Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:06775/13.0BCLSB
Data do Acordão:07/13/2022
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:JOSÉ GOMES CORREIA
Descritores:CONTENCIOSO ADUANEIRO
FAZENDAS DEMORADAS
ENCARGO DE EFEITO EQUIVALENTE
SANÇÃO PROCEDIMENTAL
CONTRA-ORDENAÇÃO ADUANEIRA
DIREITO COMUNITÁRIO
PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
Sumário:I - A percentagem ad valorem prevista no parágrafo 2º do artº 639º do Regulamento das Alfândegas não constitui um encargo de efeito equivalente, no sentido do actual artº 25º (ex artº 12) do Tratado da Comunidade Europeia, tendo, antes, natureza de sanção processual ou procedimental administrativa, tendente a assegurar o normal desenvolvimento do processo de desalfandegamento das mercadorias, ou de natureza compulsória, porventura idêntica à sanção pecuniária compulsória de direito civil - artº 829º - A do Cód. Civil.
II - Quer no direito comunitário, quer no direito interno, inexiste qualquer equivalência entre a percentagem em causa e as contra-ordenações fiscais aduaneiras, seja em razão dos respectivos elementos constitutivos, seja pelos especiais interesses ou valores jurídicos que lhes subjazem.
III - Qualquer que seja o ângulo jurídico porque seja olhada essa medida e os termos percentuais em que se desenvolve ela não ofende qualquer das dimensões em que se traduz o princípio da proporcionalidade.
IV - É que, num momento em que o fim das mercadorias é a sua venda pública, com a consequente perda para o respectivo dono, pode este desembaraçar a mercadoria pagando o quantitativo de valor pré-fixado na lei, dependendo o quantitativo a desembolsar de mera operação aritmética de acordo com o valor declarado das mercadorias.
V - Sendo a finalidade da medida a promoção do respeito dos prazos de desalfandegamento, é patente que os operadores económicos que incumpriram esses prazos verão as mercadorias ser vendidas, com o consequente prejuízo, podendo, no entanto, obviar a tal venda e prejuízo pagando além das despesas a referida percentagem, dependendo o valor da quantia a pagar do valor das próprias mercadorias, e a opção entre o seu pagamento ou não está na disponibilidade do respectivo dono, dependendo apenas da sua vontade em dispor das mercadorias, pois a Administração, feito o pedido de despacho, está obrigada a desembaraçar as mercadorias.
VI - Nesse conspecto, inexiste uma situação relativamente à qual possa afirmar-se que a estipulação da medida administrativa compulsória em causa seja intoleravelmente desproporcionada ou exorbitante e, por isso, seja constitucionalmente inadmissível.
Nº Convencional:JSTA000P29728
Nº do Documento:SA22022071306775/13
Data de Entrada:05/17/2021
Recorrente:PETRÓLEOS DE PORTUGAL – PETROGAL, S.A.
Recorrido 1:SECRETARIA DE ESTADO DOS ASSUNTOS FISCAIS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo


1. – Relatório

Vem interposto recurso jurisdicional por PETRÓLEOS DE PORTUGAL – PETROGAL, S.A., com os sinais dos autos, visando a revogação do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 16/12/2020, que julgou improcedente a acção administrativa especial intentada do despacho proferido pelo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, que indeferira o pedido de anulação do acto de liquidação de “Fazendas Demoradas”, no valor de 3.376.417,26 euros.

Inconformada, nas suas alegações, formulou a recorrente Petróleos de Portugal – Petrogal, S.A., as seguintes conclusões:

