Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0674/21.9BEAVR
Data do Acordão:04/04/2024
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:SUZANA TAVARES DA SILVA
Descritores:CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO
CARREIRA MÉDICA
HOSPITAL PÚBLICO
Sumário:O disposto no artigo 28.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 18/2017 tem de ser interpretado em conjugação com o disposto no artigo 17.º-A do Decreto-Lei n.º 176/2009, resultando deste segmento normativo que o recrutamento ou selecção para o exercício de cargos de direcção (chefia ou coordenação de departamento) no âmbito da organização das instituições do SNS não é alheio ao regime das carreiras médicas e só pode fazer-se entre os titulares das categorias de assistente graduado sénior e de assistente graduado.
Nº Convencional:JSTA000P32066
Nº do Documento:SA1202404040674/21
Recorrente:CENTRO HOSPITALAR A..., EPE, NA PESSOA DO SEU LEGAL REPRESENTANTE
Recorrido 1:AA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo

I. RELATÓRIO

1. AA e Centro Hospitalar A..., melhor sinalizados nos autos, interpuseram no Tribunal Central Administrativo Norte, recursos jurisdicionais da sentença proferida pelo TAF de Aveiro que, em antecipação do mérito da causa, julgou parcialmente procedente a acção intentada por aquela contra este Centro Hospitalar (CH A..., doravante) e anulou a deliberação do Conselho de Administração deste CH A..., de 14.07.2021, pela qual foi nomeado o contra-interessado, BB, também identificado nos autos, para o cargo de director do serviço de Gastrenterologia, em regime de comissão de serviço, por insuficiente fundamentação e julgou improcedente o pedido de condenação no pagamento de indemnização, formulado pela Autora.

2. Por Acórdão proferido pelo TCAN foi decidido negar provimento ao recurso da sentença interposto pela Entidade Demandada e conceder provimento ao recurso da Autora, revogando a sentença e anulando a deliberação respeitante à nomeação do contra-interessado, condenando-o a prosseguir com o procedimento com vista à nomeação da Autora, se nada a tal obstar.

3. Inconformado, o Centro Hospitalar A... veio intentar recurso de revista para o Supremo Tribunal Administrativo, nos termos do disposto nos artigos 140.º n.º 2 e 150.º do CPTA, tendo a mesma sido admitida por acórdão deste STA de 08.02.2024.

4. O Recorrente formulou alegações, que rematou com as seguintes conclusões:

1. O presente recurso de Revista é interposto ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 150.º do CPTA, por estar em causa a apreciação de uma questão que, tanto pela sua relevância jurídica, como pela sua relevância social, se reveste de importância fundamental e, bem assim, na medida em que a admissão do recurso é, no nosso modesto entendimento, claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.

2. No caso vertente, verifica-se, por um lado, que a questão jurídica em causa é de manifesta complexidade, bastando ver que foi objecto de apreciação pelas instâncias de forma divergente, suscitando soluções jurídicas opostas, e, por outro lado, envolve a aplicação de diversas normas e a concatenação de diversos regimes legais.

3. A análise da questão por esse Superior Tribunal permitirá, em ordem a uma melhor aplicação do direito, que se atinja um resultado interpretativo que se possa tornar uniforme, o que, atento o número de situações de preenchimento de cargos de director de serviço em tudo iguais à apreciada nestes autos, assume particular relevância social.

4. A solução jurídica que esse Supremo Tribunal vier a dar ao presente dissídio irá servir tanto de paradigma para a apreciação de idênticos casos como de orientação para outros procedimentos de recrutamento de directores de serviço de hospitais, tendo evidentemente forte repercussão na comunidade médica e da gestão hospitalar e, por inerência, nos utentes do nosso SNS, contendendo diretamente, pois, com o direito à proteção da saúde, que é um direito constitucionalmente garantido e de manifesta relevância social.

5. Verificam-se os requisitos de admissibilidade da Revista previstos no artigo 150.º n.º 1 do CPTA, sendo grande a sua contribuição para uma generalizada melhor aplicação do direito.

6. Na modesta opinião do recorrente, o acórdão recorrido erra no enquadramento jurídico da situação «sub judicio».

7. A deliberação de 14.07.2021 do Conselho de Administração ora recorrente em causa nos presentes autos enquadra-se no termo de um procedimento de acolhimento de manifestação de interesse individual conducente ao recrutamento de director de serviço, no âmbito de um centro hospitalar sob a forma de entidade pública empresarial;

8. Procedimento esse que, como resulta do Aviso n.º ...21 de ../../2021, teve enquadramento “nos termos do n.º 3 do artigo 28.º do DL n.º 18/2017, de 10 de fevereiro...” e cujo âmbito foi definido da seguinte forma: “Podem materializar a manifestação de interesse individual os/as médicos/as Especialistas em Gastrenterologia inscritos/as no respetivo Colégio da Especialidade da Ordem dos Médicos, vinculados/as a qualquer instituição do Serviço Nacional de Saúde, detentores/as de um currículo profissional robusto (assistencial, organizativo, formativo, científico e/ou académico) e de um programa de desenvolvimento e gestão clínica para o Serviço de Gastrenterologia desta instituição.”

9. Estamos perante um procedimento de recrutamento para director de serviço, por manifestação de interesse individual, o qual é disciplinado pelo regime do DL n.º 18/2017, de 10 de fevereiro, que «Regula o Regime Jurídico e os Estatutos aplicáveis às unidades de saúde do Serviço Nacional de Saúde com a natureza de Entidades Públicas Empresariais».

10. O artigo 18.º do DL n.º 18/2017, de 10 de fevereiro especifica discriminadamente as normas aplicáveis às E. P. E. e confere-lhes, aliás, o carácter de especialidade em relação às normas gerais, a que, segundo o citado dispositivo, apenas se podem somar «as normas em vigor para o SNS que não contrariem as normas aqui previstas.», normativo que o acórdão violou.

11. Foi pelos normativos aplicáveis às E. P. E. que o procedimento em causa se conformou, em observância dos quais foi feito o Aviso e que toda a sua tramitação decorreu, tendo os critérios de admissão sido os expressamente previstos no artigo 28.º n.º 2 do DL n.º 18/2017, de 10 de fevereiro para o recrutamento, por manifestação de interesse, de diretores de departamento e de serviço.

12. Os requisitos de admissibilidade ao procedimento não eram os previstos no artigo 17.º-A do DL n.º 177/2009, alterado pelo DL n.º 266/D/2012 de 31 de dezembro, e que correspondiam aos requisitos de admissão aos concursos de pretérito constantes da Secção V - ponto 53 da Portaria n.º 177/97 de 11 de março, que regulamentava os “Concursos de Habilitação ao Grau de Consultor e de Provimento na Categoria de Chefe de Serviço da Carreira Médica Hospitalar”, revogada pela Portaria n.º 207/11 de 24 de maio.

13. Bem, a sentença de 1.ª instância considerara que o artigo 28.º n.º 2 do DL n.º 18/2017, de 10 de fevereiro, era incompatível com a do artigo 17.º- A do DL n.º 176/2009 (preceito na nossa humilde opinião, ultrapassado) que estabelece que os trabalhadores integrados na carreira médica só poderão exercer cargos de direção ou chefia se forem titulares das categorias de assistente graduado sénior ou, em casos devidamente fundamentados, de assistente graduado; e, porque o artigo 28.º n.º 2 do DL n.º 18/2017, de 10 de fevereiro era uma norma posterior àquela, entendeu, na nossa opinião, bem, que a tinha revogado.

14. Considerou, porém, o acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte ora recorrido que esta norma teria que ser compatibilizada com aquela, concluindo ter existido “erro de julgamento por não ter considerado que o contrainteressado não se encontra habilitado com as condições de que depende a possibilidade de manifestação de interesse individual para o exercício do cargo de direção de serviço”, motivo pelo qual revogou a sentença.

15. Não pode o Centro Hospitalar, ora recorrente, se conformar com a interpretação dos citados preceitos feita pelo acórdão em crise, que entende se encontrar ao arrepio do que vem sendo o evoluir das opções de política legislativa na área da saúde, no sentido de conferir maior autonomia e eficácia à gestão das unidades de saúde de natureza de entidade pública empresarial.

16. As condições de que a possibilidade de manifestação de interesse individual para o exercício do cargo de direção de serviço dependeu foram as publicitadas no Aviso n.º ...21 publicado no DR de ../../2021, de onde não constava como requisito de admissão ao procedimento deter a categoria de médico assistente graduado ou assistente graduado sénior.

17. A manifestação de interesse individual do contrainteressado conformou-se com o Aviso e com todas as condições nele estabelecidas e das quais dependia a possibilidade de apresentação e sua admissibilidade.

18. A existir desconformidade entre as condições legalmente exigidas para o exercício de funções de director de serviço e as estabelecidas no Aviso, que, é nossa inabalável convicção, não ocorre, então seria no começo do processo de recrutamento, e não no seu termo, que o vício se manifestaria.

