Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01461/13
Data do Acordão:10/29/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ARAGÃO SEIA
Descritores:CASO JULGADO
LIMITES DO CASO JULGADO
IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL
SUSPENSÃO DA INSTÂNCIA
QUESTÃO PREJUDICIAL
IMPUGNAÇÃO UNITÁRIA
Sumário:I - A impugnação da decisão da Administração Fiscal que não aceite a não incidência do IMI nos termos do artigo 9º, n.º 1, al. d ou e) do CIMI, deve seguir a regra da impugnação unitária nos termos do disposto no artigo 54º do CPPT;
II - O meio processual adequado a essa impugnação, é a impugnação judicial dos actos de liquidação do imposto.
Nº Convencional:JSTA00068966
Nº do Documento:SA22014102901461
Data de Entrada:09/24/2013
Recorrente:A..., LDA
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF PENAFIEL
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - IMPUGN JUDICIAL.
DIR CIV.
Legislação Nacional:CIMI03 ART9.
CPPTRIB99 ART10 N1 D ART54.
CPC13 ART272 N1.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0419/11 DE 2011/12/07.; AC STA PROC0120/11 DE 2013/07/03.; AC STA PROC01944/13 DE 2014/01/29.
Referência a Doutrina:JOSÉ MARIA FERNANDES PIRES - LIÇÕES DE IMPOSTOS SOBRE O PATRIMÓNIO E DO SELO ALMEDINA 2010 PÁG405-408.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do supremo Tribunal Administrativo:

A………….. Lda., deduziu impugnação judicial para obter a anulação do despacho de indeferimento do pedido na reclamação graciosa apresentada pela impugnante para anulação da liquidação de IMI respeitante ao ano de 2006 consubstanciada no documento de cobrança nº 2006 017733903, no montante de € 28.443,61. Inconformada, recorreu da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel (TAF de Penafiel) datada de 9 de Maio de 2013, que julgou procedente o invocado incidente do valor da causa, fixando-o em € 21.242,58, julgou a instância parcialmente extinta na parte relativa a impugnação da decisão de indeferimento da reclamação graciosa e da liquidação do IMI de 2006 dos artigos 9637 e 9839 da matriz predial urbana da freguesia ……….. e julgou improcedente a impugnação judicial, na parte em que a instância não foi julgada extinta.