1. O Tribunal recorrido não se pronunciou sobre matéria constante da petição inicial da aqui Recorrente (designadamente a que está vertida nos arts. 122, 123 e 124), matéria essa que, atenta a sua relevância, era absolutamente decisiva para o desfecho do mérito da ação.
2. O Tribunal recorrido não podia deixar de se pronunciar sobre tal matéria e, tendo-o feito, o Acórdão recorrido deverá ser declarado nulo ao abrigo do disposto no art. 615.º, n.º 1, al. d), do CPC por omissão de pronúncia.
Sem prescindir,
3. O Tribunal recorrido errou manifestamente na qualificação jurídica dos factos carreados para os autos e na aplicação do direito concretamente pertinente, com isso permitindo que se mantenha em vigor na ordem jurídica o ato praticado pelo Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que confirmou o ato de liquidação de Fazendas Demoradas emitido pela Delegação Aduaneira de Sines, posteriormente confirmado pelo Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.
4. Tal ato deve ter-se por ilegal por violação de lei, designadamente o art. 639.º, n.º 2, do RA, já que não foram observados os requisitos aí prescritos no que à venda das mercadorias em hasta pública diz respeito.
5. De facto, em observância do disposto no preceito em vigor à data dos factos, deveriam as autoridades aduaneiras ter levado a cabo os atos necessários ao procedimento de venda em hasta pública. Não o tendo feito em momento algum, não se pode considerar verificado o pressuposto legal essencial que legitimava a Administração a aplicar a sanção por Fazendas Demoradas.
6. O Acórdão recorrido desconsidera gravemente a omissão deste requisito procedimental legalmente prescrito ao aceitar que tenha sido imediatamente instaurado o procedimento de liquidação de Fazendas Demoradas pela mera ultrapassagem do prazo de 45 dias para atribuição de um destino aduaneiro (previsto no art. 49.º do CAC).
7. Por outro lado, ainda, pecou o Tribunal recorrido quando acolheu o entendimento segundo o qual a alfândega terá considerado que a venda das mercadorias não era do interesse da Recorrente. Em nenhuma parte da lei decorre que possam as autoridades aduaneiras formular esse tipo de juízo, cabendo o mesmo, só e apenas, ao importador das mercadorias.
8. Consequentemente, deverá considerar-se que o Tribunal recorrido violou a norma constante do art. 639.º, n.º 2, do RA, sendo o ato impugnado inválido, devendo, nessa medida, ser anulado nos termos gerais do CPA.
9. Mas, ainda que assim não se entenda, há que ter presente que uma parte significativa da mercadoria importada (cerca de 71%), que foi utilizada pela Recorrente nos seus circuitos produtivos ainda antes de ter terminado o mencionado prazo de 45 dias, não poderia, objetivamente, ser sujeita a um procedimento de venda em hasta pública. A referida parte das mercadorias, pela sobredita razão, não tinha, sequer, o estatuto de “demorada”.
10. O mesmo é dizer, portanto, que o ato de liquidação, a ser admissível, apenas poderia ter incidido sobre a restante parte de mercadoria não utilizada pela Recorrente (os restantes 29%), a qual, de facto, ainda permanecia em situação de depósito temporário para além dos 45 dias de prazo para atribuição de um destino aduaneiro.
11. Nestes termos, não podia o ato impugnado (nem o Tribunal recorrido) sujeitar a taxa de 5% do valor das mercadorias à totalidade do produto importado, já que a causa que fundamenta essa aplicação não encontrava verificada.
12. Ainda no que concerne à parte de mercadoria utilizada pela Recorrente durante o período de 45 dias em que lhe devia ter sido atribuído um destino aduaneiro, cumpre notar que a mesma foi objeto de punição contraordenacional por uma infração de descaminho, justamente por a ter retirado do depósito em que se encontrava para a incluir nos seus processos produtivos.
13. Ora, estranha-se que o Tribunal recorrido, pese embora conhecendo os factos que determinaram aquela punição, tenha persistido em afirmar que as autoridades aduaneiras estavam obrigadas a aplicar a taxa de 5% sobre o valor das mercadorias que excedessem o prazo de depósito temporário.
14. A questão que se coloca é, então, a de saber como pôde o Tribunal recorrido atestar o carácter vinculativo da aplicação da mencionada taxa para as mercadorias que tenham permanecido em depósito temporário para além do prazo legalmente previsto, quando sabia que, in casu, uma significativa parte do produto importado (os referidos (71%)) tinha já saído da situação de depósito temporário (ainda que por via do cometimento de uma infração).
15. Não se podendo aceitar tamanha incongruência de pensamento, verifica-se que o Acórdão recorrido falhou quando concluiu pela violação do prazo de depósito temporário enquanto motivo que legitimava as autoridades aduaneiras a proceder à liquidação de Fazendas Demoradas tendo por base a totalidade das mercadorias.
16. Assim, deve tal aresto ser revogado, com a consequente anulação do ato praticado pelo Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que confirmou o ato liquidação, por violação ostensiva do disposto no art. 639.º, n.º 2, do RA.
17. Para além disso, o Tribunal recorrido demonstra confundir os conceitos de “prazo de armazenagem” e “prazo para atribuição de um destino aduaneiro”, não levando a cabo o desejado e necessário exercício de interpretação atualista dos mesmos.
18. E tal circunstância conduziu a que tivesse cometido um clamoroso erro de julgamento.
19. Ao tempo da entrada em vigor do RA, na longínqua década de 40 do século passado, fazia sentido falar-se em “prazo de armazenagem” das mercadorias, já que estas, chegadas ao território aduaneiro nacional, eram depositadas nas instalações das alfândegas, ficando sob sua custódia, e aí permaneciam enquanto os seus importadores cumpriam as formalidades necessárias ao seu desembaraço aduaneiro.
20. Esta realidade alfandegária foi-se alterando ao longo do tempo, sobretudo em face da circunstância de as alfândegas e delegações aduaneiras não terem capacidade de gestão dos seus próprios espaços.
21. Nesse quadro, o legislador introduziu as mencionadas “Fazendas Demoradas”, de natureza pecuniária compulsória, assim compelindo os importadores a diligenciar pelo cumprimento dos procedimentos aptos a libertarem as mercadorias da fiscalização aduaneira.
22. A ratio subjacente a esta sanção compulsória era mesmo a de punir os operadores económicos retardatários pela ocupação demorada dos espaços detidos pelas alfândegas e estâncias aduaneiras,
23. E não pela não atribuição, às mesmas, de um destino aduaneiro. A punição por tal conduta efetivava-se (e continua a efetivar) por via da instauração de procedimentos contraordenacionais.
24. Com o reconhecimento expresso, por parte do legislador, da incapacidade do Estado em assumir o armazenamento físico de todas as mercadorias de importação, foi-se abrindo concomitantemente à iniciativa privada a possibilidade de os importadores constituírem locais destinados a receber aqueles bens.
25. E este é o caso dos presentes autos: a Recorrente recebeu as mercadorias que importou diretamente nas suas próprias instalações, as quais, conforme se disse, estão aprovadas pelas autoridades aduaneiras como Entreposto Fiscal.
26. Significa isto que a mercadoria importada pela Recorrente em momento algum fora descarregada em armazéns ou depósitos cuja titularidade pertencesse às autoridades aduaneiras, situação que, porventura, legitimava a liquidação de Fazendas Demoradas pelo decurso do prazo de armazenagem.
27. Ora, esta alteração de paradigma na dinâmica alfandegária levou a que a tónica da questão se tenha passado a situar ao nível do “prazo para atribuição de um destino aduaneiro” em detrimento do “prazo de armazenagem”.
28. E estando em causa a violação de tal prazo (de 45 dias), a consequência seria aquela que vem prevista no art. 53.º, n.º 1, do CAC, onde se refere que, nesse tipo de cenário, “as autoridades aduaneiras tomarão imediatamente todas as medidas necessárias, incluindo a venda das mercadorias, para regularizar a situação tributária das mercadorias em relação às quais o cumprimento das formalidades destinadas à atribuição de um destino aduaneiro não tenha sido iniciado nos prazos fixados nos termos do art. 49”. (destacados nossos).
29. O Tribunal recorrido, ao não fazer uma interpretação atualista das normas que serviram de fundamento legal a esta liquidação, acabou por não tomar em devida nota a alteração profunda sofrida pelas atividades aduaneiras ao longo dos anos e tal circunstância levou a que tivesse ignorado a diferença entre “prazo de armazenagem” e “prazo para atribuição de destino aduaneiro” mas, sobretudo, as respetivas consequências dessa delimitação.
30. Tratando-se, em bom rigor, da violação de um prazo de atribuição de um destino aduaneiro, seria expectável que as autoridades aduaneiras, aliás, em estrita observância pelo disposto no art. 53.º do CAC, tivessem tomado as diligências necessárias à regularização da situação tributária das mercadorias (aqui se incluindo, como se viu, a venda das mesmas).
31. Ora, como atrás foi referido, nada disto sucedeu e as autoridades aduaneiras liquidaram as Fazendas Demoradas sem a prévia observância dos trâmites procedimentais tendo em vista tal desiderato, o que constitui, salvo melhor entendimento, um intolerável atropelo do princípio da Boa-Fé.
32. Nestes termos, a liquidação de Fazendas Demoradas aqui posta em crise tem por fundamento legal normas cuja interpretação deve ser efetuada com referência ao atual enquadramento jurídico-aduaneiro desta matéria e, ainda, deve ser pautada por critérios de natureza teleológica e inserção sistemática.
33. A Delegação Aduaneira de Sines, o Senhor Secretário de Estado e o Tribunal recorrido não efetuaram tal juízo interpretativo,
34. Devendo este Supremo Tribunal desaplicar os arts. 638.º e 639.º do RA, considerando o ato impugnado ilegal por ofensa grosseira do princípio da Boa-Fé a que a Administração está adstrita nos termos do disposto no art. 6.º-A do CPA e art. 266.º, n.º 2, da CRP.
35. O artigo 53º do CAC, sem prejuízo de fixar às autoridades aduaneiras o dever de regularização, confere igualmente uma razoável margem de manobra com vista à prossecução desse fim ou seja, confere margem de discricionariedade ou de livre apreciação para decidir qual das medidas a adotar.
36. A discricionariedade constitui uma opção clara do legislador de atribuir uma maior ou menor margem de liberdade de decisão à Administração, por entender que esta é a melhor forma de prosseguir os interesses públicos que àquela estão confiados.
37. O princípio do primado do direito da União Europeia impõe que o direito da União deve prevalecer sobre o direito nacional conflituante.
38. Por outro lado, porque decorre do princípio da aplicabilidade direta do direito da União que a administração pública dos Estados-membros, nomeadamente a portuguesa, aplique diretamente normas de direito da União Europeia.
39. Ora, o disposto no artigo 53º do CAC é uma norma de direito da União que beneficia de aplicabilidade direta, pois não só a norma é integrante de um regulamento comunitário, tipicamente beneficiário do princípio da aplicabilidade direta, como o seu próprio texto esclarece que não necessita de qualquer intermediação legislativa (transposição), pois expressa um comando direto às autoridades nacionais (no caso, as alfândegas).
40. Acresce que o Código Aduaneiro Comunitário é lei posterior (1992) ao Regulamento das Alfândegas e à redação das normas em causa (1988), pelo que de forma alguma se poderia alegar que o legislador nacional pretendeu restringir a margem de apreciação estabelecida pelo legislador comunitário.
41. Nessa medida, pese embora o Regulamento das Alfândegas preveja uma solução específica para a situação de facto abrangida pelo âmbito da norma (a sujeição a venda das mercadorias demoradas), daí não pode decorrer, sob pena de manifesta violação dos princípios comunitários acima enunciados, o esvaziamento da margem de discricionariedade concedida pelo legislador comunitário às alfândegas.
42. As normas em causa do Regulamento das Alfândegas são normas “abertas”, possibilitando uma adequação da tramitação às exigências postas pelo caso decidendo.
43. Subsistência a margem de discricionariedade da Alfândega atribuída pelo artigo 53º do CAC, fácil é concluir que o ato impugnado não se mostra conforme ao princípio da proporcionalidade
44. Uma vez que “ao abrigo do direito da União (e do primado deste face aos ordenamentos jurídicos nacionais) a Delegação Aduaneira de Sines poderia (e deveria) ter optado por outras medidas que melhor integrassem o momento da justiça nesta relação com a Petrogal. Na verdade, entre os meios postos à disposição das autoridades aduaneiras, embora não especificados, poderia a administração ter optado por meios menos custosos para a realização do fim em causa - a regularização da situação das mercadorias -, como por exemplo, nos termos gerais, um convite a que, num curto lapso de temporal, a Petrogal sanasse a irregularidade em questão”. (negrito nosso).
45. Nestes termos, conforme também confirma o Parecer indicado, o ato impugnado é ilegal, por vício de violação de lei, devendo este Supremo Tribunal revogar o Acórdão recorrido e determinar a sua anulação, nos termos gerais.
46. Por outro lado, a aplicação de Fazendas Demoradas, previstas nos arts. 638.º e 639.º do RA, devem ser qualificadas, de um ponto de vista substantivo, como sanção de natureza contraordenacional.
47. E não como sanção pecuniária compulsória típica de direito privado, em que se pune o incumprimento de uma prestação de facto infungível mediante a imposição de uma quantia pecuniária por cada dia de atraso no cumprimento.
48. O Estado tem ao seu dispor mecanismos suficientemente eficazes para coligir os administrados à adoção dos comportamentos que sejam conformes ao cumprimento da lei (é o que se passada, nomeadamente, com o Direito de Ordenação Social).
49. No caso em apreço, os referidos preceitos do RA têm em vista reprimir condutas ilícitas que sejam violadoras do interesse público do Estado (isto é, o desalfandegamento célere das mercadorias objeto de importação), e não a intenção de penalizar o agente por cada dia de atraso no cumprimento da obrigação que sobre ele recai.
50. E, mesmo que se aceite que as Fazendas Demoradas consubstanciem uma sanção pecuniária compulsória – o que apenas se concede por mera cautela de patrocínio – sempre se pode dizer que as circunstâncias que, in casu, ditam a sua aplicação não se verificam, já que as mercadorias importadas nunca foram armazenadas em depósitos ou instalações detidas pelas autoridades aduaneiras. O pressuposto histórico que pressupunha a aplicação daquelas medidas nunca existiu no caso em apreço.
51. Assim sendo, a norma legal que fundamentou a sua aplicação ao caso vertente ofende grosseiramente os princípios da proporcionalidade e da igualdade, consagrados nos arts. 18.º, n.º 2 e 13.º da CRP.
52. Isto porque, na verdade, aquelas medidas não são graduáveis nem determinadas em consonância com a gravidade concreta da infração, impedindo a Administração de levar em consideração o grau de ilicitude do facto, a gravidade das respetivas consequências ou a gravidade de violação dos deveres que são impostos ao agente,
53. O que conduz, na prática, a que seja concedido um tratamento igual a situações que sejam objetivamente diferentes, mediante a aplicação de coimas sem que o seu valor dependa de uma premissa básica do direito punitivo: a gravidade da contraordenação deve ser proporcional à gravidade da infração.
54. Nestes termos, o ato impugnado está assente em norma (art. 639.º, n.º 2, do RA) que viola ostensivamente os princípios da proporcionalidade, proibição do excesso e igualdade (arts. 18.º, n.º 2 e 13.º da CRP).
55. Acresce, também, que a questão da conformidade constitucional não deve restringir-se ao disposto no n.º 2 do artigo 639º do Regulamento – que fixa uma consequência secundária: a possibilidade de despacho findo o prazo máximo fixado mediante pagamento de 5% do valor das mercadorias – mas também ao disposto no n.º 1 do artigo 638º do mesmo Regulamento, que fixa a consequência primária para o não cumprimento do prazo para despachar as mercadorias por parte do importador-proprietário.
56. Com efeito, as duas normas devem ser vistas e apreciadas conjugadamente pois definem e regem o processo que o legislador quis fixar para a situação de ser ultrapassado um determinado prazo que o importador dispõe para praticar um ato que a lei lhe impõe: a apresentação de declaração aduaneira que atribua um destino aduaneiro às mercadorias que se encontrem em depósitos de regime aduaneiro ou de regime livre. São todas as consequências que o legislador previu, a forma como previu e a sua articulação que devem sujeitar-se ao teste de conformidade com a Constituição e não apenas a consequência secundária, que isoladamente considerada poderá conduzir a resultados enviesados.
57. Atualmente, o princípio do Estado de direito constitucional e abrange os seguintes subprincípios com interesse: i) os princípios da universalidade e igualdade dos direitos fundamentais (CRP, artigo 12º e 13º); ii) os princípios da necessidade e da proporcionalidade na restrição de direitos fundamentais (CRP, artigo 18º);
58. Entre as “declinações” do princípio do Estado de direito desenvolvidas pela doutrina e pela jurisprudência constitucional avulta o princípio da proibição do excesso, tornando ilegítimas as normas que afetem substancialmente direitos subjetivos ou interesses legalmente protegidos.
59. Nos termos do artigo 18.º da CRP, as limitações e restrições eventualmente estabelecidas para os direitos, liberdades e garantias e direitos equiparados terão de passar os testes da necessidade e da proporcionalidade e de respeitar a conteúdo essencial do direito fundamental em causa, não podendo traduzir-se na aniquilação do direito.
a. Da inconstitucionalidade “condicionada” do artigo 638º do Regulamento das Alfândegas por violação do artigo 18º da CRP.
60. Tratando-se de uma ação de impugnação de ato administrativo, atentos os poderes reforçados de cognição dos tribunais superiores em sede de recurso, e ainda o disposto do no artigo 95º, n.º 3 do CPTA, cabendo ao Tribunal de recurso proferir uma decisão de mérito sobre a causa, “nada parece obstar a que se pronuncie sobre novos vícios do ato administrativo” (Cfr. Mário Aroso de Almeida, Fernandes Cadilhe, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 4ª edição, p. 1134.)
61. Analisado o teor do artigo 638º do RA e considerando isoladamente a perda da propriedade do seu titular, por sujeição ao regime de venda (ou seja, sem considerar a possibilidade que é facultada pelo n.º 1 do artigo 639º do Regulamento) rapidamente se concluirá pela ofensa injustificada do núcleo essencial do direito de propriedade privada (constitucionalmente consagrada no artigo 62º da CRP).
62. A admitir-se assim, tratar-se-ia de um verdadeiro confisco de bens privados por via de norma geral, sem decisão administrativa e sem audição dos interessados (violação do direito procedimental de audição prévia).
63. É unânime a doutrina e a jurisprudência, no sentido de que o direito à propriedade privada goza do regime jurídico-constitucional dos direitos, liberdades e garantias, estabelecido designadamente no art. 18º da CRP, por se tratar de direito fundamental análogo, nos termos do art. 17º, consideração que advém do facto de se tratar igualmente de direito essencialmente negativo ou de defesa.
64. Uma medida tão restritiva de direitos, liberdades e garantias não tem qualquer respaldo noutro direito fundamental que o Estado necessitasse de assegurar, pois parece claro que o seu interesse visa tão somente “promover o normal desenvolvimento do processo de desalfandegamento das mercadorias”, como assegura o Acórdão a quo, socorrendo-se por sua vez do Acórdão do Pleno do STA (secção de contencioso tributário, de 24.9.2003).
65. Por outro lado, não parece existirem dúvidas que afeta o núcleo essencial do direito, pois determina a perda da propriedade por parte do titular que caia na alçada da norma.
66. Por fim, viola claramente o princípio da proporcionalidade na vertente da proibição do excesso, pois não se encontra qualquer justificação para a radicalidade da medida, face aos interesses em causa, e facilmente se encontram alternativas para alcançar o mesmo fim com medidas menos gravosas.
67. Assim perspetivada, trata-se claramente de uma norma que comprime e viola de forma abusiva o direito à propriedade privada, em violação do artigo 18º e 62º da CRP e, por isso, inconstitucional.
b. Da inconstitucionalidade do n.º 2 do artigo 639º do Regulamento das Alfândegas por violação do princípio da proporcionalidade.
68. É inevitável concluir que o Acórdão recorrido parte de uma premissa errada: a de que a venda das mercadorias como consequência do não cumprimento do prazo – isoladamente considerada – é uma medida constitucionalmente admissível.
69. Só assim se justifica que a conformidade com o princípio da proporcionalidade da obrigação de pagar 5% sobre o valor das mercadorias para evitar a sua venda encontre a sua justificação – à luz do Acórdão recorrido e do Tribunal Constitucional – precisamente na ideia de que se trata de uma alternativa a uma consequência já verificada e pior!
70. Se a única razão para considerar conforme ao princípio da proporcionalidade o pagamento de 5% é o facto de tal ser uma alternativa à perda das mercadorias e se a perda das mercadorias (sem possibilidade de a evitar pelo pagamento) viola a Constituição, então a conclusão é ambas as normas que corporizam este sistema (perda vs. pagamento), enquanto normas restritivas de direito análogo a direitos, liberdades e garantias, são inconstitucionais por violação do princípio do Estado de Direito, nos subprincípios da proporcionalidade e proibição do excesso, por violação do núcleo essencial do direito à propriedade privada (cfr. artigo 2º, 18º e 62º da CRP.
71. Importa ver apreciada a conformidade com o princípio da proporcionalidade da aplicação efetiva da percentagem de 5% do valor das mercadorias e a irrefutável possibilidade dessa aplicação resultar um valor manifestamente excessivo e desproporcionado, porque, na realidade, não há limite para o valor dessa coima, na medida em que ela depende apenas do valor da própria mercadoria.
72. É altamente questionável o método de cálculo utilizado pelo legislador para determinar quanto deve o importador pagar para evitar a vendas das mercadorias – uma percentagem do valor das mesmas -, sendo que a validade de tal estipulação não pode ser desligada do resultado concreto da sua aplicação.
73. Se pode não transgredir os ditames da proporcionalidade o pagamento de 5% do valor de mercadorias cujo preço seja 500 euros, seguramente choca, indigna e revolta qualquer consciência que o importador, para obviar à venda dos seus bens, tenha de pagar ao Estado 3.376.417,26 Euros (como sucede no caso em apreço), apenas porque sim.
74. É por isso que, mesmo que se aceite, de um ponto de vista constitucional, que este pagamento corresponde a uma medida administrativa de natureza compulsória, cuja finalidade é a de promover o respeito dos prazos de desalfandegamento de mercadorias por parte dos operadores económicos (cfr. Ac. 414/99, do TC), o certo é que a mesma só poderia resistir à exigência da adequação se a lei impusesse algum limite à sua fixação concreta.
75. Não necessariamente em virtude de qualquer manifestação de um princípio da equivalência – como sucede nas taxas – mas como imposição do princípio da proibição do excesso.
76. Nessa medida, o disposto nos art. 638.º e 639.º, n.º 2, do RA, interpretados nos termos em que o faz o Tribunal recorrido, é inconstitucional por violação do princípio do Estado de Direito, nos subprincípios da proporcionalidade e proibição do excesso.
c. Da inconstitucionalidade do n.º 2 do artigo 639º do Regulamento das Alfândegas por violação do princípio da igualdade.
77. A fixação de uma taxa fixa sobre o valor das mercadorias conduzirá à imposição de montantes muito díspares entre importadores que se encontrem na mesma situação, sem que exista propriamente uma razão justificativa para tratar de forma diferente situações que são objetivamente iguais.
78. Desde a sua origem, que o princípio do Estado de direito exige que todos os cidadãos sejam igualmente tratados perante a lei, o que não significa que o princípio da igualdade não possa exigir que situações diferentes sejam tratadas de forma diferente, como único comando possível para alcançar uma igualdade efetiva e real.
79. Conforme estavelmente resulta da jurisprudência do Tribunal Constitucional, serão “censuradas, com fundamento em lesão do princípio da igualdade, as escolhas de regime feitas pelo legislador ordinário naqueles casos em que se prove que delas resultam diferenças de tratamento entre as pessoas que não encontrem justificação em fundamentos razoáveis, percetíveis ou inteligíveis, tendo em conta os fins constitucionais que, com a medida da diferença, se prosseguem” – cfr. Acórdão n.º 47/2010.
80. Ora, se a finalidade é comum – conforme admite a jurisprudência dos tribunais superiores e do Tribunal Constitucional -, ou seja, é o mero respeito dos prazos de desalfandegamento de mercadorias, nada justifica a imposição de medidas desiguais.
81. Pelo menos no que respeita à ausência de um limite máximo para a medida em causa, a norma viola igualmente o princípio da igualdade a que o legislador está constitucionalmente vinculado nos termos do artigo 2º e 13º da CRP.
82. Tratando-se de norma inconstitucional, deverá este Supremo Tribunal recusar a sua aplicação e anular o ato impugnado enquanto ilegal de aplicação de norma inconstitucional, conforme lhe compete nos termos dos arts. 204.º da CRP e art. 1.º, n.º 2, do ETAF.
83. Para além disso, o ato impugnado é também ilegal porque viola o art. 53.º, n.º 1, em articulação com o art. 49.º, n.º 1, al. c), ambos do CAC, quando interpretados à luz do artigo VIII, n.º 1, al. a) e n.º 3 do acordo do GATT.
84. Ora, decorre do mencionado artigo VIII, n.º 1, al. a) e n.º 3 do acordo do GATT que as taxas e imposições (independentemente da sua natureza) que sejam cobradas sobre a importação ou exportação devem ser limitadas ao custo associado dos serviços prestados.
85. Os preceitos comunitários convocados para estes autos (nomeadamente os arts. 49.º, n.º 1, al. c) e 53.º, n.º 1, do CAC), devem ser interpretados e aplicados em conformidade com as normas internacionais que o Estado português ratificou (em especial, para o caso em presença, as que constam do acordo do GATT.
86. Efetuando-se esse exercício interpretativo, rapidamente se constata que o regime das Fazendas Demoradas em vigor na ordem jurídica portuguesa (ao abrigo da qual é automaticamente aplicada uma taxa ad valorem de 5% sobre o valor das mercadorias por incumprimento do prazo de 45 dias para a entrega da declaração aduaneira) é manifestamente desconforme com o referido preceito do acordo do GATT,
87. Já que constitui uma penalidade tributária severa (superior a três milhões de euros) por uma omissão de quatro dias no cumprimento de uma obrigação/formalidade meramente declarativa (a apresentação de uma declaração aduaneira que atribuísse às mercadorias importadas um concreto destino aduaneiro).
88. Esta penalidade (taxa ou imposição nos termos do artigo VIII, n.º 1, al. a) e n.º 3 do acordo do GATT), não é, evidentemente, “limitada ao custo aproximado dos serviços prestados”, até porque, conforme amplamente se referiu, nunca as autoridades aduaneiras prestaram qualquer serviço à aqui Recorrente no âmbito desta operação de importação.
89. E mesmo que o tivesse feito, sempre o teria sido por um curtíssimo período de tempo (4 dias).
90. A não atribuição de um destino aduaneiro às mercadorias constitui, nos termos do VIII do acordo do GATT, uma infração ligeira a uma formalidade aduaneira, ou, por outras palavras, uma “omissão ou erro facilmente reparável e manifestamente isento de qualquer intenção fraudulenta” que não se compadece com a punição concretamente aplicada pelas autoridades aduaneiras, mas que poderia conduzir, quanto muito, à aplicação de uma sanção pecuniária que constitua “um simples aviso”.
91. As autoridades aduaneiras, com a anuência do Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais e posterior confirmação do Tribunal recorrido, optaram antes pela aplicação de uma sanção pecuniária totalmente desproporcionada e ostensivamente excessiva sem qualquer paralelo no ordenamento jurídico nacional e no ordenamento jurídico de outros Estados-Membros.
92. Nessa medida, também por este motivo, o ato impugnado viola, de forma intolerável, os princípios da proporcionalidade, adequação e necessidade, razão pela qual deverá ser anulado por violação de lei (arts. 49.º, n.º 1, al. a) e 53.º, n.º 1, ambos do CAC, quando interpretados à luz do art. VIII, n.º 1, al. a) e n.º 3, do acordo do GATT) e da própria Constituição da República Portuguesa (art. 18.º, n.º 2, da CRP).
93. Por fim, sempre se dirá que o ato impugnado é ilegal por se fundamenta em normas nacionais desconformes com o Direito da União Europeia (arts. 17.º, 41.º, n.º 2, al. a) e 52.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia – “CDFUE”) e com a própria CRP.
94. O direito de audição e participação que assiste à aqui Recorrente, previsto expressamente pelo art. 41.º, n.º 2, al. a) da CDFUE e pelo art. 267.º, n.º 5, da CRP, não foi observado pelas autoridades aduaneiras quando, automaticamente e sem nota prévia, consideraram “demoradas” as mercadorias importadas.
95. Para além disso, as normas legais a que as autoridades aduaneiras recorreram para efeitos daquela liquidação, conduzem, igualmente, a uma forte compressão do direito de propriedade (em lime, à sua perda), amplamente reconhecidos pelos arts. 17.º da CDFUE e 62.º da CRP.
96. Também por este motivo deverá este Supremo Tribunal proceder à desaplicação das normas em causa, por violação das disposições dos artigos 17º, 41º, n.º 2, alínea a) e 52º, da CDFUE, bem como dos arts. 62º e 267º, n.º 5, da CRP, e proceder à anulação do ato impugnado, nos termos gerais.
Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve o presente Recurso ser julgado procedente, revogando-se, em consequência, o Acórdão recorrido por um outro que:
a. declare a nulidade do mesmo por vício de omissão de pronúncia (art. 615.º, n.º 1, al. d) do CPC;
b. julgue ilegal o ato praticado pelo Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que confirmou a liquidação de Fazendas Demoradas, por vício de violação de lei (art. 639.º, n.º 2, do RA), conducente à sua anulação nos termos gerais do CPA;
c. julgue ilegal o ato praticado pelo Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que confirmou a liquidação de Fazendas Demoradas, por ofensa do princípio da Boa-Fé a que a Administração está adstrita nos termos do art. 6.º-A do CPA e 266.º, n.º 2, da CRP;
d. julgue ilegal o ato praticado pelo Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que confirmou a liquidação de Fazendas Demoradas, por violação do princípio da proporcionalidade previsto no art. 266.º, n.º 2, da CRP e no art. 5.º do CPA;
e. julgue ilegal o ato praticado pelo Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que confirmou a liquidação de Fazendas Demoradas, por estar assente em norma inconstitucional que viola os princípios da proibição do excesso, igualdade e proporcionalidade, previstos nos arts. 266.º, n.º 2, 18.º, n.º 2 e 13.º da CRP;
f. julgue ilegal o ato praticado pelo Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que confirmou a liquidação de Fazendas Demoradas, por estar assente em normas inconstitucionais (arts. 638.º e 639.º do RA) – lei restritiva de Direitos, Liberdades e Garantias (ou direitos análogos), em violação do disposto no art. 18.º da CRP e, ainda, em violação do princípio do Estado de Direito, nos subprincípios da proporcionalidade, proibição do excesso e igualdade;
g. julgue ilegal o ato praticado pelo Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que confirmou a liquidação de Fazendas Demoradas, por violação de lei (art. 53.º, n.º 1 em articulação com o art. 49.º, n.º 1, al. a), ambos do CAC, interpretados à luz do artigo VIII, n.º 1, al. a) e do acordo do GATT;
h. julgue ilegal o ato praticado pelo Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que confirmou a liquidação de Fazendas Demoradas, por manifesta desconformidade das normas que a fundamentaram em face do Direito da União Europeia (em particular, arts. 17.º, 41.º, n.º 2, al. a) e 52.º da CDFUE) e da própria CRP (arts. 267.º, n.º 5 e 62.º).
TUDO COM AS DEMAIS CONSEQUÊNCIAS LEGALMENTE PREVISTAS.
ASSIM SE FAZENDO JUSTIÇA!
SE ASSIM NÃO ENTENDER,
Requer-se, subsidiariamente, a submissão, por parte deste Supremo Tribunal Administrativo, das questões abaixo transcritas, ao Tribunal de Justiça da União Europeia, através do sistema de reenvio prejudicial de interpretação, previsto no artigo 267.º do TFUE:
1) O artigo 267.º do TFUE, deve ser interpretado no sentido de que o Tribunal de Justiça da União Europeia tem competência para interpretar o artigo VIII, n.º 1, alínea a) e n.º 3 do GATT, o qual é parte integrante do Acordo relativo à OMC, que foi aprovado pela Decisão 94/800/CE, do Conselho?
2) Em caso de resposta afirmativa à pergunta anterior, os artigos 49.º, n.º 1, alínea a) e 53.º do CAC devem ser interpretados e aplicados tendo em conta as obrigações que para a União Europeia e para os Estados-Membros resultam do artigo VIII, n.º 1, alínea a) e n.º 3 do GATT?
3) Em caso de resposta afirmativa às questões anteriores, o artigo VIII, n.º 1, alínea a) do GATT – à luz do qual devem ser interpretados e aplicados os artigos 49.º, n.º 1, alínea a) e 53.º, ambos do CAC – deve ser interpretado no sentido de que a aplicação automática, sem excepções, no procedimento de desalfandegamento de uma percentagem fixa ad valorem de 5% sobre o valor das mercadorias, por incumprimento do prazo de atribuição do destino aduaneiro, previsto no artigo 49.º, n.º 1, alínea a), do CAC, constitui uma “taxa” ou “imposição”, na acepção daquele artigo VIII?
4) Em caso de resposta afirmativa à pergunta anterior, o artigo VIII, n.º 1 alínea a) do GATT – à luz do qual devem ser interpretados e aplicados os artigos 49.º, n.º 1, alínea a) e 53.º, ambos do CAC – deve ser interpretado no sentido de que a aplicação automática, sem excepções, no procedimento de desalfandegamento de uma percentagem fixa ad valorem de 5% sobre o valor das mercadorias por incumprimento do prazo de atribuição do destino aduaneiro, previsto no artigo 49.º, n.º 1, alínea a), do CAC, constitui uma “taxa” ou “imposição”, na acepção do referido artigo VIII, que não respeita o critério fixado neste mesmo artigo, segundo o qual as mencionadas taxas ou imposições devem ser “limitadas ao custo aproximado dos serviços prestados”? Em especial, quando (i) as mercadorias se encontram nas instalações do importador aprovadas como entreposto fiscal e não nas instalações das autoridades alfandegárias (sem custos ou risco de armazenagem para a autoridade alfandegária); (ii) não são susceptíveis de tributação em sede direitos aduaneiros e beneficiam ainda da suspensão de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) e de Imposto sobre os Produtos Petrolíferos e Energéticos (ISPPE); e (iii) o prazo legal para apresentação da declaração aduaneira foi excedido em 4 dias?
5) O artigo VIII, n.º 3 do GATT – à luz do qual devem ser interpretados e aplicados os artigos 49.º, n.º 1, alínea a) e 53.º, ambos do CAC – deve ser interpretado no sentido de que o facto de em sede de procedimento de importação não se cumprir o prazo de 45 dias, previsto no artigo 49.º, n.º 1, a), do CAC, para identificar junto das alfândegas o destino aduaneiro da mercadoria constitui uma “infracção ligeira” a uma “formalidade aduaneira”? Em especial, quando (i) as mercadorias se encontram nas instalações do importador aprovadas como entreposto fiscal e não nas instalações das autoridades alfandegárias (sem custos para a autoridade alfandegária); (ii) não são susceptíveis de tributação em sede direitos aduaneiros e beneficiam ainda da suspensão de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) e de Imposto sobre os Produtos Petrolíferos e Energéticos (ISPPE); e (iii) o prazo legal para apresentação da declaração aduaneira foi excedido em 4 dias?
6) O artigo VIII, n.º 3 do GATT – à luz do qual devem ser interpretados e aplicados os artigos 49.º, n.º 1, alínea a) e 53.º, ambos do CAC – deve ser interpretado no sentido de que a omissão, em sede de importação de mercadorias, do cumprimento do prazo de 45 dias para identificar junto das alfândegas o destino aduaneiro constitui “omissões ou erros facilmente reparáveis e manifestamente isentos de qualquer intenção fraudulenta”? Em especial, quando (i) as mercadorias se encontram nas instalações do importador aprovadas como entreposto fiscal e não nas instalações das autoridades alfandegárias (sem custos para a autoridade alfandegária); (ii) não são susceptíveis de tributação em sede direitos aduaneiros e beneficiam ainda da suspensão de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) e de Imposto sobre os Produtos Petrolíferos e Energéticos (ISPPE); e (iii) o prazo legal para apresentação da declaração aduaneira foi excedido em 4 dias?
7) Para efeitos do artigo VIII, n.º 3 do GATT – à luz do qual devem ser interpretados e aplicados os artigos 49.º, n.º 1, alínea a) e 53.º, ambos do CAC – a aplicação automática, sem excepções, no procedimento de desalfandegamento de uma percentagem fixa ad valorem de 5% sobre o valor das mercadorias por incumprimento do prazo de atribuição do destino aduaneiro, previsto no artigo 49.º, n.º 1, alínea a), do CAC, pode ser equiparada a um “simples aviso”? Em especial, quando (i) as mercadorias se encontram nas instalações do importador aprovadas como entreposto fiscal e não nas instalações das autoridades alfandegárias (sem custos para a autoridade alfandegária); (ii) não são susceptíveis de tributação em sede direitos aduaneiros e beneficiam ainda da suspensão de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) e de Imposto sobre os Produtos Petrolíferos e Energéticos (ISPPE); e (iii) o prazo legal para apresentação da declaração aduaneira foi excedido em 4 dias?
8) Em termos mais gerais, a interpretação dos artigos 49.º, n.º 1, alínea a), e 53.º do CAC, no sentido de que a omissão de atribuição de destino aduaneiro, no âmbito do procedimento de desalfandegamento, no prazo de 45 dias implica o pagamento automático, sem excepções, de uma sanção pecuniária fixa ad valorem de 5% sobre o valor da mercadoria, respeita os critérios consagrados no artigo VIII, n.º 1, alínea a) e n.º 3 do GATT?
9) A interpretação do artigo 53.º do CAC no sentido de que o incumprimento do prazo de atribuição do destino aduaneiro, previsto no artigo 49.º, n.º 1, alínea a), do CAC, é sancionável pecuniariamente de forma mais severa que a subtracção de mercadorias à fiscalização aduaneira, nos termos do artigo 57.º do CAC, é proporcional, adequada e necessária? Ou, dito de outro modo, pode um regime sancionatório de um Estado-membro punir muito mais severamente uma prática que se traduz na preterição de uma formalidade declarativa (não atribuição de um destino aduaneiro a uma mercadoria dentro dos prazos previstos, conforme artigos 49.º, n.º 1, alínea a) e 53.º, n.º 1 do CAC) do que uma conduta ilícita e culposa, que se consubstancia na subtracção das mercadorias à fiscalização aduaneira, na acepção do estabelecido pelo artigo 57.º do mesmo diploma?
10) A interpretação conjugada dos artigos 53.º e 57.º do CAC, permite concluir que uma mercadoria irregularmente introduzida no território aduaneiro da União Europeia pode, simultânea e cumulativamente, manter o estatuto de mercadoria em depósito temporário para além do momento em que ocorreu tal introdução irregular? Ou, dito de uma outra forma, deve entender-se que da mencionada interpretação conjugada daquelas duas normas resulta que a subsunção a uma delas exclui necessariamente a aplicação da outra, no sentido de se concluir que uma mercadoria irregularmente introduzida no território aduaneiro da União Europeia deve ser objecto do tratamento imposto pelo artigo 57.º (que impõe às autoridades aduaneiras uma obrigação de regularização das mercadorias que não foram submetidas a controlo aduaneiro), ficando excluída a aplicação simultânea do preceito do artigo 53.º (que fixa às autoridades aduaneiras o dever de regularizar a situação das mercadorias relativamente às quais a atribuição de um destino aduaneiro não ocorreu dentro dos prazos fixados pelo artigo 49.º, n.º 1, alínea a) do mesmo normativo)?
11) A interpretação do artigo 53.º do CAC no sentido de que o incumprimento do prazo de atribuição do destino aduaneiro, previsto no artigo 49.º, n.º 1, alínea a), do CAC, pode levar à aplicação automática, sem excepções, no procedimento de desalfandegamento de uma percentagem fixa ad valorem de 5% sobre o valor das mercadorias – correspondente in casu ao montante de € 3.376.417,26 sobre a mercadoria com o valor de USD 97.281.560,77 – isto quando (i) as mercadorias se encontram nas instalações do importador aprovadas como entreposto fiscal e não nas instalações das autoridades alfandegárias (sem custos ou risco para a autoridade alfandegária), (ii) não são susceptíveis de tributação em sede direitos aduaneiros e beneficiam ainda da suspensão de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) e de Imposto sobre os Produtos Petrolíferos e Energéticos (ISPPE); e (iii) o prazo legal para apresentação da declaração aduaneira foi excedido em 4 dias, respeita os princípios de proporcionalidade, adequação e necessidade?
12) A interpretação do artigo 53.º do CAC no sentido de que o incumprimento do prazo de atribuição do destino aduaneiro, previsto no artigo 49.º, n.º 1, alínea a), do CAC, pode levar à aplicação automática, sem excepções, no procedimento de desalfandegamento de uma percentagem fixa ad valorem de 5% sobre o valor das mercadorias, sem se tomar em consideração o período temporal decorrido após o termo do prazo dos 45 dias, tratando-se exactamente da mesma forma o incumprimento do prazo em 1 dia, em 4 dias ou em 6 meses – isto quando os tribunais superiores nacionais já tiveram oportunidade de determinar que a figura jurídica que, do ponto de vista substancial, mas se aproxima da percentagem ad valorem fixa de 5%, pela natureza da sua causa, é a da sanção pecuniária compulsória de direito civil que se encontra prevista no artigo 829.º-A do Código Civil, que prevê apenas o pagamento de uma quantia pecuniária por cada dia de atraso no cumprimento e o pagamento de juros à taxa de 5% ao ano – respeita os princípios de proporcionalidade, adequação e necessidade?
13) Os arts. 638.º e 639.º do RA, ao imporem às autoridades aduaneiras o dever de considerarem como mercadorias demoradas e, consequentemente, sujeitarem as mesmas à venda em hasta pública (ou, em alternativa, imporem ao legítimo titular da sua propriedade um encargo adicional de 5% sobre o seu valor a fim de ainda acautelar o seu resgate), sem prévia notificação a esse titular, a fim de que possa exercer o seu direito à participação através de audiência prévia, são conformes ao Direito da União Europeia, designadamente com os artigos 17º, 41º, n.º 2, alínea a) e 52º, da CDFUE ?