19. O Aviso, melhor dizendo, a deliberação de abertura do procedimento de 07.06.2021 não foi impugnada, tendo-se consolidado na Ordem Jurídica.

20. A compatibilização entre normas não pode, de forma alguma, violar a “ratio legis” de uma delas, como acaba por fazer o tribunal «a quo», esvaziando completamente de sentido a intenção do legislador do DL 18/2017, de 10 de fevereiro.

21. Veja-se que o acórdão em crise decidiu exclusivamente ancorado no teor do preâmbulo do DL n.º 176/2009 de 4 de agosto (em que a intenção do legislador foi a de não diferenciar as carreiras médicas entre hospitais públicos e EPE’s), fazendo completa tábua rasa do teor do preâmbulo do diploma posterior, o DL n.º 18/2017 de 10 de fevereiro, aprovado num momento histórico em que a ratio legis é já diversa, tendo o legislador pretendido com a publicação de um regime específico das unidades de saúde que integram o SNS com a natureza de entidade pública empresarial, adotar uma série de medidas no sentido de conferir e aumentar eficiência ao SNS, pelo reforço da capacidade e autonomia de gestão.

22. Aqui chegados, é forçoso concluir que o artigo 28.º do DL n.º 18/2017, de 10 de fevereiro configura uma norma específica dos recrutamentos pelos centros hospitalares e unidades de saúde que têm a natureza de EPE’s, que não é passível de compatibilização com o artigo 17.º-A do DL n.º 176/2009 de 4 de agosto e que, como tal, afasta a sua aplicação.

23. O acórdão recorrido violou o disposto no n.º 2 do artigo 18.º do DL n.º 18/2017 de 10 de fevereiro, que determinou que as EPE integradas no SNS se regem pelo regime jurídico aplicável às entidades públicas empresariais, com as especificidades previstas naquele decreto-lei e nos seus Estatutos, bem como nos respetivos regulamentos internos, e apenas nas normas em vigor para o SNS quando não contrariem as normas ali previstas.

24. É precisamente o caso, impondo-se o afastamento do artigo 17.- A do DL n.º 176/2009 de 4 de agosto que contraria o artigo 28.º n.º 2, os Estatutos constantes do anexo II e o Regulamento Interno do centro hospitalar ora réu, nomeadamente nos seus artigos 7.º, onde, de forma inovadora, é conferida a competência aos conselhos de administração, de designar o pessoal para os cargos de direção e de chefia, bem como para os livremente exonerar por mera conveniência de serviço, como consta dos artigos 85.º e 87.º do regulamento interno do CH A..., normas aliás transcritas nos pontos 28 e 29 da matéria assente, pela sua relevância.

25. O regime do DL n.º 18/2017, de 10 de fevereiro, de onde consta o artigo 28.º com que o procedimento se conformou, é posterior ao regime do DL n.º 176/2009, de 04 de agosto, onde consta aquele artigo 17.º-A, que prevê o regime da carreira dos médicos nas entidades públicas empresariais e nas parcerias em saúde, bem como à alteração que ao mesmo foi introduzida em 2012.

26. A norma do artigo 17.º-A do DL n.º 176/2009, de 4 de agosto, é incompatível com a do artigo 28.º do DL n.º 18/2017, de 10 de fevereiro: - as habilitações que, uma norma e outra, identificam como as necessárias para admissão em procedimento para chefe de serviço, são muito diferentes.

27. No artigo 28.º do DL n.º 18/2017, de 10 de fevereiro, e diversamente do que consta do artigo 17.º-A, o legislador não só afastou a categoria na carreira médica (assistente graduado, assistente graduado sénior), como regra absoluta e limitadora de admissão ao procedimento de recrutamento por manifestação de interesse, como teve o cuidado de a substituir pelo grau (especialista, consultor), o qual passou a constituir critério preferencial.

28. O nível habilitacional exigido na norma para a carreira médica corresponde aos graus de qualificação médica previstos no DL. N.º 176/2009, de 4 de agosto, conforme expressamente prevê o artigo 3.º do diploma, especificando no artigo 4.º, os dois graus existentes: -o grau de especialista e o grau de consultor.

29. Se o legislador quisesse indexar a possibilidade de direcção de serviço, apenas e tão-somente às categorias de assistente graduado e assistente graduado sénior teria mantido essa especificação na norma e não a teria afastado, como fez, nem sequer a elegendo como critério preferencial.

30. Fazendo apelo à ratio legis, verifica-se que a redação do artigo 28.º do DL n.º 18/2017, de 10 de fevereiro resultou de uma opção de política legislativa que visou, por um lado, não afunilar excessivamente o espectro de seleção e, por outro, garantir a possibilidade de poderem os Conselhos de Administração, no âmbito das suas novas competências conferidas nesse Diploma, fazer a destrinça entre competências eminentemente técnicas, validadas em termos de estrutura de carreira e outras competências, nomeadamente de gestão e liderança de equipas.

31. Donde, a norma do artigo 28.º revogou a norma do artigo 17.º-A no que aos procedimentos de recrutamento de diretor de serviço concerne, no âmbito das E.P.E., não só ao elencar requisitos de admissão para o procedimento de manifestação de interesse para recrutamento e nomeação de diretor de serviço distintos dos constantes daquela norma da carreira médica, como ao afastar a imperatividade da categoria profissional, excluindo-a mesmo de toda a ponderação.

32. Em abono da interpretação que defendemos, note-se que o legislador veio, hodiernamente, a reiterar o sobredito entendimento no novel Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, aprovado pelo DL n.º 55/2022, de 4 de agosto, mantendo no artigo 99.º norma que reproduz, ipsis verbis, o teor do artigo 28.º do DL n.º 18/2017 ora em análise.

33. Se o legislador entendesse ter de compatibilizar, no novo Estatuto do SNS, o regime simplificado previsto para o procedimento de recrutamento para director de serviço por manifestação de interesse, com o artigo 17.º-A citado, no sentido defendido pelo aresto recorrido – presumindo ainda, nos termos do artigo 9.º do Código Civil que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados – então não teria mantido esta norma, nomeadamente o seu nº 2, nos seus precisos termos.

34. Em sede de interpretação, há que fazer apelo, além do elemento gramatical, ao elemento teleológico e, bem assim, ao sistemático e histórico, e, como tal, verificar o que tem sido o evoluir do pensamento do legislador, ao longo do amadurecimento do SNS, no sentido de conferir uma maior autonomia gestionária para efeitos de contratação e alocação de recursos humanos.

35. E se, de facto, se pretende aumentar a eficiência do SNS, alocar melhor os recursos humanos e fixar médicos nos Serviços do SNS, tal desiderato só será possível garantindo a capacidade e responsabilidade dos Conselhos de Administração de escolher e nomear, nos termos do artigo 28.º citado, o médico da especialidade com evidência curricular de gestão que a cada momento, e para cada Serviço, se apresente capaz para dar esse «salto em frente», sem espartilhos.

36. A interpretação do acórdão recorrido, ao impor como critério prévio para a admissão de uma manifestação de interesse para exercício de cargo de diretor de serviço, a categoria de assistente graduado sénior, configura uma intolerável limitação ao princípio da igualdade de oportunidades que o artigo 28.º n.º 2 do DL n.º 18/20217 visou garantir, consubstanciando mesmo uma discriminação dos mais jovens, violadora do direito fundamental à igualdade consagrado no artigo 13.º da CRP, na medida em que só a permite a um médico já mais próximo do fim de carreira, um graduado sénior, enjeitando aqueloutros, com curriculum e provas dadas, mas mais jovens, que se pretendem dedicar e fazer carreira no SNS.

37. Por apelo ao elemento histórico constatamos que todo o procedimento de recrutamento dos directores de serviço passou a ter, com a redação do artigo 28.º citado [que se mantém na actual Lei de Bases do SNS, como referido e importa realçar], um «novo paradigma» que vem sendo seguido na generalidade das EPE’s, para nomeação dos profissionais mais adequados às funções de direcção de serviço, a desenvolver, como ali prescrito.

38. Neste «novo paradigma», o processo de recrutamento passou a ser publicitado, mediante Aviso a ser publicado, de forma a garantir a igualdade de oportunidades, imparcialidade, boa-fé e publicidade; passou, ao ser através de manifestação de interesse, a colocar nas mãos dos interessados o impulso de apresentarem candidatura e, com a mesma, as suas ideias para a gestão do serviço, possibilitando um alargar do espectro de recrutamento mesmo para além dos limites da instituição e, com isso, a abertura a receber pessoas com outras experiências, conhecimentos e culturas de trabalho ou de gestão; passou-se a exigir, como requisitos específicos de admissão, ser detentor da qualidade de médico especialista daquela área clínica, inscrito no Colégio da Especialidade e a exercer funções em qualquer instituição do SNS, o que logrou trazer uma maior abertura no espectro de selecção, que se encontrava absolutamente limitado, senão afunilado, pela detenção da categoria de assistente graduado ou graduado sénior e, com isso, a abertura a receber pessoas mais jovens, mais dinâmicas e capazes de empreender mudanças; passou a possibilitar uma tramitação simplificada, sem uma regulamentação rígida, apenas norteada pelos princípios basilares enumerados, de modo a assegurar a celeridade e discricionariedade inerentes à decisão de nomeação, visto que se trata de um cargo a ser exercido em regime de comissão de serviço, que implica o estabelecimento de uma relação de confiança.