Alegou, tendo concluído como se segue:
I. O presente recurso pretende contestar a decisão judicial do Tribunal a quo por erro de julgamento na matéria Direito, no que diz respeito à decisão do Tribunal a quo de não apreciar nos presentes autos a ilegalidade da liquidação de IMI, dos artigos matriciais 9581 e 9583, com fundamento de que a Recorrente tinha apresentado uma ação administrativa especial contra a decisão de indeferimento do pedido de não sujeição de IMI, quanto aos mesmos artigos matriciais e com fundamento na mesma ilegalidade;
II. A Recorrente não pode concordar com o fundamento da alegada contradição de julgados, nem com o fundamento de que as ilegalidades cometidas na decisão de indeferimento do pedido de não sujeições a IMI não constituem fundamentam para a ilegalidade da liquidação impugnada em apreço;
III. Dada a factualidade subjacente, a Recorrente vem considerar que o Tribunal a quo, ao alegar a contradição de julgados, decidiu com pressuposto na exceção de litispendência, e não de caso julgado, pois a causa em apreço corre alegadamente o risco de se repetir estando outra (processo n.° 647/12.2 BEPNF) ainda em curso;
IV. No presente caso, estão em causa dois atos jurídicos autónomos, pelo que o facto de serem dois atos tributários distintos, obsta a que ocorra a exceção dilatória da litispendência;
V. A acrescer ao exposto, sucede que a consequência em caso de ocorrer a litispendência seria a absolvição da instância;
VI. Logo, a ilegalidade da liquidação aqui em crise nunca iria ser conhecida, pois não consta do processo de ação administrativa especial contra a decisão de indeferimento do pedido de não sujeição de IMI;
VII. Se na ação administrativa especial apenas se impugnou a decisão de indeferimento em apreço, e se o Tribunal a quo vem alegar que os presentes autos não podem apreciar a ilegalidade da liquidação, a Recorrente ficaria diminuída nos seus direitos e garantias;
VIII. Claramente que estamos perante atos administrativos autónomos sujeitos a meios e procedimentos de defesa diferentes;
IX. Caso assim não se entenda, e sem prescindir, a solução nunca poderia passar pela exceção de litispendência, mas pela suspensão da presente instância até decisão da ação administrativa especial;
X. Deste modo, podemos concluir que nos presentes autos não se verifica a exceção de litispendência, prevista nos artigos 497° e 498°, ambos do CPC, pois os atos tributários que são objeto de impugnação nas duas causas em apreço são distintos e exigem diferentes meios de defesa;
Xl. Consequentemente, deve o presente recurso ser julgado procedente e revogada a sentença do Tribunal a quo, e, em consequência, devem ser apreciados os vícios de violação de lei invocados pela Recorrente quanto à liquidação em apreço, referente aos prédios inscritos nos artigos matriciais 9581 e 9583;
XII. O Tribunal a quo vem, ainda, invocar que as ilegalidades da decisão de indeferimento do pedido de não sujeição não constituem fundamento da liquidação impugnada nos presentes autos;
XIII. O ato tributário negativo de reconhecimento da isenção é autónomo em relação ao ato tributário de conteúdo positivo de liquidação, e, como tal, implica uma relação de instrumentalidade;
XIV. Mas ainda que sejam autónomos, a Recorrente tem legitimidade para atacar as ilegalidades de que padece o ato tributário de conteúdo positivo pela não verificação do facto impeditivo da obrigação de imposto;
XV. O contribuinte teria que proceder ao pagamento da liquidação, e só aquando da decisão transitada em julgado quanto ao pedido de não sujeição de IMI é que a situação tributária seria reconstituída;
XVI. Em bom rigor, a Autoridade Tributária e Aduaneira não deveria emitir o ato tributário de conteúdo positivo, enquanto não se consolidasse na ordem jurídica o ato tributário de reconhecimento de isenção;
XVII. Se o ato de liquidação padece de ilegalidades as mesmas não se podem manter na ordem jurídica, com todas as consequências para o contribuinte, enquanto se discute o reconhecimento da isenção;
XVIII. Tratar-se-ia de uma violação intolerável do princípio do acesso ao Direito e à tutela jurisdicional efetiva, constitucionalmente previsto no artigo 20º da CRP.
XIX. Assim, o Tribunal ad quem deve declarar inconstitucional (artigo 204° da CRP), no presente processo, por violação do princípio do acesso ao Direito e à tutela jurisdicional efetiva, constitucionalmente previsto no artigo 20° da CRP, os artigos 97° e 99°, ambos do CPPT, na interpretação segundo a qual o contribuinte está impedido de impugnar a liquidação do imposto, nos casos em que está pendente o recurso contencioso do ato que recaiu sobre o pedido de isenção desse imposto;
XX. Consequentemente, deve o presente recurso ser julgado procedente e revogada a sentença do Tribunal a quo, e, em consequência, devem ser apreciados os vícios de violação de lei invocados pela Recorrente quanto à liquidação em apreço, referente aos prédios inscritos nos artigos matriciais 9581 e 9583;
Nestes termos e nos demais que V. Exas. doutamente não deixarão de suprir, deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando a sentença recorrida, substituindo-a por outra em que seja julgado procedente o pedido da impugnação judicial, nos termos aqui recorridos, ou seja, a anulação da liquidação em apreço quanto aos artigos 9581 e 9583. Pois só assim se fará inteira e sã JUSTIÇA.

Não foram produzidas contra-alegações.

O Ministério Público, notificado pronunciou-se no sentido da procedência do recurso avançando que ao revogar-se a sentença deve ainda determinar-se que o tribunal recorrido proceda à ampliação da matéria de facto com a finalidade de se apurar se a impugnação da decisão proferida em sede de reclamação hierárquica, apresentada do acto de liquidação do IMI referente aos artigos matriciais 9581 e 9583 obedeceu ao prazo previsto no nº 2 do artº 102º do CPPT.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