Foram apresentadas contra-alegações pela recorrida Autoridade Tributária e Aduaneira, que concluiu nos seguintes termos:

A. Na sequência do acórdão do TCA Sul, que julgou improcedente a ação administrativa especial por si interposta, a ora Recorrente veio apresentar recurso de tal decisão, o qual, não obstante o argumentário apresentado, não é suscetível de alterar o conteúdo da decisão prolatada pelo Tribunal recorrido.

B. A sentença do tribunal a quo é válida, clara, encontrando-se devidamente fundamentada, de facto e de direito, em todos os seus termos, pelo que decidiu bem ao julgar improcedente a ação administrativa especial intentada, devendo o presente recurso jurisdicional para esse alto Tribunal ser julgado improcedente.

C. Embora a Recorrente nada venha acrescentar, quanto ao direito, nem quanto à matéria de facto, relativamente ao já alegado em primeira instância, pretende Recorrido reiterar a sua posição em face do peticionado, e bem assim, manifestar a sua concordância com o bem fundado e sentido da decisão objeto de recurso.

D. Alega a Recorrente nas conclusões do recurso que a douta sentença recorrida não se pronunciou sobre toda a matéria constante da PI, mas, compulsada a decisão e seus fundamentos, não se vislumbra a “omissão” a que alude.

E. Desde logo, porque, como bem se refere na mesma decisão, a situação aduaneira da mercadoria foi regularizada através da apresentação, em 06.05.2011, de declaração para atribuição do regime de livre prática e sujeição simultânea ao regime de entreposto fiscal, depois de as autoridades aduaneiras terem pedido à Petrogal que indicasse o regime aduaneiro a atribuir à mercadoria, não tendo aquela alguma vez declarado que pretendia atribuir-lhe outro destino.