39. Mal andou o acórdão em crise, ao tentar compatibilizar as normas, que, como flui do acima exposto, são incompatíveis, violando, entre outros, o n.º 2 do artigo 28.º do DL 18/2017, de 10 de fevereiro e os artigos 2.º, 3.º e 4.º do DL 176/2009, de 4 de agosto, bem como artigo 7.º do Código Civil.

40. A deliberação do CA de 14.07.2021 que nomeou director do serviço de Gastrenterologia o contrainteressado, Dr. BB, não padece, por conseguinte, do indicado vício de violação de lei, antes faz correta, sã e atualizada interpretação dos normativos, então, aplicáveis.

41. Acresce que a deliberação impugnada, como ressalta à evidência, não padece do vício de falta de fundamentação que o aresto em crise lhe assacou, motivo pelo qual se censura também o mesmo.

42. O imperativo da fundamentação não é absoluto e depende das zonas de actividade, do tipo de actos e das circunstâncias em que o mesmo é emitido.

43. Tal como sumariou esse Supremo Tribunal Administrativo no acórdão proferido no processo n.º 0139/05, “um acto está fundamentado sempre que o administrado, colocado na sua posição de destinatário normal – o bonus pater familias de que fala o art. 487.º, n.º 2 do CC – fica devidamente esclarecido acerca das razões que o motivaram e, portanto, fica habilitado a impugná-lo.” – como foi o caso.

44. Ademais, como advoga, na doutrina, Vieira de Andrade, e como também afirma na jurisprudência desse Tribunal Superior, em excertos supra transcritos, a insuficiência para conduzir a um vício de forma equivalente à falta de fundamentação, há-de ser manifesta, no sentido de ser tal que fiquem por determinar os factos ou as considerações que levaram o órgão a agir ou a tomar aquela decisão, ou então, que resulte evidente que o agente não realizou “um exame sério e imparcial dos factos e das disposições legais”, por não ter tomado em conta “interesses necessariamente implicados.”

45. Ainda que se pudesse admitir a insuficiência de fundamentação, o que não se concede, teria a mesma, para conduzir a um vício de forma equivalente à falta de fundamentação, de ser manifesta, no sentido de ser tal que ficassem por determinar os factos ou as considerações que nortearam a tomada de decisão. Não é, de todo em todo, o que sucede no caso sub judice.

46. O n.º 4 do artigo 2.º do CPA não inclui as entidades hospitalares de natureza empresarial, como é o caso do centro hospitalar recorrente, no conceito de Administração Pública que o Código adota, pelo que, entre o mais, não se lhe aplica a exigência de fundamentação do artigo 152.º do CPA.

47. É apodítico, no caso vertente, que o acto impugnado situa-se no domínio de atuação discricionária da administração e que os destinatários do mesmo, lendo a sua fundamentação, ficaram a conhecer, com clareza, o itinerário cognoscitivo e valorativo constante do acto em causa, tendo ficado em condições de saber o motivo porque se decidiu num sentido e não noutro. Tanto assim é que a autora não teve qualquer dificuldade em atacar o decidido, precisamente o ter perfeitamente percebido.

48. Acresce que, tanto a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro como o acórdão recorrido afirmam lapidarmente que do parecer elaborado pela comissão de análise do processo de recrutamento, de que o acto impugnado se apropria, constam claramente as razões por que, no entender daquela comissão, se entendeu que o nomeado deveria ser o contra-interessado e não a autora.

49. Todavia, o Venerando TCAN acabou por manter, em nosso entender mal, a decisão que considerou procedente a verificação de vício de insuficiente fundamentação.

50. A exigência de um dever de acrescida fundamentação que não tem base legal. Nem no n.º 2 do artigo 28.º do Decreto-Lei n.º 18/2017, nem em qualquer outra norma ou diploma legal que seja aplicável no caso vertente.

51. O acórdão recorrido padece de nulidade, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, aplicável ex vi do artigo 1.º do CPTA, porquanto a decisão de anulação do acto por falta de fundamentação está em contradição com os seus fundamentos, quer no concerne ao enquadramento jurídico da questão, quer ao afastamento da aplicabilidade das regras gerais do procedimento administrativo e da exigência de fundamentação do artigo 152.º do CPA.

52. Ao exigir especial dever de fundamentação do ato de nomeação do contrainteressado o TCAN faz uma errada interpretação do direito, violando, também por isso, o artigo 28.º DL n.º 18/2017, de 10 de fevereiro.

53. Por fim, o Tribunal a quo não acatou o respeito pelo princípio da separação e independência dos poderes, extravasando a sindicância da legalidade do ato impugnado e entrando na apreciação do mérito da fundamentação de um ato não vinculado, o que lhe está vedado, pelo que violou o n.º 1 do artigo 3.º do CPTA.

TERMOS EM QUE, ADMITINDO E DANDO PROVIMENTO À PRESENTE REVISTA E CONSEQUENTEMENTE, REVOGANDO O ACÓRDÃO RECORRIDO, NA PARTE EM QUE ANULOU O ACTO POR VÍCIO DE VIOLAÇÃO DE LEI E POR FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO, FARÁ ESSE SUPREMO TRIBUNAL INTEIRA E SÃ JUSTIÇA.

5. AA veio apresentar contra-alegações, tendo concluindo o seguinte:

1. A presente ação colocou em crise a deliberação da Recorrente de 14.07.2021 no âmbito procedimento concursal para recrutamento de cargo de direção de serviço de Gastrenterologia que padece que vícios, conforme veio a ser confirmado pelo Tribunal a quo e pelo MP em parecer emitido para o efeito nos termos e para os fins previstos n.º 2 do art.º 146.º do CPTA

2. O presente recurso não deve ser admitido por não estarem preenchidos, no caso, qualquer dos pressupostos legalmente exigidos, invocados pela Recorrente para o efeito, desde logo, porque

i. não está em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental e ainda porque o recurso não se revela claramente necessário para uma melhor aplicação do direito.

ii. o teor da decisão judicial posta em causa mostra-se juridicamente razoável, aceitável, e não «claramente» carente de «uma melhor aplicação do direito»,

iii. a eventual apreciação da revista nada acrescentaria em termos de enriquecimento jurisprudencial paradigmático.

iv. não existe “manifesta complexidade “uma vez que a decisão do tribunal central administrativo decidiu de acordo com a lei, não podendo ser outra distinta,

v. das referências à matéria de facto considerada provada e ao direito aplicável, constata-se que inexiste a elevada complexidade jurídica superior ao comum, que revista dificuldade específica quanto a operações exegéticas a efetuar e a um enquadramento normativo especialmente intricado e também,

vi. a questão que se pretende ver discutida, não coincide, nos seus termos e sentido, com o pressuposto legal, ou seja, “questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental” atendendo não somente à evidência da aplicação da lei em causa mas também ao facto de revestir importância apenas para a Recorrente que tem um interesse direto e pessoal em manter a decisão, ou não fosse disso manifesta a ausência ou quase inexistência de conflitos judiciais nesse sentido.

vii. ainda mais, não se verifica a necessidade de concatenação de diversos regimes legais e institutos jurídicos, ou tratamento de matéria que tenha suscitado dúvidas sérias ao julgador, tanto mais que,

3. confrontado por duas vezes consecutivas o Tr. a quo não divergiu nas respetivas conclusões, nem o Ministério publico, concluindo no sentido defendido pela agora Recorrida a saber: falta de habilitações do contra-interessado e compatibilização do artigo 17.º-A. do Decreto-lei n.º 176/2009 de 4 de agosto e do artigo 23.º do decreto-lei n.º 177/2009, com o disposto no art.º 28 n.º 2 do decreto-lei 18/2017 de 10 de fevereiro. Assim se conclui que

4. Importa manter a regra da excecionalidade dos recursos de revista, e recusar a admissão do aqui interposto pelo Recorrente

Por cautela, todavia, recorda-se que

5. A nomeação do contra-interessado, no âmbito do procedimento em causa, padece de evidente e manifesta ilegalidade, porquanto além das flagrantes diferenças a nível curricular com a aqui Recorrida, o mesmo não detém as habilitações necessárias para o efeito, atendendo ao quadro legal em vigor, condição que inviabilizaria, antes de mais, a admissibilidade da respetiva candidatura É que,

6. nos termos do artigo 17.º-A do Decreto-Lei n.º 176/ 2009 de 4 de agosto e do artigo 23.º do Decreto-Lei n.º 177/2009 do 4 de agosto, ambos alterados pelo Decreto-Lei 266-D/2012 de 31 de dezembro “os trabalhadores integrados…” consoante o caso na carreira médica ou na carreira especial médica(..) Podem exercer funções de direção, chefia ou coordenação de departamentos, serviços unidades funcionais do serviço nacional de saúde desde que sejam titulares das categorias de assistente graduado sénior ou em casos devidamente fundamentados de assistente graduado”,

7. sendo que o aqui contra-interessado – diversamente da aqui Recorrida - não dispõe de nenhuma das habilitações em causa pelo que ficaria impossibilitado de manifestar interesse individual para o exercício do cargo de direção de serviço.

