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Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01055/18.7BEBRG
Data do Acordão:10/14/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO VERGUEIRO
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
IRC
MENOS VALIAS
TRIBUTAÇÃO
Sumário:I - O art. 81º nº 2, al. b) do CIRC não só qualificava como menos-valia a diferença negativa entre o resultado da partilha e o custo de aquisição das partes sociais no caso da dissolução e partilha da sociedade, como também fixava o respectivo regime, especial, para a tributação do resultado da partilha, com uma forma própria de cálculo e com deduções específicas.
II - Dado o regime especial assim fixado e na ausência de remissão para o regime de limitação da dedutibilidade então fixado pelo n.º 3 do art. 45.º do CIRC, este não é aplicável àquela situação.
Nº Convencional:JSTA000P26495
Nº do Documento:SA22020101401055/18
Data de Entrada:07/17/2020
Recorrente:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A....., S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
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Processo n.º 1055/18.7BEBRG (Recurso Jurisdicional)



Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. RELATÓRIO

O Excelentíssimo Representante da Fazenda Pública, devidamente identificado nos autos, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, datada de 08-05-2019, que julgou procedente a pretensão deduzida por “A…….., S.A.” no presente processo de IMPUGNAÇÃO relacionado com a liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) n.º 2017 8500032975 e o consequente acto de liquidação de juros compensatórios n.º 2017 00000362574, do exercício de 2013, consubstanciados na demonstração de acerto de contas n.º 2017 00031443020, no montante de imposto a pagar de € 12.939,83.


Formulou nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem:

“ (…)

Pelo exposto, conclui-se que as menos-valias sofridas em resultado da partilha da sociedade, B………, S.A., apenas são dedutíveis por metade do seu valor, nos termos do nº 3 do art. 45º do CIRC.”

A Recorrida “A………, S.A.” apresentou contra-alegações, nas quais enuncia as seguintes conclusões:

“(…)

A. A AT recorreu da sentença proferida nestes autos de impugnação judicial - que, reconhecendo razão à A……….., determinou a anulação da liquidação na parte impugnada - por discordar da interpretação feita pelo douto Tribunal a quo relativamente à interpretação e aplicação in casu do n.º 3 do artigo 45.° do Código do IRC.

B. Sucede que a interpretação dada pelo Tribunal recorrido à referida norma - bem como o modo como a mesma foi aplicada à situação da A……… - se encontra amplamente fundada na jurisprudência unívoca que já se pronunciou sobre este tema entre nós, que, de resto, a sentença recorrida não deixa de invocar.

C. Assim, deverá entender-se que o entendimento da AT - no sentido de só concorrer para a formação do lucro tributável metade do valor apurado nas menos-valias realizadas com a liquidação de sociedades, em decorrência do n.º 3 do artigo 45.° (que, assim, se aplicaria também a estes casos) - já foi ampla e definitivamente afastado.

D. É que, como a referida jurisprudência - e a douta sentença recorrida - explicam, a disciplina fiscal da liquidação de sociedades, constante do artigo 81.°, encontra-se norteada por preocupações próprias e é, no Código do mc, absolutamente auto suficiente, no sentido de que ela contém a regulamentação completa dos efeitos tributários que lhe competem, tanto na esfera da sociedade liquidada como no plano dos respectivos sócios, sem carecer de qualquer integração por recurso a outras normas do Código (designadamente, o artigo 45.°).

E. Pelo que, fixando o mencionado artigo 81.°, n.º 2, alínea b), do Código do mc um regime especial para a tributação do resultado da partilha, e inexistindo qualquer remissão (expressa ou sequer implícita), para o regime geral de limitação da dedutibilidade das menos valias, previstas no n.º 3 do artigo 45.° do mesmo diploma, deve entender-se que este último regime não tem aplicação nos casos como aquele que se discute nos presentes autos.

F. Para além disso, comparando os dois preceitos quanto à respetiva ratio, bem como no que concerne aos seus elementos histórico, literal e sistemático, conclui-se também (necessariamente) que a limitação fiscal estipulada pelo legislador no artigo 45.0 não tem cabimento nas situações subsumíveis ao disposto no artigo 81.0 do Código do IRC (as menos-valias decorrentes da liquidação de sociedades não provêm da transmissão onerosa de partes de capital nem são «outras perdas ou variações patrimoniais negativas»).

G. Tudo sopesado, dúvidas não restam quanto ao facto de a perda apurada pela A……. na liquidação da B……… ser, nos termos legais, plena e integralmente dedutível para efeitos fiscais.

H. Sendo assim, a interpretação da AT não tem, com o devido respeito, qualquer cabimento legal, pelo que não deve ser dado provimento ao recurso interposto, antes se mantendo na ordem jurídica a sentença recorrida, a qual não merece qualquer censura.