F. Em face de toda a factualidade considerada provada, o Recorrido não pode deixar de expressar a sua perplexidade face à evidente contradição, e até manifestação de má-fé, mantendo, todo o vertido na contestação anteriormente apresentada quanto ao que vem afirmado relativamente à matéria objeto da suposta omissão de pronúncia.

G. Invocando a Recorrente, por outro lado, a existência de “clamoroso erro de julgamento” por, no seu entender, o Tribunal recorrido confundir os conceitos de “prazo de armazenagem” e “prazo para atribuição de um destino aduaneiro”, insiste-se, como se fez em primeira instância, que esse é um atributo que só pode ser imputado ao raciocínio da Recorrente, que parece desconhecer conceitos fundamentais do direito aduaneiro, como a “taxa de fazendas demoradas”, “atribuição de um destino aduaneiro” e “taxa de armazenagem”.

H. Conforme o afirmado na contestação antes apresentada, reitera-se todo o aí explanado, importando reafirmar que a taxa de fazendas demoradas nada tem a ver com taxas de armazenagem, constituindo conceitos jurídicos distintos, sendo que o facto de ter havido alterações legislativas quanto ao tipo de armazéns ou de locais de depósito temporário de mercadorias, não afasta a aplicação da taxa de fazendas demoradas, sua liquidação e cobrança.

I. Pois, face à sua natureza jurídica distinta, as taxas de armazenagem e as taxas de fazendas demoradas podem inclusivamente ser devidas em simultâneo, mas sempre independentemente umas das outras, sendo que, no quadro jurídico atual, as taxas que possam ser devidas pela armazenagem das mercadorias, independentemente do seu estatuto aduaneiro, são alheias às atribuições das autoridades aduaneiras porquanto as alfândegas já não detêm armazéns geridos por elas próprias, ao invés do que sucedia no regime jurídico de armazenagem invocado pela Recorrente.

J. Para o caso em apreço o que releva é a cobrança da taxa administrativa de natureza compulsória que constitui a taxa “ad valorem” de fazendas demoradas de 5%, prevista no artigo 639.º, § 2º do Regulamento das Alfândegas (RA), não sendo a armazenagem das mercadorias que dá lugar à liquidação da taxa de fazendas demoradas, mas sim a permanência das mesmas com o estatuto de mercadorias extra-comunitárias depois de ultrapassado o prazo máximo previsto na lei para a atribuição de destino aduaneiro à mercadoria.

K. O artigo 53.º do Código Aduaneiro Comunitário (CAC), aplicável aos factos, como bem refere o Acórdão recorrido, constitui a base jurídica que fundamenta o juízo interpretativo da sua conformidade [da taxa de fazendas demoradas] com o direito comunitário, na medida em que permite às autoridades aduaneiras a aplicação de uma medida mais gravosa, a venda, tem por objeto as mercadorias em relação às quais não foram cumpridas as formalidades destinadas a atribuir-lhes um destino aduaneiro nos prazos do artigo 49.º.

L. De facto, face ao estatuído no artigo 53.º do CAC, quanto às medidas a adotar pelas autoridades aduaneiras dos Estados-membros com vista à promoção do cumprimento da obrigação de ser dado um destino aduaneiro às mercadorias extra-comunitárias com estatuto de mercadorias em depósito temporário, vigorando no direito interno o artigo 639.º do RA, o mesmo mantém-se atual, não sendo necessário estabelecer outras medidas legislativas.

M. O Direito Português contém norma que prevê as medidas a adotar no caso de ser ultrapassado o prazo legal de depósito temporário das mercadorias, encontrando a mesma indubitável acolhimento no Direito Comunitário, que é claríssimo quanto a esta matéria, porquanto o artigo 53.º do CAC estabelece, expressamente, que as autoridades aduaneiras tomem todas as medidas necessárias para a regularização da situação das mercadorias em relação às quais o cumprimento das formalidades destinadas à atribuição de um destino aduaneiro não tenha sido iniciado nos prazos fixados no artigo 49.º do mesmo código, ou seja nos 45 dias, no caso das mercadorias chegadas por via marítima.

N. Seguindo o raciocínio da Recorrente, de que a norma do § 2º do artigo 639.º do RA não seria aplicável aos casos em que as mercadorias se encontrem na situação jurídica de ultrapassagem do prazo de depósito temporário, o regime jurídico português não preveria qualquer medida de carácter compulsório, em harmonia com o disposto no artigo 53.º do CAC, que não fosse a venda das mercadorias, o que não faz qualquer sentido.

O. Acrescendo que a mercadoria em causa, que deu entrada num local aprovado pelas autoridades aduaneiras, de acordo com a regulamentação comunitária e fiscal aplicável, vai tendo estatutos jurídicos diferentes desde a sua entrada em território nacional/comunitário: mercadoria apresentada à alfândega e em depósito temporário; mercadoria declarada para livre prática, com o consequente pagamento de direitos de importação, se a eles houver lugar, passando a deter o estatuto de mercadoria comunitária; mercadoria comunitária em entreposto fiscal de produção, com suspensão de IVA e IEC-ISP destinada a ser transformada em produtos diferentes; produto em entreposto fiscal de armazenagem, em suspensão de IEC; produto introduzido no consumo com pagamento de IVA e ISP, mediante processamento da Declaração de Introdução no Consumo (DIC) respetiva.

P. E, conforme decorre do artigo 50.º do CAC, as mercadorias apresentadas à alfândega, enquanto aguardam que lhes seja atribuído um destino aduaneiro, têm, a partir desse momento, o estatuto de mercadorias em depósito temporário, devendo, tais mercadorias, ser sujeitas às formalidades destinadas a atribuir-lhes um destino aduaneiro no prazo de 45 dias, quando chegadas pela via marítima, como foi o caso, nos termos do artigo 49.º, n.º 1, alínea a), só podendo ser armazenadas nos locais autorizados pelas autoridades aduaneiras (cf. artigo 51.º do CAC), sendo apenas permitidas as manipulações que não modifiquem a sua apresentação ou características técnicas (cf. artigo 52.º do mesmo CAC).

Q. Não obstante aquele prazo possa ser prorrogado, quando as circunstâncias o justifiquem, de acordo com o n.º 2 do artigo 49.º, no caso concreto tal prorrogação não foi solicitada, razão pela qual, decorridos 45 dias sobre a entrega da declaração sumária ou documento equivalente, a mercadoria excedeu o prazo de armazenagem, tendo, por esse motivo, passado à situação de mercadoria demorada, e por isso, jurídica e automaticamente sujeita, nos termos do direito interno, ao regime de venda em hasta pública, nos termos do artigo 638.º do Regulamento das Alfândegas.

R. Resultando inequívoco que a taxa de fazendas demoradas de 5% sobre o valor aduaneiro das mercadorias que excedem o prazo de armazenagem é de aplicação vinculada e automática, conforme decorre do artigo 639.º do RA.

S. Não suscita, pois, qualquer dúvida a situação/estatuto da mercadoria em causa, sendo certo que, na data em que foi apresentado o DAU para livre prática em entreposto fiscal, a mercadoria não comunitária em situação de depósito temporário, já estava na situação de demorada, uma vez que estas são “… as armazenadas em quaisquer depósitos de regime aduaneiro ou de regime livre quando neles excedam os respectivos prazos de armazenagem”, nos termos dos artigos 638.º, 1º, e 639.º do RA, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 483.º-E/88, de 28 de Dezembro.

T. Sendo, pois, incorreta a conclusão da Recorrente de que a disciplina jurídica plasmada no artigo 639º do RA é inaplicável ao presente caso concreto por as mercadorias em causa não poderem ser consideradas demoradas à luz do referido preceito, e, obviamente, irrelevante, face ao supra invocado, o facto de a mercadoria ter ficado na situação de mercadoria com estatuto de mercadoria em depósito temporário nas instalações da Petrogal.

U. Ao invés do afirmado pela Recorrente, estamos perante a aplicação de uma medida de natureza compulsória, pecuniária, administrativa, processual ou procedimental, que, de acordo com a jurisprudência já citada anteriormente, pela Recorrida e pelo Acórdão a quo, visa promover o normal desenvolvimento do processo de desalfandegamento das mercadorias e, tendo a Recorrente apresentado a Declaração Aduaneira/DAU, solicitando a atribuição do regime de Livre Prática e sujeição simultânea em regime de Entreposto Fiscal, a alfândega, logicamente, e porque tal decorre da legislação aduaneira aplicável, concluiu que não seria do interesse da Petrogal que a administração aduaneira procedesse à venda da mercadoria, regularizando a respetiva situação aduaneira.

V. A venda da mercadoria, que constitui a medida mais gravosa a aplicar às mercadorias em relação às quais não foram cumpridas as formalidades destinadas a atribuir-lhes um destino aduaneiro nos prazos fixados no artigo 49.º do CAC, causaria um prejuízo maior porquanto seria correspondente ao valor pago pela totalidade da mercadoria, enquanto que, dando a Administração Aduaneira cumprimento ao disposto no § 2.º do artigo 639.º do Regulamento (a que estava vinculada), o prejuízo da Recorrente foi apenas o montante de 3.376.417,26 € relativos à taxa de 5% sobre o valor da mercadoria, a título de fazendas demoradas.

W. Se a alfândega tivesse precedido a liquidação em crise da sujeição das mercadorias à venda em hasta pública, a Petrogal, querendo arrematá-la, teria que pagar a totalidade, o que, em conformidade com a vontade da Recorrente não sucedeu, ao preferir regularizar a situação aduaneira das mercadorias demoradas pagando os 5% do seu valor, a título de fazendas demoradas.

X. Deste modo, se conclui que, ao solicitar o referido destino aduaneiro, a Recorrente optou pela situação que entendeu como mais favorável, não podendo a Autoridade Aduaneira, ao aceitar a declaração aduaneira apresentada, porque vinculada ao cumprimento da lei (princípio da legalidade), deixar de aplicar a taxa de 5% sobre o valor da mercadoria, cominada no § 2.º do artigo 639.º do RA.

Y. Encontram-se reunidos todos os pressupostos legais para a aplicação da taxa de fazendas demoradas no caso vertente, pelo que andaram bem as autoridades aduaneiras ao efetuar a respetiva liquidação, sendo inteiramente legal o ato do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, ora em crise, que decidiu manter a referida liquidação na ordem jurídica, mediante o indeferimento do recurso hierárquico em que foi oficiosamente convolada a reclamação graciosa do ato de liquidação apresentada pela ora Recorrente.

Z. Não faz, também, qualquer sentido a alusão a uma “eventual” natureza punitiva, sendo que, como se sabe, o processo administrativo (e o tributário), e, concomitantemente, a responsabilidade tributária e aduaneira não se confunde com a responsabilidade criminal ou contra-ordenacional, cujos processos obedecem a pressupostos distintos, sendo enquadradas por normas de fonte nacional (legal e constitucional) igualmente distintas.

AA.A aplicação da taxa de fazendas demoradas é independente de qualquer juízo de punibilidade a título de infração, uma vez que não tem a natureza de uma sanção, antes sendo, de acordo com a vasta e pacífica jurisprudência comunitária, constitucional e tributária, qualificada juridicamente como uma medida administrativa compulsória destinada a incentivar o desalfandegamento nos prazos legalmente fixados, não perpetuando a indefinição da ausência de atribuição de um destino aduaneiro a mercadoria proveniente de terceiros países com estatuto não comunitário.

BB. E, nos termos do artigo 639.º do RA, também não existe graduação da medida, estando a administração obrigada à aplicação da taxa de 5% sobre o valor das mercadorias que excederam o prazo de depósito temporário.

CC. Também não se vislumbra igualmente a relevância do alegado pela Recorrente quanto ao direito comparado, dado que a disciplina jurídica em causa se encontra sobejamente delimitada, quanto à sua interpretação, quer a nível interno, pelos tribunais nacionais, quer no âmbito do direito da Comunidade/União pelo Tribunal de Justiça da União Europeia.

DD. Quanto às alegadas violações dos princípios da igualdade e da proporcionalidade, só pode, o Recorrido, reiterar o vertido na contestação, aderindo também, nesta parte, ao pugnado pelo TCAS no acórdão recorrido, mormente quanto às referências jurisprudenciais e doutrinais para as quais se remete.

EE. De igual modo, quanto à alegada desconformidade da taxa de fazendas demoradas prevista no §2.º do artigo 639.º do RA com a alínea a), do nº 1, do artigo VIII do GATT, clarifica-se, de novo, que a taxa de fazendas demoradas não constitui uma taxa pela prestação de qualquer serviço pelas autoridades aduaneiras, sendo, como sobredito, e jurisprudencialmente firmado, uma medida administrativa de carácter compulsório.

FF. E, como se afirmou anteriormente, a taxa de fazendas demoradas é considerada proporcional e adequada pela Jurisprudência do Tribunal Constitucional e o próprio Tribunal de Justiça da União Europeia, que já se manifestou no sentido da proporcionalidade e da adequação da medida administrativa de carácter compulsório vigente no direito português, prevista no artigo 639.º, § 2º do RA.

GG. Concluindo-se, como se fez na contestação apresentada no Tribunal recorrido, que, no caso concreto:

a) A mercadoria de terceiro país, não comunitária, entrada nas instalações da Petrogal, aprovadas como entreposto fiscal, aí permaneceu com o estatuto de mercadoria em depósito temporário, nos termos do artigo 50.º do CAC enquanto não lhe foi atribuído um destino aduaneiro nos prazos legalmente fixados;

b) A mercadoria tinha que ser sujeita às formalidades destinadas a atribuir-lhe um destino aduaneiro, no prazo de 45 dias, nos termos do artigo 49.º, n.º 1, alínea a) do CAC;

c) Tendo o DAU, para livre prática em entreposto fiscal, sido apresentado após o decurso daquele prazo sem que previamente tivesse sido pedida a sua prorrogação, a mercadoria não comunitária em situação de depósito temporário, já estava, na data daquela apresentação e aceitação, na situação de demorada, uma vez que mercadorias demoradas são “… as armazenadas em quaisquer depósitos de regime aduaneiro ou de regime livre quando neles excedam os respetivos prazos de armazenagem”, nos termos dos artigos 638.º, 1º, e 639.º do Regulamento das Alfândegas, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 483.º-E/88, de 28 de Dezembro;

d) As fazendas demoradas de 5% sobre o valor aduaneiro das mercadorias que excedem o prazo de armazenagem é de aplicação vinculada e automática, conforme decorre do artigo 639.º do RA, uma vez que, de acordo com a vasta e pacífica jurisprudência comunitária, constitucional e administrativa, tem sido qualificada juridicamente como uma medida administrativa compulsória destinada a incentivar o desalfandegamento nos prazos legalmente fixados, não perpetuando a indefinição da ausência de atribuição de um destino aduaneiro a mercadoria proveniente de terceiros países com estatuto não comunitário;

e) A mesma jurisprudência, quer comunitária, quer nacional (administrativa e constitucional), considera proporcional a aplicação desses 5%, entre outros motivos, porque o seu pagamento não é obrigatório, antes está dependente de um ato de vontade de quem devia ter cumprido o prazo previsto no artigo 49.º alínea a) do CAC e não o faz (cf., entre outros, Acórdão de 07.12.2000, Proc.º C-213/99 do TJCE, acórdão do Tribunal Constitucional n.º 414/99, de 26.06.99, acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 24.09.2003, Proc.º n.º 24 108);

f) E esse ato de vontade traduziu-se, efetivamente, no caso sub judice, na apresentação do Documento Administrativo Único/DAU para livre prática;

g) A alternativa permitida pelo artigo 53.º do CAC de se proceder à venda da mercadoria demorada, afastada pela apresentação do DAU para Livre Prática, não consente a desaplicação dos 5% de fazendas demoradas, face à sua natureza jurídica, ao carácter automático da sua aplicação no exercício de poder vinculado, decorrente do artigo 53.º do CAC e do artigo 639.º do Regulamento das Alfândegas, sendo, como foi, o ato de vontade declarativo exteriorizado fora dos prazos legais, veja-se, neste sentido, quadro factual tido em conta no acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 24.09.2003, Proc.º n.º 24 108.

h) Acresce que a Petrogal, logo após ter assumido a culpa do excesso de prazo, expressou a sua vontade através do ato declarativo de sujeição da mercadoria ao regime de Livre Prática, para efeitos de demonstrar que conviria menos à empresa que a administração aduaneira tivesse feito preceder a liquidação em crise da sujeição da mercadoria à venda em hasta pública, uma vez que, nesse caso, e querendo arrematá-la, a Petrogal teria sempre que pagar, senão pela totalidade do valor, sempre em valor superior à que resulta da aplicação dos 5% de Fazendas Demoradas, do que ficar com a mercadoria sujeitando-se ao pagamento dos 5% de Fazendas Demoradas.

