e o n.º 2 do art. 158.º do CPTA tem em vista assegurar o respeito pelo princípio da subordinação do poder administrativo ao poder judicial.
V - Tendo o precedente acórdão proferido pelo STJ anulado a deliberação então impugnada por ter constatado que determinados vogais do CSM que a votaram estavam impedidos de o fazer, é de concluir que o efeito preclusivo do caso julgado se cinge à participação daqueles na renovação da deliberação em causa, pelo que apenas se impunha que os mesmos não interviessem na votação da nova decisão.
VI - Depreendendo-se da conjugação do n.º 1 do art. 137.º e do n.º 2 do art. 156.º, ambos do EMJ, que, para deliberar validamente, não se poderia prescindir da presença de, pelo menos, dois dos vogais que são juízes de direito e posto que, do mencionado aresto, não se pode extrair que a valoração ali efectuada é extensível a qualquer outro juiz de 1.ª Instância que, transitoriamente, desempenhe aquele cargo, é inviável concluir que a presença de juízes de direito no momento da votação da deliberação ora impugnada ofende o caso julgado.
VII - Só o cabal cumprimento, pelo recorrente, do ónus de alegação e de prova de factos demonstrativos da existência de um qualquer impedimento por parte dos actuais vogais de 1.ª instância poderia espoletar a aplicabilidade da proibição da presença no momento da votação (n.º 4 do art. 31.º do CPA).
VIII - Ao decidir que a deliberação impugnada seria apenas votada pelos restantes membros do seu Plenário, o CSM agiu de modo adequado e idóneo a preservar a imagem de descomprometimento e equidistância da administração, dando assim cabal cumprimento ao dever que, em benefício do princípio da imparcialidade, lhe é imposto pela parte final do art. 9.º do CPA.
IX - No contexto da impugnação de deliberações do Plenário que versem sobre classificações de serviço, tem este STJ uniformemente entendido que a sua intervenção se confina às situações em que se detecte uma ofensa clamorosa aos princípios que regem a actividade administrativa, um erro grosseiro ou o emprego de critérios manifestamente desajustados, pois trata-se de um domínio em que o CSM actua no campo da chamada “discricionariedade técnica”, sendo certo que a adopção de solução diversa equivaleria à apropriação de prerrogativas exclusivamente conferidas àquela entidade e à substituição à mesma na prossecução de funções próprias que lhe estão legalmente confiadas.
Decisão Texto Integral:

 Acordam no Supremo Tribunal de Justiça

AA , Juiz ..., vem interpor recurso da deliberação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura de 12.07.2016 , que julgou improcedente a reclamação apresentada pelo ora recorrente da deliberação do Conselho Permanente do Conselho Superior da Magistratura de 18.03.2014 , que atribuiu ao ora recorrente na sequência de inspecção ao serviço desempenhado no período compreendido entre 27.05.2008 e 31.12.2012 a notação de “ Bom com Distinção”.

 Nas suas alegações o recorrente apresentou as alegações nos seguintes termos:

I - Enquadramento da deliberação impugnada:

Como se dizia na p. i, e como a própria douta deliberação impugnada refere, ela foi proferida em execução do douto acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 9 de julho de 2015, no Processo n9 51/148YFLSB - Secção do Contencioso (de que se juntou cópia como doe. 2).

Tal douto acórdão anulou a douta deliberação do Plenário do Conselho

Superior da Magistratura, de 17 de junho de 2014, que decidiu atribuir ao A. a

classificação de serviço de "BOM COM DISTINÇÃO"

 O A embora a respeitasse, impugnou a apreciação feita por essa douta deliberação/ invocando (i) verifícar-se o vício de omissão de pronúncia, (ii) para além do vício de falta de fundamentação, (iii) a violação do princípio da imparcialidade, (iv) e erro manifesto na apreciação dos pressupostos de jurídico-factuais.

O Supremo Tribunal de Justiça julgou improcedentes os dois primeiros vícios invocados, mas anulou a deliberação por julgar verificada a violação do princípio da imparcialidade, considerando prejudicada a apreciação do quarto vício invocado.

O Supremo Tribunal de Justiça considerou violado o princípio da imparcialidade uma vez que no respetivo procedimento tinham participado os 4 Ex.mos Senhores Juízes da 1& Instância, Vogais do Conselho Superior da Magistratura, apesar da existência de um objetivo conflito de interesses.

Como é sabido, dispõe o nD 1 do artigo 173Q do CPTA, a propósito da execução das decisões judiciais de anulação de atos, o seguinte:

Sem prejuízo do eventual poder de praticar novo ato administrativo, no respeito pelos limites ditados pela autoridade do caso julgado, a anulação de um ato administrativo constitui a Administração no dever de reconstituir a situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado, bem como de dar cumprimento aos deveres que não tenha cumprido com fundamento no ato entretanto anulado, por referência à situação jurídica e de facto existente no momento em que deveria ter atuado.

Para dar cumprimento a tal norma, o Conselho Superior da Magistratura voltou a deliberar, (i) considerando caso julgado o doutamente decidido pelo Supremo Tribunal de Justiça quanto aos vícios de omissão de pronúncia e de falta de fundamentação invocados na reclamação e (ii) reproduzindo o que deliberara quanto ao vício sobre o qual o Supremo Tribunal de Justiça não se pronunciou (erro manifesto na apreciação dos pressupostos jurídico-factuais) por julgar prejudicada a sua apreciação (face a ter julgado procedente a impugnação com base na violação do princípio da imparcialidade).

É esta a douta deliberação impugnada.

II - Nulidade por violação do caso julgado e do princípio da imparcialidade:

1.Invocava-se na p. i. que o A. requerera ao Conselho Superior da

Magistratura certidão com a indicação dos Senhores Conselheiros que participaram na

deliberação impugnada, bem como daqueles que a assinaram. A entrega de tal

certidão ou junção aos autos do PA, maxime da ata em que a deliberação impugnada foi

tomada/ permitiria apurar se existem ou não outras nulidades [já que o teor da sua

notificação (referido doe. 1 junto com a p. i.) não indicava quais os Senhores Vogais que

estiveram presentes ou os que participaram na deliberação - uma vez que as respetivas

assinaturas não são suficientemente legíveis],

Invocando-se, porém, que parecia evidente que a douta deliberação impugnada era nula, desde logo, por violação de caso julgado, face ao extrato da ata que ao A. foi enviado com a notificação da deliberação ora impugnada, onde se escreve que (...) embora encontrando-se presentes, foram considerados impedidos áe votar os Exmos. Vogais Juízes de Primeira Instância (...). (Mas que não são identificados).

O A. (salvo lapso do signatário) não foi notificado da junção do PA, nem aliás essa junção é referida na douta contestação (e a não ter sido junto há violação do nº2 1 do art.84edoCPTA).

Recebeu, sim, em data que ora não pode precisar mas que já não permitiu a sua utilização na elaboração da p. iv a certidão junta por fotocópia como doe. 1 com a douta contestação, na qual se identificam os Exmos. Vogais Juízes ãe Primeira Instância que não votaram a deliberação.

2.Ora, como já na p. i. se dizia, o que no douto acórdão do Supremo

Tribunal de Justiça esteve na base da anulação decidida foi a participação no

procedimento de inspeção dos Ex.mos Vogais Juízes de Primeira Instância e não

apenas a sua participação na votação da reclamação sobre a classificação atribuída pelo

Conselho Permanente (sublinhados do signatário).

Como, aliás, decorre da lei, designadamente dos artigos 69a, nº 1, 71°, nº 1, e 72º do  Código  do Procedimento Administrativo  (CPA).  Fala-se  em  "procedimento administrativo" e não apenas em "votação" final: Acresce que em grande parte dos casos, as decisões "tomam-se" na discussão; a votação formaliza-as.

Não se vê, aliás, que dúvida possa haver, tão clara é a lei. Basta recordar o que dispõe o art. 72- do referido Código quanto aos efeitos da declaração do impedimento:

1- Declarado o impedimento, é o impedido imediatamente substituído no procedimento

pelo respetivo suplente, salvo se houver avocação pelo órgão competente para o

efeito.

2-  Tratando-se de órgão colegial, se não houver ou não puder ser designado suplente, o

órgão funciona sem o membro impedido.

(sublinhado do signatário)

Outra interpretação seria claramente violadora do princípio da imparcialidade constitucionalmente consagrado no artigo 266, nº 2, e depois densificado em várias normas, nomeadamente nos artigos 99 e 69 e seguintes do CPA.

Ou seja, a douta deliberação impugnada ofende claramente caso julgado e viola de novo o princípio constitucional da imparcialidade.

Sendo assim nula, nos termos das alíneas d) e i) do nº9 2 do artigo  do CPA.

3.Na sua douta contestação, a este propósito, o CSM, invoca um facto que

í) ao menos no entender do A. - não tem apoio nem na notificação da deliberação, nem

na certidão referida, nem na ata da sessão que agora juntou, isto é que os Ex.mos Vogais Juízes de Primeira Instância não só não votaram como não se pronunciaram relativamente a esse ponto da ordem de trabalhos. De todos os referidos documentos a única coisa que consta é que não votaram; não há referência a que não intervieram.

Por outro lado, escreve o CSM no art. 35G da douta contestação:

Pretende o Ex.mo Recorrente, agora, que o impedimento definido abrange a simples presença dos Vogais do CSM em questão, na sessão Plenária que decidiu, entre outros pontos, a reclamação apresentada.

 

Há aqui um claro lapso: nunca o A. defendeu que os Ex.mos Vogais não deviam estar presentes na sessão Plenária. Defendeu, sim, que não deviam estar presentes na discussão e decisão do ponto da ordem de trabalhos relativo à questão dos autos/ isto é, de acordo com a ata da sessão, ao ponto n° 2.1.3.

É o que decorre da lei, art. 72-, nº21, do CPA. Aliás, retomando o que já constava do art 47, n° 1, do anterior CPA; o qual, por vez, mantinha o estabelecido no art. 4° do Decreto-Lei nº 370/83/ de 29 de outubro, acrescentando que a substituição devia ser imediata.

Não se vê, por isso, razão nem para a discordância com o douto acórdão do Supremo Tribunal de Justiça nem para apelidar de maximizante a interpretação que dele faz o A., nem para entender que um e outra contendem com a norma prevista no artigo 217a, n21, da Constituição - como se faz nos artse. 42º e 43º da contestação,

Como não se vê razão para se entender (como faz o CSM, no art. 46° da contestação) que A interpretação pretendida a que se tem feito referencia contraria, neste conspecto, para além do já mencionado princípio constitucional ínsito no n-1 do artigo 1112 da Constituição, também, as normas constantes dos artigos 215-, nº 1 - conjugado com o disposto no artigo 1B do Estatuto dos Magistrados Judiciais - e 216º, nº 5, da Constituição.

4. A imparcialidade é um princípio básico da atuação no plano objetivo (não num prisma subjetivista ou intencional) de todas as entidades administrativas num Estado de direito, até para defesa delas próprias, dos interessados e da comunidade.

4.Assim e como já se referiu, a douta deliberação impugnada ofende

claramente caso julgado e viola de novo o princípio constitucional da imparcialidade. Sendo, por isso, nula, nos termos das alíneas d) e i) do nº 2 do artigo 161º do CPA.

HL Erro manifesto na apreciação dos pressupostos jurídico-factuais

1. Sobre esta matéria, o CSM não contesta os factos invocados pelo A. limitando-se a referir (no art. 762) que (...) o Conselho Superior da Magistratura partiu de uma factualidade fundamentada e utilizou os critérios legais previstos, nomeadamente em respeito pelo disposto pelos artigos 34º, na37º, n° 1, do Estatuto dos Magistrados Judiciais e artigos 13º e 15s do RIJ, tendo concluído pela atribuição da notação com a qual o recorrente não se conforma.

Concluindo, nos arts. 77º e 78°, (...) inexistir erro na apreciação dos pressupostos de facto e de direito, que postulem a nulidade ou a anulabilidade da deliberação recorrida. Sendo que, entendimento diferente invade o campo negado ao desbravamento da reapreciação contenciosa, como vimos.

2. Como já se dizia na p. i., entende-se que a matéria em causa não esta afastada do desbravamento da reapreciação contenciosa pelo Supremo Tribunal de Justiça

Interpretação diferente, violaria, por um lado, o acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva constitucionalmente consagrados e, por outro lado, o direito a um processo equitativo, consagrado no nº 1 do artigo 6S da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

 Conclusões:

a) Os Ex.mos Vogais Juízes de Primeira Instância estavam impedidos de estar presentes na sessão Plenária aquando da discussão e votação da reclamação dos autos (ponto 2.1.3 da respetiva ordem de trabalhos);

b)         Só assim respeitando o douto acórdão do Supremo Tribunal de Justiça a que a douta deliberação impugnada devia ter dado execução,

c)         E o princípio da imparcialidade constitucionalmente consagrado no art. 266Q, nQ2, e densificado nos arts. 9° e 69° e seguintes do CPA;

d)        Assim não tendo feito, a douta deliberação impugnada ofende caso julgado e viola o referido princípio constitucional, pelo que é nula.

e)         Por outro lado, a douta deliberação impugnada padece de erro manifesto na apreciação dos pressupostos jurídico-factuais,

f)         Matéria cuja apreciação é da competência do Supremo Tribunal de Justiça; interpretação diferente violaria o acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva constitucionalmente consagrados e o direito a um processo equitativo, consagrado no art. 6° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

Termos em que dando provimento ao recurso farão V. Ex.cias, Venerandos Conselheiros,

Justiça!

O Conselho Superior da Magistratura (CSM), no processo supra identificado, ao abrigo do preceituado no artigo 176.°, n.° 1, do Estatuto dos Magistrados Judiciais (EMJ), apresenta as suas

ALEGAÇÕES:

I) Enquadramento

Vem o recorrente interpor recurso contencioso de anulação da deliberação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura prolatada em 12 de Julho de 2016, que decidiu pela improcedência da reclamação que oportunamente apresentou de deliberação do Permanente do Conselho Superior da Magistratura, atribuindo-lhe a notação de Bom com Distinção.

2 Fundamenta o seu recurso: (i) na verificação do vício de violação do caso julgado; (ii) na violação do princípio da imparcialidade e (iii) no erro manifesto na apreciação dos pressupostos jurídico-factuais.

3

Lembremos o passado destes autos, pois nos facilitam, em demais, a compreensão do seu presente.

4 Foi    realizada    inspecção    ordinária    ao    serviço    prestado    peio Excelentíssimo Juiz ... Dr. AA no período compreendido entre 27 de Maio de 2008 e 31 de Dezembro de 2012.

5 A Excelentíssima Inspectora Judicial elaborou o relatório de inspecção no qual   propôs  a   classificação  de  "Bom   com   distinção"  para   o   referido desempenho funcional.

6 Discordando da notação atribuída, o Exmo. Magistrado Judicial apresentou resposta ao abrigo do artigo 18.°, n.° 6, do Regulamento das Inspecções Judiciais, na qual, invocando vários argumentos, concluiu solicitando que lhe fosse atribuída a classificação de "Muito Bom" (fls. 206-262 dos autos apensos).

7 Em sede de informação final, a Exma. Inspectora Judicial procedeu a algumas correcções ao relatório de inspecção e pugnou pela manutenção da notação proposta (fls. 264-272 dos autos apensos).

8 Por deliberação de 18 de Março de 2014, o Conselho Permanente do Conselho Superior da Magistratura atribuiu ao Magistrado Judicial Dr. AA a notação de "Bom com distinção", peio serviço desempenhado no período compreendido entre 27 de Maio de 2008 e 31 de Dezembro de 2012 (fls. 275-321 dos autos apensos).

9Devidamente notificado, o Exmo. Juiz ... apresentou reclamação, nos termos do disposto nos artigos 165.° e 167.°, n.° 1, do Estatuto dos Magistrados judiciais (fls. 291-317 dos autos apensos).

10 Por economia processual, não se transcreve agora essa reclamação.

11 O Exmo. Senhor Juiz ... entendeu que deveria o Plenário do Conselho Superior da Magistratura, alterar o deliberado no Permanente deste Conselho e, nessa medida, atribuir-lhe a notação de Muito Bom.

12 Reunido o Plenário, veio a ser deliberado, em 17 de Junho de 2014, ser de manter a notação atribuída pelo indicado Permanente, ou seja a nota de Bom com Distinção.

13 Inconformado com tal deliberação, veio o Exmo. Senhor Juiz ... recorrer da mesma, para o Contencioso do Supremo Tribunal de Justiça, tendo pedido que aquela fosse declarada nula ou, no mínimo, anulada, tendo para tanto invocado os seguintes vícios: Vício de omissão de pronúncia. Vício de falta de fundamentação, Violação do princípio da imparcialidade e Erro manifesto na apreciação dos pressupostos jurídico-factuais do RIJ.

14 O Contencioso do STJ, por acórdão de 09 de Julho de 2015 proferido nos autos n° 51/14.8YFLSB, tendo apreciado as três primeiras questões suscitadas pelo recorrente (considerou prejudicada a apreciação da 4.a questão – Erro manifesto na apreciação dos pressupostos jurídico-factuais do RIJ), entendeu que as duas primeiras (vício de omissão de pronúncia e vício de falta de fundamentação) eram improcedentes.

15 Sendo a terceira (violação do princípio da imparcialidade), procedente.

16 Pelo  que  deliberou,   por  maioria  (com   2  votos  contra)  «anular a Deliberação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura, de 17 de Junho de 2014,   que  decidiu  atribuir  ao  Exmo. Juiz  Rui Manuel Pacheco  Duarte  a classificação de serviço de "BOM COM DISTINÇÃO"»

17 No âmbito de tal acórdão e por via do decidido, apenas ficou por conhecer, porque prejudicada tal apreciação, a questão suscitada pelo Exmo. Senhor Juiz  de  Direito,   do  alegado  «erro  manifesto  na  apreciação  dos pressupostos jurídicos».

18 Em  sequência,  foi  adoptada  deliberação  do  Plenário  do  Conselho Superior da Magistratura, prolatada em 12 de Julho de 2016, que decidiu pela improcedência    da    reclamação    que    oportunamente    apresentou    de

deliberação   do    Permanente   do   Conselho   Superior   da    Magistratura, atribuindo-lhe a notação de «Bom com Distinção».

II. O recurso contencioso de anulação.

19 Recordemos, embora sem necessidade, por se tratar de direito consolidado, que o Conselho Superior da Magistratura (C.S.M.), enquanto órgão de Estado integrado na Administração Judiciária (arts. 217.°, n.° 1 e 218.° da C.R.P.) está constitucionalmente subordinado aos princípios administrativos fundamentais previstos no art. 266.° do texto constitucional.

