Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:051/10
Data do Acordão:04/14/2010
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO
EXECUÇÃO FISCAL
FALÊNCIA
INSTAURAÇÃO DA EXECUÇÃO FISCAL
Sumário:1. Sendo a questão decidenda a de saber se pode instaurar-se e prosseguir execução fiscal contra executado antes declarado falido, por dívida vencida após a declaração de falência, a lei aplicável será a vigente à data da instauração da execução e do desenrolar dos seus termos, ou seja, atento o disposto nos artigos 4.º do Decreto-Lei n.º 433/99 de 26 de Outubro e 12.º da Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, o disposto no CPPT, pois que a autuação da execução ocorre já em plena vigência deste diploma legal.
2. Aplicando-se ao caso dos autos o disposto no CPPT, há-de reconhecer-se que a instauração da execução fiscal por créditos vencidos posteriormente à declaração de falência, como são os créditos exequendos, encontra expresso apoio legal no disposto no n.º 6 do artigo 180.º do CPPT, preceito que há-de ser, contudo, interpretado razoavelmente, atenta a unidade do sistema jurídico, no sentido de que só será viável o prosseguimento dos processos de execução fiscal por créditos vencidos após a declaração de falência se forem penhorados bens não apreendidos naquele processo.
Nº Convencional:JSTA00066381
Nº do Documento:SA220100414051
Data de Entrada:01/25/2010
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TT1INST LISBOA DE 2009/10/09 PER SALTUM.
Decisão:NEGA PROVIMENTO.
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - OPOSIÇÃO.
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART180 N6.
CPEREF93 ART29 ART154 N3.
DL 433/99 DE 1999/10/26 ART4.
L 15/2001 DE 2001/06/05 ART12.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC102/09 DE 2009/11/12.; AC STA PROC26344 DE 2001/10/24.; AC STA PROC625/06 DE 2006/11/15.
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO 5ED VII PAG231 PAG233.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório –
1 – A…, na qualidade de liquidatário judicial da massa falida da sociedade comercial “B…, Lda, com os sinais dos autos e em representação da massa falida, recorre para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, de 9 de Outubro de 2009, que julgou improcedente a oposição por si deduzida à execução n.º 3263200401004670, instaurada no Serviço de Finanças de Lisboa 12 para cobrança coerciva de dívidas de IVA de 1997 e 1998, para o que apresentou as conclusões seguintes:
- A Douta Sentença recorrida julga totalmente improcedente a Oposição deduzida, pugnando pelo prosseguimento do processo de execução fiscal, para cobrança de IVA de 1997/1998, instaurado após a declaração de falência da Recorrente, prosseguimento este que sustenta no n.º 6 do art.180.º do Código do Processo e do Procedimento Tributário.
- Ao decidir da forma como o fez, a Sentença recorrida revela uma total ignorância relativamente ao Instituto Falimentar, violando as normas especiais aí contempladas, nomeadamente, os artºs. 151º, 152º, 154º n.º 3, 175º,188º, 200º e 214º, do Código dos Processos Especiais de Recuperação de Empresas e de Falência.
- Ao permitir o prosseguimento da execução fiscal, viola ainda os princípios básicos subjacentes ao Instituto Falimentar, como sejam o do primado e plenitude da Instância Falimentar, o da execução universal e intangibilidade dos bens da falida, pondo em causa a satisfação dos interesses legalmente tutelados dos credores que o Instituto Falimentar visa proteger.
- A recorrente foi declarada falida por Douta sentença Judicial proferida em 10 de Dezembro de 1998, no âmbito do Processo Especial de Falência nº. 4056/96, que correu termos na 3ª secção da 3ª Vara Cível do Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, tendo transitado em julgado.
- Como consequência imediata da declaração de falência, procedeu-se ao encerramento dos livros da falida, estabilizou-se o seu passivo com vencimento imediato de todas as dívidas, vencidas e vincendas, ao mesmo tempo que se extinguiram os privilégios creditórios do Estado.
- A declaração de falência obsta à instauração ou ao prosseguimento de qualquer acção executiva contra a falida, seja esta de natureza civil ou fiscal, competindo aos credores, incluindo o Ministério Público na defesa dos interesses que representa, reclamarem a verificação dos seus créditos, quer comuns, quer preferenciais.