HH. Em face de todo o supra exposto, conclui-se que não merece qualquer censura a decisão do Tribunal a quo, devendo ser integralmente mantido o douto Acórdão, com as legais consequências.

Termos em que, e sempre com o mui douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser negado provimento ao recurso, mantendo-se a douta sentença do tribunal a quo, assim se fazendo Justiça.

Neste Supremo Tribunal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, notificada nos termos do art. 146.º, n.º 1, do CPTA, pronunciou-se no sentido de se impor a revogação do acórdão recorrido, julgando-se procedente a ação administrativa e determinando-se a anulação da “taxa de fazendas demoradas”, com a seguinte fundamentação:

I. Objecto do recurso.
O presente recurso vem interposto do acórdão do TCA Sul que julgou improcedente a ação administrativa intentada contra a decisão de indeferimento do recurso hierárquico, proferida pelo senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, no qual havia sido pedida a anulação de ato tributário aduaneiro de “Fazendas Demoradas”, no valor de € 3.376.417,26 euros.
A Recorrente insurge-se contra o assim decidido, invocando erro de julgamento, por errónea interpretação do regime legal aplicável, e nulidade por omissão de pronúncia.
No que respeita a este último vício, considera a Recorrente que nos artigos 122º, 123º e 124º da petição inicial suscitou a apreciação da questão relativa à impossibilidade de aplicação do regime das “fazendas demoradas” a cerca de 71% das mercadorias objeto do ato de liquidação, por já terem sido utilizadas, mas sobre a mesma não foi emitida qualquer pronúncia por parte do tribunal recorrido.
No que respeita ao erro de julgamento, considera a Recorrente que «não tendo aquela estância aduaneira iniciado qualquer procedimento de sujeição das mercadorias ao regime de hasta pública, nem, tampouco, praticado quaisquer atos preparatórios do processo de vendas das mercadorias em hasta pública nos termos à época legalmente prescritos – cfr. artigos 638.º a 678.º do RA -, não estava verificado o requisito legal essencial que fundamenta a aplicação da sanção por fazendas demoradas».
Conclui, assim, que «o ato é inválido, por vício de violação de lei, concretamente o n.º 2 do artigo 639º do Regulamento das Alfândegas, na redação vigente à data dos factos, devendo o mesmo ser anulado, nos termos gerais previstos no CPA».
Mais entende que «caso se entenda legitimada a liquidação das fazendas demoradas ao caso aqui em apreço, o que apenas se concede por precaução de patrocínio, a correspondente liquidação só seria aplicável à parte da mercadoria (cerca de 29% do total da remessa) que efetivamente perdurou em armazém para além dos 45 dias relativos ao prazo estipulado para a atribuição de um destino aduaneiro, pois só, essa parte é que poderá ser considerada como “demorada”».
Considera, ainda, que «a adoção de tal regime tinha somente em vista a punição dos operadores económicos pela ocupação demorada dos espaços físicos de armazenamento facultados pelas autoridades aduaneiras, sendo certo que a sua eventual punição pela não sujeição das mercadorias a um destino aduaneiro era efetivada mediante a instauração de procedimento de natureza contraordenacional», motivo pelo qual entende que «os preceitos que preveem a liquidação das referidas Fazendas Demoradas sejam objeto de uma interpretação atualista, senão mesmo de uma redução teleológica».
Considera, por último, que se mostra violado o princípio da proporcionalidade, na perspetiva da necessidade de tal medida para atingir o fim visado, pois a Administração Aduaneira podia ter adotado uma medida menos gravosa, designadamente formular um convite à Recorrente para sanar a irregularidade da situação. Entende, igualmente, que o disposto no nº2 do artigo 639º do Regulamento das Alfândegas padece do vício de inconstitucionalidade, por violação do princípio da proporcionalidade e da igualdade, em razão da natureza materialmente contraordenacional da sanção.
Considera a Recorrente que a medida aplicada apresenta-se como “sanção não graduável, determinada por um método de cálculo que não reflete a gravidade concreta da infração” e que “não permite que a Administração, na determinação concreta da medida da coima, leve em consideração circunstâncias tão diversas quanto o grau de ilicitude do facto e a gravidade das suas consequências, nem tão-pouco o grau de violação dos deveres impostos ao agente, nem as circunstâncias do caso que, não fazendo parte do tipo de contra-ordenação, deponham a favor ou contra ele”.
Entende, ainda, que o disposto no nº2 do artigo 639º do Regulamento das Alfândegas padece do vício de inconstitucionalidade, por se tratar de lei restritiva de Direitos, Liberdades e Garantias (ou direitos análogos).
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II. Análise do Recurso.
1. A primeira questão que se vem suscitada pelo Recorrente consiste em saber se se verifica a nulidade do acórdão, decorrente de omissão de pronúncia sobre questão jurídica suscitada na petição inicial.
No que respeita a este vício, considera a Recorrente que nos artigos 122º, 123º e 124º da petição inicial suscitou a apreciação da questão relativa à impossibilidade de aplicação do regime das “fazendas demoradas” a cerca de 71% das mercadorias objeto do ato de liquidação, por já terem sido utilizadas, mas sobre a mesma não foi emitida qualquer pronúncia por parte do tribunal recorrido.
Afigura-se-nos, contudo, que não assiste razão à Recorrente.
Desde logo porque a alegação feita nos artigos 122º, 123º e 124º da petição inicial por parte da impugnante e aqui Recorrente não consubstancia uma questão jurídica autónoma, mas simplesmente uma argumentação para sustentar a verificação do vício de ilegalidade imputado ao ato de liquidação das “fazendas demoradas” ao abrigo do regime previsto no artigo 639º do Regulamento da Alfândega, por no entender da Recorrente o referido regime implicar a abertura de um procedimento de venda da mercadoria em hasta pública, e neste caso parte da mercadoria já ter sido utilizada no processo de produção da Recorrente e nessa medida inviabilizar aquele procedimento de venda.
Aliás é manifesto que a impugnante e aqui Recorrente elege como questão jurídica o vício de “ilegalidade do acto de liquidação por violação de lei, em razão da não observância dos trâmites processuais previstos nos artigos 638º a 678º do RA”, sobre o qual faz diversos considerandos ao longo dos artigos 107 a 124 da sua petição inicial, designadamente o facto de parte da mercadoria já ter sido utilizada no processo de produção, argumento que no seu entender inviabilizaria o procedimento previsto naquelas normas legais.
Ora, impendendo sobre o juiz o dever de «… resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras» (nº2 do artigo 608º do CPC), só ocorre nulidade de pronúncia quando o tribunal não se pronuncia sobre algumas das questões jurídicas suscitadas e não quando deixa de apreciar alguns dos argumentos invocados pelas partes, entendimento este que é pacífico na jurisprudência e na doutrina. Entendemos, assim, que não se verifica a invocada nulidade do acórdão recorrido.
2. A segunda questão consiste em saber se o acórdão incorreu em erro de julgamento, na interpretação e aplicação do regime legal previsto nos artigos 678º e 679º do Regulamento das Alfândegas.
Entende a este propósito a Recorrente que não tendo a Alfândega iniciado o procedimento de venda da mercadoria, não há lugar à aplicação da sanção pecuniária prevista no §2º do artigo 679º do RA, e ainda que assim seja entendido, sempre tal aplicação se restringiria à mercadoria que nessa altura se encontrava armazenada (por a restante já ter sido introduzida no processo produtivo).
Conforme se alcança da matéria de facto assente no acórdão recorrido, em 15/03/2011 a Recorrente recebeu, via marítima e proveniente do Brasil, “granel de óleo mineral em rama”, o qual foi descarregado para o entreposto fiscal de que a Recorrente é titular em Sines, e só em 06/05/2011, ou seja, decorrido o período de 45 dias previsto no artigo 49º, nº1, alínea a), do Código Aduaneiro Comunitário, é que foi apresentada a Declaração Aduaneira de Importação para livre prática, tendo a delegação aduaneira de Sines liquidado a “taxa de fazendas demoradas”, correspondente a 5% sobre o valor da mercadoria.
No acórdão recorrido o TCA considerou que se trata de “cobrança da taxa administrativa de natureza compulsória”, que se traduz numa percentagem de 5% prevista no artigo 639.°, § 2.° do RA, estabelecida “ad valorem” , por se tratar de mercadorias extra-comunitárias mantidas em regime de suspensão de direitos aduaneiros devidos, para lá do prazo máximo previsto na lei para a atribuição de destino aduaneiro à mercadoria».
Com efeito, de acordo com o § 2º do artigo 639º do RA, na redação introduzida pelo Dec.-Lei nº 483-E/88, de 28 de Dezembro, “as mercadoras despachadas ao abrigo do disposto neste artigo estão sujeitas ao pagamento de todos os encargos e imposições devidos, acrescidos da percentagem de 5% sobre o seu valor”, ou seja, cujo desalfandegamento tenha ocorrido após o período de armazenagem de 45 dias previsto no artigo 49º, nº1, alínea a), do Código Aduaneiro Comunitário.
Como é entendimento jurisprudencial deste tribunal (cfr. acórdão do Pleno de 24/09/2003, recurso nº 024108), estamos perante uma “medida administrativa de natureza compulsória, cuja finalidade é a de promover o respeito dos prazos de desalfandegamento de mercadorias por parte dos operadores económicos”. Ora, verificado o decurso do prazo de 45 dias que a Recorrente tinha para sujeitar a mercadoria às formalidades destinadas a atribuir-lhe um destino aduaneiro (art.49º, nº1, al.a), do CAC), essa mercadoria fica num estado de abandono, recaindo sobre a Administração Aduaneira o ónus de regularizar a sua situação, designadamente através da venda. Daí que a partir do termo final daquele prazo, caso o destinatário da mercadoria pretenda proceder ao seu desalfandegamento, ficará sujeito àquela taxa denominada “taxa de fazendas demoradas”. Ou seja, independentemente de a mercadoria se encontrar em entreposto fiscal de que a Recorrente é titular, ou de a Administração Aduaneira não ter iniciado o procedimento de venda em hasta pública, a referida taxa é sempre devida caso o desalfandegamento seja efetuado decorrido aquele prazo de 45 dias.
Carece, assim, de qualquer pertinência, para efeitos de afastar a aplicação da referida taxa, a invocação pela Recorrente de que parte da mercadoria já não se encontrava em armazém, pois o que releva neste caso é o procedimento de desalfandegamento, que se reporta a toda a mercadoria (relevando, sim, em sede contraordenacional o comportamento da Recorrente ao dar-lhe o destino anunciado).
Carece igualmente de razão a Recorrente ao invocar a violação do princípio da proporcionalidade, em termos de necessidade da medida perante o fim visado, pois como operador autorizado e titular de entreposto fiscal tinha perfeito conhecimento das consequências da ultrapassagem do referido prazo de desalfandegamento da mercadoria, motivo pelo qual não se impunha à Administração a concessão de prazo para regularizar a situação, a não ser que o mesmo tivesse sido requerido pela Recorrente, em função de causas justificativas, o que não foi o caso.
3. Quanto aos vícios de inconstitucionalidade do artigo 639º, §2º do RA, por violação do princípio da proporcionalidade e da igualdade, em razão da natureza materialmente contraordenacional da sanção, e por se tratar de lei restritiva de Direitos, Liberdades e Garantias (ou direitos análogos).
Entende a Recorrente que estamos perante “uma norma que comprime e viola de forma abusiva o direito de propriedade privada, em violação do artigo 18º e 62º da CRP”, porque a lei não impõe qualquer limite à fixação em concreto. E que o disposto nos artigos 638º e 639º, nº2, do RA, interpretados nos termos em que o faz o tribunal recorrido, é inconstitucional, por violação do princípio do Estado de Direito, nos subprincípios da proporcionalidade e proibição do excesso.
No acórdão do STA de 08/03/2001, proferido no recurso nº 023254 Disponível em https://dre.pt/application/file/a/4081910., a cujo entendimento se adere, considerou-se que a taxa prevista no §2º do artigo 639º do Regulamento das Alfândegas, “não tem carácter sancionatório, constituindo um condicionamento à utilização da faculdade de dar um destino aduaneiro às mercadorias depois de decorrido o prazo legal, com o que se quer desincentivar o tardio desalfandegamento, sem envolver qualquer juízo de censura sobre a conduta do agente”. E acrescenta-se: «Mesmo que se entenda estar-se perante uma sanção, será, então, uma sanção de tipo processual, como a jurisprudência a tem qualificado. A distinção reside no objectivo do estabelecimento da sanção, que não é o de censurar o agente por ter deixado decorrer o prazo sem dar destino à mercadoria, o de reagir à violação do valor ou interesse tutelado pela norma que fixa o prazo, mas o de incentivar o tempestivo desalfandegamento por parte dos operadores económicos, de modo a que os procedimentos tenham um regular desenvolvimento, como convém à boa administração, exigindo um sacrifício económico correspondente à permissão da prática de um acto procedimental depois de esgotado o respectivo prazo» No mesmo sentido o acórdão de 9 de maio de 2001, recurso nº 023383 – disponível em https://dre.pt/application/file/a/4077602; acórdão de 19/12/2001, recurso nº 23529 (disponível em https://dre.pt/application/file/a/4064862); acórdão de 25/06/1998, recurso nº 020982 (disponível em https://dre.pt/application/file/a/4100473); e acórdão de 11/10/1995, recurso nº 016659 (disponível em https://dre.pt/application/file/a/4106217)..
Tal como se concluiu no acórdão do Pleno de 24/09/2003, a taxa tem “natureza compulsória, de índole processual ou procedimental, visando promover o normal desenvolvimento do processo de desalfandegamento das mercadorias”, pelo que não se pode equiparar a sanção pecuniária de natureza contraordenacional.
Por outro lado e como se deixou referido no acórdão recorrido, no acórdão nº 414/99 (jurisprudência sufragada igualmente nos acórdãos nº 564/2001 e 393/02) o Tribunal Constitucional já afastou o vício de inconstitucionalidade do artigo 639º do RA, por violação do princípio da proporcionalidade, nos seguintes termos:
«A actuação da Administração está efectivamente vinculada à observância do princípio da proporcionalidade, de modo particularmente relevante no âmbito do desenvolvimento de uma actividade discricionária, da qual constitui um dos limites jurídicos (artigo 266º, n.º 2 da Constituição e artigo 5º, n.º 2 do Código de Procedimento Administrativo).
O princípio da proporcionalidade impõe que exista uma adequação não só entre o fim da lei e o fim do acto como entre o fim da lei e os meios escolhidos para alcançar tal fim. A adequação terá ainda de manter-se entre as circunstâncias de facto que ocasionam o acto e as medidas que vierem a ser efectivamente tomadas. A proporcionalidade abrange assim não só a congruência, adequação ou idoneidade do meio ou medida para realizar o fim que a lei propõe como também a proibição do excesso.
Admitindo que no caso em apreço se está no domínio de intervenção do princípio da proporcionalidade, a fixação de uma percentagem fixa de 5% sobre o valor das mercadorias em causa, já sujeitas ao regime de venda em hasta pública, é medida adequada e idónea para realizar o fim da lei – a liberação das mercadorias do referido regime – passando-as de novo à livre prática?
A resposta é indubitavelmente afirmativa: num momento em que o fim das mercadorias é a sua venda pública, com a consequente perda para o respectivo dono, pode este desembaraçar a mercadoria pagando o quantitativo fixado legalmente. Este quantitativo tem o seu valor pré-fixado na lei, dependendo o quantitativo a desembolsar de mera operação aritmética de acordo com o valor declarado das mercadorias.
Dado que a finalidade da medida é a de promover o respeito dos prazos de desalfandegamento, é manifesto que os operadores económicos que incumpriram esses prazos verão as mercadorias ser vendidas, com o consequente prejuízo. Porém, a lei admite que possam obviar a tal venda e prejuízo pagando além das despesas a referida percentagem. O valor da quantia a pagar depende do valor das próprias mercadorias, e a opção, entre o seu pagamento ou não, está na disponibilidade do respectivo dono, dependendo apenas de sua vontade em dispor das mercadorias, pois a administração, feito o pedido de despacho, está obrigada a desembaraçar as mercadorias.
Não existe, assim, no caso em apreço uma situação relativamente à qual se possa afirmar que a estipulação da medida administrativa compulsória em causa seja intoleravelmente desproporcionada ou exorbitante e, por isso, seja constitucionalmente inadmissível».
Também no acórdão do Tribunal de Justiça de 07/12/2000, proc. C-213/99, igualmente citado no acórdão recorrido, se entendeu que «a aplicação de um processo que prevê a venda das mercadorias demoradas ou a cobrança de uma taxa ad valorem para regularização da situação destas mercadorias não é, em si mesma, contrária ao princípio da proporcionalidade. Compete ao órgão jurisdicional nacional apreciar se a taxa prevista no caso dos autos do processo principal respeita este princípio».
Alega a Recorrente que no acórdão do TC supra citado o tribunal não teve em consideração o desvalor do montante em concreto fixado e que no caso dos autos resulta manifestamente excessivo. E que a ausência de um limite máximo para a medida em causa não só viola o princípio da proibição do excesso, como o princípio da igualdade, por criar situações de disparidade entre operadores.
Conforme se alcança da matéria de facto fixada no acórdão, a taxa foi calculada no montante de € 3.376.417,26 euros, correspondente a 5% do valor da mercadoria.
Como se referiu no acórdão do STA de 08/03/2001 supra citado, e que importa repetir, o fim da sanção compulsória é «o de incentivar o tempestivo desalfandegamento por parte dos operadores económicos, de modo a que os procedimentos tenham um regular desenvolvimento, como convém à boa administração, exigindo um sacrifício económico correspondente à permissão da prática de um acto procedimental depois de esgotado o respectivo prazo».
Ora, salvo melhor opinião, o valor da taxa obtida é manifestamente excessivo face aos fins visados pela norma e aos interesses que se pretendem acautelar, revelando-se dessa maneira desproporcionada e exorbitante, e nessa medida constitucionalmente inadmissível, usando as expressões do acórdão do Tribunal Constitucional supra citado.
Com efeito e nesta parte concordamos com a Recorrente que não se pode aquilatar da desproporção da medida em função da perda da mercadoria, uma vez que embora o legislador parta do pressuposto de abandono decorrido que seja aquele prazo de 45 dias (e que justifica a tomada de medidas por parte da Administração Aduaneira para a regularização da situação, designadamente a sua venda), não há propriamente uma decisão de declaração de perdimento da mercadoria a favor do Estado.
Afigura-se-nos, assim, que assiste razão à Recorrente nesta parte, por a medida administrativa tomada ao abrigo do disposto no §2º do artigo 639º do Regulamento das Alfândegas se revelar no caso concreto excessiva e desproporcionada, violando nessa medida o princípio da proporcionalidade em sentido estrito ou princípio da justa medida, ínsito no princípio do estado de direito democrático, consagrado no artigo 2º da CRP, o que constitui fundamento para a anulação da denominada “taxa de fazendas demoradas” aplicada no caso concreto pela Administração Aduaneira.
Em face do exposto entendemos que se impõe a revogação do acórdão recorrido e em substituição julgar procedente a ação administrativa e determinar a anulação da “taxa de fazendas demoradas”.