8. Ora, para a aqui Recorrente os requisitos ou pressupostos legais acima mencionados, serão incompatíveis com o disposto no art.º 28 n.º 2 do Decreto-Lei 18/2017 de 10 de fevereiro, porquanto se trata de uma norma posterior, motivo pelo qual o artigo 17.º-A do Decreto-Lei. n.º 176/ 2009 de 4 de agosto deve, no entendimento da recorrente, considerar-se revogado, o que não é admissível para o Tr. a quo, e bem (!) que concluiu que as normas se devem compatibilizar.

9. E vejamos os fundamentos, para os quais a Recorrida desde sempre arguiu e aos quais inevitavelmente o T. aderiu

i. As duas normas têm hierarquia igual, não havendo qualquer relação de especialidade entre elas;

ii. Embora o art.º 28 o número 2 do Decreto-Lei n.º 18/2017 seja posterior ao artigo 17.º - A do Decreto-Lei n.º 176/2009, não é por esse facto incompatível, devendo efetivamente conjugar-se as disposições

10. Acresce que, mesmo que se atente ao disposto no art.º 7.º do CC, o n.º 2 do artigo 28.º do Decreto-Lei n.º 18/2017 de 10/02, é de hierarquia igual à do n.º 1 do artigo 17.º-A do Decreto-Lei n.º 176/99, de 04/08, não havendo qualquer relação de especialidade, e ainda que a primeira seja posterior, não será por essa razão que devem ser consideradas incompatíveis pelo que devem as normas ser conjugadas.

11. No fundo, as disposições legais encerram duas condições distintas, a saber, a primeira define as habilitações necessárias para o cargo, a segunda para além da necessidade de nomear os profissionais inscritos no colégio da especialidade na área onde vão exercer funções, define o critério de escolha entre os profissionais que têm aquelas habilitações no âmbito de um processo de recrutamento dirigido a este fim.

12. Motivo pelo qual as normas não se opõem, antes, porém, compatibilizam-se.

13. Trata-se de uma interpretação que não podia ser diversa, dada a responsabilidade das funções médicas que estão em causa, sendo reconhecido que um dos fatores críticos atuais do serviço nacional de saúde - onde se integram igualmente as EPE’s – (..) consiste na qualificação e no desenvolvimento dos respetivos profissionais e na diferenciação profissional, marcado por etapas exigentes com avaliação interpares e reconhecimento institucional.

14. Daí que, antes da verificação de quaisquer eventuais critérios preferenciais. tinha a agora Recorrente de assegurar que o contra-interessado se encontrava habilitado com as condições de que depende a possibilidade de manifestação de interesse individual para o exercício do cargo de direção de serviço, O que não fez. Ainda,

15. Contrariamente ao que defende a recorrente, o Acórdão em crise não sustenta a respetiva fundamentação meramente no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 176/2009, de 04/08, apelando ainda para as disposições constantes do decreto-lei 18/2017, a saber, n.º 1 do artigo 27.º que refere que “aos trabalhadores das EPE, integradas no SNS, estão sujeitas ao regime do contrato de trabalho nos termos do código do trabalho, bem como ao regime constante dos diplomas que definem um regime legal de carreiras de profissões de saúde (…), e artigo 28.º, concluindo que a maior exigência do legislador ao introduzir critérios no âmbito do recrutamento nos cargos de direção, se justifica em virtude da elevada tecnicidade, responsabilidade e relevância das funções a exercer

16. É precisamente da compatibilização entre todas estas disposições, que se pode sustentar, entre outros, a transparência administrativa, tanto mais que, previamente à publicação do DL n.º 18/2017, de 10/02, as Direções de Serviço das EPE’s eram atribuídas por nomeação, pelo que, o procedimento dai em diante passou a reger-se por um processo de recrutamento sujeito a um conjunto de requisitos legais impostos pelo Ministério da Saúde no sentido de nivelar e uniformizar quem pode aceder a cargos de direção de serviço no âmbito do serviço nacional de saúde, o que não exclui ou afasta a maior autonomia de gestão concedida às unidades de saúde de natureza de entidade pública empresarial, apenas a consagração de “balizas legais ” que evitam a arbitrariedade e, já agora, gestão desadequada.

17. Por isso, os trabalhadores integrados na carreira médica só podem exercer funções de direção chefia ou coordenação, desde que sejam titulares das categorias de assistente graduado sénior ou, em casos devidamente fundamentados, de assistente graduado, inscritos no colégio da especialidade da ordem dos médicos correspondente à área clínica onde vão desempenhar funções, devendo ser nomeados preferencialmente os que tenham maior evidência curricular de gestão e maior graduação na carreira médica,

18. E não estamos perante uma restrição ao direito de acesso à promoção ou progressão do aqui contra-interessada que conduz a um tratamento desigual ou diferenciado isto porque, o legislador, de algum modo, antecipadamente, em função, mormente da experiência, da relevância da função, conhecimento, da tecnicidade estabelecer quem poderá desempenhar estas funções, quem mais e melhores detém condições para exercer estes cargos, e desse modo, não existe discriminação, porque se tratam de situações que merecem um enquadramento específico em função da ponderação que previamente foi estabelecida e que encontra fundamento na relevância social da função em causa.

19. Além de que, não existe tratamento desigual, perante situações desiguais, sendo que o princípio da igualdade apenas proíbe o estabelecimento de distinções discriminatórias sem fundamento racional imaterial constitucionalmente relevante, o que não sucede no caso em apreço.

20. Deste modo, de entre os médicos que manifestaram interesse individual apenas a aqui Recorrida - assistente graduada sénior- dispõe de habilitação necessária para o efeito, pelo que deverá ser a mesma nomeada para o cargo de direção dos serviços de Gastroenterologia, prosseguindo o procedimento para este fim mantendo-se o Acórdão em crise

Termos em que deve a Revista ser recusada por não verificação dos pressupostos de que depende a sua admissibilidade e, caso assim se não entenda, sempre deve ser negado provimento ao recurso e ser mantido na íntegra o Acórdão recorrido, por ser de Lei e Justiça.

6. Notificado ao abrigo do artigo 146.º, n.º 1 do CPTA, o Magistrado do Ministério Público pronunciou-se no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Cumpre apreciar e decidir.

II – FUNDAMENTAÇÃO

1. De facto

Na decisão recorrida foi reputada como relevante a seguinte matéria de facto:

1. A autora desempenhou funções de Assistente Hospitalar de Gastroenterologia ao serviço do Centro Hospitalar A..., EPE (Hospital ...), desde 01.10.1998 - cf. doc. constante de fls. 299 do suporte físico dos autos, junto por requerimento de 17.11.2021.

2. A autora desempenhou as funções referidas mediante contrato de trabalho por tempo indeterminado celebrado entre as partes em 11.09.1998 – cf. doc. constante de fls. 299 do suporte físico dos autos, junto por requerimento de 17.11.2021.

3. Desde Junho de 2020, a autora passou a desempenhar funções de Assistente Graduada Sénior de Gastroenterologia, ao serviço do mesmo CH A..., EPE – cf. docs. 1 e 13 juntos com o requerimento inicial (RI), a fls. 22 e 60 do suporte físico dos autos, cujo teor se dá por reproduzido.

4. Desde 1998, e até 2021, a autora desempenhava as funções, em regime de comissão de serviço, de Direcção do Serviço de Gastroenterologia no centro hospitalar requerido – cf. docs. constantes de fls. 256 e 263 do suporte físico dos autos, correspondentes a fls. 70 e 83 do processo administrativo junto aos autos [“PA”], cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

5. Desde Abril de 2018, o contra-interessado desempenhava funções de Assistente Hospitalar de Gastrenterologia ao serviço do Centro Hospitalar B... – cf. doc. constante de fls. 312 do suporte físico dos autos, junto por requerimento de 30.11.2021, cujo teor se dá por reproduzido.