- À data da declaração de falência da recorrente, 10 de Dezembro de 1998, encontrava-se em vigor o Código de Processo Tributário.
- Em cumprimento da Douta Sentença de Falência proferida, e por observância com as disposições legais impostas ao Liquidatário judicial, quer pelo Instituto Falimentar, quer pela Lei Fiscal, deu cumprimento ao disposto no artº. 265 do Código de Processo tributário em vigor, tendo requerido citação pessoal dos dirigentes dos serviços centrais da administração fiscal para que estes procedessem à liquidação dos impostos, emitindo certidões das dívidas existentes.
- O Tribunal Falimentar ordenou e concretizou as citações em causa.
- Competia à Administração Fiscal, de acordo com a legislação em vigor, proceder à emissão das certidões fiscais identificando quaisquer dívidas de impostos, vencidas ou vincendas, imputadas à falida, as quais, depois de remetidas ao representante do Ministério Público, serviriam de suporte à reclamação de créditos no Processo Especial de Falência, por respeito pelo princípio do primado e da plenitude da instância falimentar, e da execução universal dos bens da falida.
- A Administração Fiscal deveria ter apurado e liquidados todos os valores de imposto que se encontravam em dívida à data da declaração de falência, independentemente de se tratarem de dívidas vencidas ou vincendas, pelo que deveriam ter apurado e liquidado os valores de imposto em causa nos Autos, IVA de 1997/1998, fazendo-o constar da certidão fiscal de dívidas remetida para o Ministério Público, para efeitos de Reclamação de Créditos.
- Apenas se admite que não tenha apurado os valores em dívida em causa nos Autos, por manifesta negligência e irresponsabilidade, já que se trata de dívidas anteriores à declaração de Falência.
- Ao não ter apurado e liquidado os valores de imposto em dívida, a Administração Fiscal tornou-se a única responsável pela caducidade dos prazos de reclamação de créditos no âmbito do Processo Falimentar, único local onde poderia obter pagamento, como resulta do princípio da execução universal dos bens da falida, tanto mais que o Estado não goza de quaisquer privilégios, ou de prazos especiais relativamente aos restantes credores, para a prática dos actos que lhe são impostos por Lei.
- A Douta Sentença proferida, ao decidir como decidiu, deu cobertura a inércia e irresponsabilidade da administração Fiscal, que, citada para o efeito, e nos termos da legislação então em vigor, não procedeu à liquidação do valor dos impostos vencidos e vincendos que se encontravam em dívida, não tendo permitido que esses mesmos créditos, de IVA 1997/1998, tivessem sido reclamados no Processo de Falência, sob pena de caducidade.
- A Douta Sentença recorrida, manifesta um total desprezo pelas normas especiais que regulam o Instituto Falimentar, já que, ao admitir o prosseguimento da execução nos moldes em que é feita, atribui ao estado um privilégio que este não tem, em desrespeito para com os demais credores da falida, abrindo a porta à cobrança de créditos fora do concurso de credores, o que está vedado aos restantes credores.
- A douta Sentença recorrida, fundamenta a sua decisão no n.º 6 do art.º 180.º do Código do procedimento e Processo Tributário, como forma de viabilizar o prosseguimento da execução, norma esta que apenas entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2000, ou seja, muito após a morte da aqui Recorrente, pelo que entendemos, não lhe ser aplicável.
- Ponderadas as razões invocadas, impunha-se que o Tribunal “a quo”, o contrário do que decidiu, tivesse conjugado as disposições legais que regulam o Instituto Falimentar, nomeadamente o nº 3 do art.º 154.º do CPEREF, bem como o disposto no artº. 264º do C.P.T., declarando, como consequência, extinta a execução com fundamento na violação dos preceitos legais acima identificados.
- Para além dos preceitos legais enunciados, a Douta sentença recorrida, viola os princípios básicos do Instituto Falimentar, nomeadamente o princípio do primado e da plenitude da Instância Falimentar, bem como o princípio da execução universal e da intangibilidade dos bens da falida, colocando em causa a satisfação dos interesses legalmente tutelados dos credores, que atempadamente, reclamaram os seus créditos e os viram reconhecidos em sede de sentença de Verificação e Graduação de Créditos, fazendo perigar os interesses dos credores que o Instituto Falimentar visa proteger.