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Por acórdão prolatado em 27.10.2022, foi determinado o reenvio prejudicial ao TJUE (cfr. p. 502 SITAF).

Por decisão do TJUE - proc.º n.º C-706/21, de 01.06.2022, “O pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), por Decisão de 27 de outubro de 2021, é manifestamente inadmissível”.

Notificadas as partes da decisão do TJUE, nada disseram.

O Ministério Público foi igualmente notificado e reagiu afirmando “Mantemos o nosso anterior parecer.”
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Os autos vêm à conferência satisfeitos os vistos legais.

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2. FUNDAMENTAÇÃO:

2.1. - Dos Factos:

Na decisão recorrida foi fixado o seguinte probatório reputado relevante para a decisão:

A) Em 15.03.2011 a Petrogal recebeu um granel de óleo mineral em rama (crude, albacora crude oit\), transportado por via marítima pelo navio SILIAT, com a contra marca 670 1 2011 000280 (280 de 12.03/2011), proveniente do Brasil com 131.380,249 MT, conforme fls. 5 (Vol. I) do Processo Administrativo constituído pelos Volumes I - da Alfândega de Setúbal/Delegação Aduaneira de Sines - e II - da Direcção de Serviços de Consultadoria Jurídica e Contencioso (PA), que se juntou aos autos para todos os efeitos legais.
B) Nesta data, 15.03.2011, o produto foi descarregado para o entreposto fiscal de produção de que a Petrogal é titular em Sines (a fls. 5 e 6 do Processo de contra-ordenação, constante do PA - Vol. II).
C) Em 03.05.2011, tendo verificado a não regularização da situação aduaneira do crude, a Delegação Aduaneira de Sines solicitou à Petrogal, através de correio electrónico, que indicasse o regime aduaneiro atribuído àquela mercadoria, questionando-a sobre a apresentação da respectiva declaração aduaneira de importação relativa à primeira quantidade constante do mapa de fls. 2 a 8 do PA, Vol. I.
D) Entre 15.03.2011 e 06.05.2011 a Petrogal retirou para produção a quantidade de 93.552,800 MT de crude sem conhecimento das autoridades aduaneiras, sem que lhe tenha sido atribuído um destino aduaneiro (fls. 2 a 8 do PA, Vol. I).
E) Em 06.05.2011, após o pedido de esclarecimento efectuado pela Delegação Aduaneira de Sines, foi apresentado o Documento Administrativo Único (DAU/Declaração Aduaneira de Importação) para livre prática com o n.º 2011PT00067020112090, de 6.5.2011, tendo sido declarado para o regime 07 00 - livre prática para entreposto fiscal - 131 380,249 MT. de óleo mineral em rama.
F) No mesmo DAU foi liquidada a taxa de fazendas demoradas correspondente a 5% sobre o valor da mercadoria, no montante de 3.376.417,26 Euros, registado com o n.º 2011/0028686 de 06.05.2011, rectificado, sob o n.º 2011/0029704, em 10.05.2011, a 93.352,800 MT de óleo mineral em rama.
G) Em 09.05.2011, a Petrogal foi notificada da liquidação efectuada no DAU, para pagar em dez dias, sendo que a caução global de desalfandegamento não se revelava suficiente para garantir o montante em dívida (cfr. fls. 25 e 26 do PA - Vol. I).
H) Em 20.05.2011, a Petrogal apresentou, junto da Alfândega de Setúbal, requerimento a solicitar a prestação de garantia no montante total da liquidação em causa com a finalidade de suspender a execução da liquidação.
I) Nesta mesma data, a Petrogal apresentou junto da Alfândega de Setúbal a Reclamação Graciosa daquele ato de liquidação e requereu a prestação da garantia, nos termos do artigo 69.º, alínea f) do Código de Procedimento e de Processo Tributário, tendo em vista obter o efeito suspensivo até decisão, o que foi autorizado, encontrando-se prestada uma fiança bancária com data de início de 13.06.2011, no montante de 3.376.417,26 Euros (de fls. 36 a 38 do PA, Vol. I).
J) A Diretora da Alfândega de Setúbal confirmou a manutenção do ato de liquidação de fazendas demoradas, com base no entendimento na legalidade do ato praticado.
L) Mediante a interposição de “reclamação graciosa”, foi pedida a revogação do acto de liquidação do chefe da Delegação Aduaneira de Sines, de 06.05.2011, corrigido em 10.05.2011, por violação flagrante do princípio da proporcionalidade nas suas acepções de adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito ou, em alternativa, com fundamento em violação de lei, uma vez que a liquidação em crise não foi precedida da sujeição das mercadorias ao regime de hasta pública, nos termos dos artigos 638.º a 678.º do RA, devendo o artigo 639.º ser objecto de interpretação atualizada de forma a remeter a sua aplicação para o último lugar das medidas legalmente admissíveis.
M) Convolada oficiosamente a reclamação graciosa em recurso hierárquico, o mesmo viria a ser indeferido pelo Despacho do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais por despacho nº 210/2011-XIX, proferido em 30.12.2011.

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2.2.- Motivação de Direito

Preliminarmente, há que realçar que, como já ficou relatado, por acórdão prolatado em 27.10.2022, foi determinado o reenvio prejudicial ao TJUE (cfr. p. 502 SITAF), sendo que por decisão do TJUE - proc.º n.º C-706/21, de 01.06.2022, “O pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), por Decisão de 27 de outubro de 2021, é manifestamente inadmissível”.
Nesta sequência, se é certo que a aludida decisão aponta que o órgão jurisdicional de reenvio conserva a possibilidade de apresentar um novo pedido de decisão prejudicial fornecendo ao Tribunal de Justiça todos os elementos que permitam a este decidir, não é menos certo que, nos fundamentos da sua decisão, o TJUE acaba por descortinar que o Acórdão de 7 de Dezembro de 2000, de Andrade (C-213/99) se inscreve num contexto jurídico comparável ao do presente processo, uma vez que diz respeito à conformidade, tendo em conta o direito da União, das mesmas disposições de direito português.
A partir daqui, perante a realidade em equação nos autos, cremos que os elementos apontados nos autos colhem aqui matéria bastante para avançar com a apreciação do presente recurso, dado que, não houve alteração da norma descrita, o que inculca a ideia de que o TJUE voltaria a reafirmar o já exposto no Acórdão de 7 de Dezembro de 2000, de modo que, não se justifica utilizar a faculdade antes apontada pelo TJUE, até porque em relação à matéria que transcendia o referido Acórdão, o TJUE utiliza uma justificação, que tem de aceitar-se, mas que é altamente discutível no plano metodológico, dado que, em lugar de proceder à análise pretendida no sentido de habilitar o órgão jurisdicional de reenvio com a ferramenta interpretativa necessária para a decisão da matéria em apreço, aparenta reclamar uma definição prévia da situação a confirmar ou infirmar em função do que vier a ser decidido por aquele Tribunal.

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Posto isto, é consabido que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA e 2º al. e) do CPPT.
No caso, em face dos termos em que foram enunciadas as conclusões de recurso pela recorrente, as questões que cumpre decidir subsumem-se a saber se a decisão vertida no acórdão, a qual julgou indeferida a acção administrativa especial intentada, padece de (i) nulidade por omissão de pronúncia, uma vez que suscitou a apreciação da questão relativa à impossibilidade de aplicação do regime das “fazendas demoradas” a cerca de 71% das mercadorias objecto do acto de liquidação, por já terem sido utilizadas, mas sobre a mesma não foi emitida qualquer pronúncia por parte do tribunal recorrido, padece de (ii) erro de julgamento por errónea interpretação do regime legal aplicável, previsto nos artigos 678º e 679º do Regulamento das Alfândegas, uma vez que não tendo a Alfândega iniciado o procedimento de venda da mercadoria, não haveria lugar à aplicação da sanção pecuniária prevista no §2º do artigo 679º do RA, e ainda que assim se entendesse, sempre tal aplicação se restringiria à mercadoria que nessa altura se encontrava armazenada, por a restante já ter sido introduzida no processo produtivo, e padece ainda (iii) do vício de inconstitucionalidade da norma contida no artigo 639º, §2º do RA, por violação do princípio da proporcionalidade e da igualdade, em razão da natureza materialmente contraordenacional da sanção, e por se tratar de lei restritiva de Direitos, Liberdades e Garantias (ou direitos análogos), revelando-se a medida administrativa adoptada excessiva e desproporcionada, violando nessa medida o princípio da proporcionalidade em sentido estrito ou princípio da justa medida, ínsito no princípio do estado de direito democrático, consagrado no artigo 2º da CRP.
Aquilatando.