20 Nos seus termos, a Administração visa a prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos.

21 Os seus órgãos e agentes estão sujeitos à Constituição e à Lei, devendo actuar, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da Justiça, da imparcialidade e da boa-fé.

22Tratando-se o presente recurso, de um processo impugnatório de um acto deliberativo, o seu objecto circunscreve-se - conforme resulta do artigo 50.°, n.° 1, do Código de Processo dos Tribunais Administrativos - à anulação, declaração de nulidade ou inexistência desse acto.

23 De facto, em conformidade com o estabelecido no n.° 1 do 3.° do CPTA, no respeito pelo princípio da separação e interdependência dos poderes, os tribunais administrativos julgam do cumprimento pela Administração das normas e princípios jurídicos que a vinculam e não da conveniência ou oportunidade da sua actuação.

24 Estando vedado reapreciar o mérito do acto da Administração para o substituir por outro, a operação de reapreciação em sede de recurso contencioso consistirá, pois, em verificar se a deliberação impugnada -excluídos os casos de erro manifesto - obedeceu ou não às exigências externas da Ordem Jurídica, afrontando algum dos invocados princípios -causas de invalidade - por violação de Lei, erro nos pressupostos de facto, falta ou insuficiência de fundamentação, etc, vício ou vícios que, afectando a aptidão intrínseca do acto para produzir os respectivos efeitos finais, evidencie seja determinada a reclamada anulação.

25 O Supremo Tribunal de Justiça, em sede de reapreciação contenciosa de deliberação do CSM, «funciona limitativamente enquanto órgão de jurisdição do contencioso administrativo» - assim, o Acórdão do STJ de 27-10-2009 citado no acórdão do mesmo Tribunal de 19-09-2012 (relator JOÃO CAMILO), disponível na base de dados www.dgsi.pt.

26 Contencioso que julga do cumprimento pela Administração das normas e princípios jurídicos que a vinculam e não da conveniência ou oportunidade da sua actuação - cfr. artigo 3.°, n.° 1, do CPTA. Como refere Jorge de Sousa «relativamente à generalidade dos actos da Administração (...) o n.° 1 do artigo 3° do CPTA claramente revela a existência de uma reserva de Administração, uma zona da actividade administrativa (...) que está fora dos poderes de sindicabilidade dos tribunais (...)» ("Poderes de Cognição dos Tribunais Administrativos; in Julgar, n.°3, p. 136).

27«Estamos perante um recurso contencioso de mera anulação, regulamentado nos artigos 168.° e seguintes do Estatuto dos Magistrados Judiciais, em que o pedido, delimitado pelos artigos 168.° e seguintes do mesmo diploma, e 192.° do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, terá de ser sempre de anulação ou declaração de nulidade ou de inexistência do acto recorrido ef assim, como contencioso de mera legalidade, não compete a[o] Supremo  Tribunal de Justiça fazer administração  activa,  substituindo-se  à entidade recorrida». - Cfr. o Acórdão do ST) de 05-07-2012 (relator OLIVEIRA VASCONCELOS), disponível na citada base de dados.

28 Especificamente sobre o recurso contencioso na matéria aqui em questão, como decidiu o ST] em 21-4-2010 "é jurisprudência unanime do Supremo Tribunal que o recurso interposto para o STJ que atribuiu determinada classificação a um magistrado judicial é um recurso de mera legalidade, razão pela qual o pedido terá de ser sempre de anulação ou a declaração de nulidade ou de inexistência do acto recorrido, não cabendo ao STJ sindicar o juízo valorativo formulado pelo CSM, a menos que o mesmo enferme de erro manifesto, crasso ou grosseiro, ou se os critérios utilizados na avaliação forem ostensivamente desajustados. Muito menos caberá ao STJ substituir-se ao CSM, alterando as classificações aos magistrados judiciais que impugnam as classificações que lhes foram atribuídas pelo CSM. Daqui decorre que ao Supremo Tribunal está vedado, em princípio, intrometer-se no conteúdo da decisão recorrida, apenas lhe cabe pronunciar-se sobre a sua legalidade"

29 Também no acórdão de 1-10-2009, do STJ, "segundo jurisprudência assente, a matéria em causa, relevando da avaliação ou apreciação do mérito com base em relatórios de inspecções de serviços se insere no âmbito da chamada justiça administrativa, caracterizada por uma grande liberdade no que respeita "à eleição dos elementos decisórios e à respectiva ponderação e valoração, actuando com uma ampla margem de discricionariedade técnica

embora vinculada ao dever de atribuição de uma classificação justa. Nesta perspectiva, a sindicabilidade da decisão pelo STJ, intervindo por meio da sua Secção de Contencioso, só será coadunável com a sua natureza caso se verifique erro manifesto, crasso ou grosseiro ou se adoptem critérios manifestamente desajustados".

30 Ou ainda no acórdão de 10-7-2008, sempre do STJ, "as avaliações ou apreciações do mérito com base em relatórios de inspecção inserem-se no âmbito da chamada justiça administrativa, donde, perante decisão em que se reconhece que o funcionário possui as condições indispensáveis para o exercício do cargo, o STJ não possa censurar os critérios quantitativos ou qualitativos, que estiveram na base dessa decisão"(todos estes acórdãos em sumários internos da Secção de Contencioso do STJ, disponível em www.stj.pt).

III) Dos vícios invocados pelo recorrente:

a) Ofensa do caso julgado e do princípio da imparcialidade

31 Porque o recorrente o fez, optemos por analisar em conjunto a alegação deste vício.

 32 O tratamento conjunto justifica-se, na medida em que a estrutura lógica da argumentação também no mesmo assente: a deliberação em questão viola o caso julgado emergente do Ac. do STJ de 9 de Julho de 2015, na medida em que o procedimento de deliberação não respeitou a interpretação dada pelo STJ naquele Acórdão, relativamente ao princípio da imparcialidade.

33 Ou seja, cumpre analisar se a nova deliberação do Plenário do CSM respeitou o princípio da imparcialidade, como tal interpretado pelo STJ ou, diremos   mais,   como   tal   interpretado   pelo   Exmo.   Recorrente,   numa interpretação maximizante do Acórdão em questão.

34 Lembremos que o acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, em questão, adoptou um critério normativo (ao qual depois se subsume o caso concreto em apreço) com carácter de generalidade, e, por isso, suscetível de aplicação a outras situações, assente na verificação de um impedimento deliberativo pela simples circunstância de o Vogal do CSM ter um número de ordem na lista de antiguidade inferior ao visado na deliberação.

35 Pretende  o  Exmo   Recorrente,  agora,   que  o  impedimento  definido abrange a simples presença dos Vogais do CSM em questão, na sessão Plenária que decidiu, entre muitos outros pontos, a reclamação apresentada. Ou seja, para além de estarem impedidos de votar, os Vogais do CSM em questão não podiam participar na sessão Plenária, ainda que não se pronunciassem nem votassem - como o fizeram -, relativamente à mesma reclamação.

36 Este requisito não consta de qualquer norma vigente, nem se infere quer dos preceitos constitucionais mencionados na decisão do STJ quer do artigo 44.°, n.° 1 do CPA.

37

Repare-se, aliás, que nos votos de vencido do acórdão em questão consta enunciada a necessidade de que a interpretação normativa conforme à Constituição em face do aludido artigo 44.° do CPA, enquanto aplicável aos membros do CSM, se paute por critérios exigentes.

38

Isso mesmo resulta do seguinte trecho do voto de vencido do Exmo. Senhor Conselheiro Santos Cabral:

«A afirmação da existência de impedimento em sede de procedimento administrativo, aplicável ao caso vertente, fundamenta-se na existência de circunstâncias específicas que contêm potencialidade para colidir com o comportamento isento e independente da Administração, colocando em causa a sua imparcialidade, bem como a confiança dos interessados e da comunidade.

É evidente que a seriedade e gravidade do motivo ou motivos causadores do sentimento de desconfiança sobre aquela imparcialidade só podem conduzir à sua recusa ou escusa quando objectivamente considerados. Assim, o mero convencimento subjectivo por parte de um interessado, ou o desvirtuamento da conduta em causa, extraindo consequências perfeitamente exógenas ao funcionamento do instituto, nunca terão virtualidade para fazer desplotar o referido incidente.

Falamos de uma razão séria, e grave, da qual resulte, inequivocamente, um estado de forte desconfiança sobre a imparcialidade da Administração (propósito de favorecimento de certo sujeito em detrimento de outro). Visa salvaguardar-se um bem essencial que é a equidistância sobre a condução do respectivo acto administrativo».

39 O sentido interpretativo que o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça e agora exacerbadamente o Exmo. Recorrente recortam existir na aplicação efectuada a respeito da alínea a) do n.° 1 do artigo 44.° do Código de Procedimento Administrativo aplicável à data, para dela extrair a verificação de um "interesse impeditivo" - genérico (relacionado com a mera numeração de ordem decorrente da posição decorrente) - dos Vogais juízes do CSM que refere, relativamente à deliberação em cuja votação participaram, mostra-se inconstitucional, face à larguíssima amplitude de uma tal interpretação desproporcional aos interesses em jogo, sem qualquer exigência de manifestação de um interesse concreto e grave, nos termos, aliás, bem

assinalados nas declarações de voto que acompanham o acórdão que fez vencimento.

40 Esta inusitada e amplíssima interpretação do aludido normativo e a configuração que, na prática (e na sua execução levada ao extremo), com reporte ao impedimento de todos os Vogais Juízes (quer provenham da 1.a instância, das Relações, ou mesmo do Supremo Tribunal de Justiça) entra em frontal colisão com o modo de composição e representação constitucionalmente regulada na alínea c), do n.° 1, do artigo 218.° da CRP, contendendo, ainda, com os princípios fundamentais constitucionais da separação de poderes, base do Estado de Direito democrático (cfr. artigos 2.° e 111.° da CRP), na medida em que afronta com as competências para dispor sobre o modo de composição e representação do Conselho Superior da Magistratura.

41 E - a mesma - determina uma ilegítima restrição - que não se mostra constitucional ou infraconstitucionalmente prevista (estabelecendo, pelo contrário, o n.° 2 do artigo 218.° do CRP, que as regras sobre garantias dos juízes são aplicáveis a todos os vogais do CSM, sem os discriminar) - dos poderes dos Vogais Juízes do CSM, que, ademais, perante uma tal interpretação   normativa,   legitima   uma   indevida   desigualdade   (que   a Constituição não regula, nem parece consentir) no exercício de poderes que, individualmente, lhes competem, face aos demais Vogais (não eleitos pelos juízes) que compõem tal Conselho - cfr. a este respeito, o decidido no Ac. do TC n.° 345/2015.

42 Além do mais, prevendo a Constituição que «a formação, a composição, a competência e o funcionamento dos órgãos de soberania são os definidos na Constituição» - cfr. artigo 111.°, n.° 2 - uma tal interpretação, constante do acórdão, atenta frontalmente contra a formação, composição, regras de funcionamento e competência que o legislador constituinte estabeleceu para o CSM.

43 A interpretação que fez vencimento no Acórdão em referência e agora a interpretação maximizada também contendem com a norma prevista no artigo 217.°, n.° 1, da Constituição, na medida em que aí não se efetua qualquer restrição sobre a atuação de todo o Conselho Superior da Magistratura, não pretendendo a Constituição que apenas atue, em processo classificativo de juízes e, em termos mais amplos, nas matérias aí reguladas (cuja atribuição é própria do CSM) - com uma composição parcelar de membros.

44 Da norma do artigo 161.°, n.° 3, do Estatuto dos Magistrados Judiciais pretende-se extrair um princípio genérico de aplicação - com apelo à norma do artigo 216.°, n.° 5 da Constituição, a qual colide frontalmente com os deveres, garantias e direitos estabelecidos para os juízes, os quais, se regem por um só estatuto (cfr. artigo 215.°, n.° 1, da Constituição, conjugado com o disposto no artigo 1.° do Estatuto dos Magistrados Judiciais - dos impedimentos previstos para os juízes - e extensivos aos vogais do CSM - nos mesmos moldes estabelecidos «quando no exercício de função tipicamente administrativa, como seja aquela que são chamados a exercer enquanto vogais do Conselho Superior da Magistratura», desconsiderando a diferença que, na realidade, existe entre a «imparcialidade judicial» e a «imparcialidade administrativa» e que se projeta, obviamente, num diverso âmbito das respetivas situações passíveis de impedimento.

45 Este "princípio genérico" é, de facto, inexistente quanto ao modo de funcionamento do CSM e, se bem que se compreende, quanto aos serviços de inspeção - cuja estruturação implica, na realidade, uma prévia (face ao CSM) ponderação administrativa sobre a classificação do magistrado judicial -não se demanda na atuação ulterior, quer do Conselho Permanente, quer da eventual intervenção do Conselho Plenário, no processo classificativo, pelo que, não se podem ter por aplicáveis, quanto ao CSM, de forma irrestrita e sem qualquer motivação, as cautelas que - em sede do mencionado n.° 3 do artigo 161.° do EMJ - são exigidas quanto à relação de «posicionamento» entre inspector e inspecionando.

46 A intepretação pretendida a que se tem feito referência contraria, neste conspecto, para além do já mencionado princípio constitucional ínsito no n.° 1 do artigo 111.° da Constituição, também, as normas constantes dos artigos 215.°, n.° 1 - conjugado com o disposto no artigo 1.° do Estatuto dos Magistrados Judiciais -e 216.° n° 5 da Constituição.

47 O que, aqui e agora, expressamente se invoca.

48 Para além deste pressuposto de inconstitucionalidade que, a nosso ver, inquina o mérito deste recurso, vejamos a alegação concreta.

49. Não se compreende, senão por desencontro postal, o alegado no art.14°,  pois,   o   CSM   emitiu   e   enviou   ao   Exmo.   Recorrente  a   certidão pretendida, em 26/10/2016 - como resulta do documento n° 1 que   ora se junta.

50 Do teor da referida certidão, resulta o seguinte, quanto à composição e funcionamento da sessão plenária ora atacada: na sessão do Plenário Ordinário do passado dia 12 de Julho de 2016, estavam presentes os Exmo(a)s Sr(a)s Conselheiros:

[...]

51 (...) os Exmos. Srs. Conselheiros atrás referidos, foram considerados para efeitos da formação do quórum, no entanto, em cumprimento do acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, embora estando presentes, foram impedidos de votar os Exmos. Srs. Conselheiros, [...].

52

Mais se certifica narrativamente,  que a identificação dos Exmos.  Srs. Conselheiros que votaram a deliberação do processo de Inspecção ordinária

 2014-10/10, foram, respectivamente: [...].

53 Nenhum deles, acrescentamos para que dúvidas não pairem, Juiz ... com antiguidade inferior à do Exmo. Recorrente.

54 Ou seja, os Vogais do CSM impedidos de votar a deliberação em questão, por força da interpretação dada pelo ST), efectivamente, não a votaram.

55 Apenas constituíram o Plenário do CSM reunido na sessão do dia aprazado, sob pena de obstaculização ao pleno exercício funcional por parte do Conselho Superior da Magistratura, no âmbito das atribuições que ihe estão acometidas, desde logo, em face do n.° 1 do artigo 217.° do texto constitucional, por falta de quorum.

Relembre-se que, caso não participem na sessão - por impedimento em última análise de 6 dos vogais do CSM - não se mostra possível obedecer ao normativo constante do artigo 150.°, n.° 1 e n.° 2 do EMJ, nem, logicamente, ao comando normativo ínsito no n.° 3 do artigo 156.° do EMJ, pois, nunca seria possível, caso se trate de deliberação relativamente a desembargador mais antigo na lista de antiguidade que qualquer dos Vogais de 2.a instância, compor o número de membros necessários sequer para a realização da sessão plenária, quanto mais para a validade deliberativa.

57Ora, da acta da sessão em causa, que se junta como documento n° 2, disponível na base de dados https://juizes.iudex.pt - eventualmente, até com maior clareza do que a constante da certidão supra referida -, consta expressamente, o seguinte: Juiz ... Dr. AA - Na apreciação deste projecto, em cumprimento do acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, embora encontrando-se presentes, foram considerados impedidos de votar os Exmos, Vogais Juízes de Primeira Instância e deliberado por unanimidade dos restantes Exmos. Srs. Conselheiros presentes, aprovar o projecto de deliberação do Exmo. Senhor Dr. [...] (...).

58 Ou seja, resulta inequivocamente da acta em questão que os Vogais Juizes de Primeira Instância, considerados impedidos de votar pelo Acórdão do STJ em questão, não participaram na discussão, sequer, do projecto de decisão elaborado pelo Relator, o Exmo. Vogai Juiz Desembargador [...] - não se alcançando a razão da dúvida suscitada pelo Exmo. Recorrente no art. 3o das suas alegações, face ao teor inequívoco da a<tta em análise.

59 Não participaram da discussão nem, a seguir, da votação.

60 Pelo que se deverá concluir que as necessidades de imparcialidade (administrativa, diremos nós) reclamada pelo Exmo. Recorrente e sufragadas pelo STJ, no Acórdão em questão, se mostram perfeitamente satisfeitas.

61 Não sendo crível que se possa defender que a simples presença na sessão dos vogais impedidos tenha,  com  maior ou  menor intensidade, influenciado o sentido da deliberação.

62 Nem sequer invocando o Exmo. Recorrente tal influência, moral ou argumentativa, de uns vogais sobre os restantes.

63 Ou seja, a simples presença do vogal impedido, sem que se demonstre ou alegue sequer, participação da discussão relativa à deliberação a tomar, não afecta em nenhum grau a imparcialidade determinada e exigível.

64 Sob pena de paralisação do funcionamento do órgão.

65 E consequente inconstitucionalidade do regime legal aplicável, na interpretação proposta pelo Exmo Recorrente - que ultrapassa de forma decisiva o âmbito da decisão do STJ, logo, do caso julgado emergente da mesma - nomeadamente do art. 31 °, n°4 do CPA, aprovado pelo Dec.-Lei n° 4/2015, de 7/1.

66 O que aqui e novamente, se invoca, para que dúvidas não restem e não mais possa ser retirado.

67 Do que se conclui pela improcedência da arguida nulidade, por violação

do caso julgado e, indirectamente, do princípio da imparcialidade.

b) Do erro nos pressupostos de facto.

68 I- O erro nos pressupostos de facto constitui uma das causas de invalidade do acto  administrativo,  consubstanciando  um  vício  de violação  de iei que

 configura uma ilegalidade de natureza material, pois é a própria substancia do acto administrativo que contraria a lei.

II- Tal vício consiste na divergência entre os pressupostos de que o autor do acto partiu para prolatar a decisão administrativa final e a sua efectiva verificação na situação em concreto, resultando do facto de se terem considerado na decisão administrativos factos não provados ou desconformes com a realidade.