- Determinando o prosseguimento da execução, põe em causa o princípio da execução universalidade, já que permite conhecer das responsabilidades do falido fora do Processo Falimentar, pondo em causa, consequentemente, o princípio da intangibilidade do acervo de bens e direitos da Massa falida, ou seja, põe em causa a satisfação dos interesses legalmente tutelados dos credores, que reclamaram os seus créditos e os viram reconhecidos em sede de Sentença de Verificação e graduação de créditos, fazendo perigar a satisfação dos mesmos, que o Instituto Falimentar tem como desiderato proteger.
- O n.º 6 do artº. 180º do CPPT, não se aplica à situação em apreço, não só porque não tinha existência jurídica à data da morte da sociedade, mas porque ainda que se admitisse a sua existência, teria de ser interpretado como um acto inconsequente e irresponsável do legislador, resultante da falta de consideração global do ordenamento jurídico, nomeadamente do Instituto Falimentar, e do disposto no n.º 3 do art.º 154.º do CPEREF, o que se comprova pela própria contradição com o n.º 1 desse mesmo art.º 180 do CPPT.
- Pelo exposto mal andou o Tribunal “a quo”, ao decidir como decidiu, já que deveria ter julgado procedente a oposição deduzida, com fundamento na violação do disposto no n.º 3 do artº 154.º do CPEREF, conjugado com o disposto no n.º 1 do art.º 264º do C.P.T., disposições estas em vigor à data da extinção da referida sociedade comercial, fundamentando ainda a decisão, na violação dos princípios basilares do Instituto Falimentar, a saber, o princípio do primado e da plenitude da instância falimentar, da execução universal e da intangibilidade dos bens e direitos da Massa Falida.
- Ao decidir como decidiu, não só violou o Instituto Falimentar e suas disposições, como violou os princípios básicos que lhe estão subjacentes, mormente o princípio da igualdade de credores, favorecendo os interesses do estado, em detrimento dos demais credores, pondo em causa os interesses legalmente protegidos destes, que o Instituto Falimentar está obrigado a salvaguardar.
Termos em que deverá o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a Douta Sentença Recorrida, fazendo-se assim JUSTIÇA.

2 – Não foram apresentadas contra-alegações.

3 – O Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer nos seguintes termos:
Objecto: Saber se pode, ou não, ser instaurada e prosseguir execução fiscal por dívidas de sociedade falida vencidas após a declaração judicial de falência.
FUNDAMENTAÇÃO
Conforme consta do probatório a execução foi instaurada por dívidas de IVA de 1997 e 1998, cujo prazo de pagamento voluntário terminara em 31 de Dezembro de 2002. A declaração de falência da executada ocorreu em 10 de Dezembro de 1998. Assim sendo os impostos antes referidos venceram-se após a declaração de falência.
O que está em causa, no caso concreto, é a questão de saber se pode ser instaurada e prosseguir execução fiscal por dívidas da sociedade falida vencidas após a declaração judicial de falência, tendo em atenção designadamente o disposto no n.º 3 do artigo 154.º do CPEREF e no n.º 6 do artigo 180.º do CPPT.
Sufragamos o entendimento do acórdão deste Supremo tribunal de 12/11/2009, processo n.º 102/09, quando entende que aqueles preceitos são disposições literalmente contraditórias, que devem ser harmonizadas, por via duma interpretação restritiva da norma do CPEREF, no sentido de que o n.º 3 do artigo 154.º não se aplica ao processo de execução fiscal.
Assim, conforme se refere naquele douto aresto, “é possível legalmente a instauração de execução fiscal, após a declaração de falência, mas para imediata sustação e avocação pelo Tribunal judicial e apensação àquele processo – artigos 180.º, n.º 1 e 2, do CPPT, e 154.º, n.º 3 do CPEREF – ou, tratando-se de créditos após a declaração de falência, prosseguindo a execução mas apenas se forem penhorados bens ali não apreendidos.”
No caso em apreciação, a dívida objecto da execução fiscal diz respeito ao IVA de 1997 e 1998, créditos estes que se venceram apenas em 31 de Dezembro de 2002, após a declaração de falência, pelo que entendemos ser correcta a ter suporte legal a instauração da execução e subsequente citação. Apenas existirão restrições no que toca à penhora de bens, só podendo ser apreendidos bens não apreendidos no processo de falência.