(i) -Da nulidade do acórdão por omissão de pronúncia

Neste vector, substancia a recorrente que, embora nos artigos 122º, 123º e 124º da sua petição inicial desencadeou a apreciação da questão relativa à impossibilidade de aplicação do regime das “fazendas demoradas” a cerca de 71% das mercadorias objecto do acto de liquidação, por já terem sido utilizadas, sobre a mesma não foi emitida qualquer pronúncia por parte do tribunal recorrido, o que constitui o vício decisório de omissão de pronúncia, gerador da sua nulidade.
Prescreve o art. 615°/1, d) do CPC (em consonância com o artº 125º do CPPT), que “é nula a sentença quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.”
Um vício que tem a ver com os limites da actividade de conhecimento do tribunal, estabelecidos quer no art. 608º/2 do CPC: «O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras», quer, com referência à instância recursiva, pelas conclusões da alegação do recorrente, delimitativas do objecto do recurso, conforme resulta dos artigos 635º/4 e 639º/1 e 2, do mesmo diploma legal.
Se o juiz deixa de conhecer questão submetida pelas partes à sua apreciação e que não se mostra prejudicada pela solução dada a outras, peca por omissão.
Vício relativamente ao qual importa definir o exacto alcance do termo «questões» por constituir, in se, o punctum saliens da nulidade.
Como é comummente reconhecido, vale a este propósito, ainda hoje, o ensinamento de ALBERTO DOS REIS, na distinção a que procedia: «[….] uma coisa é o tribunal deixar de pronunciar-se sobre questão que devia apreciar, outra invocar razão, boa ou má, procedente ou improcedente, para justificar a sua abstenção.»
«São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer a questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão.»
O mesmo é dizer, o tribunal deve resolver todas e apenas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, mas não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação e aplicação das regras de direito, pelo que os argumentos, motivos ou razões jurídicas não o vinculam, ou dizer ainda, o juiz não tem que esgotar a análise da argumentação das partes, mas apenas que apreciar todas as questões que devam ser conhecidas, ponderando os argumentos na medida do necessário e suficiente.
Diz, a este mesmo propósito, LEBRE DE FREITAS: «Resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação não significa considerar todos os argumentos que, segundo as várias vias, à partida plausíveis, de solução do pleito, as partes tenham deduzido ou o próprio juiz possa inicialmente ter admitido.
Por um lado, através da prova, foi feita a triagem entre as soluções que deixaram de poder ser consideradas e aquelas a que a discussão jurídica ficou reduzida.
Por outro lado, o juiz não está sujeito às alegações das partes quanto à indagação, interpretação e aplicação das normas jurídicas (art. 5-2) e, uma vez motivadamente tomada determinada orientação, as restantes que as partes hajam defendido, nomeadamente nas suas alegações de direito, não têm de ser separadamente analisadas.»
Numa que parece ser ainda maior exigência, referia ANSELMO DE CASTRO:
«A palavra questões deve ser tomada aqui em sentido amplo: envolverá tudo quanto diga respeito à concludência ou inconcludência das excepções e da causa de pedir (melhor, à fundabilidade ou infundabilidade dumas e doutras) e às controvérsias que as partes sobre elas suscitem. Esta causa de nulidade completa e integra, assim, de certo modo, a da anulabilidade por falta de fundamentação. Não basta à regularidade da sentença a fundamentação própria que contiver; importa que trate e aprecie a fundamentação jurídica dada pelas partes. Quer-se que o contraditório propiciado às partes sob os aspectos jurídicos da causa não deixe de encontrar a devida expressão e resposta na decisão.»
Todavia, aquele autor logo ressalva que «Seria erro, porém, inferir-se que a sentença haja de examinar toda a matéria controvertida, se o exame de uma só parte impuser necessariamente a decisão da causa, favorável ou desfavorável. Neste sentido haverá que compreender-se a fórmula da lei “exceptuadas aquelas questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras”».
Omissão de pronúncia que se não verifica no caso em apreço, pois, tal como aponta o EPGA no seu douto Parecer, a alegação feita nos artigos 122º, 123º e 124º da petição inicial por parte da impugnante e aqui Recorrente não consubstancia uma questão jurídica autónoma, mas simplesmente uma argumentação para sustentar a verificação do vício de ilegalidade imputado ao ato de liquidação das “fazendas demoradas” ao abrigo do regime previsto no artigo 639º do Regulamento da Alfândega, por no entender da Recorrente o referido regime implicar a abertura de um procedimento de venda da mercadoria em hasta pública, e neste caso parte da mercadoria já ter sido utilizada no processo de produção da Recorrente e nessa medida inviabilizar aquele procedimento de venda.
De resto, é por demais evidente que a impugnante e ora Recorrente identifica como questão jurídica fundamental o vício de “ilegalidade do acto de liquidação por violação de lei, em razão da não observância dos trâmites processuais previstos nos artigos 638º a 678º do RA”, sobre o qual aduz múltiplos argumentos ao longo dos artigos 107 a 124 da sua petição inicial, designadamente o facto de parte da mercadoria já ter sido utilizada no processo de produção, argumento que no seu entender inviabilizaria o procedimento previsto naquelas normas legais.
Ora, tendo a decisão recorrida emitido pronúncia sobre a questão suscitada pela impugnante e resolvida nos termos que a recorrente também reputa errados, e encontrando-se convenientemente fundamentada de facto e de Direito, não é configurável a omissão de pronúncia que lhe vem assacada.
Do que se conclui que apenas as questões essenciais, questões que decidem do mérito do pleito ou, convenhamos, de um problema de natureza processual relativo à validade dos pressupostos da instância, é que constituem os temas de que o julgador tem de conhecer, quando colocados pelas partes.
Por último importa não confundir a nulidade por falta de conhecimento com o erro de julgamento, que se verifica quando o juiz não decide acertadamente, por decidir «contra legem» ou contra os factos apurados [vd A. dos Reis, In “Código de Processo Civil”, Anotado, Volume V, pg. 130].
Ora, no caso em apreciação, o tribunal não conheceu de questão de que não devesse conhecer.
Assim, independentemente da maior ou menor validade da argumentação aduzida, o certo é que não se está em presença de omissão de pronúncia porque se acha em causa o conhecimento de questão de que o tribunal devia conhecer, mas apenas em face do desenvolvimento de um raciocínio no âmbito da ponderação de determinada questão, no caso a atinente ao regime legal aplicável que, a nosso ver, abrangia a questão que agora o recorrente diz ter o tribunal deixado de conhecer.
Resultando da análise da decisão recorrida que o Tribunal se pronunciou especificamente e de forma clara, rigorosa e explícita sobre todas as causas de pedir invocadas, ainda que não aluda a sobre todos e cada um dos argumentos aduzidos pois o que importa é que o tribunal decida, como decidiu, as questões postas, não lhe incumbindo apreciar todos os fundamentos ou razões em que eles se apoiam para sustentar a pretensão, conclui-se que a mesma não está, de todo em todo, afectada na sua validade jurídica por omissão de pronúncia, não se verificando a arguida nulidade.
Em vista da situação concreta, Fernando Amâncio Ferreira adverte para uma confusão muito amiudada e que dá origem a que a omissão de pronúncia seja frequente e indevidamente invocada nos tribunais nos seguintes termos:
«Trata-se da nulidade mais invocada nos tribunais, originada na confusão que se estabelece com frequência entre questões a apreciar e razões ou argumentos aduzidos no decurso da demanda» e «não enferma de nulidade de omissão de pronúncia o acórdão que não se ocupou de todas as considerações feitas pelas partes, por as reputar desnecessárias para a resolução do litígio» (Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, 9.ª edição, pág. 57).
Não se verifica, pois, a nulidade da decisão recorrida por omissão de pronúncia.

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(ii) - Do erro de julgamento por errónea interpretação do regime legal aplicável, previsto nos artigos 678º e 679º do Regulamento das Alfândegas

Substanciando-o, esgrime a Recorrente que o mesmo decorre de a Alfândega ter iniciado o procedimento de venda da mercadoria, não havendo por isso lugar à aplicação da sanção pecuniária prevista no §2º do artigo 679º do RA; mas, admitindo o entendimento contrário, a aplicação de tal sanção seria circunscrita à mercadoria que nesse momento se encontrava armazenada dado que a sobrante já havia sido introduzida no processo produtivo.
Que dizer de tal argumentação?
Em sede de decisão fáctica flui claramente do probatório fixado na decisão recorrida que, em 15/03/2011 a Recorrente recebeu, via marítima e proveniente do Brasil, “granel de óleo mineral em rama”, o qual foi descarregado para o entreposto fiscal de que a Recorrente é titular em Sines, e só em 06/05/2011, (portanto, decorrido o período de 45 dias previsto no artigo 49º, nº1, alínea a), do Código Aduaneiro Comunitário), é que foi apresentada a Declaração Aduaneira de Importação para livre prática, tendo a delegação aduaneira de Sines liquidado a “taxa de fazendas demoradas”, correspondente a 5% sobre o valor da mercadoria.
Enquadrando essa factualidade o acórdão recorrido ajuizou que se tratava de “cobrança da taxa administrativa de natureza compulsória”, que se exprime numa percentagem de 5% prevista no artigo 639.°, § 2.° do RA, estabelecida “ad valorem” , por se tratar de mercadorias extra-comunitárias mantidas em regime de suspensão de direitos aduaneiros devidos, para lá do prazo máximo previsto na lei para a atribuição de destino aduaneiro à mercadoria».
E, na verdade, estatuía o § 2º do artigo 639º do RA, na redacção introduzida pelo Dec.-Lei nº 483-E/88, de 28 de Dezembro, “as mercadoras despachadas ao abrigo do disposto neste artigo estão sujeitas ao pagamento de todos os encargos e imposições devidos, acrescidos da percentagem de 5% sobre o seu valor”, o que vale por dizer, cujo desalfandegamento tenha ocorrido após o período de armazenagem de 45 dias previsto no artigo 49º, nº1, alínea a), do Código Aduaneiro Comunitário.
Pontifica a tal respeito o trilho jurisprudencial traçado no Acórdão do Pleno deste STA de 24/09/2003, tirado no Processo nº 024108), que assenta em que essa constitui uma “medida administrativa de natureza compulsória, cuja finalidade é a de promover o respeito dos prazos de desalfandegamento de mercadorias por parte dos operadores económicos”.
Mais se fundamenta nesse douto aresto que “Acentuando que "o objectivo de um direito como a taxa controvertida... (ora, em causa), que visa penalizar os operadores económicos que não respeitem as formalidades e os prazos previstos, não se afigura contrário ao direito comunitário" pois, "se não existisse tal medida, a inobservância das formalidades previstas acabaria por não ter qualquer consequência para o operador autorizado a regularizar a sua situação depois de expirados os prazos".
Insistindo em que a dita sanção que qualifica de "medida de segurança destinada a garantir o pagamento efectivo do direito correspondente", "não se afigura contrária ao direito comunitário, observando, embora, que ela deve ser fixada "em condições análogas às existentes em direito nacional para infracções da mesma natureza e da mesma gravidade".
Mas já acima se viu que não estão em causa "infracções" sequer da mesma natureza.
É, assim, de concluir que a percentagem, ad valorem, de 5%, prevista no parág. 2º do artº 639º do regulamento das Alfândegas, não viola o direito comunitário, nomeadamente o actual artº 25º (ex - artº 12º) do Tratado da Comunidade Europeia, não podendo ser considerado "um encargo de efeito equivalente a um direito aduaneiro", proibido por aquele normativo.
Cfr., aliás, sobre a natureza da dita percentagem, e por mais recentes, os Ac. do Tribunal Constitucional, de 02Out02 in D. Rep., 2ª série, de 05Nov02, de 11Dez01 in cit. de 1Fev02 e do TCA, de 16Out01 in CTF, 403-337.
E, sobre a conformidade do predito normativo, com o direito comunitário, os Acd.s do STA, de 19-12-01 Rec. 23.529, 02-05-01 Rec. 23.255 e jurisprudência aí citada, in Acd.s Dout. 479-1448 e de 06-06-01 Rec. 23.231.”
Condensando a doutrina plasmada no acórdão uniformizador que vimos seguindo e citando, como pode ver-se em www.dgsi.pt, elaborou-se o seguinte sumário:
“I - A percentagem ad valorem prevista no parág. 2º do artº 639º do Regtº das Alfândegas não constitui um encargo de efeito equivalente, no sentido do actual artº 25º (ex artº 12) do Tratado da Comunidade Europeia, tendo, antes, natureza de sanção processual ou procedimental administrativa, tendente a assegurar o normal desenvolvimento do processo de desalfandegamento das mercadorias, ou de natureza compulsória, porventura idêntica à sanção pecuniária compulsória de direito civil - artº 829º - A do Cód. Civil.
II - No plano do direito comunitário - como, aliás, no do direito interno - não existe qualquer equivalência entre a percentagem em causa e as contra-ordenações fiscais aduaneiras, seja em razão dos respectivos elementos constitutivos, seja pelos especiais interesses ou valores jurídicos que lhes subjazem.”
Por esse injuntivo prisma e volvendo ao caso concreto, constata-se que, uma vez que já decorrera o prazo de 45 dias que a Recorrente tinha para sujeitar a mercadoria às formalidades destinadas a atribuir-lhe um destino aduaneiro (art.49º, nº1, al.a), do CAC), essa mercadoria fica num estado de abandono, recaindo sobre a Administração Aduaneira o ónus de regularizar a sua situação, designadamente através da venda.
Findo aquele prazo, o destinatário da mercadoria só podia proceder ao seu desalfandegamento mediante a sua sujeição à designada “taxa de fazendas demoradas” pelo que, independentemente de a mercadoria se encontrar em entreposto fiscal de que a Recorrente é titular, ou de a Administração Aduaneira não ter iniciado o procedimento de venda em hasta pública, a referida taxa é sempre devida caso o desalfandegamento seja efectuado decorrido aquele prazo de 45 dias.
E a essa conclusão não obsta o facto alegado pela recorrente de que parte da mercadoria já não se encontrava em armazém, pois o que é verdadeiramente determinante é o procedimento de desalfandegamento, que abrange toda a mercadoria sem prejuízo da relevância em sede contraordenacional do comportamento da Recorrente ao dar-lhe o destino anunciado, como bem acentua o Ministério Público.
Sendo igualmente de corroborar o ponto de vista do Distinto PGA no sentido de que não assiste razão à Recorrente ao invocar a violação do princípio da proporcionalidade, em termos de necessidade da medida perante o fim visado, pois como operador autorizado e titular de entreposto fiscal tinha perfeito conhecimento das consequências da ultrapassagem do referido prazo de desalfandegamento da mercadoria, motivo pelo qual não se impunha à Administração a concessão de prazo para regularizar a situação, a não ser que o mesmo tivesse sido requerido pela Recorrente, em função de causas justificativas, o que não foi o caso.
Termos em que improcedem as conclusões recursórias em apreço.

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(iii) - Do vício de inconstitucionalidade da norma contida no artigo 639º, §2º do RA, por violação dos princípios da proporcionalidade, da proibição do excesso e da igualdade