Na sentença recorrida deu-se como assente a seguinte factualidade concreta:
A) A impugnante foi notificada do documento de cobrança da primeira prestação do IMI de 2006 n.° 2006 017733903, no montante de €28.443,61, junto aos autos de fls. 45 a 47, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
B) De 28/12/1999 a 25/4/2006 a impugnante exerceu as actividades de “compra e venda e revenda de bens imobiliários” - CAE 70120 e “promoção imobiliária” - CAE 70110; em 26/4/2006 alterou a sua actividade passando a exercer a partir daí até 1/1/2008 apenas a actividade de “Compra e Venda de Bens Imobiliários” - CAE 68100; e em 2/1/2008 passou a exercer também a actividade de “Construção de Edifícios (Residenciais e Não Residenciais)” - CAE 41200 (fls. 253 verso e 254).
C) Em 15/10/2004 a impugnante adquiriu à sociedade “B…………., Ld.ª”, dois lotes de terreno para construção inscritos na matriz predial urbana da freguesia de ………. sob os artigos 9581 e 9583 (fls. 48).
D) Esses prédios foram participados à administração tributária pela impugnante tendo passado a figurar no seu activo (fls. 127 do PA).
E) Em 18/11/2004 a impugnante apresentou o pedido de não sujeição ao IMI desses prédios, por serem terrenos para construção que passaram a constar do activo de uma empresa que tinha por objecto a construção de edifícios para venda, nos termos do art. 9°, n.° 1, alínea c), do CIMI, pelo requerimento de fls. 48, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
F) A B…………….., Lda, beneficiou da não sujeição a Contribuição Autárquica dos referidos prédios no ano de 2003, por figurar no activo da empresa que tem por objecto a venda de prédios, nos termos do art. 10°, n.° 1, alínea f), do Código da Contribuição Autárquica (CCA) (fls. 36 e 255 verso).
G) O pedido de não sujeição referido E) foi indeferido pela decisão junta a fls. 50, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
H) A impugnante recorreu hierarquicamente desta decisão pelo requerimento de fls. 109 a 117 do PA, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
I) Este recurso hierárquico foi indeferido pela decisão de fls. 251 a 255 verso, cujo teor aqui se dá por reproduzido.
J) A impugnante impugnou judicialmente a decisão de indeferimento do recurso hierárquico, pela petição inicial junta a estes autos de fls. 269 a 286, cujo teor aqui se dá por reproduzido, que deu origem à acção administrativa especial n.° 647/12.2 BEPNF.
K) Pela acção administrativa especial n.° 455/06.0 BEPNF, a impugnante impugnou judicialmente a decisão que negou provimento ao recurso hierárquico da decisão de indeferimento do pedido de não sujeição a IMI do prédio do artigo 9839 (fls. 113 a 119).
L) Na sequência da procedência desta acção administrativa especial, a administração tributária procedeu à anulação das liquidações do artigo 9839 (fls. 159 a 162).
Nada mais se deu como provado.

Há agora que apreciar este recurso que nos vem dirigido.
Como bem se percebe das alegações de recurso, a recorrente discorda, no essencial, do entendimento da sentença recorrida de que lhe negou a possibilidade de lançar mão da acção de impugnação judicial com vista a atacar a decisão da reclamação graciosa desfavorável, e bem assim as liquidações de IMI referentes ao ano de 2006 dos prédios 09581 e 09583 de …………, uma vez que entende ter direito à não sujeição do imposto relativamente a esses prédios e a esse ano.
Pretende mais, a recorrente, que não pode ser obrigada a proceder ao pagamento do imposto em causa, enquanto se encontrar pendente a discussão administrativa da não sujeição dos prédios ao imposto agora liquidado, cfr. conclusões XIV a XIX.

Como se surpreende da leitura da matéria de facto que se levou ao probatório da sentença recorrida, a sequência temporal dos diversos actos praticados pela recorrente e pela AT é a seguinte:
-em 18/11/2004, a impugnante apresentou pedido de não sujeição a IMI dos prédios 09581 e 09583 de …………;
-por despacho datado de 28/12/2004, tal pedido foi indeferido, por se ter entendido que não se encontravam reunidos os pressupostos legalmente previstos para a não sujeição;
-a impugnante recorreu hierarquicamente deste despacho em 25/01/2005;
-a AT efectuou a liquidação do imposto de IMI, referente aos prédios 09581 e 09583 de …………, e a outros, por referência ao ano de 2006, e notificou a recorrente do respectivo documento de cobrança, com prazo de pagamento durante o mês de Abril de 2007;
-na sequência do recebimento desse documento, em 12/06/2007, a recorrente deduziu reclamação graciosa em que pede a anulação da liquidação de IMI referente àqueles prédios, quer por ilegalidade decorrente de aplicação retroactiva das leis fiscais, quer por errónea interpretação do disposto no artigo 9º, n.º 6 do IMI;
-esta reclamação graciosa foi decidida por despacho datado de 27/11/2007, com o fundamento de que não havia sido deferida a pretensão de não sujeição a imposto dos prédios em referência;
-a presente impugnação deu entrada em juízo em 18/12/2007;
-o recurso hierárquico anteriormente referido foi decidido por despacho datado de 31/05/2012, tendo-se concluído pelo seu indeferimento;
-esta decisão do recurso hierárquico foi contenciosamente impugnada por via de acção administrativa especial, que assumiu o número 647/12.2BEPNF.