(...)

N- 0 recurso contencioso, na vigência da LPTA, é o meio próprio para obter o reconhecimento judicial da existência de todos os vícios que possam inquinar um acto administrativo lesivo, e, assim, obter a sua anulação contenciosa.

V- Constituindo o erro nos seus pressupostos um dos vícios de violação de lei que conduzem àquela anulação, competindo ao recorrente alegar e provar no recurso os factos integrativos do erro, cabe ao Tribunal face a todos elementos legalmente admissíveis de que dispõe, formular um juízo sobre a conformidade com a realidade dos pressupostos de facto que a Administração teve em conta aquando da prolação do acto impugnado.- citando ao Ac. do STA de 12/3/2009 (relator Freitas Carvalho), disponível na base de dados www.dgsi.pt.

69 Poderá o STJ, com base neste entendimento, constituir verdadeira 2a instância para reapreciação da matéria de facto? Parece-nos que não, senão, vejamos:

70 Recentemente, em Ac. de 16/12/2014 (relator Rodrigues da Costa), disponível na base de dados www.dasi.pt, foi decidido pelo STJ que tf - Em conformidade com o disposto no art. 178.° do EMJ e no art. 192.° do CPTA, ao recurso das deliberações do CSM - que se devem ter como actos formalmente administrativos - é, em particular, regulado pelas normas contidas nos arts. 150.° a 151°, do CPTA, que disciplinam o recurso de revista para o STA e, supletivamente, o disposto no CPC.

III- Este regime processual restringe o conhecimento dos tribunais de revista - como é o STJ ~ à matéria de direito para a qual têm os seus poderes direccionados, só se admitindo o conhecimento da matéria de facto quando a entidade administrativa recorrida tenha dado com provado um facto sem que tenha produzido a prova tida por lei como indispensável para demonstrar a sua existência ou tenham sido desrespeitadas as normas que fixem a força probatória de meios de prova (art. 150°, n.°4, infine, do CPTA), não competindo ao STJ, nesta sede, reapreciar a factualidade por aquela fixada (que, segundo a primeira parte deste preceito, não pode constituir objecto da revista), sem prejuízo de, por aplicação do disposto no art. 682.°, n.° 3, do CPC, poder determinar a alteração da mesma, a fim de serem corrigidas contradições ou supridas insuficiências, de modo obter uma decisão rigorosa do aspecto jurídico da causa.

N - Não se vislumbrando que a decisão recorrida haja incorrido em vícios desse tipo na decisão recorrida e não tendo esta dado como provados factos sem a prova legalmente indispensável para o efeito ou sem observância das pertinentes regras legais, não se justifica a sua alteração (...).

71Continuando a citar esta decisão, Deste modo, com excepção destas duas situações, não compete ao STJ, em sede de recurso contencioso, proceder à reapreciação da matéria de facto que se encontra fixada pela autoridade administrativa recorrida, por forma a averiguar se algum ou alguns dos factos provados foram incorrectamente julgados, se devem ser aditados ou retirados factos à matéria considerada provada ou se as provas que foram produzidas impunham decisão diversa daquela que foi deliberada. A este propósito, importa considerar a primeira parte do n.°4 do art. 150.° do CPTA, onde se estabelece que "o erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto de revista (...)"), sendo, pois, inerente à natureza desta a aplicação do direito ao caso, conforme este se encontra factualmente delimitado, de modo a ponderar e a decidir sobre se foram acolhidas, na sua perspectiva, as melhores soluções jurídicas para o quadro factual fixado pela entidade recorrida.

Também se admite, por aplicação subsidiária do CPC (vide art. 1.° do CPTA), que o STJ determine a alteração da matéria de facto considerada provada, quando, como resulta do disposto no art. 682.°, n.° 3, do CPC, aprovado pela Lei 41/2013, de 26 de Junho (ou anteriormente como dispunha, em idêntico sentido, o art. 729.°, n.° 3, do CPC de 1961), o quadro factual deva ser ampliado ou quando se imponha a correcção de contradições, de modo a conseguir-se uma decisão correcta e rigorosa do aspecto jurídico da causa.

Deste modo, com excepção das situações contempladas pelo art 150.°, n.°4, in fine, do CPC (erro na apreciação de provas vinculadas) e do art. 682. °, n. ° 3, do CPC actualmente vigente (carência ou insuficiência da matéria de facto provada ou contradições da decisão sobre a matéria de facto, que impossibilitem a decisão jurídica da causa), está vedado ao STJ, enquanto tribunal de revista, determinar a alteração da matéria de facto, na medida em que este tribunal tem os seus poderes direccionados ou, mais do que isso, vinculados, para a ponderação e para a aplicação do (melhor) direito ao caso.

72 Veja-se, ainda, o Ac. do STJ de 5/6/2012 (Isabel Pais Martins), disponível na mesma base de dados: X- O n° 1 do art. 3.° do CPTA revela, claramente, a existência de uma reserva da Administração, uma zona da actividade administrativa, não regulada por normas ou princípios jurídicos, que está fora dos poderes de sindicabilidade dos tribunais administrativos. Os poderes de cognição dos tribunais administrativos abrangem apenas as vinculações da Administração por normas e princípios jurídicos e não a conveniência ou oportunidade da sua actuação com regras ou princípios de ordem técnica ou a adequação ou não das escolhas que fizer sobre a forma de atingir os fins de interesse público que visa satisfazer com a sua actuação, pelo menos quando não se detectar concomitantemente a ofensa de princípios jurídicos, designadamente, os da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa fé, enunciados no n.°2 do art. 266.° da CRP.

XI - Assim, o controle judicial da actuação administrativa nesta margem de reserva da Administração terá de limitar-se à verificação da ofensa ou não dos princípios jurídicos que a condicionam e será, em princípio, um controle pela negativa (um contencioso de anulação e não de plena jurisdição), não podendo o tribunal, em regra substituir-se à Administração na ponderação das valorações que se integram nessa margem.

XII - Tem sido entendimento, sucessivamente reafirmado, no STJ, o de que a suficiência da prova e da matéria de facto em que se fundamenta a decisão punitiva em processo disciplinar pode ser objecto de recurso contencioso. Sem que, todavia, o controlo da suficiência da prova passe peia reapreciação da prova disponível e pela formação de uma nova e diferente convicção face aos elementos de prova disponíveis.

73 À luz desta jurisprudência do STJ, que podemos considerar como firme, analisemos, pois, a alegação do recorrente.

74 O recorrente insurge-se quanto ao facto da deliberação recorrida considerar que a factualidade apurada no processo de inspecção quando integrada nos normativos que definem a respectiva lide apenas permitem classificar o serviço que prestou, no período compreendido entre 27 de Maio de 2008 e 31 de Dezembro de 2012, com a nota de "Bom com Distinção".

75 Com efeito, o recorrente entende que, face aos normativos aplicáveis ao caso, sempre seria de concluir pela atribuição da classificação de "Muito Bom", como sucedeu em casos muito idênticos ao seu.

76 No caso concreto, o Conselho Superior da Magistratura partiu de uma factualidade fundamentada e utilizou os critérios legais previstos, nomeadamente em respeito pelo disposto pelos artigos 34.°, n.° 1 e 37.°, n.° 1, do Estatuto dos Magistrados Judiciais e artigos 13.° e 15.° do RIJ, tendo concluído pela atribuição da notação com a qual o recorrente não se conforma.

77 Conclui-se inexistir erro na apreciação dos pressupostos de facto e de direito, que postulem a nulidade ou a anulabilidade da deliberação recorrida.

78 Sendo   que,   entendimento   diferente   invade   o   campo   negado   ao desbravamento da reapreciação contenciosa, como vimos.

79 Em feliz síntese do tratamento que deve ser dado a esta questão, veja-se o Ac. do ST de 14/10/2015 (relator Martins de Sousa), disponível na base de dados www.dgsi.pt: IV - A inclusão de factos conclusivos e juízos valorativos na deliberação do CSM não reconduz ao erro nos pressupostos de facto ou ao vício de violação de lei - não importando, pois, a sua anulação -, sendo certo que, estando provados os factos materiais que os suportam, a recorrente tem a possibilidade de demonstrar o desacerto dessas valorações, motivo é de concluir que essa inserção não contende com o direito a uma efectiva tutela jurisdicional (n.° 4 do art. 268.° da CRP) ou com os princípios vertidos no art. 20.°, no n.° 1 do art. 32° e no n.° 3 do art. 268.°, todos da CRP. V- Não é subsumível ao erro nos pressupostos de facto a existência de diferentes valorações dos mesmos factos protagonizadas pelo recorrido e pela recorrente.

80 Daí a improcedência também deste vício, pelo que, concluímos,  ficam por demonstrar as divergências entre os pressupostos de que o autor do acto partiu para prolatar a decisão administrativa final e a sua efectiva verificação na situação em concreto.

81 Em conformidade com o exposto, o recurso em apreço deverá, em absoluto, soçobrar.

Por tudo o exposto e sem prejuízo da Superior apreciação dos Venerandos Juízes Conselheiros desse Supremo Tribunal de Justiça, deverá ser julgado improcedente o presente recurso contencioso.

Factos a considerar:

São os seguintes os factos apurados, tendo em consideração o teor dos documentos autênticos juntos pelas partes:

1.Em 17 de Junho de 2014, o Plenário do Conselho Superior da Magistratura deliberou não conceder provimento à reclamação apresentada pelo recorrente contra deliberação do Conselho Permanente daquele órgão;

2.O recorrente impugnou contenciosamente a deliberação mencionada em 1., aduzindo, ademais, a seguinte argumentação: « [q]uatro dos ilustres vogais do CSM que assinaram a douta deliberação impugnada têm um interesse direto e pessoal na classificação de serviço que for atribuída em definitivo ao A., motivo pelo qual estavam impedidos de participar na tomada da decisão que ora se impugna. »

Isto é, o Exmo. Senhor Dr. [...], enquanto vogais do CSM que participaram na deliberação da classificação de serviço do A., apresentam, no plano objetivo (e não do prisma subjetivista ou intencional) um interesse direto e pessoal na classificação que vier a ser definitivamente atribuída àquele, porquanto tal classificação irá influenciar o número de ordem que o mesmo ocupará em relação a estes quatro digníssimos vogais do CSM em futuro movimento judicial.»

«O ora A. foi admitido no X Curso Normal de Formação do Centro de Estudos Judiciários (CEJ) em setembro de 1991, tendo, atualmente, a classificação de serviço "Bom com Distinção", ocupando a posição de antiguidade nº 155, com o nº de ordem 432 (…)».

Por sua vez, o Exmo. Senhor Dr. Juiz Gonçalo David da Fonseca Oliveira Magalhães, frequentou o XVI Curso Normal de Formação do CEJ, com início em setembro de 1997, e detém, neste momento, a classificação de serviço de "Muito Bom", ocupando a posição de antiguidade nº 638, com o nº de ordem 334 (…).»

Já a Exma. Senhora Dra. Juíza [...] frequentou XVII Curso Normal de Formação do CEJ, com início em 1998, detém a classificação de serviço de "Muito Bom", e ocupa a posição de antiguidade nº 709, com o nº de ordem 373 (…).

O Exmo. Senhor Dr. Juiz [...];, por seu turno, frequentou XVI Curso Normal de Formação do CEJ, com início em setembro de 1997, detém a classificação de serviço de "Muito Bom" e preenche a posição de antiguidade nº 653, com o nº de ordem 341 (…).»

Por fim, o Exmo. Senhor Dr. Juiz [...] frequentou X Curso Normal de Formação do CEJ, com início em 1991, detendo a posição de antiguidade nº 163, com o nº de ordem 42 (…).»

Sucede que se o A. obtivesse na sequência do presente processo de inspeção a classificação de "Muito Bom", continuaria a ocupar a posição nº 155 quanto à antiguidade, mas já teria o nº de ordem 37, o que significaria ocupar uma posição mais adiantada na classificação em relação a estes quatro ilustres vogais do CSM que tiveram, recorde-se, intervenção direta na atribuição da classificação de serviço do A. »

Assim, não se pode deixar de concluir que aqueles quatro ilustres vogais do CSM têm, ainda que de forma não intencional, um interesse direto na classificação de serviço do A., pois poderão ser, no plano objetivo, prejudicados ou beneficiados consoante a classificação que seja atribuída àquele. »

Por isso, estavam os ilustres vogais do CSM impedidos de participar na produção da douta deliberação impugnada, nos termos do disposto no artigo 44º, nº 1, alínea c), do CPA, motivo pelo qual deveriam ter-se abstido de intervir no presente processo de inspeção, o que, (…) não ocorreu.» «[t]endo a douta deliberação impugnada sido produzida por membros do CSM que, do prisma objetivo, apresentam um interesse direto e pessoal no desfecho do presente processo de inspeção, não podemos deixar de considerar que a mesma se encontra inquinada por violação do princípio da imparcialidade, consagrado na norma do artigo 266º, nº 2, da CRP, e no artigo 6º do CPA (….)»

«Por tudo o quanto se disse, a douta deliberação impugnada é ilegal, devendo, em consequência, ser anulada, nos termos do disposto no artigo 135º do CPA».

3.Apreciando a questão mencionada em 2., o Supremo Tribunal de Justiça, em acórdão proferido no processo n.º 51/14.8YFLSB no dia 9 de Julho de 2015 e já transitado em julgado, discorreu do seguinte modo: «2.3.3 Cumpre conhecer deste segmento do recurso relativo à imputada violação do princípio da imparcialidade.

2.3.3.1 Num primeiro apelo de cariz constitucional, importa tomar em linha de consideração o princípio da imparcialidade com referência (i) quer à Administração Pública, (ii) quer ao Conselho Superior da Magistratura.

(i) No que ao CSM concerne.

Dispõe o artigo 218º da Constituição da República: (…)

Acerca da composição do CSM, referem GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA que a mesma «obedece claramente às seguintes regras: (a) uma maioria de membros designados pelos órgãos de soberania diretamente eleitos – PR e AR -, acentuando assim a sua legitimação democrática e contrariando a criação de formas de autogestão corporativa da magistratura; (b) simultaneamente, uma forte presença de membros oriundos da própria magistratura, a maior parte deles eleitos pelos próprios juízes, de entre si (isto é, pelo conjunto dos juízes e não separadamente pelas várias categorias de juízes), o que se traduz numa certa medida de autogoverno da magistratura; (c) ausência de membros designados pelo Governo, sublinhando a separação entre a magistratura e o executivo e afastando toda a ingerência deste no governo daquela; (d) a entrega da presidência do CSM ao Presidente do STJ, de modo a evitar, através dessa união pessoal de cargos, qualquer conflito de legitimidade ou de autoridade, e por forma a reforçar a posição dos juízes do STJ dentro do Conselho.»

Em outro passo,

«Os membros do CSM designados pela própria magistratura são eleitos de harmonia com o princípio da representação proporcional (nº1/c), o que, além de corresponder a um princípio geral de direito eleitoral constitucional (Art. 113º - 5), garante uma adequada representação das várias correntes da magistratura judicial, contribuindo, assim, para acentuar a legitimidade democrática do CSM. (cfr. L nº 21/85, art. 148º - 1)»

Com o dizer-se «As regras sobre garantias dos Juízes são aplicáveis a todos os vogais do Conselho Superior da Magistratura», importará tomar sob consideração o disposto no artigo 216º, onde, sob a epígrafe «Garantias e incompatibilidades», se estabelece no nº5 que «A lei pode estabelecer outras incompatibilidades com o exercício da função de juiz».

Retomando o ensinamento de GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA a respeito deste item:

«No nº5 a constituição autoriza o legislador a estabelecer outras incompatibilidades com o exercício da função de juiz. A lei pode, assim, densificar outras incompatibilidades para além das que estão previstas neste preceito. Algumas dessas incompatibilidades relacionam-se com a salvaguarda do princípio da imparcialidade. Estão, neste caso, as chamadas «incompatibilidades endoprocessuais», destinadas a evitar que convicções pré-adquiridas em fases anteriores do mesmo processo e da mesma res judicandi (sobretudo em processo penal) tenham influência marcante nos momentos decisórios («imparcialidade como ausência de preconceitos ou de parti pris»). É neste contexto que as incompatibilidades abrangem as figuras de impedimento e de recusa, de forma a garantir a chamada «incompatibilidade de prevenção», asseguradora da imagem de imparcialidade e de ausência de condicionamentos (alguns autores aludem aqui à «salvaguarda da substância e imagem da independência e da terciariedade do juiz»). (…)

(ii) No que à Administração Pública diz respeito. ([16])

Nos termos do artigo 266º da CRP, (…)

Seguindo, de novo, o ensinamento de GOMES CANOTILHO/VITAL MOREIRA:

«A garantia da imparcialidade da Administração implica, entre outras coisas, o estabelecimento de impedimentos dos titulares dos órgãos e agentes administrativos para intervirem em assuntos em que tenham interesse pessoal, direto ou indirecto (cfr. CPA, arts. 3º e ss). As dimensões assinaladas revelam que o princípio da imparcialidade, enquanto princípio material vinculativo da administração, cumpre basicamente três funções: (i) o cidadão pode confiar em que os seus assuntos submetidos à apreciação da administração merecerão uma decisão imparcial; (ii) o titular de órgão ou o funcionário deve precaver-se que perante a hipótese de conflito de interesses a sua decisão seja considerada como violadora dos seus deveres pessoais e funcionais; (iii) a administração deve, enquanto organização, acautelar-se de, no caso de conflito de interesses, que as suas decisões corram o risco de não serem cumpridas ou aceites.» (…)

Temos pois, numa apreciação conjugada, uma axiologia, que poder-se-ia dizer de cariz jus-ético, prevenindo, no âmbito lato das garantias e incompatibilidades, seja com referência aos Vogais do CSM, seja com referência à Administração Pública, a figura do impedimento.

2.3.3.2 Num segundo patamar, infraconstitucional, tomar-se-ão em consideração (i) desde logo o Estatuto dos Magistrados Judicias (EMJ), (ii) também, com particular razão de ser, o Código do Procedimento Administrativo (CPA).

No que respeita ao exercício jurisdicional, é indubitável que, num Estado de direito, a solução jurídica dos conflitos deverá fazer-se sempre com observância de regras de independência e de imparcialidade.

