Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0550/15.4BEPNF
Data do Acordão:05/04/2023
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:FONSECA DA PAZ
Descritores:APRECIAÇÃO PRELIMINAR
AJUDAS COMUNITÁRIAS
PRESCRIÇÃO
Sumário:Não se justifica admitir a revista de acórdão confirmativo de sentença que, com fundamento no “vício de prescrição do respectivo procedimento”, julgou procedente acção administrativa especial para impugnação do acto de rescisão unilateral do contrato de atribuição de ajudas quando da matéria de facto provada – que o Supremo tem de acatar – parece decorrer que o ofício de notificação de que o recorrente faz depender a interrupção da prescrição não foi enviado para a morada correcta.
Nº Convencional:JSTA000P30960
Nº do Documento:SA1202305040550/15
Data de Entrada:04/24/2023
Recorrente:IFAP - INSTITUTO DE FINANCIAMENTO DA AGRICULTURA E PESCAS, I.P.
Recorrido 1:A…, HERDEIROS, LDA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
ACORDAM NA FORMAÇÃO DE APRECIAÇÃO PRELIMINAR DA SECÇÃO DO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA:

1.”A…, Herdeiros, Lda.” intentou, no TAF, contra o IFAP – Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas, I.P., acção administrativa especial para impugnação do acto de rescisão unilateral do contrato de atribuição de ajudas, com a consequente devolução da quantia de € 74.222,13, pedindo que se declare a sua nulidade ou, se assim se não entender, que se decrete a respectiva anulação.
Foi proferida sentença a julgar a acção procedente e a anular o acto impugnado, com fundamento na verificação do “vício de prescrição do respectivo procedimento”.
A entidade demandada apelou para o TCA-Norte, o qual, por acórdão de 13/1/2023, negou provimento ao recurso, confirmando a sentença.
É deste acórdão que a entidade demandada vem pedir a admissão do recurso de revista.

2. Tem-se em atenção a matéria de facto considerada pelo acórdão recorrido.

3. O art.º 150.º, n.º 1, do CPTA, prevê que das decisões proferidas em 2.ª instância pelos tribunais centrais administrativos possa haver excepcionalmente revista para o STA “quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental” ou “quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”.
Como decorre do texto legal e tem sido reiteradamente sublinhado pela jurisprudência deste STA, está-se perante um recurso excepcional, só admissível nos estritos limites fixados pelo citado art.º 150.º, n.º 1, que, conforme realçou o legislador na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs. 92/VIII e 93/VIII, corresponde a uma “válvula de segurança do sistema” que apenas pode ser accionada naqueles precisos termos.
A sentença, para considerar decorrido o prazo prescricional de 4 anos, previsto no art.º 3.º, do Regulamento (CE, EURATOM) n.º 2988/95 do Conselho, de 18/12/1995, entendeu que a prescrição se deveria considerar interrompida em 30/7/2007 (data em que a A. expedira a carta onde, em sede de audiência prévia, se pronunciava sobre a intenção da entidade demandada de rescindir o contrato), começando então a correr um novo prazo que só se interrompeu com a notificação da decisão final, ocorrida em 24/11/2014, por ser de considerar irrelevante que, em 2010, lhe tenha sido enviado um ofício de notificação desta decisão que veio a ser devolvido por não ter sido remetido para a morada correcta.
Sobre esta questão do ofício de notificação enviado para a morada errada, o acórdão recorrido referiu:
“Por outro lado, toda a argumentação aduzida pelo recorrente para sustentar a culpa da recorrida pela não recepção da notificação que lhe foi enviada em 2010 não é de acolher, tendo presente os factos que resultaram provados.
A notificação da autora/recorrida para exercer o direito de audiência prévia foi enviada para a seguinte morada, por ofício de 26/06/2007: “... – ... – ... ...”; tal notificação foi por ela recebida, pois que apresentou a sua pronúncia através de requerimento remetido por carta registada expedida em 30/07/2007 (cfr. pontos 18 e 19 do probatório).
Contudo, não foi para essa morada que o IFAP enviou o ofício de 2010 a notificar a autora/recorrida da decisão final, mas antes para “... ... ...” (cfr. ponto 22 do probatório).
Evidencia também o probatório que só quatro anos mais tarde, em 2014, é que o IFAP voltou a notificá-la de tal decisão, tendo enviado o respectivo ofício para a morada para onde havia remetido a notificação para exercer o direito de audiência prévia, da qual fez constar o mesmo código postal e a indicação “...” (cfr. ponto 23 do probatório).
Ou seja, o que resulta do probatório é que o IFAP não endereçou correctamente a primeira notificação da decisão final, já que foi a única que veio devolvida com a indicação “Não atendeu”. As demais notificações enviadas à autora/recorrida foram remetidas para outra morada, tendo sido por ela recebidas”.
O IFAP justifica a admissão da presente revista com a necessidade de se proceder a uma correcta aplicação do direito e por a questão ser susceptível de extravasar os limites da situação singular em apreço, imputando-lhe um erro de julgamento por o ofício de 26/10/2010 ter sido remetido para a morada da A. que constava do contrato e que nunca fora por ela alterada, pelo que, nos termos do art.º 224.º, n.º 2, do C. Civil, essa notificação deveria ser considerada eficaz para efeitos de interrupção da prescrição.
Porém, da matéria de facto provada – que este Supremo tem de acatar – parece resultar que o ofício que foi devolvido não foi enviado para a morada correcta.
Assim, para além da unanimidade das instâncias no julgamento da questão sobre que incide o recurso, o acórdão recorrido decidiu de forma aparentemente acertada, pelo que não se verifica a alegada “clara necessidade de uma melhor aplicação do direito” nem se está perante uma questão de importância fundamental, até porque os contornos particulares da situação não a tornam facilmente repetível
Nestes termos, não se justifica a admissão da revista.

4. Pelo exposto, acordam em não admitir a revista.

Custas pelo recorrente.

Lisboa, 4 de maio de 2023. – Fonseca da Paz (relator) – Teresa de Sousa – José Veloso.