NESTES TERMOS E NOS MAIS DE DIREITO, REQUER-SE A V. EXAS. QUE SE DIGNEM CONSIDERAR TOTALMENTE IMPROCEDENTE O RECURSO INTERPOSTO PELA RECORRENTE, COM TODAS AS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS.”

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Cumpre decidir.




2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que a matéria apontada nos autos resume-se, em suma, em saber se as menos-valias resultantes do aumento de capital realizado pela impugnante numa sua participada, a B…………, S.A., no valor de 4 271 000,00€, poderão ser englobadas por metade do seu valor nos termos do nº 3 do art. 45º do CIRC, ao tempo em vigor, aquando da liquidação e partilha desta última sociedade.



3. FUNDAMENTOS

3.1. DE FACTO

Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:

“…

1) A sociedade A………., S.A., ora Impugnante, NIPC ………., é uma sociedade comercial constituída sob a forma de sociedade anónima, com um capital social de € 32.500.000,00, representado por 32.500.000 ações de valor nominal de € 1,00 cada, e encontra-se registada para o exercício da atividade principal de - Acabamento de fios, tecidos e artigos têxteis N.E.‖ a que corresponde o Código de Atividades Económicas (CAE) 13303, estando enquadrada, à data de 31/12/2013, em sede de IRC, no regime geral de determinação do resultado tributável e, em sede de IVA, no regime geral de periodicidade mensal - (cfr. ponto II.2 do Relatório de Inspeção Tributária (RIT), de fls. 59 do Processo Administrativo (PA) constante do documento 005797591 do SITAF e que aqui se dá por integralmente reproduzido).
2) Os Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Braga (SIT), desencadearam procedimento inspetivo externo à aqui Impugnante, ao abrigo da ordem de serviço n.º OI201702786, de âmbito parcial ao imposto de IRC e ao período/exercício de 2013, com início em 16/10/2017 e conclusão dos atos inspetivos em 30/10/2017 – (cfr. ordem de serviço e ponto II.1 do RIT, de fls. 13 e 59 do Processo Administrativo (PA) constante do documento 005797591 do SITAF e que aqui se dá por integralmente reproduzido).
3) Em 27/11/2017, foi elaborado pelos SIT, relatório de inspeção tributária, sancionado superiormente em 28/11/2017, onde foram efetuadas correções à matéria tributável de IRC do exercício de 2013 no montante de € 10.534.824,62 - (cfr. quadro de fls. 58 do Processo Administrativo (PA) constante do documento 005797591 do SITAF e que aqui se dá por integralmente reproduzido).
4) As correções referidas no ponto 3) deste probatório, resultaram da seguinte fundamentação inclusa no relatório de inspeção, que dali se extrai e que para o que ora interessa consta o seguinte:
- (…)
III.2. Cálculo de resultado da partilha
No apuramento do resultado tributável do ano de 2013, o sujeito passivo deduziu, no campo 769 do quadro 07 da declaração de rendimento modelo 22 de IRC, o montante de 15.951.942,19 EUR relativos ao resultado da partilha da sociedade B………….. SA, NIPC ……………., dissolvida em 2013-12-27, escriturada pelo Método da Equivalência Patrimonial, calculado da seguinte forma:

Por seu lado, o custo de aquisição considerado corresponde às seguintes entradas para o capital social da participada, de acordo com a ata da Assembleia Geral constante do anexo I:

1. Capital social em 2012-12-31: 2.400.000,00 EUR;
2. Conversão em capital social das prestações acessórias já constituídas no montante de 9.289.000,00 EUR (saldo de 9.264.000,00 EUR em 2012-12-31, acrescido de 25.000,00 EUR realizadas durante o ano de 2013);
3. Aumento de capital social de 4.271.000,00 EUR subscrito por entrada em dinheiro.
A sociedade B…………….. SA encontra-se cessada em IVA desde 2012-12-31, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 34.º do Código do IVA. Através da consulta à declaração de Informação Empresarial Simplificada/Declaração Anula do ano de 2012, verifica-se que o ativo da empresa ascendia, em 2012-12-31, a 42.666,18 EUR, apresentando um passivo de 4.280.403,06 EUR, e um capital próprio negativo de 4.237.736,88 EUR, para o qual contribuíram os resultados transitados negativos de 15.775.668,05 EUR. Analisada a composição do saldo credor da conta de fornecedores, observa-se que o sujeito passivo é o principal credor da empresa, com um montante acumulado, em 2012-12-31, de 4.261.007,71 EUR.
Pelo exposto, conclui-se que o aumento de capital da B……… SA em 4.271.000,00 EUR, subscrito integralmente pelo sujeito passivo, efetuado num ano em que já não tinha qualquer atividade, ocorreu, na sua quase totalidade, para fazer face ao pagamento da dívida que aquela empresa tinha perante o sujeito passivo, uma vez que já não possuía ativos suficientes para a saldar.
Ora, pela via do aumento de capital e imediata dissolução da sociedade, o sujeito passivo viu reconhecida uma menos-valia na partilha da sociedade correspondente à quase totalidade do capital investido, bem como viu reavido o valor do seu crédito, o qual, de outra forma, constituiria uma perda só recuperável fiscalmente pela via da constituição de uma imparidade ou pela via da incobrabilidade, cumpridas as regras emanadas pelo artigo 36.º e artigo 41.º do CIRC, respetivamente, na redação à data.
Assim, conclui-se que o aumento de capital social da sociedade B…….. SA em 4.271.000,00 efetuado pelo sujeito passivo foi fictício na medida do crédito que sobre ela detinha, pelo que o valor de aquisição da participada, para efeitos de apuramento do resultado da partilha, vai ser corrigido para menos em 4.261.007,71 EUR, efetuando-se uma correção fiscal do período de 2013 no mesmo montante.
III.3. Englobamento de resultado da partilha
Conforme anteriormente referido, no apuramento do resultado tributável do período de 2013, o sujeito passivo englobou a totalidade da menos-valia apurada com o resultado da partilha da sociedade B……… SA, no montante de 15.951.942,19 EUR.
O n.º 3 do artigo 45.º do CIRC, na redação à data dos factos, dispunha que “A diferença entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de parte de capital, incluindo a sua remição e amortização com redução de capital, bem como outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, designadamente prestações suplementares, concorrem para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor.‖
Assim sendo, e atendendo à correção proposta no ponto anterior, o sujeito passivo só poderá englobar o seguinte valor:

(…)” - (cfr. fls. 68 e 69 do Processo Administrativo (PA) constante do documento 005797591 do SITAF e que aqui se dá por integralmente reproduzido).

5) O relatório de inspeção tributária referido no ponto antecedente deste probatório, foi remetido à ora Impugnante, através do ofício n.º 52310103, de 29/11/2017, por carta registada com aviso de receção, que o recebeu em 30/11/2017 - (cfr. fls. 54 e 55 do Processo Administrativo (PA) constante do documento 005797591 do SITAF e que aqui se dá por integralmente reproduzido).
6) Na sequência da elaboração e correspondente notificação à ora Impugnante do teor do RIT referido nos pontos anteriores, foi emitida a liquidação adicional de IRC do exercício de 2013 n.º 2017 8500032975 e a respetiva liquidação de juros compensatórios n.º 2017 00000362574, consubstanciados na demonstração de acerto de contas n.º 2017 00031443020, no montante de imposto a pagar de € 12.939,83 - (cfr. doc. n.º 1 junto com a petição inicial e que aqui se dá por integralmente reproduzido).

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Factos não provados
Inexistem factos não provados, com relevância para a decisão a proferir.
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Motivação da decisão de facto
A convicção do Tribunal relativamente à matéria de facto dada como provada resultou da análise dos documentos constantes dos autos e do Processo Administrativo (que contém em anexo, e dele faz parte integrante, cópia do Processo Inspetivo), que não foram impugnados, assim como, na parte dos factos alegados pelas partes que, não tendo sido impugnados, também são corroborados pelos documentos juntos (cfr. art.º 76.º n.º 1 da LGT e art.º 362.º e seguintes do CC), conforme discriminado nos vários pontos do probatório.
Não resultam provados ou não provados quaisquer outros factos com interesse para a decisão.”

«»

3.2. DE DIREITO

Assente a factualidade apurada cumpre, então, entrar na análise da realidade em equação nos autos, sendo que a este Tribunal está cometida a questão de saber se as menos-valias resultantes do aumento de capital realizado pela impugnante numa sua participada, a B………., S.A., no valor de 4 271 000,00€, poderão ser englobadas por metade do seu valor nos termos do nº 3 do art. 45º do CIRC, ao tempo em vigor, aquando da liquidação e partilha desta última sociedade.

Nas suas alegações, a Recorrente refere que o nº 3 do art. 45º do CIRC, com a redacção em vigor à data dos factos, é bem claro ao prever que a diferença negativa entre as mais e as menos valias resultantes em perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio concorrem para a formação do lucro tributável apenas pela metade do seu valor, sendo que este último preceito é uma norma excepcional relativamente à dedutibilidade das perdas constante do art. 23º do CIRC, já que vem delimitar expressamente a dedução da diferença negativa entre as mais e as menos valias resultantes em perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio em apenas metade do seu valor.
Mais aponta que o conceito de perdas ínsito no aludido nº 3 do art. 45º do CIRC é um conceito que abrange especificamente toda e qualquer perda ou variação patrimonial negativa relativas expressamente a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, no qual se inclui naturalmente as menos-valias sofridas em resultado das partilhas das sociedades, incluindo, pois, as consideradas menos-valias previstas no art. 81º do CIRC, ou seja, todas as perdas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio só podem ser englobadas por metade do seu valor e dada a especificação referida expressamente a todas as perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio constante do preceito em causa, outra interpretação do nº 3 do art. 45º ou art. 81º, ambos do CIRC, parece-nos, pois, extremamente forçada.
Que dizer?
Como é sabido, a decisão recorrida julgou procedente impugnação judicial deduzida contra o ato de liquidação adicional de IRC do exercício de 2013, no segmento em que decidiu que o normativo do artigo 45º nº 3 do CIRC (na redacção à data do facto tributário) não é aplicável às menos-valias resultantes da partilha de sociedade participada, no entendimento de que constitui um regime especial para a tributação do resultado da partilha, inexistindo qualquer remissão, no artigo 81.º, para o regime geral de limitação da dedutibilidade das menos-valias previsto no outro citado artigo.