Independência/Imparcialidade comummente analisadas numa dupla vertente: a subjetiva - dizer também: a “independência vocacional” (…), a “atitude interna” super partes, a “postura”  “fora e acima das paixões e interesses que no pleito se agitam” (…) - e a objetiva  - na ideia de que o desempenho do cargo de juiz  seja rodeado de cautelas  legais destinadas a garantir  a sua imparcialidade  e a assegurar a confiança geral  na objetividade da jurisdição

Se relativamente àquela (subjetiva) pode valer a presunção da sua existência até prova em contrário, já relativamente a esta (objetiva) uma tal presunção seria manifestamente insuficiente (…)

No ensinamento de Figueiredo Dias:

“ [...] tanto a doutrina [...] como a jurisprudência [....] europeias têm tomado em igual linha de consideração a dimensão objetiva e subjetiva da imparcialidade ; sendo certo que, se alguma preponderância é dada a alguma destas dimensões, ela se refere à dimensão objectiva; não só porque a demonstração da imparcialidade ou da parcialidade subjectiva (íntima) do juiz é de difícil alcance e demonstração, como porque, acima de tudo, se pretende colocar os tribunais, na sua atividade julgadora, a salvo de suspeições ou desconfianças que desmereçam a sua função jurídico-social. Na frase, ainda aqui lapidar, de Cavaleiro de Ferreira, ‘não importa, aliás, que na realidade das coisas o juiz permaneça imparcial, interessa, sobretudo, considerar se em relação com o processo poderá ser reputado imparcial” (…)

Nesta perspetiva objetiva assumem particular relevância as cautelas legais: ao nível primário das Leis Fundamental e substantiva, pelas garantias da “inamovibilidade” e da “irresponsabilidade” (…); depois, ao nível da definição normativo-adjectiva, pela delimitação das situações de suspeição e/ou de impedimento. (…)

Lembrar-se-á, ainda, pela particular pertinência para o caso concreto, que também o EMJ previne, no artigo 161º/3 uma situação de impedimento: (…)

Aos impedimentos que aos Exmos. Juízes de Direito cumpre respeitarem no exercício da iuris dictio, acresce o dever de igual respeito relativamente aos impedimentos legalmente estabelecidos quando no exercício de função tipicamente administrativa, como seja aquela que são chamados a exercer enquanto vogais do Conselho Superior da Magistratura.

Dispõe o artigo 6º do CPA: (…)

E no art. 44º (Casos de impedimento), estipula-se no nº1, alínea a): (…)

Entende-se assumir significação relevante que as normas relativas quer aos casos de impedimento (Artºs 44º a 47º e 51º) quer aos fundamentos de escusa e suspeição (Artºs 48º a 50º) se mostrem inseridas na Secção VI, sob a epígrafe «Das garantias de imparcialidade»

Dizer, são garantias de imparcialidade que estão em causa na consagração das situações tipificadas como impedimentos, nas quais, basicamente, é na específica atenção à pessoa do titular do órgão ou à pessoa do agente da Administração Pública e ao interesse que a mesma tenha na decisão que ocorre a proibição de intervenção em procedimento administrativo ou em ato.

Sobre a delimitação do conceito de interesse impeditivo, acompanha-se o pensamento de Mário Esteves de Oliveira/Pedro Costa Gonçalves/J. Pacheco de Amorim quando referem que nos casos das alíneas a), b) e c):

«[h]á-de fazer-se em função de dois parâmetros: por um lado trata-se de garantir a objetividade e utilidade públicas da decisão administrativa em vista da (melhor) prossecução do interesse público, e, por outro lado, de assegurar a imparcialidade e a transparência dessa decisão, face àqueles que nela estão interessados e face à coletividade administrativa em geral.»

bem como quando  referem que:

«[a] situação de impedimento,  a existir, se traduz na mera verificação de um pressuposto legal que conduz ao impedimento (e à invalidade do ato praticado pelo impedido) – considerando o Código que a situação de impedimento origina, em abstrato, uma perturbação no exercício da competência (…)»(…)

2.3.3.3 No caso concreto: o quadro fáctico dado por adquirido relativamente aos Exmos. Vogais do Conselho, um deles enquanto Relator da decisão proferida pelo Conselho Permanente, os demais diretamente intervenientes na Deliberação do Plenário, configura uma situação de impedimento relativamente a cada um deles?

Seguramente, sim.

Conforme entendimento expresso no Ac. do STA, de 14 de agosto de 2002 (Processo nº01160/02),

«[o]princípio da imparcialidade , decorrente do artigo 266º da CRP e explicitado no artigo 6º do CPA, exige que a Administração no exercício da sua atividade trate de “forma justa e imparcial todos os que com ela entrem em relação”, tendo essa exigência sido origem do estabelecimento de uma série de impedimentos visando a concretização dessa forma de tratamento – vd. Nº1 do artigo 44º do CPA.

E entre eles encontra-se o que prescreve que “nenhum titular de órgão ou Agente da Administração Pública pode intervir em procedimento administrativo…quando nele tenha interesse, por si, como representante ou como gestor de negócios de outra pessoa.” Al. a) do citado preceito.

É, assim, visível que a lei, tendo em vista a promoção de um exercício imparcial da atividade administrativa, proíbe que o titular de um órgão ou agente da Administração, interessado (por si, ou na qualidade de representante ou gestor de negócios de outrem) no desenvolvimento ou no desfecho de um processo administrativo possa nele intervir.

Desse modo, e por força destes dispositivos, esse titular ou agente da Administração ficará impossibilitado de tomar decisões no procedimento administrativo sempre que os seus interesses (ou os interesses que representa) estejam conectados, direta ou indiretamente, com a causa que o mesmo visa alcançar (…).»

Apropriadamente, refere o Ac. do STA de 23.04.2003 (processo nº 0651/03): a Administração é como a mulher de César – não basta ser imparcial, tem também de parecer!

In casu, como alega o Exmo. Juiz Recorrente, os Exmos. Juízes Vogais em causa apresentam, no plano objetivo (e não do prisma subjectivista ou intencional) um interesse direto e pessoal na classificação que lhe vier a ser definitivamente atribuída.

Porquê?

Porque tal classificação – rectius, se obtida a classificação pretendida de Muito Bom – irá influenciar, em futuro movimento judicial, o número de ordem que o Recorrente ocupará em relação aos quatro vogais sob referência.

Vale dizer, nas palavras do Exmo. Recorrente, «se o A. obtivesse na sequência do presente processo de inspeção a classificação de MUITO BOM, continuaria a ocupar a posição nº155 quanto à antiguidade, mas já teria o número de ordem 37, o que significaria ocupar uma posição mais adiantada na classificação em relação aos quatro vogais do CSM».

Não colhe, aqui, o argumento invocado pelo CSM de que «o ponto de partida não deve nem pode ser o da suspeição, mas o dos deveres a que os magistrados judiciais estão vinculados».

Consabidamente, posto que um juiz esteja obrigado a administrar a justiça casos há, devidamente tipificados na lei – nomeadamente adjetiva penal e adjetiva cível – que obrigam à sua declaração de impedimento.

Não é diferente o exercício no âmbito da função administrativa e a sujeição às garantias de imparcialidade – v.g. casos de impedimento - estabelecidas no Código do Procedimento Administrativo.

Vem a propósito lembrar, no sentido de uma melhor distinção entre impedimento e suspeição que

«[e]nquanto a situação de impedimento,  a existir, se traduz na mera verificação de um pressuposto legal que conduz ao impedimento (e à invalidade do ato praticado pelo impedido) – considerando o Código que a situação de impedimento origina, em abstrato, uma perturbação no exercício da competência -, na suspeição a lei já não impõe a proibição de intervenção do titular do órgão, deixando a questão à decisão de um órgão da própria Administração, conhecedor do carácter daquele que vai agir pela Administração e dos interesses que se jogam no respetivo procedimento.

Isto quer dizer que, se não se deu por um impedimento, que existia, a decisão final do procedimento nem por isso deixa de ser inválida; ao passo que se a escusa ou suspeição não forem declaradas, a decisão final, podendo ser impugnada com fundamento em parcialidade (desproporção ou desigualdade), não é, porém, imediata e diretamente ilegal, só pelo facto de ser de autoria daquela pessoa.» (…)

É inelutável, pois, no caso concreto, a existência de um objetivo conflito de interesses. Na aparência objetiva não se pode ilidir o interesse de cada um dos Vogais em causa relativamente à classificação a atribuir ao Exmo. Juiz Recorrente.

Nesta conformidade, teria sido avisado que cada um dos referidos vogais tivesse suscitado o seu impedimento.

Porém, visto a confirmação do impedimento, existente mas não declarado, relativamente aos Exmos. Juízes de Direito, Vogais do Conselho Superior da Magistratura, a Deliberação do Plenário deste Conselho, de 17 de junho de 2014, mostra-se inválida por violação das garantias da imparcialidade, logo anulável nos termos do artigo 51º do Código do Procedimento Administrativo.», tendo, a final, decidido «Pelo exposto, na procedência do recurso interposto pela recorrente, acordam os juízes que constituem a secção de contencioso deste Supremo Tribunal de Justiça em anular a Deliberação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura, de 17 de junho de 2014, que decidiu atribuir ao Exmo. Juiz AA a classificação de serviço de «BOM COM DISTINÇÃO».

4.Na sessão do Plenário do Conselho Superior da Magistratura realizada no dia 10 de Julho de 2016, estiveram presentes os seus seguintes membros: [...];

5.Na sessão referida em 4. foi deliberado «Foi realizada inspecção ordinária ao serviço prestado pelo Excelentíssimo Juiz ... Dr. AA no período compreendido entre 27 de Maio de 2008 e 31 de Dezembro de 2012.

A Excelentíssima Inspectora Judicial elaborou o relatório de inspecção no qual propôs a classificação de “Bom com distinção” para o referido desempenho funcional.

Discordando da notação atribuída, o Exmo. Magistrada Judicial apresentou resposta ao abrigo do artigo 18.º, n.º 6, do Regulamento das Inspecções Judiciais, na qual, invocando vários argumentos, concluiu solicitando que lhe fosse atribuída a classificação de “Muito Bom” (fls. 206-262).

Em sede de informação final, a Exma. Inspectora Judicial procedeu a algumas correcções ao relatório de inspecção e pugnou pela manutenção da notação proposta (fls. 264-272).

Por deliberação de 18 de Março de 2014, o Conselho Permanente do Conselho Superior da Magistratura atribuiu ao Magistrado Judicial Dr. AA a notação de “Bom com distinção”, pelo serviço desempenhado no período compreendido entre 27 de Maio de 2008 e 31 de Dezembro de 2012 (fls. 275-321).

Devidamente notificado, o Exmo. Juiz ... apresentou reclamação, nos termos do disposto nos artigos 165.º e 167.º, n.º 1, do Estatuto dos Magistrados Judiciais (fls. 291-317). (…)»

«Por via de todo esse circunstancialismo o Exmo. Senhor Juiz ... entendeu que deveria o Plenário do Conselho Superior da Magistratura, alterar o deliberado no Permanente deste Conselho e, nessa medida, atribuir-lhe a notação de Muito Bom.

Reunido o Plenário, veio a ser deliberado, em 17 de Junho de 2014, ser de manter a notação atribuída pelo indicado Permanente, ou seja a nota de Bom com Distinção.

Inconformado com tal deliberação, veio o Exmo. Senhor Juiz ... recorrer da mesma, para o Contencioso do Supremo Tribunal de Justiça, tendo pedido que aquela fosse declarada nula ou, no mínimo, anulada, tendo para tanto invocado os seguintes vícios: (…)»

- Violação do princípio da imparcialidade, com fundamento no facto de «quatro vogais do CSM., que assinaram a Deliberação em causa, terem “um interesse directo e pessoal na classificação de serviço que for atribuído em definitivo ao A.”, porquanto tal classificação irá influenciar o número de ordem que o mesmo ocupará em relação a estes quatro vogais do CSM em futuro movimento judicial». Concretizou, referindo que «se o A. obtivesse na sequência do presente processo de inspecção a classificação de “MUITO BOM”, continuaria a ocupar a posição n.º 155 quanto à antiguidade, mas já teria o número de ordem 37, o que significaria ocupar uma posição mais adiantada na classificação em relação a esses quatro ilustres vogais do CSM».

Destarte, estavam aqueles vogais impedidos de participar na produção da deliberação impugnada, antes «deveriam ter-se abstido de intervir no presente processo de inspecção».

Acrescentou ainda, «entender-se que aos vogais do CSM não se aplicam os impedimentos consagrados no art.º 44.º do CPA, “ex vi” do art.º 178.º do EMJ, é realizar uma interpretação inconstitucional de tais preceitos, porquanto a mesma é manifestamente violadora dos princípios a que a Administração está vinculada, nomeadamente os da legalidade, da justiça e da imparcialidade, consagrados nos artigos 2.º e 266.º, n.ºs 1 e 2, da CRP». (…)».

«O Contencioso do STJ, por acórdão de 09 de Julho de 2015, tendo apreciado as três primeiras questões suscitadas pelo recorrente (considerou prejudicada a apreciação da 4.ª questão - Erro manifesto na apreciação dos pressupostos jurídico-factuais do RIJ), entendeu que as duas primeiras (vício de omissão de pronúncia e vício de falta de fundamentação) eram improcedentes, sendo a terceira (violação do princípio da imparcialidade), procedente, pelo que deliberou, por maioria (com 2 votos contra) «anular a Deliberação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura, de 17 de Junho de 2014, que decidiu atribuir ao Exmo. Juiz AA a classificação de serviço de “BOM COM DISTINÇÃO”». (…)»

No âmbito de tal acórdão e por via do decidido, apenas ficou por conhecer, porque prejudicada tal apreciação, a questão suscitada pelo Exmo. Senhor Juiz ..., do alegado «erro manifesto na apreciação dos pressupostos jurídicos».

Aqui chegados, importará proferir nova deliberação em obediência ao determinado na Deliberação do Contencioso do STJ.

Certo é porém que as questões que em tal acórdão do STJ se mostram apreciadas e conhecidas têm a autoridade de caso julgado, sendo insusceptíveis de novo conhecimento/reapreciação (art.º 621.º do CPC), atenta a interpretação que a jurisprudência faz da expressão “limites e termos em que julga”, ínsita em tal preceito legal.

A este propósito aqui se deixa expresso o entendimento do STJ sobre esta matéria, vertido no Acórdão de 12/07/2011 (…), com o seguinte sumário (…).»

II – Fundamentos

1. De facto e de Direito

Perante o que ora deixamos exposto, avançaremos na apreciação da Reclamação do Exmo. Senhor Juiz ..., sendo que quer a matéria factual assente, quer a de direito, uma vez que o relator da presente deliberação não está abrangido por qualquer impedimento que obstaculize o seu relato, estando nesse quadrante respeitado o teor da decisão anulatória da anterior Deliberação do Plenário deste Conselho , e porque se considera que a fundamentação antes defendida se mostra de acordo com o actual entendimento deste órgão, passaremos a reproduzi-la, fazendo-a nossa, em tudo que não contrarie o indicado acórdão do Contencioso do STJ:

«(…).

II. Os Factos

Do relatório inspectivo, com a correcção elaborada pela Exma. Inspectora Judicial, conforme resultante da deliberação reclamada, ressalta a seguinte factualidade a apreciar: (…)     

II - Exercício da Função - Apreciação e Fundamentação

Capacidades humanas (…)

De todo em todo, é seguro concluir que o Senhor Juiz conduziu a sua vida pessoal e profissional com urbanidade e civismo, discreto na actuação funcional e norteado pelo dever de reserva.

Em paralelo, e no cômputo final dos elementos recolhidos e observação do seu trabalho, é minha opinião que exibe conhecimento dos problemas axiais que atravessam o meio social e económico envolvente, denotando compreensão na casuística das situações da vida que ajuizou, pontuando a sua intervenção pelas medidas do bom senso e sentido de justiça.

Foi isento, independente e comprometido com a eficácia da acção de justiça. (…)

Adaptação ao Serviço (…)

«Apreciação global do trabalho

Posto o que, a apreciação global do trabalho do Senhor Juiz Dr. AA objecto desta inspecção sugere os seguintes tópicos:

1º         O Senhor Juiz pugna por uma actuação funcional eivada das boas práticas da celeridade na tramitação e agendamento do processado e cumprimento dos prazos legais, de relevo na situação de decisões finais - sentenças e acórdãos.

2º         É dedicado, presente no Tribunal quotidianamente, pontual e disciplinador na condução das audiências de julgamento a que preside, sem minorar o princípio do contraditório ou a tutela das garantias constitucionais dos arguidos.

3º         As suas decisões revelam empenho no apuramento da verdade material, e os conteúdos substantivos radicam no bom senso, apurado sentido de justiça e alinhamento com os valores sociais e éticos dominantes.

4º Dispondo de larga experiência funcional, mostrou sedimentação da sua preparação técnica no domínio da jurisdição criminal sobrevinda da afectação exclusiva em Águeda a partir de Abril de 2009, assumindo com vigor o julgamento de alguns processos crime de significativo trabalho material, exigente concentração e desgaste psicológico.

5º Genericamente o trabalho escrutinado corrobora as qualidades meritórias já anteriormente destacadas no exercício funcional do Senhor Juiz Dr. AA, como sejam a confiança, seriedade e prestígio do seu trabalho na administração da justiça.

6º No que concerne à qualidade técnica do seu trabalho, isto é, no suporte dogmático - jurídico e concepção/construção de muitas das suas decisões, suponho que não logrou superar algumas das insuficiências pregressas, como, a quebra ocasional do rigor conceptual e a de desconsideração pela adequada técnica de enunciação factual e motivação da convicção, detectando com frequência parca e telemática argumentação jurídica, maxime no tocante às matérias de direito civil, podendo e devendo investir futuramente no seu aperfeiçoamento.

7º De resto, ponderando o largo tempo de serviço, e a capacidade intelectual do Senhor Juiz, o investimento que colocou na sua formação académica, a atender ao descritivo do seu curriculum,  sendo expectável um superior patamar de cultura jurídica que muitas das peças não exibem, incisivamente nos índices de rigor lógico-sistemático, na fundamentação de motivos, na dialéctica argumentativa e pontual aligeiramento na elaboração do conteúdo integrado das peças finais decisórias. (…)»

O Senhor Juiz AA redige em português correcto e fluente, de fácil compreensão e o discurso argumentativo e o enquadramento jurídico são correlativos com a factualidade em análise.

A estrutura dos seus acórdãos e sentenças obedece à previsão legal, e a sistematização gráfica dos conteúdos viabiliza a compreensão rápida pelos destinatários directos.

Na indicação das provas fundadoras da convicção do tribunal revela preocupação pelos valores da transparência e da verdade material.

Todavia, tal desiderato é cumprido por recurso preponderante à transcrição dos depoimentos testemunhais, afastando-se amiúde da correcta visão crítica das provas e da exigida explicitação das razões que motivaram a opção do julgador e que afinal substanciam a vertente ultima da legitimação do poder judicial.

