Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
02B3638
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: MOITINHO DE ALMEIDA
Nº do Documento: SJ200212120036382
Data do Acordão: 12/12/2002
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: T REL LISBOA
Processo no Tribunal Recurso: 2325/02
Data: 04/18/2002
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Sumário :
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça :

1.A intentou a presente acção declarativa, com processo ordinário, contra a B, pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de Esc.10.731.626$00.

Alegou para o efeito e em substância que, no dia 16 de Dezembro de 1995, na Estrada ..... n°.., na localidade de Póvoa de Santa Iria, ocorreu um acidente de viação em que o autor foi vítima de atropelamento causado pelo veículo ligeiro de passageiros com a matrícula QF...., conduzido por C, seu proprietário.

Deste acidente causado por culpa exclusiva do condutor do veículo automóvel, resultaram para o autor danos patrimoniais e não patrimoniais, avaliados, respectivamente em Esc.8.900.000$00 e 1.831.626$00.

A Ré segurou a responsabilidade civil resultante da utilização do veículo QF.....

A acção foi, em 1ª instância, julgada parcialmente procedente e a Ré condenada a pagar ao Autor, a título de danos não patrimoniais, a quantia de Esc.3.500.000$00 e, a títulos de danos patrimoniais, a quantia de Esc.7.060$00, acrescida do que se liquidar em execução de sentença no que respeita a determinados danos.

Por acórdão de 18 de Abril de 2002, foi concedido parcial provimento ao recurso do Autor, sendo a Ré condenada a pagar a este a quantia de 30.000 Euros, a título de indemnização por danos não patrimoniais.

Inconformados Autor e Ré recorreram para este Tribunal, concluindo as alegações das suas revistas nos seguintes termos:

Recurso da Ré B

1.Os factos assentes consubstanciam dano moral para cuja compensação o Mm°Julgador deveria ter fixado verba não superior a 1.500 contos (7.500 euros).

2. a decisão recorrida, ao ter fixado para compensação de tais danos verba superior à acabada de referir violou o disposto no art°496,n°3 do C. Civil;

3. Devendo ser assim revogada em conformidade com o alegado.

Recurso do Autor A

- Face aos factos dados como provados, a indemnização a pagar ao Recorrente, deverá ser superior a 30.000 Euros;

- Para o aumento da indemnização deverá ter-se em conta os critérios jurisprudenciais em vigor que têm em atenção o aumento dos prémios de seguros e o aumento do nível de vida dos portugueses;

- O Acórdão recorrido deveria ter fixado uma indemnização de 44.393,00 Euros;

- Violou o Acórdão recorrido, os artigos 562° e 496° do Código Civil.

2. É a seguinte a matéria de facto com relevância para a apreciação do recurso:

- O Autor, em consequência do sinistro, foi imediatamente transportado ao Hospital Reynaldo dos Santos, em V.Franca de Xira;

- Dando aí entrada nos serviços de urgência, em 16/12/1995, sendo-lhe diagnosticado traumatismo craneano com perda de conhecimento, fractura exposta, grau II. Dos ossos da perna direita e ferida inciso-contusa do couro cabeludo;

- O Autor ficou, de imediato, internado nesta unidade hospitalar para ser submetido a uma intervenção cirúrgica dos ossos da perna direita;

- O que veio a acontecer, no dia 11/1/1996, na qual se procedeu sob anestesia geral, à redução e osteutaxis da tíbia direita com fixador externo, orthofix;

- Em 23/1/1996, o Autor foi submetido a nova intervenção cirúrgica realizada por cirurgião plástico;

- O autor permaneceu no Hospital Reynaldo dos Santos 52 dias, obtendo alta em 6/2/1996;

- Após o internamento hospitalar, o Autor frequentou as consultas de ortopedia e cirurgia plástica, realizando vários exames médicos;

- No início do ano escolar de 96/97, quando se encontrava na escola, o Autor sentiu um estalo na perna direita, no mesmo sítio da fractura anterior;

- O Autor foi , mais uma vez, conduzido ao Hospital Reynaldo dos Santos, tendo-lhe sido diagnosticada uma fractura de 1/3 dos ossos da perna direita e aplicado aparelho de gesso, continuando a ser seguido na consulta externa de ortopedia deste Hospital;

- Em consequência do embate, o Autor foi projectado a uma distância de 15 metros ficando caído no sentido Lisboa/Alverca;

- O autor em consequência da lesão, terá de efectuar nova cirurgia plástica;

- Em consequência do acidente, o Autor sofreu fortíssimas dores físicas e grave abalo;

- Em consequência do acidente, o autor não podia movimentar-se e, por isso, viu-se impossibilitado de fazer a sua vida normal;

- O Autor sofreu novas dores de grande intensidade, em consequência da segunda fractura;

- E agravou, ainda, o seu estado de saúde, nomeadamente a mobilidade da sua perna direita;

- Toda esta situação criou no Autor um clima de profunda tensão e angústia, tanto mais que, antes do acidente, o Autor era uma pessoa bastante activa, não possuindo qualquer perturbação, defeito físico ou doença;

- O Autor, na sequência da intervenção cirúrgica a que foi submetido, ficou com notáveis cicatrizes que lhe causam grande desgosto e traumatismos de vária ordem;

- Deixou de poder correr como anteriormente ao acidente, não podendo praticar desportos que impliquem tal movimento;

- O Autor, estudante, durante o período de internamento e recuperação, não frequentou as aulas do liceu;

- Pelo que não conseguiu transitar com aproveitamento para o ano seguinte.

- O Autor nasceu a 27 de Julho de 1978.

Cumpre decidir.

3. A única questão a decidir prende-se com a indemnização a atribuir ao Recorrente A, a título de danos não patrimoniais.

A este respeito importa observar que a atribuição de determinada soma pecuniária a título de ressarcimento de danos não patrimoniais tem como fundamento a necessidade de proporcionar ao lesado a compensação da dor e desgosto sofridos.

De acordo com a jurisprudência deste Tribunal, a importância a fixar deve constituir uma efectiva compensação, actualizada de modo a respeitar o disposto no artigo 496°, do Código Civil (entre outros, o acórdão de 11 de Setembro de 1999, na CJ II, Tomo III, p.89).

Ora, no acórdão de 11 de Janeiro de 2000 (processo n°1000/99) , num caso em que o lesado tinha 22 anos, ficou com uma incapacidade permanente de 50%, e a coxear, com a necessidade permanente de uma tala de apoio à marcha e igualmente sofreu graves dores, foi sujeito a várias operações e não poderá praticar desportos que impliquem corrida, foi fixada a indemnização de Esc.5.000.000$00.

Atendendo ao período de tempo decorrido (cerca de três anos), muito embora este caso revele aspectos de maior gravidade (incapacidade permanente de 50%) e uso de tala para o apoio à marcha), consideramos que, no presente processo, a indemnização de 25.000 Euros é a adequada.

Termos em que se nega a Revista do Recorrente A e se concede parcial provimento à revista da B condenando-se esta a pagar àquele a quantia de 25.000 Euros.

Custas pelos Recorrentes na proporção do vencido.

Lisboa, 12 de Dezembro de 2002

Moitinho de Almeida

Joaquim de Matos

Ferreira de Almeida