Neste segmento, a recorrente assaca ao acórdão recorrido os vícios de inconstitucionalidade do artigo 639º, §2º do RA, por violação do princípio da proporcionalidade e da igualdade, em razão da natureza materialmente contraordenacional da sanção, e por se tratar de lei restritiva de Direitos, Liberdades e Garantias (ou direitos análogos) decorrente de se tratar de “uma norma que comprime e viola de forma abusiva o direito de propriedade privada, em violação do artigo 18º e 62º da CRP”, porque a lei não impõe qualquer limite à fixação em concreto, bem como de o disposto nos artigos 638º e 639º, nº2, do RA, interpretados nos termos perfilhados pelo tribunal a quo, é inconstitucional, por violação do princípio do Estado de Direito, nos subprincípios da proporcionalidade e proibição do excesso.
Da bem elaborada sentença recorrida destaca-se o seguinte bloco fundamentador:
“(…)
Quanto à alegação que a aplicação das ditas fazendas demoradas não deveriam ter sido aplicados ao caso concreto porque as mercadorias não se encontravam em regime de hasta pública, requisito indispensável à aplicação do artigo 639.° do Regulamento das Alfândegas, resulta dos factos descritos no processo administrativo, que, tendo a administração aduaneira constatado, em 03.05.2011, que a declaração sumária relativa à contra marca n° 280/2011 se encontrava por apurar, e que o prazo de depósito temporário previsto no artigo 49.° do CAC tinha sido ultrapassado, foi imediatamente instaurado o correspondente processo de fazendas demoradas; e que, instada a Autora a indicar o regime aduaneiro atribuído à mercadoria em causa e a respectiva declaração aduaneira, a mesma apresentou, em 6 de Maio de 2011, a Declaração Aduaneira solicitando a atribuição do regime de Livre Prática e sujeição simultânea em regime de Entreposto Fiscal.
Por tal razão, e porque parte da mercadoria já se encontrava a ser utilizada/ transformada pela Petrogal no seu entreposto fiscal, a alfândega concluiu que não seria do interesse da recorrente que a administração aduaneira procedesse à venda da mercadoria, tendo antes sido regularizada a respectiva situação aduaneira.- portanto não pode a A. “venire contra factum próprio”, ao pretender que se procedesse à venda da mercadoria, que, de resto, já não se encontrava na totalidade em “stock”, por ter sido utilizado indevidamente. – daí que se tenha considerado a dita infracção de descaminho, essa sim, de cariz contra-ordenacional.- cfr sobre as duas figuras e no sentido ora pugnado por este Tribunal vd Ac. do STA, de 24.09.2003, proferido no Proc. Nº 24108.
Nos termos do artigo 639.° do RA, a administração está vinculada à aplicação da referida taxa “ad valorem”, nem pode graduar a aplicação da medida, antes está obrigada à aplicação da taxa de 5% sobre o valor das mercadorias que excederam o prazo de depósito temporário.
Quanto aos alegados princípios constitucionais e legais relativos à boa-fé reportado aos valores fundamentais do direito e da confiança suscitada na A. pela actuação em causa nos autos, não se descortina, face à circunstância de a aplicação da taxa de 5% resultar de um poder vinculado da administração, que não de um poder discricionário, qual a legitima expectativa que poderia o A. acalentar de um outro comportamento por parte do R..
Quanto aos ditos valores fundamentais do direito, assenta a A. nos ditos princípios da proporcionalidade, sendo certo que a jurisprudência comunitária, constitucional e da Instância judicial superior dos TAF, tem vindo a afastar a questão da sua alegada desproporcionalidade, já que tal ponderação implicaria a violação do princípio da legalidade, atenta a formulação do artigo 639.° do Regulamento das Alfândegas “As mercadorias despachadas ao abrigo do disposto neste artigo [as demoradas] estão sujeitas ao pagamento de todos os encargos e imposições devidas acrescidos da percentagem de 5% sobre o seu valor”.
Para mais resultando do Acórdão de 07.12.2000, Processo n.° C-213/99 do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, que “o artigo 53° [do CAC] não se opõe à aplicação automática, sem notificação prévia, dum processo como o previsto pela legislação portuguesa que prevê a venda das mercadorias demoradas para além dos prazos legais previstos para a declaração de colocação em livre prática ou do pedido de atribuição doutro destino aduaneiro”, cfr., Nuno Aleixo, Pedro Rocha e Ricardo de Deus in Código Aduaneiro Anotado e Comentado, 2007, anotação 3 ao artigo 53.°, pág. 360, Ed. Rei dos Livros, no mesmo sentido se pronunciando o acórdão doutrinal de 06.06.2001 do Supremo Tribunal Administrativo, recurso n.° 23 231.
De igual modo o Tribunal Constitucional, no seu Acórdão n.° 414/99, de 26.06.99, veio considerar igualmente que “dado que a finalidade da medida é a de promover o respeito dos prazos de desalfandegamento, é manifesto que os operadores económicos que incumpriram esses prazos verão as mercadorias vendidas, com o consequente prejuízo. Porém, a lei admite que possam obviar a tal venda e prejuízo pagando, além das despesas, a referida percentagem”, para concluir pela proporcionalidade e consequente constitucionalidade da medida administrativa compulsória.
Por sua vez, o Supremo Tribunal Administrativo, no Acórdão doutrinal de 06.06.2001, aprecia a alegada desproporcionalidade da medida, referindo que é colocado “na disponibilidade do importador o pagamento respectivo, para obter o desalfandegamento e obstar à venda em hasta pública” (derradeira medida consentida pelo artigo 75.° do CAC).
E no mesmo sentido, no Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 24.9.2003, Processo n.° 24108, supra mencionado, considerou-se que à taxa de 5% foi atribuída “natureza compulsória, de índole processual ou procedimental, visando promover o normal desenvolvimento do processo de desalfandegamento das mercadorias”.
E mais adiante, no mesmo aresto, citando o Acórdão de 19.12.2001, Recurso 23529, do mesmo Supremo Tribunal Administrativo “o operador económico é livre de escolher entre o pagamento dos direitos aduaneiros e da sanção pecuniária compulsória ou deixar ir os bens para venda em hasta pública.” Ora,
O produto em causa, com o estatuto de mercadoria em depósito temporário, conservou esse estatuto até lhe ter sido atribuído um destino aduaneiro, nos termos do artigo 50.° do CAC, o que veio a acontecer, por acto voluntário da então reclamante, quando foi apresentada e aceite a declaração para livre prática.
A circunstância de estar fisicamente em entreposto fiscal de produção não alterou o referido estatuto, antes o novo estatuto de produto comunitário em suspensão de IEC só foi adquirido após aceitação do DAU em 06.05.2011, data em que já havia passado à situação de mercadoria demorada e, consequentemente, sujeita juridicamente ao regime de venda.
Acresce que o artigo 53.° do CAC, norma que, na interpretação comunitária da compatibilidade da taxa de fazendas demoradas com o direito comunitário, constitui a base jurídica que fundamenta o juízo interpretativo da sua conformidade com o direito comunitário, na medida em que permite às autoridades aduaneiras a aplicação de uma medida mais gravosa, a venda, tem por objecto as mercadorias em relação às quais não foram cumpridas as formalidades destinadas a atribuir-lhes um destino aduaneiro nos prazos fixados no artigo 49.° Ora, nos termos dos ditos princípios gerais do direito, “quem permite o mais, permite o menos”, encontrando-se sempre ressalvado o direito do interessado de deixar prosseguir o processo de venda de tais mercadorias Por isso,
Toda a jurisprudência produzida, quer comunitária, quer nacional, considera sempre a aplicação da taxa de 5%, tendo-a como proporcional, entre outros motivos, porque o seu pagamento não é obrigatório, antes está dependente de um acto de vontade de quem devia ter cumprido o prazo previsto no artigo 49.°, alínea a) do CAC e não o fez.
E esse acto de vontade traduz-se, efetivamente, no caso concreto, pela apresentação do DAU para livre prática.
Quanto ao alegado pela Autora relativo à pretensa desconformidade da taxa de fazendas demoradas prevista no § 2º, do artigo 639°, do RA, com a alínea a), do n.° 1, do artigo VIII do GATT, assenta num pressuposto que não se verifica, porquanto a taxa de fazendas demoradas não constitui uma taxa pela prestação de qualquer serviço pelas autoridades aduaneiras, sendo, como sobredito, e jurisprudencialmente se firmou, uma medida administrativa de carácter compulsório.
Quanto à dita violação pelo artigo 53.°, n° 1, em articulação com o artigo 49.°, n° 1 alínea a), ambos do CAC, por não respeitar os critérios consagrados no n.° 3 do artigo VIII do GATT, dir-se-á que a mesma se refere a emolumentos e taxas aplicadas no âmbito de serviços prestados, o que, no presente caso é igualmente imprestável para os presentes autos, porque, como também já se mencionou, a taxa de fazendas demoradas não constitui uma taxa pela prestação de qualquer serviço pelas autoridades aduaneiras.”
Discurso jurídico que reputamos irrepreensível e que propendemos a corroborar na íntegra, pelo que já se disse e especialmente pelo que diremos a seguir.
Sobre a temática em referência aderimos de pleno, tal como o fez o Ministério Público no seu douto parecer, à doutrina consagrada no acórdão deste STA de 08/03/2001, proferido no recurso nº 023254 e que se pode consultar em https://dre.pt/application/file/a/4081910 de harmonia com a qual a taxa prevista no §2º do artigo 639º do Regulamento das Alfândegas, “não tem carácter sancionatório, constituindo um condicionamento à utilização da faculdade de dar um destino aduaneiro às mercadorias depois de decorrido o prazo legal, com o que se quer desincentivar o tardio desalfandegamento, sem envolver qualquer juízo de censura sobre a conduta do agente”, sendo que «Mesmo que se entenda estar-se perante uma sanção, será, então, uma sanção de tipo processual, como a jurisprudência a tem qualificado. A distinção reside no objectivo do estabelecimento da sanção, que não é o de censurar o agente por ter deixado decorrer o prazo sem dar destino à mercadoria, o de reagir à violação do valor ou interesse tutelado pela norma que fixa o prazo, mas o de incentivar o tempestivo desalfandegamento por parte dos operadores económicos, de modo a que os procedimentos tenham um regular desenvolvimento, como convém à boa administração, exigindo um sacrifício económico correspondente à permissão da prática de um acto procedimental depois de esgotado o respectivo prazo».
Cfr. também nesse sentido os acórdão de 9 de maio de 2001, recurso nº 023383 – disponível em https://dre.pt/application/file/a/4077602; de 19/12/2001, recurso nº 23529 (disponível em https://dre.pt/application/file/a/4064862); de 25/06/1998, recurso nº 020982 (disponível em https://dre.pt/application/file/a/4100473); e de 11/10/1995, recurso nº 016659 (disponível em https://dre.pt/application/file/a/4106217).
Essa constelação jurisprudencial em que também se ancora a sentença recorrida, está em linha como o já referido acórdão do Pleno de 24/09/2003, que outorga à taxa sub judice uma “natureza compulsória, de índole processual ou procedimental, visando promover o normal desenvolvimento do processo de desalfandegamento das mercadorias”, não sendo comparável a sanção pecuniária de natureza contraordenacional.
Acresce que, como bem denota o acórdão recorrido, no acórdão nº 414/99 (jurisprudência sufragada igualmente nos acórdãos nº 564/2001 e 393/02) o Tribunal Constitucional já afastou o vício de inconstitucionalidade do artigo 639º do RA, por violação do princípio da proporcionalidade, nos seguintes termos:
«A actuação da Administração está efectivamente vinculada à observância do princípio da proporcionalidade, de modo particularmente relevante no âmbito do desenvolvimento de uma actividade discricionária, da qual constitui um dos limites jurídicos (artigo 266º, n.º 2 da Constituição e artigo 5º, n.º 2 do Código de Procedimento Administrativo).
O princípio da proporcionalidade impõe que exista uma adequação não só entre o fim da lei e o fim do acto como entre o fim da lei e os meios escolhidos para alcançar tal fim. A adequação terá ainda de manter-se entre as circunstâncias de facto que ocasionam o acto e as medidas que vierem a ser efectivamente tomadas. A proporcionalidade abrange assim não só a congruência, adequação ou idoneidade do meio ou medida para realizar o fim que a lei propõe como também a proibição do excesso.
Admitindo que no caso em apreço se está no domínio de intervenção do princípio da proporcionalidade, a fixação de uma percentagem fixa de 5% sobre o valor das mercadorias em causa, já sujeitas ao regime de venda em hasta pública, é medida adequada e idónea para realizar o fim da lei – a liberação das mercadorias do referido regime – passando-as de novo à livre prática?
A resposta é indubitavelmente afirmativa: num momento em que o fim das mercadorias é a sua venda pública, com a consequente perda para o respectivo dono, pode este desembaraçar a mercadoria pagando o quantitativo fixado legalmente. Este quantitativo tem o seu valor pré-fixado na lei, dependendo o quantitativo a desembolsar de mera operação aritmética de acordo com o valor declarado das mercadorias.
Dado que a finalidade da medida é a de promover o respeito dos prazos de desalfandegamento, é manifesto que os operadores económicos que incumpriram esses prazos verão as mercadorias ser vendidas, com o consequente prejuízo. Porém, a lei admite que possam obviar a tal venda e prejuízo pagando além das despesas a referida percentagem. O valor da quantia a pagar depende do valor das próprias mercadorias, e a opção, entre o seu pagamento ou não, está na disponibilidade do respectivo dono, dependendo apenas de sua vontade em dispor das mercadorias, pois a administração, feito o pedido de despacho, está obrigada a desembaraçar as mercadorias.
Não existe, assim, no caso em apreço uma situação relativamente à qual se possa afirmar que a estipulação da medida administrativa compulsória em causa seja intoleravelmente desproporcionada ou exorbitante e, por isso, seja constitucionalmente inadmissível».
E há que chamar à colação, como se fez igualmente na sentença recorrida, o acórdão do Tribunal de Justiça de 07/12/2000, proc. C-213/99, no qual se verteu que «a aplicação de um processo que prevê a venda das mercadorias demoradas ou a cobrança de uma taxa ad valorem para regularização da situação destas mercadorias não é, em si mesma, contrária ao princípio da proporcionalidade. Compete ao órgão jurisdicional nacional apreciar se a taxa prevista no caso dos autos do processo principal respeita este princípio».
E também não colhe a alegação da Recorrente de que no acórdão do TC atrás referido o tribunal não teve em consideração o desvalor do montante em concreto fixado e que no caso dos autos resulta manifestamente excessivo, sendo que a ausência de um limite máximo para a medida em causa não só viola o princípio da proibição do excesso, como o princípio da igualdade, por criar situações de disparidade entre operadores.
Porém, neste ponto, patenteia o probatório fixado no acórdão recorrido que a ajuizada taxa foi calculada no montante de € 3.376.417,26 euros, correspondente a 5% do valor da mercadoria e já se viu, em linha com o referido acórdão do STA de 08/03/2001, que o fim da sanção compulsória é «o de incentivar o tempestivo desalfandegamento por parte dos operadores económicos, de modo a que os procedimentos tenham um regular desenvolvimento, como convém à boa administração, exigindo um sacrifício económico correspondente à permissão da prática de um acto procedimental depois de esgotado o respectivo prazo».
Nesta parte entendeu o Ministério Público no seu douto parecer que “…, o valor da taxa obtida é manifestamente excessivo face aos fins visados pela norma e aos interesses que se pretendem acautelar, revelando-se dessa maneira desproporcionada e exorbitante, e nessa medida constitucionalmente inadmissível, usando as expressões do acórdão do Tribunal Constitucional supra citado.
Com efeito e nesta parte concordamos com a Recorrente que não se pode aquilatar da desproporção da medida em função da perda da mercadoria, uma vez que embora o legislador parta do pressuposto de abandono decorrido que seja aquele prazo de 45 dias (e que justifica a tomada de medidas por parte da Administração Aduaneira para a regularização da situação, designadamente a sua venda), não há propriamente uma decisão de declaração de perdimento da mercadoria a favor do Estado.
Afigura-se-nos, assim, que assiste razão à Recorrente nesta parte, por a medida administrativa tomada ao abrigo do disposto no §2º do artigo 639º do Regulamento das Alfândegas se revelar no caso concreto excessiva e desproporcionada, violando nessa medida o princípio da proporcionalidade em sentido estrito ou princípio da justa medida, ínsito no princípio do estado de direito democrático, consagrado no artigo 2º da CRP, o que constitui fundamento para a anulação da denominada “taxa de fazendas demoradas” aplicada no caso concreto pela Administração Aduaneira.”
Não acompanhamos o Ministério Público nesse modo de ver porquanto e como bem se demonstra na sentença recorrida, quanto à proibição do excesso, o TC, mormente no seu Ac. nº393/2002, de 2 de Outubro de 2002 reiterou que “O Tribunal Constitucional já procedeu à apreciação da conformidade à Constituição da norma que constitui objecto do presente recurso. Com efeito, nos Acórdãos n.ºs 414/99 e 564/2001 (Diário da República, 2.ª série, de 13 de Março de 2000 e de 1 de Fevereiro de 2002, respectivamente), o Tribunal Constitucional procedeu ao confronto da norma em causa com o princípio da proporcionalidade.
No Acórdão n.º 414/99 (para o qual remeteu o Acórdão n.º 564/2001), o Tribunal Constitucional considerou o seguinte:
"A actuação da Administração está efectivamente vinculada à observância do princípio da proporcionalidade, de modo particularmente relevante no âmbito do desenvolvimento de uma actividade discricionária, da qual constitui um dos limites jurídicos (artigos 266.º, n.º 2, da Constituição e 5.º, n.º 2, do Código do Procedimento Administrativo).
O princípio da proporcionalidade impõe que exista uma adequação não só entre o fim da lei e o fim do acto como entre o fim da lei e os meios escolhidos para alcançar tal fim. A adequação terá ainda de manter-se entre as circunstâncias de facto que ocasionam o acto e as medidas que vierem a ser efectivamente tomadas. A proporcionalidade abrange assim não só a congruência, adequação ou idoneidade do meio ou medida para realizar o fim que a lei propõe como também a proibição do excesso.
Admitindo que no caso em apreço se está no domínio de intervenção do princípio da proporcionalidade, a fixação de uma percentagem fixa de 5% sobre o valor das mercadorias em causa, já sujeitas ao regime de venda em hasta pública, é medida adequada e idónea para realizar o fim da lei - a liberação das mercadorias do referido regime -, passando-as de novo à livre prática?
A resposta é indubitavelmente afirmativa: num momento em que o fim das mercadorias é a sua venda pública, com a consequente perda para o respectivo dono, pode este desembaraçar a mercadoria pagando o quantitativo fixado legalmente. Este quantitativo tem o seu valor pré-fixado na lei, dependendo o quantitativo a desembolsar de mera operação aritmética de acordo com o valor declarado das mercadorias.
Dado que a finalidade da medida é a de promover o respeito dos prazos de desalfandegamento, é manifesto que os operadores económicos que incumpriram esses prazos verão as mercadorias ser vendidas, com o consequente prejuízo. Porém, a lei admite que possam obviar a tal venda e prejuízo pagando além das despesas a referida percentagem. O valor da quantia a pagar depende do valor das próprias mercadorias, e a opção entre o seu pagamento ou não está na disponibilidade do respectivo dono, dependendo apenas da sua vontade em dispor das mercadorias, pois a Administração, feito o pedido de despacho, está obrigada a desembaraçar as mercadorias.
Não existe, assim, no caso em apreço, uma situação relativamente à qual possa afirmar-se que a estipulação da medida administrativa compulsória em causa seja intoleravelmente desproporcionada ou exorbitante e, por isso, seja constitucionalmente inadmissível."
Em consequência, o Tribunal Constitucional decidiu não julgar inconstitucional a norma apreciada.”
Nos presentes autos seguir-se-á tal entendimento, remetendo-se, no essencial, para a fundamentação citada.
Destarte, improcedem as conclusões recursórias em análise o vale por dizer que a sentença deve ser confirmada por via da total improcedência do recurso.

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3.- Decisão:

Nos termos expostos, acordam os Juízes deste Tribunal em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas pela recorrente.

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Lisboa, 13 de Julho de 2022. - José Gomes Correia (relator) - Aníbal Augusto Ruivo Ferraz – Pedro Nuno Pinto Vergueiro.