Na verdade, o que se pretende com a motivação – convicção do Juiz, não é, tal como na maioria das decisões se vê representada, uma espécie de resumo do que o juiz pensou para chegar àquela decisão de facto, mas outrossim, deverá assentar nos argumentos que justificam e pressupõem a decisão, e tem como objectivo demonstrar e convencer que há boas razões e argumentos logicamente correctos para a opção do julgador ser considerada válida e aceitável. Somente por essa via se cumprirá o consagrado duplo grau de jurisdição da matéria de facto

No enquadramento jurídico da situação sob análise convoca os preceitos legais apropriados à solução plausível de direito, bem como no tratamento doutrinário e jurisprudencial a propósito, conquanto a indagação seja tendencialmente telegráfica no âmbito da jurisdição cível, e por vezes as citações/transcrições constituem deambulações doutrinárias inúteis, a propósito de matérias estabilizadas, e omissas em casos que suscitam controvérsia e, por conseguinte, aprofundamento pelo Juiz de molde a convencer da bondade da sua decisão.

No âmbito da jurisdição criminal

Em geral percepcionei uma boa capacidade de apreensão das situações jurídicas que apreciou e julgou, demonstrando possuir um juízo enraizado numa ponderação casuística das circunstâncias, não colidindo com a certeza e segurança do direito.

De igual modo, no domínio das medidas de coacção aplicadas, ou, mantidas, actuou e decidiu com estrito respeito pelos princípios da necessidade, adequação e proporcionalidade.

Aprecia regularmente as contestações e os pedidos de indemnização civil, fixando valores patrimoniais consentâneos aos bens atingidos e, em geral, temperados com o uso da equidade, em alinhamento com os montantes prevalecentes na jurisprudência actual.

No decurso da audiência de julgamento, quando ocorre confissão do arguido, observa o preceituado no art. 344 do CPP, não dispensando, porém, a sua audição, ou, a recolha de outros elementos de prova, tendentes a apurar das condições económicas e sociais do arguido e lesados, tomando as decisões incidentais que se apresentam.

É pronto e adequado ao ordenar a passagem de mandados de condução do arguido, em face de falta injustificada, sancionada com multa, agilizando e credibilidade a eficácia dos tribunais. A alteração não substancial da acusação é tratada no âmbito da previsão legal do disposto no art.º 358 do CPP.

Detalhando.

Os relatórios contemplam todos os elementos configurados na lei e identificadores essenciais dos arguidos e dos crimes imputados pela acusação.

A sistematização de conteúdos é em regra correcta e facilitadora da leitura e consulta posterior pelas entidades judiciárias.

Poderia, embora, ter aludido mais frequentemente ao essencial das contestações crime e fundamentos dos pedidos cíveis, assim viabilizando uma mais fácil compreensão das razões de facto das partes.

Paralelamente, na elaboração de acórdão para a realização de cúmulo jurídico de penas, aconselho que no relatório reproduza o núcleo principal, de forma sintética, da factualidade e circunstâncias incriminatórias de cada decisão a englobar (ou não) no cúmulo sobretudo porque a compreensão da pena global final será optimizada. 

Isto porque, o volume de processos a seu cargo permite-lhe objectivamente maior detença em cada decisão.

Segue-se a matéria de facto provada, nem sempre expurgada de juízos de valor  e expressões conclusivas,  dando-lhe uma sequência lógico-cronológica, mas aglutinando com frequência mais do que um facto em cada ponto, levado quiçá pelo facilitismo do decalque do texto acusatório,  incluindo conceitos ou expressões de índole semântica equívoca ou ecléctica, ou até asserções jurídico-valorativas,  perigando o rigor e a transparência dos elementos fácticos do crime tipificado.

Sendo indiscutível o acerto final das decisões e das penas cominadas, e o bom recorte técnico das peças elaboradas, qualidades que atravessam os seus acórdãos, apresenta contumazes deficiências na enunciação dos factos sob a melhor técnica, combinando por vezes conceitos jurídicos, conclusões e juízos de valor/opinativos na matéria de facto  que não se explicam neste momento da sua longa carreira.

Parece-me que sobretudo enquanto Juiz de exclusividade, atenta a carga comportável de processos a que presidiu, poderia e deveria incrementar melhor método e disciplina na enunciação fáctica.

Insere na sentença os factos essenciais para aferir da relevância jurídico - criminal da conduta dos arguidos e fixar a medida da sua responsabilidade, e das condições de vida pessoal e familiar dos arguidos e dos ofendidos.

Anoto todavia, que neste aspecto importante para no dosear da culpa, mostra-se demasiado ancorado no texto estrito dos relatórios elaborados pelos serviços da Segurança Social, procedendo até à transposição ipsis verbis para a sentença de uma metalinguagem própria da psicologia e sociologia,  a exigir descodificação pelo julgador, e maxime rever-se no acervo dos factos que foram dados como provados, pois são apenas estes que legitimamente suportarão a compreensão real da situação do arguido e, caracterizem os sentimentos, fins e motivos determinantes da conduta.

Por regra enumera os factos não provados de forma atomística, apesar de também aqui se detectar por vezes a inclusão de conceitos e valorações que se deverão evitar.

A fundamentação de facto apresenta-se maioritariamente sectorizada por factos, fazendo apelo devidamente identificado a cada prova,  mas nem sempre sob espírito crítico, no sentido de convencer da razoabilidade do juízo probatório pelo qual o tribunal optou,  designadamente no tocante à prova testemunhal,  que reproduz exaustivamente,  cujas “assentadas” não correspondem à autêntica motivação da decisão de facto e à sua razão axiológica,  sucedendo ocasionalmente que a fundamentação da decisão mais não é do que mera reafirmação fáctica.

De igual sorte, no domínio da expressão da motivação dos factos não provados detecta-se, por vezes, algum aligeiramento na demonstração da insuficiência probatória  e, a intercepção com o princípio do in dubio pro réu,  designadamente, estando nos autos prova pericial que se revelou inconsistente para a convicção dos julgadores.

No capítulo da qualidade e sedimentação da sua preparação técnica e ampliação da cultura jurídica do Senhor Juiz, verifica-se que acolheu na vertente pedagógica algumas das deficiências detectadas na anterior avaliação, mantendo ainda traços menos positivos.

Os tipos de ilícito são escalpelizados nos respectivos elementos objectivos e subjectivos e por referência à factualidade apurada; a alteração da qualificação jurídica vertida na acusação é realizada adrede com as advertências processuais anteriores que se exigem.

Há que sublinhar que da selecção de regime legal especial, a escolha, medida das penas principais e acessórias e penas únicas se apresentam regularmente fundamentadas na lei e nos critérios gerais da doutrina e jurisprudência, mostrando-se ajustadas na proporcionalidade e sentido de justiça do caso concreto. 

Observo, não obstante que na maioria das situações de cúmulo jurídico, apesar de prosseguir com rigor as regras legais dos limites mínimos e máximos, e excluindo com propriedade o designado cúmulo por arrastamento, o Senhor Juiz alcança a pena única dispensando-se de concretizar no caso concreto os factos que suportaram a fixada pena única.

No segmento da apreciação e julgamento dos pedidos cíveis, opta na maioria por tratar sinteticamente as questões, com acolhimento e transcrição dos pressupostos gerais da responsabilidade civil e subsunção adequada aos preceitos legais aplicáveis, ajustando o valor fixado para a indemnização dos danos.

Ao terminar os acórdãos lança as instruções aptas à execução da pena e gestão próxima do processo, como são as futuras liquidações, mandados de desligamento, e em regra dá destino aos objectos/bens apreendidos nos autos,  ordenando a entrega ou destruição ou perda de objectos do crime.

No âmbito da Jurisdição cível

O hiato temporal de exercício na especialidade cível pelo Senhor Juiz AA, incluso nesta inspecção limita-se ao seu desempenho por cerca de 7 meses no Círculo de ... e, obviamente na apreciação e julgamento dos pedidos cíveis relativos à responsabilidade civil e tramitados no processo comum em conformidade com o disposto no art.º 71do CPP.

De um modo global percepcionei no seu trabalho uma boa capacidade de apreensão das situações jurídicas, demonstrando bom senso e prudência nas decisões proferidas.

No tocante à apreciação dos meios probatórios e o registo textualizado do processo de convicção quanto aos factos provados e não provados, é por norma feita pelo recurso ao teor literal dos depoimentos das testemunhas, e menção enunciativa dos demais meios de prova produzidos a carecer de uma abordagem crítica e parcimoniosa dos argumentos determinativos da convicção.

No aspecto da fundamentação jurídica manuseia com acerto os institutos jurídicos, e apresenta uma visão integrada do ordenamento jurídico.

As sentenças incluem relatórios sucintos, seguindo-se a enunciação dos factos provados, cujo alinhamento é o decalque da ordem seguida no despacho de condensação, talqualmente constam dos articulados,  apresentam-se elencados de forma entrecortada, o que torna tortuoso a compreensão do quadro factual, afastado da boa técnica de enunciação por ordem lógica e cronológica, a qual se devia justificar sem reparo, atenta a experiência pregressa do Senhor Juiz, simultaneamente os factos carregam expressões conclusivas e conceitos de direito.

A fundamentação jurídica por indicação liminar às questões a resolver mereceu um tratamento nem sempre aprofundado e até omissivo na demonstração e consistência das soluções jurídicas encontradas, com apelo ocasional à jurisprudência e doutrina, e por fim o dispositivo, incluindo a imputação e repartição das custas devidas. (…)»

«Enquanto órgão de gestão e disciplina da magistratura judicial, atribuição desde logo conferida pelo artigo 217.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa e vertida no artigo 136.º da Lei n.º 21/85, de 30 de Julho (Estatuto dos Magistrados Judiciais), além de garante tutelar da independência dos tribunais, no desenvolvimento dos poderes de autoridade e responsabilidade que lhe estão cometidos, o Conselho Superior da Magistratura assume, entre outras competências, a de proceder à avaliação do desempenho profissional dos magistrados judiciais.

No que concerne à promoção e inspecção dos juízes, embora o Conselho Superior da Magistratura actue no âmbito de um poder discricionário, onde emergem «espaços de folga valorativa», existem normativos que definem os princípios orientadores, a dimensão da avaliação, o tempo e a periodicidade, os elementos de referência da avaliação e outras regras que devem nortear o processo inspectivo.

Com efeito, a avaliação de desempenho dos juízes desenvolve-se de acordo com os princípios consagrados no Estatuto dos Magistrados Judiciais e no respeito pelas regras e objectivos que enformam o sistema integrado de avaliação contido no Regulamento de Inspecções Judiciais, aprovado no Plenário do Conselho Superior da Magistratura, de 19 de Dezembro de 2002 e publicado no DR, série II, de 15/01/2003 e posteriores actualizações.

Os juízes de direito são classificados de acordo com o seu mérito, de Muito Bom, Bom Com Distinção, Bom, Suficiente e Medíocre, nos termos do disposto pelo artigo 33.º do EMJ.

O artigo 34.º do EMJ dispõe que a classificação dos juízes deve atender: ao modo de desempenho da função; ao volume, dificuldade e gestão do serviço a seu cargo; à capacidade de simplificação dos actos processuais; às condições do trabalho prestado; à sua preparação técnica; à sua categoria intelectual; exercício de funções enquanto formador dos auditores de justiça; aos trabalhos jurídicos publicados; à sua idoneidade cívica.

Dispõe ainda o artigo 37.º, n.º 1, do EMJ que, nas classificações, há sempre que ponderar o tempo de serviço, o resultado das inspecções anteriores, os processos disciplinares e quaisquer elementos complementares constantes do respectivo processo individual (cfr., também, os artigos 14.º e 15.º do RIJ).

Por seu turno, o artigo 13.º do RIJ densifica os critérios que norteiam a avaliação do mérito, apelando aos conceitos de capacidade humana para o exercício da profissão, à adaptação ao tribunal ou ao serviço e à preparação técnica em ordem a permitir o controlo externo da decisão e a reforçar o objectivismo valorativo e a segurança metodológica do procedimento inspectivo, diminuindo, por essa via, ao mesmo passo, a álea que surge sempre associada a qualquer processo de classificação. A capacidade humana para o exercício da profissão está associada à idoneidade cívica; à independência, isenção e dignidade da conduta; ao relacionamento com outros intervenientes processuais e público em geral; ao prestígio profissional e pessoal de que goza; à serenidade e reserva de que goza; à capacidade de compreensão das situações concretas em apreço e sentido de justiça, face ao meio sócio cultural onde a função é exercida e à capacidade e dedicação na formação de magistrados, tal como decorre do n.º 2 do citado artigo 13.º do RIJ.

A adaptação ao tribunal ou ao serviço é analisada, entre outros, pelos factores referenciados no n.º 3 do dispositivo em referência: bom senso; assiduidade, zelo e dedicação; produtividade; método; celeridade na decisão; capacidade de simplificação processual; direcção do tribunal, das audiências e outras diligências, designadamente quanto à pontualidade e calendarização destas.

Na preparação técnica, a inspecção toma globalmente em linha de conta, entre outros, os seguintes factores: a categoria intelectual; a capacidade de apreensão das situações jurídicas em apreço; a capacidade de convencimento decorrente da qualidade da argumentação utilizada na fundamentação das decisões, com especial realce para as originais; e o nível jurídico do trabalho inspeccionado, apreciado, essencialmente, pela capacidade de síntese na enunciação e resolução das questões, pela clareza e simplicidade da exposição e do discurso argumentativo, pelo senso prático e jurídico e pela ponderação e conhecimentos revelados nas decisões.

A recolha de toda a informação que for considerada relevante para efeitos de avaliação é feita através de instrumentos de registo normalizados e a validação das classificações obedece a critérios impostos pelas ferramentas normativas de auto-regulação e deve ser conforme com as próprias linhas jurisprudenciais emanadas do Conselho Superior da Magistratura.

A atribuição de Muito Bom equivale ao reconhecimento de que o Juiz ... teve um desempenho elevadamente meritório ao longo da respectiva carreira e a classificação de Bom com Distinção corresponde a uma actuação meritória ao longo da respectiva profissão, conforme flui do disposto no artigo 16.º, n.º 1, alíneas a) e b), do RIJ.  

No quadro normativo de referência a notação de Bom assume-se como classificação padrão. Na realidade, como decorre do artigo 36.º, n.º 4, do EMJ, «no caso de falta de classificação não imputável ao magistrado, presume-se a de Bom, excepto se o magistrado requerer inspecção, caso em que será realizada obrigatoriamente». A este propósito, prescreve o artigo 16.º, n.º 1, alínea c), do RIJ, que tal nota equivale ao reconhecimento de que o juiz revelou possuir qualidades a merecerem realce para o exercício do cargo, nas condições em que desenvolveu a actividade.

Neste sentido aponta também a prática constante do Conselho Superior da Magistratura que, sustentado no exigente processo de selecção e formação de magistrados, bem como no período prévio de experimentação controlada, se presume que a avaliação do desempenho dos magistrados em regime probatório se situa no nível classificativo Bom.

A classificação Suficiente equivale ao reconhecimento que o juiz possui as condições indispensáveis para o exercício do cargo e que o seu desempenho funcional é apenas satisfatório (artigo 16.º, n.º 1, alínea d), do RIJ).

Na perspectiva da quantidade e da qualidade do trabalho produzido, a notação de Medíocre corresponde a um desempenho profissional e “funcional aquém do satisfatório” e indiciador de inaptidão para o exercício da função, face ao enquadramento precipitado nos artigos 34.º, n.º 2, do EMJ e 16.º, n.º 1, alínea e) do RIJ.

Ao proceder à avaliação e classificação, o Conselho Superior da Magistratura dispõe de larga margem de liberdade e discricionariedade na apreciação da prova apurada e na aplicação concreta dos critérios e pressupostos legais. Nesta actividade, não obstante a apontada liberdade e discricionariedade, o Conselho está vinculado à prolação de uma decisão justa e que obedeça aos critérios legais e regulamentares enunciados.

A avaliação postula uma comparação entre o desempenho profissional expectável e o serviço efectivamente verificado e estabelece a ponte entre as competências do inspeccionado e os critérios regulamentares que disciplinam a atribuição de uma determinada classificação.

Vejamos então os vários aspectos invocados pelo Exmo. Juiz na sua reclamação. (…)»

«Justifica o procedimento de fazer constar dos acórdãos de que é relator de resumo das declarações e depoimentos prestados em audiência de julgamento, embora reconhecendo ter entretanto procedido a um ajuste neste procedimento.

Nada caberá acrescentar quanto a este aspecto, reconhecido pelo próprio reclamante.(…)»

«E.1). Discordando da censura efectuada na deliberação reclamada quanto aos relatórios dos acórdãos nos processos criminais, pois o relatório de inspecção refere que «Os relatórios contemplam todos os elementos configurados na lei».

E.2). Discordando da afirmação constante da deliberação reclamada de acordo com a qual faz «longas transcrições das contestações apresentadas pelos arguidos”, pois tal não consta do relatório de inspecção e nem foram identificados em concreto os processos em que tal poderá ter ocorrido.

Quanto a estes dois pontos enunciados, consta do relatório de inspecção:

«A estrutura dos seus acórdãos e sentenças obedece à previsão legal, e a sistematização gráfica dos conteúdos viabiliza a compreensão rápida pelos destinatários directos. (…)

Os relatórios contemplam todos os elementos configurados na lei e identificadores essenciais dos arguidos e dos crimes imputados pela acusação.

A sistematização de conteúdos é em regra correcta e facilitadora da leitura e consulta posterior pelas entidades judiciárias.

Poderia, embora, ter aludido mais frequentemente ao essencial das contestações crime e fundamentos dos pedidos cíveis, assim viabilizando uma mais fácil compreensão das razões de facto das partes.»

Por seu turno, na deliberação reclamada pode ler-se:

Foram ainda apontados dois outros aspectos menos conseguidos: Nos relatórios dos acórdãos criminais, o Exmo. Sr. Juiz ... não alude ao essencial dos pedidos de indemnização civil e das contestações apresentados; e na enumeração dos factos necessários para a determinação da medida concreta das penas que aplica, limita-se a transcrever os relatórios sociais elaborados.

Quanto ao primeiro, afigura-se-nos que é correcta a asserção feita pela Exma. Sra. Inspectora Judicial. Como podemos constatar da leitura dos acórdãos criminais, nos relatórios o Exmo. Sr. Juiz tem por hábito identificar as partes civis e indicar o montante do pedido de indemnização, sem mencionar, de forma sintética, a causa de pedir; em simultâneo, faz longas transcrições das contestações apresentadas pelos arguidos, em lugar de mencionar apenas as conclusões que de tais peças podem ser extraídas.»