Pois bem, tal como se aponta no Ac. deste Tribunal de 17-02-2016, Proc. nº 01401/14, www.dgsi.pt, “… A determinação do lucro tributável dos sujeitos passivos de IRC faz-se nos termos do n.º 1 do art. 17.º do respectivo Código: «O lucro tributável das pessoas colectivas e outras entidades mencionadas na alínea a) do n.º 1 do artigo 3.º é constituído pela soma algébrica do resultado líquido do exercício e das variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no mesmo período e não reflectidas naquele resultado, determinados com base na contabilidade e eventualmente corrigidos nos termos deste Código».
De acordo com o disposto no art. 20.º, n.º 1, alínea h), do CIRC, «[c]onsideram-se rendimentos [antes, proveitos e ganhos] os resultantes de operações de qualquer natureza, em consequência de uma acção normal ou ocasional, básica ou meramente acessória, nomeadamente (…) h) Mais-valias realizadas; (…)»
No art. 23.º, n.º 1, do mesmo Código especificam-se quais gastos [antes, custos ou perdas] que a lei releva. Após uma definição ampla do conceito de gastos fiscais – «os que comprovadamente sejam indispensáveis para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora» –, o preceito faz uma enumeração meramente exemplificativa, na qual inclui as «menos-valias realizadas» [cfr. alínea l)].
Quanto às variações patrimoniais positivas, diz o n.º 1 do art. 21.º do CIRC: «Concorrem ainda para a formação do lucro tributável as variações patrimoniais positivas não reflectidas no período de tributação, excepto (…) b) As mais-valias potenciais ou latentes, ainda que expressas na contabilidade, incluindo as reservas de reavaliação ao abrigo de legislação de carácter fiscal».
Paralelamente, quanto às variações patrimoniais negativas, dispõe o art. 24.º, n.º 1, do mesmo Código: «Nas mesmas condições referidas para os gastos, concorrem ainda para a formação do lucro tributável as variações patrimoniais negativas não reflectidas no resultado líquido do período de tributação, excepto (…) b) As menos-valias potenciais ou latentes, ainda que expressas na contabilidade».
O n.º 1 do art. 46.º do CIRC dá-nos a definição de mais e menos-valias: «Consideram-se mais-valias ou menos-valias realizadas os ganhos obtidos ou as perdas sofridas mediante transmissão onerosa, qualquer que seja o título por que se opere e, bem assim, os decorrentes de sinistros ou os resultantes da afectação permanente a fins alheios à actividade exercida, respeitantes a: a) Activos fixos tangíveis, activos intangíveis, activos biológicos que não sejam consumíveis e propriedades de investimento, ainda que qualquer destes activos tenha sido reclassificado como activo não corrente detido para venda; b) Instrumentos financeiros, com excepção dos reconhecidos pelo justo valor nos termos das alíneas a) e b) do n.º 9 do artigo 18.º».
O n.º 2 do mesmo artigo indica o método para o respectivo cálculo: «As mais-valias e as menos-valias são dadas pela diferença entre o valor de realização, líquido dos encargos que lhe sejam inerentes, e o valor de aquisição deduzido das perdas por imparidade e outras correcções de valor previstas no artigo 35.º, bem como das depreciações ou amortizações aceites fiscalmente, sem prejuízo da parte final do n.º 5 do artigo 30.º». O valor de realização é definido no n.º 3 do mesmo artigo.
Ou seja, em princípio (Desde que respeitem os requisitos do art. 23.º do CIRC.), as menos-valias e as perdas realizadas por uma sociedade com uma determinada operação comercial concorrem, negativamente, para a formação do lucro tributável do respectivo exercício.