Este é também o entendimento perfilhado por Jorge Lopes de Sousa, em Código de Procedimento e Processo Tributário, anotado e comentado, II volume, 5.ª edição, anotação 7, pág. 233.
Tendo a execução sido instaurada em 2004 e este processo sido autuado em 2005, há-de ser o regime do CPPT o aplicável ao caso em análise, ao contrário do que pretende a Recorrente. É o que resulta do disposto no artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 433/99 de 26 de Outubro e no artigo 12.º da Lei n.º 15/2001 de 5 de Junho.
CONCLUSÃO
Em nosso entender o recurso não merece provimento.

4 – Notificadas as partes do Parecer do Ministério Público, nada vieram dizer.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

- Fundamentação -
5 – Questão a decidir
É a de saber se pode ser instaurada e prosseguir execução fiscal por dívidas de IVA da sociedade falida vencidas após a declaração judicial de falência.

6 – Matéria de facto
Na sentença objecto do presente recurso foram dados como provados os seguintes factos:
1º - No S.F. de Lisboa 12 foi instaurada execução contra “B…, Lda”, por dívidas de IVA de 1997 e 1998, cujo prazo de pagamento voluntário terminara em 31/10/2002 – docs. fls. 83, 85 e 86.
2º - A executada fora declarada falida em 10/12/1998 – doc. fls. 8.
3º - O M.P. reclamou no processo de falência IVA respeitante a 1992 – doc. fls. 11.
7 – Apreciando.
7.1 Da possibilidade de instauração e prosseguimento de execução fiscal para cobrança de dívida de sociedade declarada falida após a declaração de falência
A sentença recorrida, a fls. 108 a 110 dos autos, julgou improcedente a oposição deduzida considerando, na parte que é objecto de recurso (pois que no que respeita à inexistência de duplicação de colecta o recorrente nada alegou no presente recurso), que perante a prova de que o prazo de pagamento voluntário terminou em 31/10/2002, ou seja, tendo-se a dívida vencido após a falência ter sido decretada, nos termos do n.º 6 do artigo 180.º do Código de Procedimento e de processo Tributário (CPPT) não haverá que sustar a execução (cfr. sentença recorrida, a fls. 110 dos autos).
Discorda do decidido o recorrente, alegando em síntese que as disposições do Código de Procedimento e de Processo Tributário, em especial o n.º 6 do seu artigo 180.º, são inaplicáveis ao caso dos autos, porque posteriores à “morte” da sociedade executada, sendo aplicáveis ao caso dos autos as disposições do Código de Processo Tributário, que não continha disposição paralela à daquele n.º 6 do artigo 180.º do CPPT, e bem assim que a decisão recorrida viola o disposto no n.º 3 do artº 154.º do CPEREF bem como os princípios basilares do Instituto Falimentar e os princípios básicos que lhe estão subjacentes, que enuncia (cfr. as conclusões das alegações de recurso supra transcritas).
O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal no seu parecer junto aos autos e supra transcrito defende que o não provimento do recurso, aderindo à jurisprudência deste Tribunal em caso análogo (Acórdão do STA de 12 de Novembro de 2009, rec. n.º 102/09) e apoiando-se na doutrina de Jorge Lopes de Sousa quanto à necessária compatibilização do n.º 8 do artigo 180.º do CPPT com o n.º 3 do artigo 154º do Código dos Processos Especiais de Recuperação de Empresa e de Falência (CPEREF), disposições aplicáveis ao caso dos autos, atento à data da instauração e autuação da execução, por um lado, e à do processo de falência, por outro.
Vejamos, pois.
Não tem razão o recorrente quando alega que o Código de Procedimento e de Processo Tributário, em especial o n.º 6 do seu artigo 180.º, é inaplicável ao caso dos autos, pois que, tendo entrado em vigor em 1 de Janeiro de 2000, é posterior à declaração de falência.
Sendo a questão decidenda a de saber se pode instaurar-se e prosseguir execução fiscal contra executado antes declarado falido, por dívida vencida após a declaração de falência, a lei aplicável será a vigente à data da instauração da execução e do desenrolar dos seus termos, ou seja, atento o disposto nos artigos 4.º do Decreto-Lei n.º 433/99 de 26 de Outubro e 12.º da Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, o disposto no CPPT, pois que a autuação da execução ocorre já em plena vigência deste diploma legal (cfr. cópia autenticada do processo de execução fiscal, a fls. 82 a 99 dos autos, em especial fls. 83, da qual resulta ter sido o processo autuado em 13/01/2004), que assim é aplicável.