No essencial, pretende a recorrente com a presente impugnação judicial, evitar ter que proceder ao pagamento do imposto liquidado até que esteja definitivamente decidida, por via administrativa e/ou por via judicial, a questão de saber se os prédios urbanos 09581 e 09583 de …………., devem ou não ser abrangidos pelo regime legal de não sujeição do imposto.

Não há qualquer dúvida, e nisso consente a recorrente, que em ambos os processos judiciais se encontra a ser discutido o mesmo assunto [cfr. acórdão deste Supremo Tribunal, datado de 07/12/2011, recurso n.º 0419/11], isto é, a não sujeição a IMI dos prédios em questão, apesar de os actos tributários em discussão não serem os mesmos; desta não identidade dos actos tributários, retira a recorrente a conclusão de que não se verifica a excepção da litispendência ou do caso julgado.

Na verdade, o que a recorrente pretende com a presente impugnação, e pretendia com a impugnação graciosa hierárquica (e agora com a acção administrativa especial que intentou), passa pela inclusão destes dois prédios urbanos no regime previsto pelo artigo 9º, n.º 1, al. d) ou e) do CIMI, obtendo, assim, o deferimento do início do pagamento do IMI para além de 4, ou 3 anos, a contar da data em que o terreno passou a figurar no seu inventário.

Porém, o acesso a este regime específico está dependente de uma actuação positiva do interessado junto da AT, do exercício de um direito potestativo, nos termos do disposto naquele artigo 9º, n.ºs. 4 e 5, actuação esta que condiciona a própria actuação da AT, enquanto actuação vinculada à lei, - [“…Trata-se de uma mera comunicação e não de um requerimento que exija a produção de qualquer acto de reconhecimento do direito à não tributação. Esse direito deriva directamente da Lei e não depende de qualquer acto administrativo de reconhecimento ou outro. A comunicação é apenas condição de eficácia do exercício do direito. A razão de ser desta comunicação resulta apenas da necessidade de a administração fiscal conhecer dois factos importantes para o funcionamento da relação jurídica fiscal - a efectiva afectação do imóvel ao activo circulante da empresa e a data em que ela ocorreu. A primeira é indispensável à constituição do direito à não sujeição, e a segunda ao gozo do direito e à sua vigência. Esta comunicação é apenas uma condição de eficácia do exercício do direito à não tributação, não tendo efeitos constitutivos do direito, dado que, como antes referimos, esse deriva directamente da Lei. A entrega da comunicação corresponde ao exercício de um direito potestativo pela empresa proprietária do imóvel, não tendo que aguardar qualquer resposta da administração fiscal.”, cfr. José Maria Fernandes Pires, in Lições de Impostos sobre o Património e o do Selo, Almedina, 2010, pp. 405 a 408] - e condiciona mesmo a produção dos seus efeitos, cfr. n.º 5, quer quanto ao seu início, quer quanto à sua duração.
Isto para dizer que, esta questão da sujeição ou não ao IMI, nos termos daqueles preceitos legais, é antecedente e pressuposto da liquidação a efectuar pelos serviços de finanças, sendo a liquidação do imposto (ou não liquidação) uma consequência da pronúncia sobre verificação dos pressupostos que a AT tome a tal respeito, nomeadamente a verificação do circunstancialismo a que se refere o n.º 6 do referido artigo 9º.
Ou seja, as eventuais ilegalidades de que sofra este acto administrativo em matéria tributária, cfr. art. 10º, n.º 1, al. d) do CPPT e acórdão deste Supremo Tribunal, datado de 03/07/2013, recurso n.º 0120/11 (a respeito de acto idêntico no domínio da CA), que não “reconheça” o acesso a tal regime, ou o “reconheça” apenas parcialmente, não se reconduzem a ilegalidades próprias do acto tributário da liquidação, uma vez que este acto, enquanto acto eminentemente vinculado, quer à lei, quer ao anterior acto de verificação dos pressupostos da não sujeição, está condicionado pelo sentido e alcance deste acto antecedente, ou seja, este acto condiciona de forma irremediável o subsequente acto de liquidação.