Mas existem algumas limitações, entre as quais ora nos interessa considerar a do art. 45.º do CIRC, com a epígrafe «Encargos não dedutíveis para efeitos fiscais», que no seu n.º 3 estabelecia: «A diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital, incluindo a sua remição e amortização com redução de capital, bem como outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, designadamente prestações suplementares, concorrem para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor».
Esta norma restritiva do montante de menos-valia susceptível de dedução não existia na versão original do CIRC (Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442-B/88, de 30 de Novembro. ). Designadamente, no art. 42.º, que correspondia ao referido art. 45.º, nenhuma restrição havia relativamente à dedução das menos-valias. Como deixámos já dito, apenas se afirmava, na alínea l) do n.º 1 do art. 23.º do CIRC, que se consideravam gastos «as menos-valias realizadas».
A referida norma foi aditada (sob o n.º 3) ao então art. 42.º do CIRC (depois 45.º) pela Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro (Orçamento do Estado ara 2003), com a seguinte redacção: «A diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital, incluindo a sua remissão e amortização com redução de capital, concorre para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor».
O Relatório do Ministério das Finanças para o Orçamento do Estado de 2003 (Disponível em
http://www.dgo.pt/politicaorcamental/Paginas/OEpagina.aspx?Ano=2003&TipoOE=Proposta+de+Or%u00e7amento+do+Estado&TipoDocumentos=Lei+%2f+Mapas+Lei+%2f+Relat%u00f3rio.), após referir «[n]o que respeita às receitas, estabelecem-se desde logo duas prioridades, a saber, o combate à fraude e evasão fiscais e o alargamento da base tributável» (pág. 34), enquadrou a medida de «exclusão parcial (50%) das menos-valias registadas na alienação de partes sociais pela generalidade das empresas» no âmbito das alterações em sede de IRC em ordem ao «alargamento da base tributável e medidas de moralização e neutralidade» (pág. 53).
Ulteriormente, com a entrada em vigor da Lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro (Orçamento do Estado para 2006), o referido n.º 3 do então art. 42.º do CIRC recebeu a seguinte redacção: «A diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital, incluindo a sua remição e amortização com redução de capital, bem como outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, designadamente prestações suplementares, concorrem para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor».
O Relatório do Ministério das Finanças para este Orçamento (Disponível em
http://www.dgo.pt/politicaorcamental/Paginas/OEpagina.aspx?Ano=2006&TipoOE=Proposta+de+Or%u00e7amento+do+Estado&TipoDocumentos=Lei+%2f+Mapas+Lei+%2f+Relat%u00f3rio.) enquadrou esta alteração no âmbito do «combate à fraude e evasão fiscais e outras medidas direccionadas à consolidação orçamental» (pág. 31).
Ou seja, o n.º 3 introduzido no art. 42.º do CIRC (depois, art. 45.º) pelo Orçamento do Estado para 2003 veio impor uma limitação à dedutibilidade das perdas resultantes de menos-valias, nos termos da qual a diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital concorre em apenas metade do seu valor para a formação do lucro tributável. Sob essa óptica, na realização de uma menos-valia seria determinante apurar se esta resulta da transmissão onerosa de partes de capital. Na afirmativa, haveria de se aplicar a limitação dos 50% da diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias.
Com o Orçamento do Estado para o ano de 2006, a referida limitação viu o seu âmbito de aplicação ser alargado: para além das menos-valias resultantes de alienações onerosas, passou também a incluir as transmissões onerosas de «outras componentes do capital próprio».
A norma, em qualquer das suas versões, integra uma medida anti-abuso, na medida em que o legislador terá pretendido (para além do alargamento da base tributável) evitar a manipulação do resultado fiscal.
Tenha-se presente que, após a republicação do CIRC, efectuada pelo Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de Julho, a norma em questão passou a ser o n.º 3 do art. 45.º.
Vejamos agora o que se passa relativamente à liquidação de sociedades, em ordem a indagar do tratamento fiscal a conceder aos rendimentos dela (rectius, da partilha) eventualmente resultantes para os sócios que sejam pessoas colectivas.
Com a dissolução da sociedade [cfr. arts. 141.º a 145.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC)] inicia-se, normalmente, a fase de liquidação, consistindo esta no conjunto de actos realizados com a finalidade de dar satisfação aos direitos de terceiros e realização de activos, assim se criando as condições para atribuição aos sócios dos valores a partilhar (cfr. arts. 146.º, 147.º e 156.º do CSC) (Para maior desenvolvimento, RAÚL VENTURA, Dissolução e Liquidação de Sociedades, Comentário ao Código das Sociedades Comerciais, Almedina, 1987, pág. 210 e segs.).