No mesmo sentido, em caso análogo, decidiu este Tribunal no seu Acórdão de 12 de Novembro de 2009 (rec. n.º 102/2009), acórdão subscrito pela presente relatora como primeira adjunta.
Falecem, pois, as alegações do recorrente tendentes a afastar a aplicabilidade das disposições do CPPT e propugnando a aplicação das constantes do Código de Processo Tributário.
Sendo, pois, aplicável ao caso dos autos o disposto no CPPT, há-de reconhecer-se que a instauração da execução fiscal por créditos vencidos posteriormente à declaração de falência, como são os créditos exequendos em causa nos presentes autos (cfr. os números 1 e 2 do probatório fixado na sentença recorrida e supra transcrito), encontra expresso apoio legal no disposto no n.º 6 do artigo 180.º do CPPT, que estabelece, em derrogação ao disposto nos números anteriores do mesmo artigo, que: «O disposto neste artigo não se aplica aos créditos vencidos após a declaração de falência ou despacho de prosseguimento da acção de recuperação da empresa, que seguirão os termos normais até à extinção da execução».
Trata-se, como bem observa JORGE LOPES DE SOUSA (Código de Procedimento e de Processo Tributário: Anotado e Comentado, II volume, 5.ª ed., Lisboa, Áreas Editora, 2007, pp. 231/233, nota 7 ao art. 180.º do CPPT), de um regime especial para os processos de execução fiscal, pois nos arts. 29º e 154º nº 3, do CPEREF (…) determina-se a suspensão de todas as execuções instauradas contra o devedor e todas as diligências de acções executivas que atinjam o seu património e proíbe-se a instauração de novas execuções (…), pelo que tem de concluir-se que no n.º 6 do art.180.º deste Código, que não tinha norma correspondente no CPT, pretendeu introduzir-se um regime especial para as execuções fiscais. (op. cit., p. 232).
Observe-se contudo que, embora a lei diga expressamente, relativamente às situações contempladas no n.º 6 do artigo 180.º do CPPT, que (os processos) seguirão os termos normais até à extinção da execução, propõe JORGE LOPES DE SOUSA (op. cit. p. 233), no que tem sido acompanhado pela jurisprudência deste Tribunal (cfr. Acórdãos de 24/10/2001, rec. n.º 26.344, de 15/11/2006, rec. n.º 625/06 e de 12 de Novembro de 2009, rec. n.º 102/09) que «(…) deverá entender-se este seguimento em consonância com as normas do CPEREF e do CIRE, sob pena de se abrir a porta à possibilidade de se inutilizar todo o esforço de recuperação da empresa e de satisfação equilibrada dos direitos dos credores que se visa com estes processos especiais, o que seria uma solução manifestamente desacertada, atentos os fins de interesse público e social estão subjacentes àqueles», pelo que «(…) a interpretação razoável daquele n.º 6, que se compagina com a unidade do sistema jurídico, que é o elemento primacial da interpretação jurídica (artigo 9.º, n.º 1 do Código Civil), é a de que só será viável o prosseguimento dos processos de execução fiscal por créditos vencidos após a declaração de falência ou insolvência ou do despacho de prosseguimento da acção de recuperação da empresa se forem penhorados bens não apreendidos naqueles processos de falência ou recuperação ou insolvência».
E é este o entendimento que também aqui adoptamos, em conformidade com a jurisprudência citada, pelo que há-de concluir-se que falece razão ao recorrente quando considera no caso dos autos não poder ser instaurada e prosseguir a execução fiscal. Esta pôde ser instaurada e prosseguir em conformidade com a lei, embora sofra restrições no que toca à penhora de bens, só podendo ser apreendidos bens não apreendidos no processo de falência.

O recurso não merece, pois, provimento.
- Decisão -
8 - Termos em que, face ao exposto, acordam o juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em negar provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida.

Custas pelo recorrente, fixando-se a procuradoria em 1/6.

Lisboa, 14 de Abril de 2010. Isabel Marques da Silva (relatora) - Alfredo Madureira - João Torrão