«As respectivas passagens são suficientemente ilustrativas da ausência de fundamento do alegado pelo Exmo. Juiz. (…)»

Questão diversa é a da discordância do Exmo. Juiz quanto às conclusões a retirar a partir da factualidade assente, de tal sorte que, a final, pugna deverem alicerçar atribuição da notação de Muito Bom.

Aqui (sob a alínea A), e uma vez mais, o Exmo. Juiz rebate a afirmação das circunstâncias favoráveis em que o serviço foi prestado (alínea A.1); realça as características dos processos (alínea A.2); sublinha as circunstâncias desfavoráveis (alínea A.3); e conclui pela indução das circunstâncias favoráveis (alínea A.4).

Quanto ao primeiro aspecto, foi já analisado em articulação com o que o Exmo. Juiz classifica como aspectos desfavoráveis e daí se tendo retirado as devidas conclusões.

No mais, as características dos processos foram enunciadas e ponderadas, como o foi a gestão imprimida ao serviço pelo Exmo. Juiz, a qual foi definida como adequada e muito positiva.

Sob a alínea B), o Exmo. Juiz rebate uma vez mais as vertentes quantitativa e qualitativa da sua prestação.

A primeira vertente está suficientemente assente, explicitada e analisada, reiterando-se que não constitui o cerne da menos conseguida prestação por parte do Exmo. Juiz.

Na segunda vertente residem as fragilidades dessa mesma prestação, o que está suficientemente explícito e foi analisado quer no relatório de inspecção, quer na deliberação reclamada, colhendo também suporte documental junto.

A este propósito note-se que a avaliação do desempenho do Exmo. Juiz, nos diversos aspectos que foram analisados e ponderados não foi negativa, sendo que bem pelo contrário foi tida como bastante positiva, como bastante positiva, por meritória, foi a notação atribuída. Tal demonstra simplesmente que, numa mesma realidade complexa como a da avaliação do serviço prestado por um juiz, coexistem aspectos de diferente natureza, uns positivos, outros negativos, alguns em harmonia entre si, outros contraditórios, mas cada um com o seu peso relativo para a avaliação global final a efectuar.

Neste pressuposto, tão errado será considerar que aspectos positivos e negativos não podem coexistir por se contradizerem, como errado será sobrevalorizar uns postergando outros.

Se é certo que, conforme se retira do relatório de inspecção e foi acolhido na deliberação reclamada, o Exmo. Juiz conta com 19 anos e 7 meses de exercício efectivo da judicatura, sem mácula, com evidente esforço profissional e pessoal, empenho, dedicação, resultados positivos demonstrados no período sob inspecção, não menos certo é que nesse mesmo período, na sua prestação foram também registados aspectos menos conseguidos, os quais foram expressamente sinalizados.

Ao fazer a crítica da qualidade da prestação do serviço, o Conselho Permanente do Conselho Superior da Magistratura limitou-se a recorrer aos critérios avaliativos que, de forma constante e reiterada, vêm sendo, sucessivamente, utilizados no tratamento de situações similares. A deliberação reclamada obedece aos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da imparcialidade.

Com isto não se coloca em causa o nível de consciência profissional e o sentido de responsabilidade do Exmo. Juiz inspeccionado. Todavia, ao contrário do alegado, as constatações positivas circunscrevem-se à notação de Bom com distinção e isso aponta que, na actualidade, o Exmo. Juiz ... possui qualidades a viabilizarem e merecerem uma apreciação qualitativamente diferenciada que permite atribuir-lhe aquela nota de mérito. Ao invés, não se vislumbra a existência de elementos de facto que permita concluir que o desempenho do Exmo. Juiz no período em inspecção foi elevadamente meritório, e que assim viabilizem a atribuição da notação de Muito Bom.

Como se mencionou, a avaliação estabelece a ponte entre as competências do inspeccionado e os critérios regulamentares que disciplinam a atribuição de determinada classificação. Neste processo comunicativo, ponderados os aspectos mais e menos meritórios assinalados no relatório de inspecção, verifica-se que, no exame dos elementos carreados para os autos, resulta com clareza e rigor que o inspeccionado atingiu os pressupostos e as condições de atribuição da nota de Bom com distinção exigidos pela norma habilitadora.

Assim, impõem-se a improcedência da reclamação.»

III. DECISÃO

Desta forma, face a tudo quanto se deixou exposto, os membros que integram o Plenário do Conselho Superior da Magistratura deliberam o não provimento da reclamação apresentada, assim mantendo a deliberação tomada pelo Conselho Permanente do Conselho Superior da Magistratura que atribuiu ao Excelentíssimo Senhor Juiz ... AA a classificação de Bom com distinção, pelo serviço prestado no período compreendido entre 27 de Maio de 2008 e 31 de Dezembro de 2012.»

6.A deliberação parcialmente transcrita em 5. foi votada pelo [...]

Questões a decidir:

Apreciando as alegações produzidas pela recorrente nos presentes autos, temos que a questão a decidir se resume a determinar se a deliberação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura parcialmente transcrita no ponto n.º 5 do elenco factual deve ser declarada nula por violação do caso julgado material decorrente da decisão judicial aludida no ponto n.º 3 do mesmo elenco ou por violação do princípio da imparcialidade ou antes anulada por padecer de erro sobre os pressupostos jurídicos em que assenta.

DA VIOLAÇÃO DO CASO JULGADO MATERIAL:

Na petição inicial, o recorrente sustentou que o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça referido no ponto n.º 3 do elenco factual impunha que os Exmos. Vogais do Conselho Superior da Magistratura que são Juízes de 1.ª Instância ficassem impedidos de participar no procedimento inspectivo e não apenas na votação respeitante à deliberação que incidiu sobre a reclamação que apresentou, tanto mais que as decisões se tomam na discussão e que a votação apenas as formaliza.

Adiante, nas alegações a que se refere o n.º 1 do artigo 176.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, precisou que, em seu entender e na esteira do decidido naquele aresto, era vedada a presença dos mesmos Exmos. Vogais no momento da discussão acerca da reclamação apresentada e da respectiva votação.  

Em tese geral, pode-se afirmar que o respeito pela decisão judicial radica na necessidade de garantir o prestígio dos Tribunais mas, sobretudo, na defesa da certeza, da segurança jurídica e da paz social (assim, v. MANUEL DE ANDRADE, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra págs. 305 e 306 e ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil Anotado, Coimbra, vol. III, pág. 94).

Na verdade, o princípio constitucional da segurança jurídica e da protecção da segurança dos cidadãos (expressamente consagrado no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa) implica que haja um mínimo de certeza e segurança nos direitos das pessoas e nas expectativas juridicamente criadas, sendo-lhe imanente a protecção da confiança dos cidadãos e da comunidade na ordem jurídica e na actuação do Estado. 

O caso julgado é o corolário máximo desses princípios, sendo assiduamente caracterizado como a expressão concreta da lei perante os factos trazidos a juízo (na impressiva afirmação de ALBERTO DOS REIS, Processo de Execução, vol. I, 2.ª Edição, pág. 17 – trata-se de truncar «o nexo que liga a norma à situação concreta, substituindo-se aquela na disciplina desta»), apontando-se-lhe, como limite objectivo, o objecto do processo, o qual se define, primeiramente, por referência à providência solicitada e, secundariamente, pela causa de pedir.

No contexto específico do contencioso de mera anulação – assim se tem caracterizado, pacificamente, a impugnação, perante este Supremo Tribunal de Justiça, das deliberações do Plenário do Conselho Superior da Magistratura –, a pretensão imediata é a invalidação do acto recorrido, correspondendo esse direito potestativo, de acordo com a teoria da consubstanciação, ao “facto concreto ou nulidade específica que se invoca para obter o efeito jurídico pretendido” (n.º 4 do artigo 581.º do Código de Processo Civil – neste sentido, v., entre outros, o Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso do Supremo Tribunal Administrativo de 23 de Janeiro de 2003 – proferido no processo n.º 048079 – e o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 7 de Dezembro de 2011 – proferido no processo n.º 0419/11 –, ambos acessíveis em www.dgsi.pt).

Por isso, é de considerar que o efeito de caso julgado associado à sentença proferida é inseparável do acto impugnado e não se projecta para além dele. Na verdade, o processo impugnatório é ainda um «processo feito a um acto (…)» (assim AROSO DE ALMEIDA, Sobre a autoridade do caso julgado das sentenças de anulação de actos administrativos, Almedina, pág. 52).

Tem-se tradicionalmente entendido (entre outros, v. MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO COSTA GONÇALVES e J. PACHECO DE AMORIM, Código do Procedimento Administrativo Comentado, 2.ª Edição, Almedina, pág. 649 e VIEIRA DE ANDRADE, A Justiça Administrativa (Lições), 9.ª Edição, Almedina, pág. 372) que as decisões judiciais que anulam actos administrativos contêm um momento definitório (que se concretiza no acertamento da invalidade do acto da administração e na sua eliminação retroactiva), também apelidado de efeito constitutivo.

Associa-se-lhes, paralelamente, um alcance preclusivo, o qual se reconduz à imposição à administração, em sede de renovação do acto anulado, da proibição de reincidir nos vícios que determinaram a anulação (assim, entre outros, FREITAS DO AMARAL, A Execução das Sentenças do Tribunais Administrativos, Almedina, 2.ª Edição, págs. 36 e 92 a 94; e os Acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso do Supremo Tribunal Administrativo de 21 de Março de 1991, proferido no processo n.º 019760 e de 29 de Janeiro de 1997, proferido no processo n.º 027517, ambos acessíveis em www.dgsi.pt).

Por isso, pode-se dizer que a qualificação de determinadas circunstâncias como vícios do acto integra o caso julgado material (neste sentido, o citado Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 21 de Março de 1991 e, bem assim, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9 de Julho de 2014, proferido no processo n.º 1/14.1YFLSB e sumariado em http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-sumarios/contencioso/Contencioso-2014.pdf – sobre a razão de ser histórica desta ampliação no âmbito do contencioso de mera anulação, v. AROSO DE ALMEIDA, ob. cit., pág. 127, 128 e 136 e, em breve síntese do mesmo autor, Inutilidade superveniente e caso julgado no contencioso administrativo de impugnação de actos administrativos, in Scientia Iuridica, tomo LXII, 2013, págs. 390 e 391).

É que, como ensina VIEIRA DE ANDRADE, (ob. cit. pág. 376), «O alcance do julgado e, portanto, a delimitação, quer do efeito conformativo, quer mesmo do efeito reconstitutivo, depende da necessidade de ter em conta os fundamentos da decisão de anular, isto é, a concreta ilegalidade demonstrada, não bastando a consideração do dispositivo da sentença - por outras palavras, o alcance da sentença decorre do carácter normativo (negativo) da sentença anulatória. (…)». 

Em face da preclusão ocasionada pelo julgado, obtempera-se que o acertamento transcende o âmbito do acto impugnado para se projectar em ulteriores manifestações do poder que, por intermédio daquele, foi exercido, condicionando o seu posterior uso no contexto da relação jurídico-administrativa subjacente (assim AROSO DE ALMEIDA, ob. cit., págs. 122 e 128) e mesmo até perante outros administrados (assim VIEIRA DE ANDRADE, ob. cit., pág. 374).

Como corolário lógico do que viemos de expor emerge que a invalidade do acto reincidente será sempre primeiramente aferida por referência à sentença que anteriormente declarou a inexistência/nulidade/anulabilidade do acto anterior (assim FREITAS DO AMARAL, ob. cit., pág. 53).

Acentue-se, porém, que o alcance negativo do efeito preclusivo do caso julgado a que temos vindo a aludir não impõe à administração o conteúdo de determinados actos mas apenas a observância de uma regra de não contrariedade ao decidido, cuja geometria depende do concreto conteúdo do acertamento judicial e, em particular, dos vícios determinantes da anulação (assim FREITAS DO AMARAL, ob. cit., págs. 53 e 57).

Na verdade, como explica AROSO DE ALMEIDA (ob. cit., págs. 145 e 146), se o acto foi anulado porque se decidiu que os pressupostos de que ele partiu não existiam, é vedado à administração pretender que eles se verificavam, ficando a renovação/substituição do acto com o mesmo conteúdo (vg. a escolha do mesmo candidato) dependente da demonstração da superveniência da verificação desses pressupostos.

Por seu turno, se o acto foi invalidado por se ter demonstrado que a administração, indevidamente, omitiu a ponderação de determinados aspectos ou teve em consideração elementos que não deveria ter valorado, o efeito negativo a que vimos aludindo implica que se proceda à apreciação dos aspectos preteridos ou à inutilização de critérios impropriamente empregues (a este respeito, v., entre outros, o Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso do Supremo Tribunal Administrativo de 2 de Julho de 2008, proferido no processo n.º 01328A/03 e acessível em www.dgsi.pt).

A este propósito, é ainda corrente mencionar-se um efeito preclusivo complementar, o qual se consubstancia na vinculação da Administração aos elementos que já integravam o procedimento e que não se devam ter por afectados ou carentes de revisão em função da decisão judicial definitiva (assim AROSO DE ALMEIDA, ob. cit., págs. 165 e 166; a este respeito, v., exemplificativamente, entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15 de Outubro de 2013, proferido no processo n.º 64/13.7YFLSB e sumariado em http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-sumarios/contencioso/contencioso-2013.pdf e o Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso do Supremo Tribunal Administrativo de 27 de Outubro de 2005, proferido no processo n.º 0408/05 e acessível em www.dgsi.pt).

Ressalvada a superveniência (objectiva ou subjectiva) de factos novos dotados de relevância, tais elementos procedimentais consolidam-se e, tornando-se incontestáveis, podem mesmo conduzir a Administração a uma posição de estrita vinculação onde antes imperava a discricionariedade.

Ao invés, se a invalidação se ficou a dever a motivos formais – não se tendo discutido as posições substanciais das partes –, apenas se impõe o exercício do poder nas condições legalmente previstas, nada obstando, pois, que o novo acto possua o mesmo conteúdo que o anterior (assim, FREITAS DO AMARAL, ob. cit., pág. 94 e, entre tantos outros, o Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso do Supremo Tribunal Administrativo de 15 de Outubro de 2008, proferido no processo n.º 028055A e acessível em www.dgsi.pt). 

A distinção vinda de traçar assume particular relevância no contexto da execução da decisão judicial anulatória, a qual é ainda tida como um resultado do efeito constitutivo da sentença (assim MÁRIO AROSO DE ALMEIDA Anulação de actos administrativos e relações jurídicas emergentes e VIEIRA DE ANDRADE, ob. cit., pág. 373 – que alude a um efeito reconstitutivo da sentença definitiva).

É, porém, de observar que o respeito pelo caso julgado, embora esteja intimamente relacionado com a sua correcta execução, não se confunde com esta (neste sentido, v. FREITAS DO AMARAL, ob. cit., págs. 37 e 38).

Convém precisar que a execução a que nos referimos consiste no acatamento voluntário da decisão judicial, não se reconduzindo, portanto, ao cumprimento coercivo do julgado, a que corresponde o processo executivo regulado nos artigos 176.º a 179.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

No contexto das sentenças invalidantes de actos administrativas, a execução, na aludida acepção, reporta-se, no dizer da lei (artigo 173.º, n.º 1, do mesmo diploma), ao «dever de reconstituir a situação que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado, bem como de dar cumprimento aos deveres que não tenha cumprido com fundamento no acto entretanto anulado, por referência à situação jurídica e de facto existente no momento em que deveria ter actuado.», tudo em homenagem ao princípio da reconstituição da situação hipotética actual (assim, o Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso do Supremo Tribunal Administrativo de 2 de Julho de 2008, proferido no processo n.º 01328A/03 e acessível em www.dgsi.pt), primeiramente enunciado por FREITAS DO AMARAL (ob. cit., pág. 41).

Por outras palavras, incumbe à administração tomar as medidas necessárias à adequação do plano factual à realidade jurídica definitivamente estabelecida pela sentença anulatória. Trata-se de uma faceta positiva do dever de conformação que impende sobre a administração relativamente às decisões judiciais transitadas em julgado (assim MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, Anulação…, pág. 41), a qual, porém, só em parte se deve ter como atribuível ao efeito do caso julgado, porquanto decorre de normas de direito substantivo (assim VIEIRA DE ANDRADE, ob. cit., pág. 376).

Como resulta do preceito vindo de citar, os deveres que impendem sobre a administração desdobram-se em três planos, a saber: a execução do efeito repristinatório da anulação; o cumprimento dos deveres antes descumpridos; e a substituição do acto ilegal sem reincidir nos vícios de que ele padecia e que determinaram a anulação (assim, v. MÁRIO AROSO DE ALMEIDA e CARLOS ALBERTO FERNANDES CADILHA, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, pág. 790; a respeito das soluções consagradas naquele preceito, v. MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, Anulação…, págs. 682 a 689).

Aproximemo-nos agora da caracterização da invalidade do acto administrativo que desconsidere o caso julgado.

De acordo com a alínea i) do n.º 2 do artigo 161.º do Código do Procedimento Administrativo são nulos os actos que ofendam os casos julgados. Paralelamente, o n.º 2 do artigo 158.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos sanciona com a nulidade os actos desconformes com decisões judiciais.

Por via destes preceitos e embora sejam não sejam coincidentes os respectivos campos de aplicação (a este respeito, v. MÁRIO AROSO DE ALMEIDA e CARLOS ALBERTO FERNANDES CADILHA, ob. cit., pág. 860), visa-se fundamentalmente assegurar que as decisões judiciais que vinculam a administração são efectivamente por ela cumpridas e respeitadas, dando-se assim expressão prática, no âmbito do procedimento administrativo, ao princípio da subordinação do poder administrativo ao poder judicial (contido no n.º 2 do artigo 205.º da Constituição da República Portuguesa e, paralelamente, no n.º 1 do artigo 158.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos) e à necessidade de harmonizar os poderes estaduais.

Na posse destes considerandos, avancemos para a resolução da primeira questão suscitada pelo recorrente.

Porém, como ponto prévio e tendo em mente o teor dos artigos 39.º a 47.º da resposta do recorrido, não podemos deixar de obtemperar que, nesta sede, não nos debruçaremos sobre a pretensa inconstitucionalidade do entendimento normativo subjacente ao teor do aresto parcialmente transcrito no ponto n.º 3 do elenco factual.

Perfilhando o recorrido o entendimento de que as interpretações normativas ali preconizadas são desconformes com os preceitos constitucionais que invoca, cabia-lhe ter reagido no tempo e pelo modo devidos, não sendo esta, a sede própria para, a pretexto da interpretação preconizada pelo recorrente, o sustentar.

É o que, sem necessidade de mais considerandos, se deixa exarado.