Os liquidatários deverão pagar todas as dívidas da sociedade para as quais seja suficiente o activo social (art. 154.º do CSC), a começar pelas dívidas fiscais (Sob pena de ficarem pessoal e solidariamente responsáveis pelas importâncias respectivas (cfr. art. 26.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária).), devendo o activo restante ser destinado, em primeiro lugar, ao reembolso do montante das entradas efectivamente realizadas. Se depois de feito o reembolso integral se registar saldo, este deve ser repartido na proporção aplicável à distribuição dos lucros, devendo, caso contrário, o activo existente ser distribuído pelos sócios, por forma que a diferença para menos recaia em cada um deles na proporção da parte que lhes competir nas perdas da sociedade (n.ºs 3 e 4 do art. 156.º do CSC).
O art. 81.º do CIRC define a natureza dos rendimentos gerados numa operação de partilha, estabelecendo que «[é] englobado para efeitos de tributação dos sócios, no exercício em que for posto à sua disposição, o valor que for atribuído a cada um deles em resultado da partilha, abatido do preço de aquisição das correspondentes partes sociais» (n.º 1) e que «[n]o englobamento, para efeitos de tributação da diferença referida no número anterior, deve observar-se o seguinte: a) Essa diferença, quando positiva, é considerada como rendimento de aplicação de capitais até ao limite da diferença entre o valor que for atribuído e o que, face à contabilidade da sociedade liquidada, corresponda a entradas efectivamente verificadas para realização do capital, tendo o eventual excesso a natureza de mais-valia tributável; b) Essa diferença, quando negativa, é considerada como menos-valia, sendo dedutível apenas quando as partes sociais tenham permanecido na titularidade do sujeito passivo durante os três anos imediatamente anteriores à data da dissolução, e pelo montante que exceder os prejuízos fiscais transmitidos no âmbito da aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades e desde que a entidade liquidada não seja residente em país, território ou região com regime fiscal claramente mais favorável que conste de lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças» (n.º 2).
Ou seja, o art. 81.º estabelecia, nos termos citados, o regime e as regras, especiais, aplicáveis ao apuramento das mais e menos-valias decorrentes da partilha pelos sócios, fixando condições para a dedutibilidade das menos-valias apuradas, a saber: i) as participações têm de permanecer na titularidade do sócio nos três anos imediatamente anteriores à dissolução; ii) as participações têm de estar registadas por montante que exceda os prejuízos fiscais transmitidos no âmbito da aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades; iii) a entidade liquidada não pode ser residente em país, território ou região com regime fiscal claramente mais favorável que conste de lista aprovada por portaria do Ministro das Finanças.
No caso sub judice, a Fazenda Pública não questiona a existência de uma menos-valia com a partilha das sociedades em consequência da sua liquidação, não questiona o montante da mesma, nem questiona a verificação das referidas condições de dedutibilidade previstas no art. 81.º do CIRC.
Sustenta, no entanto, que essa menos-valia só poderá concorrer para a formação do lucro tributável do exercício do ano de 2010 por metade do seu valor, atento o disposto no n.º 3 do art. 45.º do CIRC. Não porque as menos-valias em causa resultem da alienação onerosa de partes de capital - pois a AT admite que, porque advêm de liquidação e partilha de sociedades, não resultam -, mas porque considera que as mesmas são subsumíveis à 2.ª parte daquele preceito, ou seja, ao conceito de «outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio».
Recordemos aqui a exposição do acórdão arbitral de 25 de Novembro de 2013, proferido no processo n.º 108/2013-T (Disponível em
https://caad.org.pt/tributario/decisoes/decisao.php?s_processo=108%2F2013&s_data_ini=&s_data_fim=&s_resumo=&s_artigos=&s_texto=&id=200.), relatado pelo Conselheiro JORGE LOPES DE SOUSA, no que se refere à interpretação do n.º 3 do art. 45.º do CIRC:
«[…]
A análise do texto normativo revela com clareza que o legislador elegeu, para nele incluir, três tipos de situações que se deverão ter, em função da presunção de boa técnica legislativa, por distintas, a saber:
a. “A diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital”;
b. “outras perdas (...) relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio”;
c. “outras (...) variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio”».