6. Em 07.06.2021, foi deliberado autorizar a abertura de procedimento, conforme patente em proposta de 04.06.2021, do seguinte teor:
“Considerando que:
- Os titulares de cargos de direção exercem as funções em regime de comissão de serviço;
- A comissão de serviço é caracterizada pela provisoriedade do cargo;
- O atual Conselho de Administração iniciou o seu mandato no dia 14 de fevereiro de 2020;
- Atenta à alteração da composição do órgão de Gestão.
Torna-se necessário promover as diligências necessárias à nomeação do Diretor de Serviço de Gastroenterologia, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 28.º do Decreto-lei n.º 18/2017 de 10 de fevereiro, cumprindo os princípios de imparcialidade, igualdade de oportunidades e transparência pelo que proponho a abertura do procedimento conducente ao recrutamento de um profissional para exercer, em regime de comissão de serviço, o cargo de diretor(a) do Serviço de Gastroenterologia do CH A....
O procedimento Concursal será realizado por manifestação de interesse individual a ser avaliado por uma Comissão de Análise constituída por:
Presidente - Dr. CC, Assistente Graduado de Otorrinolaringologia e Diretor Clínico do Centro Hospitalar A..., E.P.E.
Vogal efetivo — Dra. DD, Assistente Graduada Sénior de Medicina Interna e adjunta da Direção Clínica do Centro Hospitalar A..., E. P. E.
Vogal efetivo —Dr. EE, Assistente Hospitalar Graduado de Gastroenterologia do Centro Hospitalar C.../..., E. P. E.
Vogal suplente — Dr. FF, Assistente Graduado Sénior de Cirurgia do Centro Hospitalar A..., E. P. E.
Vogal suplente — Dra GG, Assistente Graduado Sénior de Patologia Clínica adjunta da Direção Clínica do Centro Hospitalar A..., E. P. E.
(…)” – cf. fls. 1-3 do PA, cujo teor se dá por reproduzido.

7. Mediante o Aviso n.º ...21, publicado em Diário da República em ../../2021, o CH A... publicitou a abertura de procedimento de “acolhimento de manifestação de interesse individual conducente ao recrutamento de Director/a de Serviço de Gastrenterologia” – cf. doc. constante de fls. 4 e ss. do PA.

8. O aviso referido no ponto anterior era do seguinte teor:
“Recrutamento de Diretor/a do Serviço de Gastrenterologia do Centro Hospitalar A..., E. P. E.
1 - Enquadramento - Nos termos do n.º 3 do artigo 28.º do Decreto-Lei 18/2017, de 10 de fevereiro, faz-se público que, por Deliberação do Conselho de Administração do Centro Hospitalar A..., E. P. E., de 09 de junho de 2021, se encontra aberto, pelo prazo de 10 (dez) dias úteis, um processo de acolhimento de manifestação de interesse individual conducente ao recrutamento de Diretor/a do Serviço de Gastrenterologia.
2 - Âmbito - Podem materializar a manifestação de interesse individual os/as médicos/as Especialistas em Gastrenterologia inscritos/as no respetivo Colégio da Especialidade da Ordem dos Médicos, vinculados/as a qualquer instituição do Serviço Nacional de Saúde, detentores/as de um currículo profissional robusto (assistencial, organizativo, formativo, científico e/ou académico) e de um programa de desenvolvimento e gestão clínica para o Serviço de Gastrenterologia desta instituição.
3 - Conteúdo funcional e a remuneração - O conteúdo funcional e a remuneração são os estabelecidos na carreira médica em vigor, bem como nos princípios e regras aplicáveis às unidades de saúde que integram o Serviço Nacional de Saúde com a natureza de entidade pública empresarial, conforme o Decreto-Lei 18/2017, de 10 de fevereiro.
4 - Regime de trabalho - O período normal de trabalho é de 40 horas semanais, sem prejuízo da aplicação das regras previstas no artigo 5.º do Decreto-Lei 266-D/2012, de 31 de dezembro.
5 - Elementos - Da manifestação de interesse individual constarão os seguintes elementos:
a) Nome, naturalidade, data de nascimento, nacionalidade, número de cartão de cidadã/o ou de bilhete de identidade, número da cédula da Ordem dos Médicos, morada, código postal, telefone e endereço de correio eletrónico.
b) Referência ao Diário da República onde se encontra publicado este Aviso.
c) Dois documentos, impressos em suporte de papel e em ficheiro de formato PDF gravados num dispositivo portátil de memória:
i) Curriculum vitae, com menos de 2000 palavras.
ii) Plano de gestão, com menos de 3000 palavras.
6 - Formalização da candidatura - A manifestação de interesse individual deverá ser efetuada através de requerimento, dirigido ao Presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar A..., E. P. E., em suporte de papel, e entregue no Serviço de Gestão de Recursos Humanos durante o horário normal de expediente, ou enviada através de correio registado com aviso de receção, para o endereço postal da instituição, até à data limite fixada na publicitação.
7 - Comissão de análise - A manifestação de interesse individual será analisada por uma comissão ad-hoc composta por:
Presidente - Dr. CC, Assistente Graduado Sénior de Otorrinolaringologia e Diretor Clínico do Centro Hospitalar A..., E. P. E.
Vogal efetivo - Dr.ª DD, Assistente Graduada Sénior de Medicina Interna e adjunta da Direção Clínica do Centro Hospitalar A..., E. P. E.
Vogal efetivo - Dr. EE, Assistente Graduado de Gastrenterologia do Centro Hospitalar C.../..., E. P. E.
Vogal suplente - Dr. FF, Assistente Graduado Sénior de Cirurgia Geral do Centro Hospitalar A..., E. P. E.
Vogal suplente - Dr.ª GG, Assistente Graduada Sénior de Patologia Clínica e Adjunta da Direção Clínica do Centro Hospitalar A..., E. P. E.
8 - Análise, discussão e parecer - A comissão promove a análise dos documentos submetidos e poderá promover, se entender da sua necessidade, a sua discussão pública, presencial ou por via telemática, elaborando um parecer qualitativo, que poderá incluir recomendações ao Conselho de Administração.
9 - Nomeação - A nomeação do/a Diretor/a de Serviço faz-se em reunião ordinária do Conselho de Administração, tendo em conta o parecer da comissão, além de fatores e argumentos adicionais a discutir e a explicitar em ata.
10 - Publicitação - A nomeação será publicada no Portal Interno e no sítio da instituição na Internet.
9 de junho de 2021. - O Presidente do Conselho de Administração, HH.” – cf. doc. constante de fls. 4 e ss. do PA.

9. No âmbito do procedimento referido nos pontos antecedentes, em ../../2021 reuniu a comissão nomeada para análise das manifestações de interesse individual para o exercício do cargo de Director/a do Serviço de Gastroenterologia, lavrando-se acta com o seguinte teor:
“Aos 14 dias do mês de junho, pelas 19:00h, reuniu a comissão nomeada para análise das manifestações de interesse individual para o exercício do cargo de Diretor/a do Serviço de Gastroenterologia constituída por:
Presidente
CC
Vogais
DD
EE
A reunião teve por finalidade definir os critérios a aplicar na análise dos curriculum profissionais dos candidatos ao cargo suprarreferido, bem como dos respetivos projetos de gestão.
Nesta conformidade, é deliberado:
A comissão em causa não graduará as propostas, antes procederá à emissão de relatório, não vinculativo, na sequência da avaliação dos currículos, da adequação projetos de gestão apresentados e das competências demonstradas pelos elementos que apresentem manifestação de interesse individual para o exercício do cargo de Diretor/a de Serviço de Gastroenterologia.
Na sequência da referida análise, a comissão elaborará um relatório com pareceres qualitativos individuais, podendo ainda incluir uma apreciação comparativa dos méritos e fragilidades dos interessados, bem como recomendações ao Conselho de Administração.
Nesse relatório serão considerados os aspetos curriculares relevantes ao exercício do cargo de Diretor de Serviço designadamente experiência profissional, capacidade de gestão, bem como o percurso académico relevante e total disponibilidade para o exercício do cargo.
Igualmente, ponderar-se-á a clareza e qualidade do Plano de Gestão apresentado no que diz respeito à metodologia para a identificação de problemas, propostas efetivas de melhoria, desenvolvimento com o alinhamento estratégico do CH A... e respetiva aplicabilidade à Instituição.
Para o efeito, e se entender da sua necessidade, a comissão após análise dos documentos, poderá promover a discussão dos documentos apresentados com os candidatos por via telemática ou presencial.
Por nada haver mais a tratar a reunião foi dada como concluída pelas 19:30h, sendo a ata assinada pelos elementos presentes.” – cf. doc. constante de fls. 6 e 7 do PA.

10. Por documento datado de 23.06.2021, dirigido ao Presidente do Conselho de Administração do CH A..., a autora requereu “admissão ao Recrutamento de Director de Serviço de Gastrenterologia (…) aberto pelo Aviso n.º ...21 (…)” – cf. fls. 46 do PA, cujo teor se dá por reproduzido.

11. Em anexo ao documento referido no ponto antecedente, a autora enviou “curriculo vitae” e “plano de gestão” – cf. fls. 46 e ss. do PA, cujo teor se dá por reproduzido.