Contudo, não se encontra no CIMI, nem em qualquer outro diploma legal que trate esta matéria da não sujeição deste imposto, que tal acto prévio deva ser impugnado por forma autónoma, de forma imediata, nem sequer sendo evidente a sua lesividade imediata, uma vez que a mesma só se concretiza com a efectiva liquidação do imposto, havendo, por isso, que se lhe aplicar a regra geral da impugnação unitária do artigo 54º do CPPT.
Dispõe este preceito legal, sob a epígrafe “Impugnação unitária” que, salvo quando forem imediatamente lesivos dos direitos do contribuinte ou disposição expressa em sentido diferente, não são susceptíveis de impugnação contenciosa os actos interlocutórios do procedimento, sem prejuízo de poder ser invocada na impugnação da decisão final qualquer ilegalidade anteriormente cometida.
Daqui se pode concluir, assim, que as ilegalidades de que sofra tal acto de indeferimento do pedido de não sujeição a IMI podem, e devem, ser arguidas quando da impugnação da liquidação do imposto, cfr. a este respeito o acórdão deste Supremo Tribunal, datado de 29/01/2014, recurso n.º 01944/13.
Por esta razão teremos que concluir que bem andou a recorrente em deduzir esta impugnação judicial, contra a decisão da reclamação graciosa e contra as liquidações de IMI que lhe haviam sido notificadas (uma vez que a reclamação graciosa também havia sido deduzida contra as mesmas liquidações).

E aqui chegados, apesar de termos concluído de forma diferente da Sra. Juíza a quo no tocante à natureza do “acto” que não reconheceu a não sujeição ao imposto do IMI, deparamo-nos com a mesma dificuldade que vem realçada na sentença recorrida.
Tratando esta impugnação judicial e a acção administrativa especial n.º 647/12.2BEPNF do mesmo “assunto”, no dizer do acórdão proferido no recurso n.º 0419/11 atrás citado, ficamos confrontados com a possibilidade de vir a ocorrer uma contradição de julgados, no caso de nos dois processos virem a ser proferidas decisões em sentido oposto.
Portanto, apenas um dos processos deve ver a sua tramitação seguir o seu curso normal, não devendo o tribunal pronunciar-se quanto ao mérito em ambos, precisamente porque estamos perante uma situação de prejudicialidade, daquela acção relativamente a esta impugnação.
E se é certo que seria este processo que teria primazia na sua tramitação, sendo mesmo desnecessária a acção administrativa especial entretanto intentada, a verdade é que naquela acção apenas se conhece do acto, e suas ilegalidades, cuja decisão condiciona o sentido da liquidação aqui impugnada, pelo que, se configura como prejudicial relativamente a esta impugnação, cfr. artigo 272º, n.º 1 do CPC (novo).
Portanto, impõe-se, face à existência de tal evidente prejudicialidade, que se suspenda a presente instância, até que aquela acção administrativa especial esteja decidida com trânsito em julgado, cfr. nesse sentido, J. Lopes de Sousa, CPPT- 6ª ed., vol. II, anot. 3 ao art. 122º, pág. 306.

Pelo exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em:
a) Conceder provimento ao recurso e, em consequência, revogar a sentença recorrida;
b) Suspender a presente instância, até que nos autos de acção administrativa especial, n.º 647/12.2BEPNF, seja proferida decisão transitada em julgado.
c) Ordenar a baixa dos autos, para que aí passem a aguardar o período de suspensão e para a adopção das diligências necessárias para o efeito.
Sem custas.
D.N.

Lisboa, 29 de Outubro de 2014. – Aragão Seia (relator) – Casimiro Gonçalves – Francisco Rothes.