Como supra se afirmou, impõe-se que, para descortinar a ocorrência de ofensa ao caso julgado, se procure, primeiramente, o alcance da decisão tomada, o que, por sua vez, importa o recurso às regras da interpretação dos negócios jurídicos (artigos 236.º a 238.º do Código Civil), sendo que a exegese a efectuar deverá atender, basilarmente, à fundamentação adoptada e à parte dispositiva da sentença (neste sentido, v., entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28 de Janeiro de 1997, CJSTJ, tomo I, pág. 83).

Atentando no discurso fundante da decisão tomada por esta Secção de Contencioso no dia 9 de Julho de 2015 no processo n.º 51/14.8YFLSB (integralmente transcrita, no que aqui releva, no ponto n.º 3 do elenco factual) constata-se que a razão de ser do decidido radicou na constatação de que os Exmos. Srs. Vogais do Conselho Superior da Magistratura aí nominalmente designados se encontravam impedidos de intervir na deliberação então impugnada pelo recorrente.

É o que, com inabalável certeza, se extrai do segmento em que se lê que «o quadro fáctico dado por adquirido relativamente aos Exmos. Vogais do Conselho, um deles enquanto Relator da decisão proferida pelo Conselho Permanente, os demais diretamente intervenientes na Deliberação do Plenário, configura uma situação de impedimento relativamente a cada um deles?

Seguramente, sim.».

Para motivar essa consideração, o aresto a que aludimos ponderou que os referidos Exmos. Vogais apresentavam «no plano objetivo (e não do prisma subjectivista ou intencional) um interesse direto e pessoal na classificação que lhe vier a ser definitivamente atribuída.

Porquê?

Porque tal classificação – rectius, se obtida a classificação pretendida de Muito Bom – irá influenciar, em futuro movimento judicial, o número de ordem que o Recorrente ocupará em relação aos quatro vogais sob referência.

Vale dizer, nas palavras do Exmo. Recorrente, «se o A. obtivesse na sequência do presente processo de inspeção a classificação de MUITO BOM, continuaria a ocupar a posição nº155 quanto à antiguidade, mas já teria o número de ordem 37, o que significaria ocupar uma posição mais adiantada na classificação em relação aos quatro vogais do CSM (…)»

«É inelutável, pois, no caso concreto, a existência de um objetivo conflito de interesses. Na aparência objetiva não se pode ilidir o interesse de cada um dos Vogais em causa relativamente à classificação a atribuir ao Exmo. Juiz Recorrente.»

E foi essa a consideração que conduziu à detecção do vício de violação de lei que levou à anulação da deliberação mencionada no ponto n.º 1 do elenco factual.

É o que resulta do trecho em que se lê «Nesta conformidade, teria sido avisado que cada um dos referidos vogais tivesse suscitado o seu impedimento.

Porém, visto a confirmação do impedimento, existente mas não declarado, relativamente aos Exmos. Juízes de Direito, Vogais do Conselho Superior da Magistratura, a Deliberação do Plenário deste Conselho, de 17 de junho de 2014 mostra-se inválida por violação das garantias da imparcialidade, logo anulável nos termos do artigo 51º do Código do Procedimento Administrativo.».

Perante a meridiana clareza que evola desta análise exegética do discurso motivador da decisão, debalde, pois, se poderá nele buscar um laivo argumentativo que sustente a posição defendida pelo recorrente.

Com efeito, o que, em escorreito resumo, se decidiu foi que os Exmos. Srs. Juízes [...], na sua qualidade de Vogais do Conselho Superior da Magistratura e de membros do Plenário deste ente (cfr. alínea c) do n.º 1 do artigo 137.º e n.º 2 do artigo 150.º, ambos do Estatuto dos Magistrados Judiciais), se deveriam ter declarado (ou sido declarados) impedidos em deliberações respeitantes ao recorrente que viessem a ser adoptadas por este órgão do recorrido.

Ora, sem mais, essa valoração não é extensível a qualquer Juiz de 1.ª Instância que, transitoriamente, desempenhe idêntico cargo no Conselho Superior da Magistratura.

É que a razão de ser do impedimento constatado no aludido acórdão – que, no essencial, assenta na existência (ou, pelo menos, na aparência objectiva da existência) de um interesse pessoal e directo na subsistência da notação de serviço do recorrente – refere-se exclusivamente ao trajecto profissional daqueles Exmos. Srs. Juízes e, em particular, à posição relativa dos mesmos na lista de antiguidade por referência ao respectivo número de ordem.

Estamos, por isso, perante um impedimento que é associável unicamente àqueles porquanto possui um cunho eminentemente pessoal.

Vale isto por dizer, em são resumo, que a «base da anulação decidida» (para empregar a expressão do recorrente) não assentou na participação no «procedimento inspectivo» de Exmos. Vogais que desempenhem funções como Juízes de Direito mas antes na intervenção dos atrás aludidos Exmos. Srs. Juízes de Direito na deliberação então impugnada pelo recorrente. Aliás, posto que não se descortina que qualquer um deles haja tido qualquer sorte de intervenção no pregresso curso do procedimento inspectivo, é inconcebível que a abrangência do caso julgado fosse tão ampla como sustenta o recorrente.

Daí que se não descortine que o acórdão a que vimos aludindo haja formulado uma sorte de regra genérica e abstracta que inviabilize qualquer intervenção de um dos Exmos. Vogais que desempenham funções como Juízes de Direito em todos os procedimentos administrativos (mormente, inspectivos) que digam respeito ao recorrente.

Posto isto, parece ser claro que o efeito preclusivo do caso julgado material se cinge à intervenção dos Exmos. Srs. Juízes [...] em deliberações do Plenário que dissessem respeito ao recorrente.

Por isso, em decorrência do preceituado do disposto do n.º 1 do artigo 173.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, a execução do julgado – na acepção de que acima demos conta e atenta a disciplina substantiva aplicável – bastar-se-ia com a declaração dos impedimentos dos Exmos. Srs. Vogais acima identificados por parte do Exmo. Sr. Presidente do Plenário do Conselho Superior da Magistratura (cfr. n.º 1 do artigo 137.º e n.º 4 do artigo 70.º do Código do Procedimento Administrativo).

Subsequentemente, seria suficiente (mas também necessário, já que, com a anulação contenciosamente decidida, mantinha-se pendente a reclamação aduzida pelo recorrente contra a deliberação do Conselho Permanente) a adopção de nova deliberação pelo Plenário (um órgão de que são titulares todos os membros do Conselho Superior da Magistratura – cfr. n.º 1 do artigo 137.º e n.º 2 do artigo 150.º, ambos do Estatuto dos Magistrados Judiciais), na qual interviriam os suplentes dos Vogais tidos como impedidos.

Caso estes não pudessem ser designados, o Plenário, em homenagem ao princípio da colegialidade, funcionaria sem aqueles Vogais (n.º 2 do artigo 72.º Código do Procedimento Administrativo).

O Conselho Superior da Magistratura, porém, entendeu que, na votação da deliberação recorrida, não deveriam intervir os Exmos. Srs. Juízes de 1.ª Instância que aí desempenham funções como Vogais, embora hajam estado presentes na sessão em que a mesma foi adoptada (pontos n.os 4 a 6 do elenco factual).

Apreciemos a legalidade desse procedimento em face do que se revela ser a correcta interpretação do julgado.

Em primeiro lugar, tenha-se em consideração que, em decorrência das eleições para o Conselho Superior da Magistratura realizadas em 7 de Abril de 2016, os Exmos. Juízes de Direito que desempenham funções de Vogais daquela entidade são, actualmente e como decorre do ponto n.º 4 do elenco factual, o Dr. [...]

Não se tratam, pois, dos mesmos Exmos. Sr. Juízes em relação aos quais se verificava o impedimento declarado por este Supremo Tribunal de Justiça no processo n.º 51/14.8YFLSB.

Daí que, atenta a sucessão no desempenho dessas funções, se justificasse, plenamente, que não fossem designados os suplentes destes últimos Exmos. Srs. Juízes para integrarem o Plenário do Conselho Superior da Magistratura.

Por outro lado, importa notar que, nos órgãos colegiais (como é, inequivocamente, o caso do Plenário do Conselho Superior da Magistratura), o impedimento de um dos respectivos titulares que determine que estes funcionem sem algum dos seus membros pode colocar o quórum necessário para a aprovação de deliberações mas não implica que deva ser reduzido o número total de membros legalmente requerido para aferir a validade dos seus actos (neste sentido, v. MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO COSTA GONÇALVES e J. PACHECO DE AMORIM, ob. cit., pág. 255).

Ora, o n.º 2 do artigo 156.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais estatui que o Plenário do Conselho Superior da Magistratura que «Para a validade das deliberações exige-se a presença de, pelo menos, 12 membros.».

Equivale isto por dizer que a lei erige, como a condição de validade das deliberações tomadas pelo Plenário do Conselho Superior da Magistratura, a presença de 12 dos seus membros (neste sentido, v. o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8 de Novembro de 2007, proferido no processo n.º 4674/07 e acessível em www.dgsi.pt).

            Na sessão do Plenário do Conselho Superior da Magistratura realizada no dia 10 de Julho de 2016, estiveram presentes 14 dos seus membros (cfr. ponto n.º 4 do elenco factual), sendo que, como vimos, 4 deles são os Juízes de Direito que actualmente desempenham o cargo de Vogais eleitos pelos magistrados judiciais de 1.ª Instância.

Assim, crê-se ser evidente a conclusão de que, para deliberar regularmente, o Plenário não poderia prescindir da presença de, pelo menos, dois deles. É que só assim se mostraria assegurado o quórum de funcionamento imposto pela disposição legal acima citada.

Por fim, atenta a pessoalidade da circunstância impeditiva aludida no aresto proferido no processo n.º 51/14.8YFLSB, sempre seria necessário alegar e demonstrar que a mesma, ainda que em moldes factualmente distintos, também se verificava, paralelamente, em relação aos Juízes de Direito que, actualmente, se acham nomeados como Vogais do Conselho Superior da Magistratura.

Só assim se poderia, eventualmente, ter como ofendido o caso julgado material ali formado.

Ora, nada se alegou ou demonstrou relativamente a esses aspectos e os mesmos não constituem facto notórios.

Assim sendo, não se descortina qualquer razão factualmente compreensível que leve a considerar que o entendimento professado por este Supremo Tribunal de Justiça é, sem mais, extensível àqueles Exmos. Srs. Juízes como se de uma norma jurídica se tratasse.

Dito de outra forma, caso o recorrente entendesse que o impedimento constatado pelo acórdão do Supremo Tribunal de Justiça a que vimos aludindo se verificava também em relação àqueloutros Exmos. Srs. Juízes caber-lhe-ia alegar e provar os pertinentes factos para o sustentar em vez de, simplesmente, se escudar numa infundada interpretação daquele aresto.

Temos, pois, que, no seguimento de tudo quanto viemos de expor, não se perfilha o entendimento de que a deliberação recorrida padece de nulidade por ofensa ao caso julgado.

Da violação do princípio da imparcialidade:

Ingressemos agora na apreciação da alegação segundo a qual a deliberação impugnada contende com o princípio da imparcialidade e que, como tal, está ferida de nulidade por ofensa ao conteúdo essencial de um direito fundamental.

Primo, cabe referir que, como decorre, entre tantos outros (v., ademais, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Novembro de 2015, proferido no processo n.º 125/14.5YFLSB e o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 17 de Junho de 2003, proferido no processo n.º 0666/03, ambos acessíveis em www.dgsi.pt; na doutrina, v., entre outros, MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO COSTA GONÇALVES e J. PACHECO DE AMORIM, ob. cit., pág. 647), do acórdão proferido no processo n.º 51/14.8YFLSB, o acto administrativo que postergue o princípio da imparcialidade (segunda parte do n.º 2 do artigo 266.º da Constituição da República Portuguesa e artigo 9.º do Código do Procedimento Administrativo) é meramente anulável por vício de violação de lei.

Independentemente, porém, da qualificação jurídica que deva ser associada a uma pretensa infracção do princípio da imparcialidade, propendemos a considerar que ela não se verifica.

Vejamos.

Com a devida vénia, fazem-se nossas as judiciosas e grandiloquentes considerações tecidas no acórdão proferido no processo n.º 51/14.8YFLSB acerca da caracterização deste princípio.

A elas se acrescenta apenas que o princípio da imparcialidade impõe à Administração a adopção de um tratamento isento e equidistante relativamente a todos os particulares que consigo interagem no âmbito do procedimento, impedindo-a de os favorecer uns ou de desfavorecer outros por razões estranhas à sua função.

Para efeitos analíticos, este princípio é usualmente desdobrado no plano das garantias do procedimento (incompatibilidades, impedimentos e suspeições – artigos 69.º e ss. do Código do Procedimento Administrativo) e no plano das garantias da própria decisão (assim JORGE MIRANDA e RUI MEDEIROS, Constituição da República Portuguesa Anotada, tomo III, Coimbra, pág. 566).

Dado o modo pouco preciso como se acha formulada a alegação em apreço, cabe apenas reconhecer que a factualidade provada não evidencia que os Exmos. Srs. Juízes de Direito que, actualmente, exercem funções como Vogais do Conselho Superior da Magistratura detenham qualquer sorte de interesse egoístico na improcedência da reclamação da deliberação do Conselho Permanente apresentada pelo recorrente.

Paralelamente, não transparece da factualidade alegada e/ou apurada qualquer motivo que, plausivelmente e com razoabilidade, permita concluir que aqueloutros titulares do Plenário do Conselho Superior da Magistratura intervieram na discussão que precedeu a adopção da deliberação ora impugnada ou influíram, decisiva e relevantemente, no seu conteúdo e sentido.

Note-se, ademais, que, ao invés do que parece preconizar o recorrente, tais atitudes não são passíveis de serem inferidas a partir, simplesmente, da demonstração da sua presença na sessão em que foi adoptada a deliberação recorrida.

Ora, como se assinalou no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 24 de Novembro de 2004 (proferido no processo n.º 0565/04) «O princípio da imparcialidade não é fatalmente omnipresente. Isto é, embora ele atravesse todo o procedimento e não se reserve apenas para a fase da decisão final, a intervenção e o exercício dos poderes funcionais no seu decurso só adquire desvalor antijurídico quando determinem ou influenciem a decisão administrativa num certo sentido».

Por seu turno, crê-se ser manifesto que só o cabal cumprimento, pelo recorrente, do ónus de alegação e de prova dos factos demonstrativos da existência de um qualquer impedimento por parte dos Exmos. Srs. Juízes de 1.ª Instância acima referidos poderia espoletar a aplicabilidade do disposto do n.º 4 do artigo 31.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (em que se estatui que «Não podem estar presentes no momento da discussão nem da votação os membros dos órgãos colegiais que se encontrem ou se considerem impedidos») em cujo preceituado se parece basear a alegação em apreço.

É que a proibição da presença no momento da discussão e votação (que se justifica pelo melindre derivado da assistência à reunião de titulares do órgão colegial que se achem impedidos – assim MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA, PEDRO COSTA GONÇALVES e J. PACHECO DE AMORIM, ob. cit., pág. 178) só tem cabimento quando, efectivamente, se verifique um impedimento.

Assim, não se divisa que a deliberação recorrida haja sido tomada em virtude da influência ou sequer da ponderação de interesses estranhos ao interesse público subjacente à apreciação do mérito dos magistrados judiciais confiado ao Conselho Superior da Magistratura (cfr. n.º 1 do artigo 217.º da Constituição da República Portuguesa e alínea a) do artigo 149.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais).

É, pois, inviável concluir nos termos propugnados pelo recorrente.

Ainda a respeito do princípio da imparcialidade, destaque-se que o artigo 9.º do Código do Procedimento Administrativo preconiza que a Administração Pública deve adoptar «soluções organizatórias e procedimentais indispensáveis à preservação da isenção administrativa e à confiança nessa isenção», o que, ademais, se deve reconduzir à prevenção de conflitos de interesses (assim LUIZ CABRAL de MONCADA Código do Procedimento Administrativo Anotado, Coimbra, pág. 100). Tal requererá, num passo, a prévia identificação das situações que, à partida, podem gerar suspeitas e, noutro, a sua superação/resolução mediante a intervenção das pertinentes garantias procedimentais (assim J. PACHECO DE AMORIM Os princípios gerais da atividade administrativa no projeto de revisão do Código do Procedimento Administrativo (CPA), in CJA n.º 100, pág. 24).

Ora, conjugando a composição do Plenário e a distribuição dos mandatos dos Vogais eleitos pelos magistrados judiciais (n.º 1 do artigo 218.º da Constituição da República Portuguesa, n.º 1 do artigo 137.º e artigo 142.º, ambos do Estatuto dos Magistrados Judiciais), poder-se-ia conjecturar o funcionamento desse órgão sem a presença de Juízes de Direito, como aventou o Ministério Público no seu douto parecer.

Perante este quadro legal, justificar-se-ia que o recorrido ter adoptado soluções organizativas para que o Plenário fosse ser composto nesses moldes?

Mesmo que se considere que uma decisão tomada num «contexto suspeito do ponto de vista da imparcialidade em caso de incumprimento» do dever acima mencionado é passível de ser anulada (J. PACHECO DE AMORIM, ob. cit., págs. 24 e 25), a verdade é que a ponderação da globalidade dos factos provados não autoriza que se repute que a mera presença de Exmos. Srs. Juízes na sessão do Plenário em questão é, por si só, idónea a colocar em perigo a isenção dos Vogais que votaram a deliberação recorrida.

Itera-se, por seu turno, que se queda indemonstrada a ocorrência de qualquer impedimento relativamente a esses Exmos. Srs. Juízes e que, decorrentemente, carece de sentido a convocação de qualquer paralelismo com o disposto no n.º 4 do artigo 31.º do Código do Procedimento Administrativo.

Por outro lado, a interpretação do julgado feita pelo Conselho Superior da Magistratura permite afastar quaisquer receios que se pudessem ter quanto a esse aspecto. Na verdade, ao decidir que a deliberação impugnada seria apenas votada – o que, naturalmente, supõe a prévia discussão do projecto que a corporiza – pelos restantes membros do seu Plenário, o recorrido, como se lhe impunha, agiu de modo adequado e idóneo a preservar a imagem de descomprometimento e equidistância da administração.

Assim, perante a falta de alegação e demonstração de outros factos, deve-se, entender que não era exigível ao recorrido que organizasse o funcionamento do seu Plenário no sentido de excluir a presença dos seus titulares que desempenham funções como Juízes de Direito.

De tudo quanto viemos de expor, somos a concluir pela improcedência dos vícios adjectivos invocados.

Não encontramos, paralelamente, argumentos que, convincentemente, permitam sustentar uma posição contrária.