12. O “plano de gestão” da autora organizava-se de acordo com as seguintes rubricas:
A. Introdução
B. Terapêutica endoscópica de doentes obesos
C. Erradicação pré-cirurgia bariátrica da infecção por Hpylori
D. Gestão de imagem – Literacia em Saúde
E. Anexos
- cf. fls. 49 e ss. do PA, cujo teor se dá por reproduzido.

13. O curriculum vitae da autora organizava-se de acordo com as seguintes rubricas:
A. Dados biográficos
B. Unidade de Endoscopia
C. Actividades de organização
D. Actividade científica
E. Formação
F. Sociedades Científicas G. Actividade de investigação
- cf. doc. constante de fls. 69 e ss. do PA, cujo teor se dá por reproduzido.

14. Por documento datado de 25.06.2021, dirigido ao Presidente do Conselho de Administração do CH A..., o contra-interessado requereu “admissão para Recrutamento de Director de Serviço de Gastrenterologia (…) aberto pelo Aviso n.º ...21 (…)” – cf. fls. 9 do PA, cujo teor se dá por reproduzido.
15. Em anexo ao documento referido no ponto antecedente, o contrainteressado enviou “curriculum vitae” e “plano de gestão” – cf. fls. 10 e ss. do PA, cujo teor se dá por reproduzido.

16. O “plano de gestão” do contra-interessado organizava-se de acordo com as seguintes rubricas:
1. Introdução
2. Missão. Visão e Valores
3. Contexto
3.1 Nacional
3.2 Especialidade de Gastrenterologia
3.3 CH A...
3.4 0 Serviço de Gastrenterologia
3.4.1. Introdução
3.4.2 Estrutura Física
3.4.3 Recursos Humanos
3.4.4 Atividade Assistencial
3.4.5 Atividade Científica e Pedagógica
4. Análise SWOT
5. Formulação do Plano Estratégico
5.1 Introdução
5.2 Medidas Prioritárias
5.2.1 Organização Interna
5.2.2 Profissionais Especializados
5.3 Intervenção Sectorial
5.3.1 Atividade Assistencial
5.3.2 Atividade Científica
5.4 Equipamentos
5.5 Recursos Humanos
5.6 Articulação Intra-Hospitalar
5.7 Articulação com ACeS / USFs
5.8 Articulação Inter-Hospitalar
5.9 Qualidade
5. 10 Pandemia Covid-19
5. 10 Rastreio do Cancro Colorretal
6. Considerações Finais
7. Bibliografia
- cf. fls. 16 e ss. do PA, cujo teor se dá por reproduzido.

17. O curriculum vitae do contra-interessado organizava-se de acordo com as seguintes rubricas:
Experiência profissional;
Educação e formação;
Competências linguísticas;
Publicações;
Distinções e prémios;
Competências de organização;
Competências relacionadas com o trabalho;
Outras competências;
Publicações como segundo autor;
Apresentações em congressos/palestrante em reuniões científicas;
Apresentações/Reuniões multidisciplinares formativas com outros serviços.
- cf. fls. 37 e ss. do PA, cujo teor se dá por reproduzido.

18. No âmbito do procedimento identificado em “5”, em 12.07.2021 reuniu a comissão nomeada para análise das manifestações de interesse individual para o exercício do cargo de Director/a do Serviço de Gastroenterologia, lavrando-se acta com o seguinte teor:
“(…)
A comissão de análise nesta data foi constituída por:
Presidente Dr. CC
Vogais
Dr.ª DD
Dr. EE
A comissão de análise verificou a entrega de 2 candidaturas:
1. BB
2. AA
A Comissão de Análise confirmou que os documentos solicitados no Aviso de Abertura foram remetidos presencialmente pelos interessados, de acordo com as regras e os prazos estabelecidos.
A comissão de analise procedeu à apreciação conjunta dos Curriculum Vitae e Plano de Gestão com relatório (em anexo), elaborando o parecer (em anexo) à presente ata, que é remetido ao Conselho de Administração para efeitos de eventual nomeação, sob proposta da comissão oportunamente nomeada nesse sentido.
Por nada mais haver a tratar a reunião foi dada como concluída pelas 12:15h, sendo a ata assinada pelos elementos presentes.” – cf. fls. 81 e ss. do PA, cujo teor se dá por reproduzido.

19. Em anexo à acta referida no ponto anterior, a “Comissão de análise” do procedimento identificado em “5.” elaborou parecer com o seguinte teor:

[IMAGEM]

- cf. fls. 83 e ss. do PA, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

20. Na sequência da emissão do parecer referido no ponto antecedente, o Conselho de Administração do CH A... emitiu, em 14.07.2021, deliberação com o seguinte teor:

“Na sequência do processo de acolhimento de manifestação de interesse individual conducente ao recrutamento de Diretor/a do Serviço de Gastrenterologia do Centro Hospitalar A..., EPE., aberto pelo Aviso n.º ...21, no Diário da República, Série II, n.º 113/2021, de 14 de junho, e após parecer e recomendação elaborada pela Comissão de Análise nomeada para o efeito, o Conselho de Administração, o Conselho de Administração delibera nomear o Dr. BB, para o cargo de Diretor do Serviço de Gastrenterologia, em regime de Comissão de Serviço.” – cf. fls. 87 do PA, cujo teor se dá por reproduzido.

21. Por ofício de 26.07.2021, subscrito pelo Presidente do Conselho de Administração do CH A..., o contra-interessado foi informado de que havia sido indicado para o cargo de Director do Serviço de Gastroenterologia – cf. fls. 88 do PA, cujo teor se dá por reproduzido.

22. Por mensagem de correio electrónica datada de 13.08.2021, a requerente solicitou dos serviços do requerido “o acesso ao processo [de recrutamento de Director do Serviço de Gastroenterologia]” – cf. doc. 1 junto com o RI, cujo teor se dá por reproduzido.

23. Por requerimento de 16.08.2021, a requerente solicitou ao Presidente do Conselho de Administração do requerido a emissão de cópia de todos os documentos constantes do procedimento de recrutamento de Director do Serviço de Gastroenterologia do CH A... – cf. doc. 1 junto com o RI, cujo teor se dá por reproduzido.

24. No dia 23.08.2021 foram entregues em mão, à requerente, os elementos por si solicitados – cf. acordo [7.º RI e 44.º da oposição].

25. Em 24.09.2021 foi celebrado “protocolo de colaboração” entre o CH A..., o Centro Hospitalar B... (“CH B...”) e o contra-interessado, mediante o qual os três intervenientes acordaram que este último passaria a desempenhar as funções de Director do Serviço de Gastroenterologia, no CH A..., com suspensão do contrato de origem do contra-interessado com o “CH B...”, até que fosse obtida a competente autorização de mobilidade – cf. doc. junto com o requerimento de 09.11.2021, a fls. 285 e ss. do suporte físico dos autos.

26. Por comunicação interna datada de 30.09.2021, dirigida a “Todos utilizadores CH A...”, igualmente disponibilizada no sistema de “Intranet do CH A...”, foi divulgada informação com o seguinte teor:

“Na sequência do processo de acolhimento de manifestação de interesse individual conducente ao recrutamento de Diretor/a do Serviço de Gastrenterologia do CH A..., aberto pelo Aviso n.º ...21, no Diário da República, 2.ª Série, n.º 113, de 14 de junho, e após parecer e recomendação elaborada pela Comissão de Análise nomeada para o efeito, o Conselho de Administração, em reunião de 14 de julho de 2021, deliberou nomear o Sr. Dr. BB, para o exercício do cargo de Diretor do Serviço de Gastrenterologia do CH A..., em regime de Comissão de Serviço, com efeitos a 1 de Outubro de 2021.

Neste momento de mudança, o Conselho de Administração reconhece e agradece o trabalho desenvolvido pela Sra. Dra. AA, enquanto desempenhou as funções de Diretora do Serviço de Gastrenterologia, enaltecendo a sua dedicação e empenho.” – cf. doc. constante de fls. 94 e ss. do PA, cujo teor se dá por reproduzido.

27. Em 30.09.2021 foi celebrado entre o centro hospitalar requerido e o contra-interessado “Acordo de prestação de trabalho em Regime de Comissão de Serviço” – cf. fls. 96 e ss. do PA, cujo teor se dá por reproduzido.