A própria AT reconhece que a situação sub judice não se enquadra na situação da alínea a), pelo que resta verificar da possibilidade de enquadramento nas alíneas b) e c) supra, sendo que a AT sustenta, conclusivamente, que a situação se enquadra na segunda parte da norma (a aditada pelo Orçamento para 2006), afirmando que «o legislador pretendeu abarcar outras situações que não decorressem unicamente de transmissões onerosas da partes de capital» (cfr. conclusões X e seguintes, maxime XII).

Retomemos a exposição do citado acórdão arbitral:

«A aparente abrangência indiscriminada das previsões em causa [refere-se às situações elencadas sob as alíneas b) e c)], poderá, contudo, ser razoavelmente mitigada se se atentar que “perdas” e “outras variações patrimoniais negativas”, serão conceitos, não redundantes, mas dotados de um sentido próprio e distinto.

Para compreender tal facto, será necessário recuar aos artigos 23.º e 24.º do mesmo Código, atentando na evolução terminológica operada pelo artigo [leia-se, pelo Decreto-Lei n.º] 159/2009, de 13 de Dezembro.

Com efeito, antes da entrada em vigor deste último diploma, os artigos referidos do CIRC referiam, respectivamente, que:

· “Consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, nomeadamente os seguintes: (...)”;

· “Nas mesmas condições referidas para os custos ou perdas, concorrem ainda para a formação do lucro tributável as variações patrimoniais negativas não reflectidas no resultado líquido do exercício, excepto: (...)”.

Verifica-se, deste modo, que aquando da consagração da redacção actual do artigo 45.º/3 do CIRC, este Código distinguiu expressamente, para o que aqui releva, três tipos de situações, a saber:

a. Custos;

b. Perdas;

c. Variações patrimoniais negativas não reflectidas no resultado líquido do exercício.

A previsão do artigo 42.º/3 (predecessor do actual 45.º/3), dever-se-á considerar, assim, por reportada a estes conceitos, definidos nos artigos 23.º e 24.º. Deste modo, e por razões óbvias, da previsão daquela norma dever-se-ão ter por excluídos os custos relativos “a partes de capital ou outras componentes do capital próprio”, incluindo-se ali, unicamente, as perdas (tal como definidas no artigo 23.º) e variações patrimoniais negativas (tal como definidas no artigo 24.º), relativas àquelas partes.
E que assim é, ou seja, que a expressão “outras perdas ou variações patrimoniais negativas” utilizada no actual artigo 45.º/3 do CIRC não tem um sentido indiscriminadamente abrangente, mas antes um sentido preciso, definido nos artigo 23.º e 24.º, decorre desde logo do facto de o legislador ter empregue a mesma distinção.

[…]

A alteração normativa implementada pelo Decreto-Lei 159/2009, de 13 de Julho, não terá alterado nada de relevante na matéria em causa. Com efeito, não obstante o corpo do artigo 23.º ter passado a referir-se unicamente a gastos, o certo é que o CIRC continua a utilizar a expressão “perdas”, incluindo no próprio artigo 23.º (cfr. n.º 1, alínea h)). Tal ocorre em coerência, aliás, com o SNC, que nos termos do ponto 2.1.3.e) do anexo ao Decreto-Lei 158/2009 de 12 de Julho, mantém a distinção entre “gastos” e “perdas”.

Deste modo, conclui-se que o artigo 45.º/3 do CIRC aplicável, se reportará a:

a. diferenças negativas entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital;

b. outras perdas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio; e

c. outras variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, sendo que por “perdas” se deve entender os factos qualificáveis como tal à luz do CIRC, e por “variações patrimoniais negativas” se deverá entender variações patrimoniais negativas não reflectidas no resultado líquido do exercício, tal como definidas no artigo 24.º.

Não se incluirão deste modo, no âmbito da norma em causa, os factos qualificáveis como “gastos”, à luz do CIRC, ainda que relativos a partes de capital ou outras componentes do capital próprio.

A própria AT parece reconhecer isto mesmo, já que no “Manual de Preenchimento do Quadro 07, Modelo 22” [a fls. 31 (Disponível em
http://info.portaldasfinancas.gov.pt/NR/rdonlyres/BAFFC60A-E1B8-4217-89E1-17440629A6BA/0/ManualQ07201104052V.pdf.)], a propósito do campo 737, refere que “Neste campo são inscritas, em 50%, as importâncias relativas a outras perdas (que não sejam menos-valias, dado que estas obedecem ao “mecanismo” das mais-valias e menos-valias) relativas a partes de capital ou outras componentes de capital próprio. […]».

Tendo presente o que vimos de dizer, podemos avançar no sentido de que as referidas menos-valias também não se enquadram nas situações previstas sob as alíneas b) e c) acima descritas. Desde logo, porque sendo o art. 81.º, n.º 2, alínea b), do CIRC que, qualificando a natureza dos rendimentos, equipara a menos-valias a diferença negativa entre o resultado da partilha e o custo de aquisição das partes sociais, não faria sentido considerar agora essa diferença como outra perda ou outra variação patrimonial negativa.

Aliás, como bem referiu a Recorrida, existindo, como existe, um regime especial para tributação do resultado da partilha de sociedades no âmbito do qual as menos-valias resultantes da liquidação e partilha de sociedades têm uma forma própria de cálculo e com deduções específicas, mal se compreenderia que lhe fosse também aplicado o regime geral do n.º 3 do art. 45.º do CIRC, a menos que o legislador expressamente remetesse para o mesmo, o que não fez.