Sempre se dirá, em todo o caso, que a invalidação da deliberação por violação do dever ínsito no artigo 9.º do Código do Procedimento Administrativo deveria ser, primeiramente, posta à consideração das partes, atento, por um lado, a novidade da questão (n.º 3 do artigo 95.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos) e, por outro, a posição do recorrido sobre o tema.

DO ERRO SOBRE OS PRESSUPOSTOS DE FACTO:

Invoca subsidiariamente o recorrente a existência de erro na apreciação dos pressupostos jurídicos-factuais da atribuição da classificação de serviço cujo reconhecimento seria da competência deste Supremo Tribunal de Justiça, sendo que, a entender-se diferentemente, se colocaria em crise o direito a uma tutela jurisdicional efectiva e o direito a um processo equitativo.

A alegação em apreço reconduz-se à mera invocação de um erro nos pressupostos de direito e não a um erro nos pressupostos de facto, como sustenta o recorrido.

O vício atribuído ao acto consiste na errada interpretação e/ou aplicação das normas constitucionais, legais e regulamentares convocáveis, mormente, por falta de coincidência entre os pressupostos de facto apurados e aqueles de que de depende a aplicação de determinado preceito ou de regras de direito (assim, v., entre outros, os Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 08 de Janeiro de 1965 – AD n.º 39, pág. 465 – e de 07 de Abril de 1987 – AD n.º 315, pág. 323).

Segundo MARCELO CAETANO (Manual de Direito Administrativo, Vol. I, Almedina, pág. 502 e segs.), o erro de direito integra o vício de violação de lei, o qual é usualmente associado ao exercício de poderes vinculados, produzindo-se aquele quando «a Administração decida coisa diversa do que a lei estabelece ou nada decida quando a lei mande decidir algo»  (cita-se FREITAS DO AMARAL - com a colaboração de LINO TORGAL - Curso de Direito Administrativo, Vol. II, Almedina, págs. 390 e 391).

No contexto da impugnação de deliberações do Plenário que versem sobre classificações de serviço, tem este Supremo Tribunal de Justiça uniformemente entendido que o Conselho Superior da Magistratura, no desempenho da tarefa de avaliação do mérito dos magistrados judiciais, actua no campo da chamada “discricionariedade técnica” que mais não é do que a formulação, baseada numa apreciação livre, de juízos exclusivamente assentes na experiência e nos conhecimentos científicos e/ou técnicos do órgão decisor e em que releva a apreensão, de carácter eminentemente subjectivo, de elementos de convicção por ele colhidos no processo inspectivo.

Consequentemente, ressalvadas as situações de ofensa clamorosa aos princípios que regem a actividade administrativa ou de erro grosseiro no emprego dos critérios e juízos valorativos de que o Conselho Superior da Magistratura se socorra, é vedado ao Supremo Tribunal de Justiça, no âmbito da impugnação judicial de deliberações atinentes a classificação de serviço sindicar a bondade intrínseca das mesmas.

É que, como já aflorámos, o seu âmbito cognitivo cinge-se à “mera” apreciação da legalidade, o que clarividentemente resulta da interpretação conjugada do disposto no artigo 178.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, no n.º 1 do artigo 3.º e no n.º 1 do artigo 50.º - ex vi no artigo 192.º -, todos do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

Não se lhe pode, pois, solicitar que aprecie como foram exercidos os critérios de mérito tidos como relevantes por parte do órgão da Administração, que dissinta da sua conveniência ou oportunidade ou que sobreponha aos que foram usados pelo Conselho Superior da Magistratura os seus próprios critérios avaliativos, já que tal equivaleria à apropriação de prerrogativas exclusivamente conferidas àquela entidade e à substituição à mesma na prossecução de funções próprias que apenas à mesma estão legalmente confiadas (no sentido vindo de sumariar, v., entre tantos outros, os Acórdãos proferidos nos processos n.º 126/13.0YFLSB – em 20 de Março de 2014 - e n.º 4/14.6YFLSB - em 25 de Setembro de 2014 –, ambos acessíveis em www.dgsi.pt, bem como os arestos proferidos nos processos n.º 5/13.1YFLSB – em 8 de Maio de 2013 –, n.º 8/14.9YFLSB – em 14 de Outubro de 2015 – e n.º 80/15.4YFLSB – em 17 de Dezembro de 2015, sumariados, respectivamente, em http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-sumarios/contencioso/contencioso-2013.pdf e em http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-sumarios/contencioso/contencioso-2015.pdf; na doutrina, v. MÁRIO AROSO DE ALMEIDA e CARLOS FERNANDES CADILHA, ob. cit., ao escreverem que os Tribunais «não se podem substituir às entidades públicas na formulação de valorações que, por já não terem carácter jurídico, mas envolverem juízos sobre a conveniência e oportunidade da sua actuação, se inscrevem no âmbito próprio da discricionariedade administrativa»).

 

Não vemos razões para, neste particular caso, deixar de aderir a este entendimento.

Desde logo, impõe-se constatar que a atribuição ao recorrente da classificação de serviço de “Bom com distinção” não corresponde ao exercício de poderes estritamente vinculados, o que, desde logo e num plano conceptual, arredaria qualquer hipótese de se descortinar um vício de violação de lei na deliberação recorrida.

Por outras palavras, o indeferimento da reclamação apresentada pelo recorrente espelha uma posição do Conselho Superior da Magistratura que escapa à mera subsunção lógica. Trata-se de uma valoração autónoma que se traduz numa escolha entre a alternativa de manter a classificação decidida pelo seu Conselho Permanente ou de a substituir por aquela que o impetrante pretende.

Por seu turno, é insofismável que o cerne da argumentação aduzida pelo recorrente reconduz-se à manifestação de uma discordância sobre a valoração do seu desempenho.

Ora, o Supremo Tribunal de Justiça não está habilitado a reflectir sobre o acerto ou o desacerto do juízo valorativo que recaia sobre o modo como o recorrente executa as suas funções. Faltam-lhe elementos avaliativos que lhe permitam, com razoabilidade e propriedade, aquilatar se a prestação funcional do recorrente se alcandorou ao patamar exigido pela atribuição da notação máxima ou se, ao invés, se quedou num plano classificativo inferior.

O mérito ou demérito do recorrente no exercício do seu múnus é avaliado por critérios qualitativos de que o Supremo Tribunal de Justiça não pode lançar mão, pois extravasam o âmbito desta impugnação judicial e inserem-se no domínio exclusivo da administração.

Acresce, enfim, que não se detecta (nem, de resto, se alega) qualquer infracção aos princípios gerais que regem a actividade administrativa neste domínio.

E vislumbrar-se-á qualquer erro palmar que careça de ser corrigido por intermédio da presente impugnação?

Vejamos.

Como alega o recorrente, a atribuição da notação de “Muito bom” corresponde ao «reconhecimento de um desempenho elevadamente meritório ao longo da respectiva carreira». Por seu turno, a notação de “Bom com distinção” corresponde ao «reconhecimento de desempenho meritório ao longo da respectiva carreira» (cfr. alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 16.º do RIJ, aprovado pela Deliberação n.º 55/2003, do Conselho Superior da Magistratura – publicada no Diário da República, 2.ª série, n.º 12, de 15 de Janeiro de 2003 e sucessivamente alterado).

Partindo destes subsídios normativos, temos que a deliberação recorrida não apontou qualquer reparo às capacidades humanas do recorrente para o desempenho do magistério judicial e destacou as suas qualidades técnicas e preparação.

Porém, não pode o recorrente pretender que se faça “tábua rasa” de outros aspectos menos conseguidos da sua prestação funcional que ali se evidenciam e, sobretudo, menosprezar o seu alcance e relevância para a atribuição da referida notação.

Na verdade, como o próprio recorrente destaca (artigo 36.º da petição inicial), ali se escreveu, a respeito do recorrente e «No que concerne à qualidade técnica do seu trabalho (…) não logrou superar algumas das insuficiências pregressas, como, a quebra ocasional do rigor conceptual e a de desconsideração pela adequada técnica de enunciação factual e motivação da convicção, detectando com frequência parca e telemática argumentação jurídica, maxime no tocante às matérias de direito civil, podendo e devendo investir futuramente no seu aperfeiçoamento.».

Ademais, «ponderando o largo tempo de serviço, e a capacidade intelectual do Senhor Juiz, o investimento que colocou na sua formação académica, a atender ao descritivo do seu curriculum, sendo expectável um superior patamar de cultura jurídica que muitas das peças não exibem, incisivamente nos índices de rigor lógico-sistemático, na fundamentação de motivos, na dialéctica argumentativa e pontual aligeiramento na elaboração do conteúdo integrado das peças finais decisórias.»

E, mais à frente na deliberação impugnada, seguem-se outros reparos cuja relevância não deve ser obliterada.

Referimo-nos, em particular, às seguintes constatações:

            «Na indicação das provas fundadoras da convicção do tribunal revela preocupação pelos valores da transparência e da verdade material

Todavia, tal desiderato é cumprido por recurso preponderante à transcrição dos depoimentos testemunhais, afastando-se amiúde da correcta visão crítica das provas e da exigida explicitação das razões que motivaram a opção do julgador e que afinal substanciam a vertente ultima da legitimação do poder judicial. »

            «No enquadramento jurídico da situação sob análise convoca os preceitos legais apropriados à solução plausível de direito, bem como no tratamento doutrinário e jurisprudencial a propósito, conquanto a indagação seja tendencialmente telegráfica no âmbito da jurisdição cível, e por vezes as citações/transcrições constituem deambulações doutrinárias inúteis, a propósito de matérias estabilizadas, e omissas em casos que suscitam controvérsia e, por conseguinte, aprofundamento pelo Juiz de molde a convencer da bondade da sua decisão.»

            «Poderia, embora, ter aludido mais frequentemente ao essencial das contestações crime e fundamentos dos pedidos cíveis, assim viabilizando uma mais fácil compreensão das razões de facto das partes.

Paralelamente, na elaboração de acórdão para a realização de cúmulo jurídico de penas, aconselho que no relatório reproduza o núcleo principal, de forma sintética, da factualidade e circunstâncias incriminatórias de cada decisão a englobar (ou não) no cúmulo sobretudo porque a compreensão da pena global final será optimizada. 

Isto porque, o volume de processos a seu cargo permite-lhe objectivamente maior detença em cada decisão.

Segue-se a matéria de facto provada, nem sempre expurgada de juízos de valor e expressões conclusivas, dando-lhe uma sequência lógico-cronológica, mas aglutinando com frequência mais do que um facto em cada ponto, levado quiçá pelo facilitismo do decalque do texto acusatório, incluindo conceitos ou expressões de índole semântica equívoca ou ecléctica, ou até asserções jurídico-valorativas, perigando o rigor e a transparência dos elementos fácticos do crime tipificado.

Sendo indiscutível o acerto final das decisões e das penas cominadas, e o bom recorte técnico das peças elaboradas, qualidades que atravessam os seus acórdãos, apresenta contumazes deficiências na enunciação dos factos sob a melhor técnica, combinando por vezes conceitos jurídicos, conclusões e juízos de valor/opinativos na matéria de facto que não se explicam neste momento da sua longa carreira.

Parece-me que sobretudo enquanto Juiz de exclusividade, atenta a carga comportável de processos a que presidiu, poderia e deveria incrementar melhor método e disciplina na enunciação fáctica.»

            «Anoto todavia, que neste aspecto importante para no dosear da culpa, mostra-se demasiado ancorado no texto estrito dos relatórios elaborados pelos serviços da Segurança Social, procedendo até à transposição ipsis verbis para a sentença de uma metalinguagem própria da psicologia e sociologia, a exigir descodificação pelo julgador, e maxime rever-se no acervo dos factos que foram dados como provados, pois são apenas estes que legitimamente suportarão a compreensão real da situação do arguido e, caracterizem os sentimentos, fins e motivos determinantes da conduta.

Por regra enumera os factos não provados de forma atomística, apesar de também aqui se detectar por vezes a inclusão de conceitos e valorações que se deverão evitar.

A fundamentação de facto apresenta-se maioritariamente sectorizada por factos, fazendo apelo devidamente identificado a cada prova, mas nem sempre sob espírito crítico, no sentido de convencer da razoabilidade do juízo probatório pelo qual o tribunal optou, designadamente no tocante à prova testemunhal, que reproduz exaustivamente, cujas “assentadas” não correspondem à autêntica motivação da decisão de facto e à sua razão axiológica, sucedendo ocasionalmente que a fundamentação da decisão mais não é do que mera reafirmação fáctica.

De igual sorte, no domínio da expressão da motivação dos factos não provados detecta-se, por vezes, algum aligeiramento na demonstração da insuficiência probatória e, a intercepção com o princípio do in dubio pro réu, designadamente, estando nos autos prova pericial que se revelou inconsistente para a convicção dos julgadores.

No capítulo da qualidade e sedimentação da sua preparação técnica e ampliação da cultura jurídica do Senhor Juiz, verifica-se que acolheu na vertente pedagógica algumas das deficiências detectadas na anterior avaliação, mantendo ainda traços menos positivos.

«Observo, não obstante que na maioria das situações de cúmulo jurídico, apesar de prosseguir com rigor as regras legais dos limites mínimos e máximos, e excluindo com propriedade o designado cúmulo por arrastamento, o Senhor Juiz alcança a pena única dispensando-se de concretizar no caso concreto os factos que suportaram a fixada pena única.

            «No tocante à apreciação dos meios probatórios e o registo textualizado do processo de convicção quanto aos factos provados e não provados, é por norma feita pelo recurso ao teor literal dos depoimentos das testemunhas, e menção enunciativa dos demais meios de prova produzidos a carecer de uma abordagem crítica e parcimoniosa dos argumentos determinativos da convicção.»

            «As sentenças incluem relatórios sucintos, seguindo-se a enunciação dos factos provados, cujo alinhamento é o decalque da ordem seguida no despacho de condensação, talqualmente constam dos articulados, apresentam-se elencados de forma entrecortada, o que torna tortuoso a compreensão do quadro factual, afastado da boa técnica de enunciação por ordem lógica e cronológica, a qual se devia justificar sem reparo, atenta a experiência pregressa do Senhor Juiz, simultaneamente os factos carregam expressões conclusivas e conceitos de direito.

A fundamentação jurídica por indicação liminar às questões a resolver mereceu um tratamento nem sempre aprofundado e até omissivo na demonstração e consistência das soluções jurídicas encontradas, com apelo ocasional à jurisprudência e doutrina (…)».

Deste extenso enunciado extrai-se que as críticas dirigidas à prestação do recorrente não enquadram apenas situações meramente esparsas ou excepcionais, como se advoga.

Com efeito, o que dele resulta é, antes de mais, a reprodução de práticas que já antes haviam negativamente avaliadas, a que se juntam incompreensíveis deficiências (vg. na exposição da convicção adquirida pela valoração de meios de prova ou na fundamentação jurídica do julgado cível) que não são explicáveis por um incomportável volume de serviço ou pela relativa inexperiência profissional do inspeccionado e que são até pouco consentâneas com a formação académica do recorrente e com o seu trajecto profissional.

Por isso, repudia-se veementemente o menosprezo a que o recorrente vota os aspectos menos positivos da sua prestação focados na deliberação recorrida em contraponto com a hiperbolização dos encómios que àquela aí são tecidos e da dimensão temporal da sua carreira.

Como certeiramente se refere na deliberação impugnada, «(…) numa mesma realidade complexa como a da avaliação do serviço prestado por um juiz, coexistem aspectos de diferente natureza, uns positivos, outros negativos, alguns em harmonia entre si, outros contraditórios, mas cada um com o seu peso relativo para a avaliação global final a efectuar. Neste pressuposto, tão errado será considerar que aspectos positivos e negativos não podem coexistir por se contradizerem, como errado será sobrevalorizar uns postergando outros.».

Daí que, em conclusão, tenhamos que considerar que os juízos valorativos contidos na deliberação recorrida se revelam coerentes com a apreciação efectuada acerca do cariz meritório do trabalho do recorrente, coadunando-se, por isso, de forma suficiente e adequada com a classificação de “Bom com distinção”, prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 16.º do RIJ que lhe foi atribuída.

Equivale isto por dizer que não se descortina que a deliberação recorrida haja incorrido em qualquer sorte de erro (muito menos, crasso) ao manter a deliberação do Conselho Permanente, motivo pelo qual não lhe pode ser assacado o vício de violação de lei a que supra aludimos.

Reportemo-nos, agora e enfim, ao conteúdo dos artigos 52.º e 53.º da petição inicial.

É de considerar que, aí, não é apontada qualquer norma ou dimensão interpretativa cuja conformidade constitucional se pretenda sindicar, o que, como é bom de ver, inviabiliza, desde logo, qualquer tipo de apreciação mais exigente.

Em todo o caso, sempre se dirá que o direito à tutela jurisdicional efectiva (n.º 4 do artigo 268.º da Constituição da República Portuguesa - que é emanação do direito de acesso aos tribunais, contido no n.º 1 do artigo 20.º da Lei Fundamental) tem de ser articulado e compaginado com o princípio da separação de poderes (artigo 2.º do mesmo diploma) que, como decorre do n.º 1 do artigo 3.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, subjaz ao entendimento que se sustentou acerca dos limites dos poderes cognitivos deste Supremo Tribunal de Justiça quando estejam em causa matérias inseridas no âmbito da chamada justiça administrativa (neste sentido, v. JORGE MIRANDA e RUI MEDEIROS, ob. cit., pág. 616 e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Fevereiro de 2015, proferido no processo n.º 50/14.0YFLSB e acessível em www.dgsi.pt).

Daí que, por si só, a mera invocação daquele direito fundamental seja insuficiente para concluir pela desconformidade constitucional da interpretação dada às normas acima identificadas.

Mais difícil é, porém, enfrentar a invocação de que se violaria o princípio a um processo equitativo (consagrado pelo artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos e acolhido pela Constituição da República Portuguesa no seu artigo 20.º, n.º 4).

A noção de processo equitativo designa um complexo de direitos de que as pessoas gozam – a começar pelo próprio direito à acção e direito a um tribunal independente – mas que abrange uma rede densa de direitos e faculdades atribuídos às partes processuais.

Confrontando a vaguidade desta alegação com a abrangência deste princípio e, bem assim, com a justificação daquela limitação, facilmente se conclui que esta invocação está fatalmente condenada à improcedência.

 Decisão:

            Nestes termos , acordam os Juízes que constituem a secção de contencioso do Supremo Tribunal de Justiça em julgar improcedente o recurso interposto por AA.

            Custas pelo recorrente

 Lisboa e Supremo  Tribunal de Justiça


Tavares de Paiva (Relator)
Gabriel Catarino
Pires da Graça
Ana Luísa Geraldes
Manuel Braz
Júlio Gomes
Sebastião Póvoas (Presidente da Secção)