28. Em 09.12.2020 havia sido elaborado pelo Conselho de Administração do CH A... novo “Regulamento Interno”, do qual consta, além do mais, o seguinte:

“Secção V
Direção e Chefia
Artigo 85º
Constituição e Nomeação de Direções
1. Sem prejuízo da observância dos Princípios da transparência e da igualdade de oportunidades, bem como do cumprimento dos demais procedimentos legais em vigor, compete ao Conselho de Administração a nomeação de colaboradores para o exercício de funções de direção, chefia e coordenação das estruturas intermédias de gestão previstas no presente Regulamento Interno.
2. Os titulares dos cargos de direção, chefia e coordenação podem ser livremente exonerados do exercício destas funções pelo Conselho de Administração, com fundamento em mera conveniência de serviço, no sentido de ser implementada uma nova dinâmica, por inobservância da Lei ou dos regulamentos, por não cumprimento das deliberações do Conselho de Administração ou por não cumprimento dos objetivos estabelecidos.
(…)
Artigo 87º
Competências do Diretor de Serviços da Área de Prestação de Cuidados Clínicos
1. Aos diretores dos serviços da área de prestação de cuidados clínicos, sem prejuízo das competências atribuídas a outros órgãos, compete planear e dirigir o serviço em articulação com a coordenação das unidades de gestão e o Conselho de Administração, sendo responsável pela correção e prontidão dos cuidados de saúde a prestar aos utentes, bem como pela utilização e eficiente aproveitamento dos recursos postos à sua disposição.
2. Compete, em especial, ao diretor de serviço:
a) Definir a organização da prestação de cuidados de saúde e emitir orientações, na observância das normas emitidas pelas entidades competentes;
b) Elaborar, nos termos definidos na alínea a) do n.º 1 do artigo 87.º, o relatório de atividades e o plano anual que integra a contratualização interna, bem assim como assegurar o seu adequado cumprimento, ouvida a direção de enfermagem;
c) Analisar mensalmente os desvios verificados face à atividade esperada e às verbas orçamentadas, corrigi-los ou, sendo necessário, propor medidas corretivas;
d) Assegurar a produtividade e eficiência dos cuidados de saúde prestados e proceder à sua monitorização e avaliação;
e) Promover a aplicação dos programas de controlo de qualidade e de produtividade, zelando por uma melhoria contínua de qualidade dos cuidados de saúde;
f) Garantir a organização e constante atualização dos processos clínicos, designadamente através da revisão das decisões de admissão e de alta, mantendo um sistema de codificação correto e atempado das altas clínicas;
g) Propor ao Diretor Clínico, quando necessário, a realização de auditorias clínicas;
h) Garantir a atualização das técnicas utilizadas, promovendo por si ou propondo aos órgãos competentes as iniciativas aconselháveis para a valorização, o aperfeiçoamento e a formação profissional do pessoal em serviço, e organizar e supervisionar todas as atividades de formação e investigação;
i) Tomar conhecimento e propor as medidas adequadas em resposta a reclamações apresentadas pelos utentes;
j) Assegurar a gestão adequada dos recursos humanos, incluindo a avaliação interna do desempenho global dos profissionais, zelar pelo cumprimento das obrigações laborais do pessoal do serviço;
k) Assegurar a observância das leis, dos regulamentos e das normas aplicáveis ao seu serviço, nomeadamente quanto à salvaguarda dos ativos, assim como o acompanhamento dos objetivos globais definidos;
l) Garantir o registo atempado e correto da contabilização dos atos clínicos e providenciar pela gestão dos bens e equipamentos do serviço;
m) Assegurar a gestão eficiente dos consumos, nomeadamente com medicamentos e material clínico, bem como dos gastos com pessoal correspondentes a abonos variáveis, nomeadamente com horas extraordinárias, prevenções, noites e subsídios de turnos;
n) Acompanhar as decisões da Comissão de Farmácia e Terapêutica relativamente às terapêuticas para a sua área clínica, podendo propor à Direção Clínica opções casuísticas.” – cf. doc. 4 junto com a oposição, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

29. O regulamento interno referido no ponto anterior foi homologado por despacho da senhora Ministra da Saúde datado de 09.06.2021 – cf. doc. 5 junto com a oposição, cujo teor se dá por reproduzido.


*

Os factos elencados foram dados como provados com base no acordo das partes, apurado mediante a posição por si assumida nos respectivos articulados (o qual relevou, em particular, para prova do facto elencado sob o n.º 24), bem como com base no teor dos documentos juntos aos autos, indicados por referência a cada concreto ponto da matéria.

No mais, a prova testemunhal produzida nos autos incidiu maioritariamente sobre matéria de facto irrelevante para a decisão jurídica da causa, debruçando-se a generalidade dos depoimentos prestados sobre o currículo e desempenho profissional dos candidatos, bem como às (melhores ou piores) condições de funcionamento do serviço de Gastroenterologia do centro hospitalar demandado. Como se verá, a avaliação do percurso profissional da autora e do contra-interessado, e bem assim dos respectivos méritos no que toca à organização e prestação do serviço, encontra-se fora do âmbito da apreciação jurisdicional a que incumbe proceder, razão por que nada há, neste âmbito, a transpor para o elenco.

Na parte relevante, a globalidade da prova testemunhal produzida, bem como as declarações prestadas pelas partes, tiveram apenas a virtualidade de reiterar a informação que já resultava de outros elementos de prova, designadamente documental – os quais, de resto, são especificamente referidos no tocante a cada concreto ponto de facto.

Nada mais se provou com relevo para a solução jurídica da causa.

2. Do Direito

2.1. Da alegada nulidade do acórdão recorrido por contradição entre a fundamentação e a decisão

O Recorrente CH A... assaca ao aresto em crise uma nulidade por contradição entre a fundamentação e a decisão, que identifica com a circunstância de a decisão ser de anulação da deliberação que nomeou o aqui contra-interessado, por violação do disposto no n.º 1 do artigo 17.º-A do Decreto-Lei n.º 176/2019, mas na fundamentação dessa decisão se ter considerado que não eram aplicáveis a este procedimento as regras do CPA.

Ora, a alegada contradição não existe, como de resto resulta evidente do excerto da decisão recorrida que passamos a transcrever: “(…) Não há qualquer contradição entre afastar as normas do CPA do processo de recrutamento em causa e dizer que do ato impugnado devem constar as razões explicativas da nomeação de um candidato em detrimento do outro (nem há qualquer contradição da decisão nos seus termos). De outra forma, não haveria, como supra se explica, como sindicar o cumprimento do disposto no n.º 2 do art. 28.º do DL 18/2017, norma que pretendeu, como também já se explicou, tornar a nomeação do diretor de serviço mais exigente, pese embora a sua contratação se regule basicamente pelo direito privado (…)”.

Como resulta expressamente do excerto que transcrevemos, a decisão recorrida sustenta a necessidade de uma fundamentação específica da escolha de um médico menos graduado na carreira, uma vez que é o próprio artigo 28.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 18/2017 que aponta como critério preferencial a “maior graduação na carreira médica”, sendo essa a razão pela qual se considera haver violação do dever legal expresso de fundamentação acrescida da decisão, mesmo que aquela não seja regulada pelo código do procedimento administrativo. O que a decisão concluiu é que não estamos perante um poder de escolha arbitrário, ou meramente assente na valia do curriculum e do plano de trabalho apresentados pelos interessados, pois a condição preferencial da graduação mais elevada na carreira médica impõe que a escolha seja legalmente conformada com o disposto no artigo 17.º-A do Decreto-Lei n.º 18/2017, o que não sucedeu, desde logo por falta de fundamentação a respeito da preterição do critério legalmente indicado como preferencial.

Assim, é expressa e manifestamente apresentada uma fundamentação coerente com a decisão. Pelo que improcede a alegada nulidade. Já o questionamento da correcção dos fundamentos apresentados é uma questão que consubstancia um motivo para a impugnação da decisão por erro de julgamento, mas que não é adequado a sustentar a referida nulidade.

2.2. Do alegado erro de julgamento

2.2.1. O Recorrente CH A... não se conforma com a decisão recorrida e imputa-lhe um vício de violação de lei, considerando que a mesma se apoia numa errada interpretação do direito aplicável ao caso. Mais concretamente, o Recorrente sustenta a sua tese nos seguintes argumentos: i) o TCAN erra quando considera que o artigo 17.º-A do Decreto-Lei n.º 176/2009 pode ser aplicado ao caso, uma vez que o mesmo tem de considerar-se revogado ou derrogado pelo teor do artigo 28.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 18/2017; ii) o aviso de abertura apenas referia que o recrutamento para o cargo se faria nos termos do artigo 28.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 18/2017 e não foi impugnado, tendo-se consolidado a interpretação segundo a qual apenas o artigo regularia os termos deste procedimento selectivo; iii) o disposto no artigo 28.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 18/2017 sempre haveria de prevalecer por ser uma norma de carácter especial e posterior ao artigo 17.º-A do Decreto-Lei n.º 176/2009; iv) a ratio da regra em vigor à data do procedimento de selecção em apreço era a de premiar competências de gestão e de liderança sobre competências técnicas e níveis habilitacionais, como o artigo 99.º do Decreto-Lei n.º 55/2022 viria depois a comprovar.