Como também salientou a Recorrida, a AT já afirmou que «o art. 67.º, n.º 2, alíneas a) e b) [correspondente ao citado art. 81.º, n.º 2, alíneas a) e b)] não se limita a qualificar como mais-valia a diferença positiva entre o valor das entradas efectivamente verificadas para a realização do capital social e o custo de aquisição das partes sociais e como menos-valia a diferença negativa entre o resultado da partilha e o custo de aquisição das partes sociais, pois define também o respectivo regime de tributação, não lhes sendo, portanto, aplicável, dada a sua distinta natureza, o disposto nos arts. 42.º a 44.º do Código do IRC» (Cfr. Parecer n.º 103/96 do CEF, sancionado por Despacho do Director Geral dos Impostos de 12.03.97). Mais se diz no citado parecer que «[…] ainda que o legislador […] declare que a diferença positiva entre o valor das entradas efectivamente verificadas para a realização do capital social e o custo de aquisição das partes sociais tem a natureza de mais-valia e que a diferença negativa entre o resultado da partilha e o custo de aquisição é considerada menos-valia dedutível não acrescenta que lhe é aplicável o regime fiscal previsto para as mais-valias e menos-valias realizadas, decerto porque não cabem na definição geral dada pelo n.º 1 do art. 42.º [depois, 46.º], o qual atende, sobretudo, à natureza da operação de transferência dos elementos do activo imobilizado».

Ou seja, a própria AT reconhece que a norma do n.º 2 do art. 81.º do CIRC não se limita a qualificar a natureza do ganho como mais-valia, mas também lhe define o respectivo regime tributário, com exclusão do regime fiscal das mais-valias e menos-valias.

Acresce que, como igualmente bem salientou a Recorrida, poderá até haver uma justificação para a não aplicação da medida anti-abuso (limitação a metade do montante dedutível da menos-valia) no caso em que está em causa a diferença negativa entre o resultado da partilha e o custo de aquisição das partes sociais no caso da dissolução e partilha da sociedade e que a lei equipara a menos-valia: é que os riscos de evasão fiscal por manipulação do resultado fiscal não são tão evidentes nos casos da dissolução e partilha de uma sociedade como nos casos de transmissão onerosa de partes sociais.

Assim, a nosso ver nada obsta a que a menos-valia apurada nos termos do art. 81.º, n.º 2, alínea b), do CIRC, concorra integralmente para a formação do lucro tributável do ano de 2010. …”.

Perante o carácter assertivo do que ficou exposto e porque concordamos integralmente com o que ali ficou decidido e respectivos fundamentos, sem olvidar o disposto no n.º 3 do art. 8.º do Código Civil, resta apenas reiterar o que ficou ali consignado, até porque as alegações da Recorrente não têm a virtualidade de colocar em crise o que ficou dito no aresto apontado.

De facto, o artigo 81º nº 2 al. b) do CIRC (na redacção à data do facto tributário) qualificava como menos-valias a diferença negativa entre o resultado da partilha e o custo de aquisição das partes sociais no caso de dissolução e partilha de entidade em causa, como também fixava o respectivo regime especial, para a tributação do resultado da partilha, com um forma própria de cálculo e com deduções específicas e face a esse regime especial e na ausência de remissão para o regime fixado no artigo 45º nº 3 do CIRC este não é aplicável à aquela realidade.

Poderá até haver uma justificação para a não aplicação da medida anti abuso do artigo 45º nº 3 do CIRC, uma vez que os riscos de evasão fiscal por manipulação do resultado fiscal não serão tão evidentes no caso de dissolução e partilha de sociedades e outras entidades como no caso de transmissão onerosa de parte sociais.

Tal significa que a decisão recorrida não merece qualquer censura, situação que tem um verdadeiro efeito de implosão no que concerne ao presente recurso.

A Recorrente (tal como a Recorrida) requer ainda que, atendendo a que o valor da acção é superior a 275.000€, a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do art. 6.º n.º 7 do Regulamento de Custas Processuais, tendo em consideração o valor e a natureza da causa, dado que, como decorre do presente articulado, a causa se mostra pouco complexa e a matéria se encontra exposta de forma clara e sintética.

No que concerne ao peticionado, este Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a afirmar que a dispensa do remanescente da taxa de justiça tem natureza excepcional, pressupõe uma menor complexidade da causa e uma simplificação da tramitação processual aferida pela especificidade da situação e pela conduta das partes.

Ora, no caso presente, deparamos com uma causa que se afigura de “complexidade inferior à comum” atento o seu carácter remissivo, razão pela qual se verificam os requisitos expressamente consagrados na lei para determinar a requerida dispensa de remanescente.

Nesta sequência, e em linha com o que tem sido a orientação jurisprudencial deste Tribunal, justifica-se a dispensa do remanescente da taxa de justiça devida pelo recurso, ao abrigo da norma citada pelas partes, em função da aludida complexidade inferior à comum, tendo ainda presente que a conduta processual das partes se limitou ao que lhes é exigível e legalmente devido.




4. DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida.

Custas pela Recorrente, com dispensa do remanescente da taxa de justiça.

Notifique-se. D.N..




Lisboa, 14 de Outubro de 2020. - Pedro Vergueiro (relator) - Aragão Seia - Nuno Bastos - .