2.2.2. As Instâncias seguiram, quanto a este ponto, fundamentações distintas.

Para o TAF de Aveiro, o disposto no artigo 17.º-A do Decreto-Lei n.º 176/2009 é totalmente incompatível com o teor do 28.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 18/2017, pois o primeiro imporia que só um assistente graduado ou um assistente graduado sénior pudesse exercer cargos de chefia, e conclui pela exclusiva aplicação ao caso do regime do artigo 28.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 18/2017, para concluir que, neste caso, a escolha poderia recair sobre um assistente hospitalar, mas isso não afasta a invalidade do acto por insuficiência de fundamentação, uma vez que do mesmo não consta a ponderação e avaliação dos critérios preferenciais indicados no artigo 28.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 18/2017, ou seja, quanto à experiência de gestão e à (maior) graduação na carreira médica.

Já para o TCAN as duas normas antes mencionadas não são incompatíveis. Pelo contrário, da interpretação conjugada do artigo 17.º-A do Decreto-Lei n.º 176/2009 e do artigo 28.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 18/2017, resulta que “(…) o legislador pretendeu privatizar a contratação e agilizar o modo de recrutamento dos médicos ao serviço das E.P.E.s, mas não prescindiu das habilitações mínimas para o exercício de determinados cargos, mantendo para as E.P.E.s a mesma exigências que exige para as demais unidades de saúde do sector público. Assim, em ambos os casos, estabeleceu que os trabalhadores integrados na carreira médica só podem exercer funções de direcção, chefia ou coordenação de departamentos, serviços ou unidades funcionais do Serviço Nacional de Saúde, desde que sejam titulares das categorias de assistente graduado sénior ou, em casos devidamente fundamentados, de assistente graduado (…) a norma do n.º 2 do artigo 28º do DL 18/2007, de 10.02, que é de hierarquia igual à do n.º 1 do artigo 17º- A do Decreto-Lei n.º 176/99, de 04.08 (não havendo qualquer relação de especialidade entre elas), sendo aquela posterior a esta, não é, contrariamente ao que refere a sentença recorrida, com esta incompatível. Devendo conjugar-se o regime constante do n.º 2 do artigo 28º do Decreto-Lei 18/2017, de 10.02 com o do n.º 1 do artigo 17ºA do DL 176/2009, de 04.08, de tal forma que os trabalhadores integrados na carreira médica só podem exercer funções de direção (chefia ou coordenação de departamento), desde que sejam titulares das categorias de assistente graduado sénior ou, em casos devidamente fundamentados, de assistente graduado (cfr. n.º 1 do artigo 17ºA do DL 176/2009), e inscritos no colégio da especialidade da Ordem dos Médicos correspondente à área clínica onde vão desempenhar funções, devendo ser nomeados preferencialmente os que tenham evidência curricular de gestão e maior graduação na carreira médica (cfr. n.º 2 do artigo 28º do Decreto-Lei 18/2017, de 10.02)”. E por isso, para o TCAN, apenas a A. possuía a habilitação legal (assistente graduada sénior) necessária para o exercício do cargo de chefia.

2.2.3. E a interpretação sufragada pelo acórdão recorrido não merece censura. Efectivamente, são vários os argumentos que suportam a tese ali adoptada de que o disposto no artigo 28.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 18/2017 tem de ser interpretado em conjugação com o disposto no artigo 17.º-A do Decreto-Lei n.º 176/2009, ou seja, que o recrutamento ou selecção para o exercício de cargos de direcção (chefia ou coordenação de departamento) no âmbito da organização das instituições do SNS não é alheio ao regime das carreiras médicas e só pode fazer-se entre os titulares das categorias de assistente graduado sénior e de assistente graduado, uma vez que é o regime jurídico das carreiras médicas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 176/2009, que assim o dispõe expressamente.

E o fundamento não é apenas – como avança o TCAN – o de que o artigo 17.º-A do Decreto-Lei n.º 176/2009 assim o dispõe expressamente e essa norma está em vigor, pelo que se impõe retirar dela um conteúdo útil. A conclusão é também inevitável se atentarmos no conteúdo funcional das diferentes categorias da carreira médica. Um assistente hospitalar não dispõe de qualquer conteúdo funcional na área da gestão ou da coordenação, limita-se a: i) prestar cuidados de saúde; ii) recolher, registar, e efectuar tratamento e análise da informação relativa ao exercício das suas funções; iii) participar nas actividades de planeamento e programação do trabalho a executar pela unidade ou serviço; iv) participar em programas e projectos de investigação ou de intervenção; v) colaborar na formação de médicos em processo de especialização; vi) participar em júris de concurso ou noutras actividades de avaliação dentro da sua área de especialização ou competência – artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 176/2009. Já no caso do assistente graduado, para além das funções antes descritas, integra-se também no seu conteúdo funcional: i) planear e programar o trabalho a executar pela unidade ou serviço; ii) desenvolver atitudes e práticas de coordenação técnico-científica e de auto-aperfeiçoamento, que constituam modelo de referência para os médicos e outros profissionais da unidade ou serviço em que esteja integrado; iii) manter e promover actividades regulares de investigação e apresentar anualmente aos profissionais da unidade ou serviço em que esteja integrado relatório da actividade realizada – artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 176/2009. E no caso do assistente graduado sénior, às competências do assistente hospitalar e do assistente graduado, somam-se ainda as de: i) planear, programar e avaliar o trabalho da respectiva unidade, serviço ou departamento; ii) assumir a responsabilidade pelas actividades de formação e de desenvolvimento profissional contínuo dos médicos da sua unidade, serviço ou departamento ou das atribuições de formação médica da instituição, quando designado; iii) elaborar, promover ou apoiar a concretização de projectos de desenvolvimento técnico-científico, institucional, de qualidade e de inovação, que mobilizem e envolvam o conjunto da equipa profissional em que esteja integrado – artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 176/2009.

Em suma, da análise do conteúdo funcional das diferentes categorias da carreira médica resulta evidente que apenas as de assistente graduado e de assistente graduado sénior dispõem de competências funcionais adequadas ao exercício de cargos de direcção e chefia, como se prevê expressamente no artigo 17.º-A do Decreto-Lei n.º 176/2009.

Por isso, ao regular o procedimento de selecção para o exercício destes cargos no âmbito do regime jurídico da gestão dos hospitais E.P.E., o artigo 28.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 18/2017 impõe que a graduação na carreira médica seja um critério preferencial – leia-se, o assistente graduado sénior seja, em tese, mais apto ao exercício do cargo do que o assistente graduado – sem prejuízo de uma evidência curricular de gestão – por formação e experiência – poderem permitir sustentar um resultado diferente, ou seja, o de que num caso concreto um assistente graduado disponha de maior aptidão em concreto para exercer aquela função do que um assistente graduado sénior que com ele “concorra” para o exercício de um cargo de chefia. Mas, tal como bem interpreta o acórdão recorrido, o recrutamento há-de fazer-se de entre aqueles que são funcionalmente qualificados para o efeito de acordo com a lei, ou seja, de entre aqueles que, à luz do regime jurídico da carreira medida, podem exercer aquele tipo de funções, o que não é o caso dos assistentes hospitalares. A intenção de premiar a capacidade de gestão e liderança não põe em causa as condicionantes legais em que se há-de realizar o recrutamento e que engloba também o regime jurídico da carreira médica (artigo 27.º do Decreto-Lei n.º 18/2017).

Por isso, tem razão o acórdão recorrido quando, no julgamento deste caso concreto conclui o seguinte: “(…) [A]ssim sendo, fica evidente que entre os dois médicos que manifestaram interesse, apenas a Recorrente – assistente graduada sénior - dispõe da habilitação necessária para ser diretora de serviço, pois o contrainteressado é assistente hospitalar. A sentença recorrida padece de erro de julgamento por não ter considerado que o contrainteressado não se encontra habilitado com as condições de que depende a possibilidade de manifestação de interesse individual para o exercício do cargo de direção de serviço (…)”.

E esse é o regime jurídico que ainda hoje resulta da conjugação do artigo 17.º-A do Decreto-Lei n.º 176/2009, com o disposto no artigo 99.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 52/2022, de 4 de Agosto, que aprovou o Estatuto do SNS.

Acresce que, sendo uma exigência legal que os médicos sejam titulares das categorias de assistente graduado ou assistente graduado sénior para o exercício de funções de direcção e são sendo aquela exigência cumprida pela decisão que foi anulada pelo acórdão do TCAN, ficam prejudicados os argumentos respeitantes à alegada violação in casu dos princípios jurídicos que regem o exercício da actividade administrativa. Até porque, recorde-se, o acórdão recorrido concluiu pela anulação da deliberação impugnada nos autos por violação expressa do disposto no n.º 1 do artigo 17º-A do DL 176/2009 e não por falta de fundamentação.

III – Decisão

Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Administrativo em negar provimento ao recurso.
Custas pelo Recorrente.

Lisboa, 4 de Abril de 2024. - Suzana Maria Calvo Loureiro Tavares da Silva (relatora) - Cláudio Ramos Monteiro - Maria do Céu Dias Rosa das Neves.