Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:062/20.4BESNT
Data do Acordão:01/13/2022
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:MARIA DO CÉU NEVES
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P28785
Nº do Documento:SA120220113062/20
Data de Entrada:10/01/2021
Recorrente:A........, S.A.
Recorrido 1:ESPAP - ENTIDADE DE SERVIÇOS PARTILHADOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, I.P.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO

A………, S.A., melhor identificada nos autos, em que é recorrida Entidade de Serviços Partilhados da Administração Pública, IP., tendo sido notificada do Acórdão proferido neste STA em 18.11.2021 que negou provimento ao recurso de revista por si interposto, veio ao abrigo do disposto no art° 615°, nº 1, aI. c) do CPC expor e requer:
1. «O Acórdão proferido em 18.11.2021 negou provimento ao recurso de revista considerando não se verificarem as ilegalidades apontadas pela recorrente às normas dos art°s 9°, nºs 2 e 3,11°, n° 4 e 22° do Caderno de Encargos;
2. A propósito da norma do art° 22° do Caderno de Encargos consta do Acórdão que "o que o nº 3 do artº 38° da Lei nº 34/2013 verdadeiramente impõe é que a celebração do contrato seja feita directamente com o beneficiário dos serviços prestados, situação diferente da proibição da cessão da posição contratual ou da subcontratação, que a existirem, têm de ser conformes e cumprir com os demais requisitos previstos nas normas do CPC (..); Assim, é evidente que o arº 22° do CE, não viola a referida disposição legal pois quem vai celebrar o contrato de prestação de serviços é a entidade adjudicante e uma das adjudicatárias do acordo-quadro - cfr. alínea j da matéria de facto supra ";
3. Ora, este segmento da decisão é ininteligível;
4. Ao impor que o contrato da prestação de serviços das empresas de segurança privada seja celebrado directamente com a beneficiária dos serviços prestados, o art° 38º, nº 3 da Lei n° 34/2013 está a proibir a subcontratação nesses contratos;
5. Não se percebe, pois, que o Acórdão refira que a imposição do art° 38°, n° 3 da Lei nº 34/2013 é diferente da proibição da subcontratação;
6. Se é certo que, em caso de cessão de posição contratual, o cessionário substitui o cedente no contrato de prestação de serviços, passando por isso a existir um contrato directamente estabelecido com a beneficiária dos serviços;
7. No caso de subcontração, não é assim;
8. O subcontratado, que é quem vai prestar os serviços, não celebra directamente com a beneficiária dos serviços qualquer contrato;
9. O subcontratado celebra contrato com o prestador originário dos serviços (o subcontratante), o qual mantém a sua posição contratual no contrato que celebrou com a respectiva beneficiária e contrata o subcontratado para realizar a totalidade ou parte da prestação;
10. Assim, a proibição de subcontratação decorre do art° 38°, nº 3 da Lei n° 34/2013;
11. Acresce que o acordo Quadro não visa só a vigilância humana, mas também a ligação a central de receção e monitorização de alarmes, sendo que o art° 57°, n° 2 da Portaria nº 273/2013 de 20.08 proíbe expressamente a subcontratação deste serviço;
12. Assim, o art° 38°, nº 3, da Lei n° 34/2013, ao exigir que os contratos de prestação de serviços das empresas de segurança privada sejam celebrados directamente com o beneficiário dos serviços prestados, está a proibir a subcontratação nos contratos de prestação de serviços de segurança privada;
13. Porquanto nesta situação, quem vai prestar os serviços não celebra directamente qualquer contrato com a beneficiária dos mesmos, precisamente o que a Lei n° 34/2013 e a Portaria nº 273/2013 pretendem impedir.
14. Daí que o Acordo-Quadro, ao conter uma norma como a do art° 22° do Caderno de Encargos, que permite a subcontratação nos contratos celebrados ao seu abrigo, está a permitir que os serviços de segurança privada possam vir a ser prestados não pelas adjudicatárias do acordo quadro com quem as entidades adjudicantes celebraram directamente contrato, mas por entidades terceiras subcontratadas, as quais, como vimos, não celebram directamente contrato com as entidades adjudicantes;
15. O que constitui violação do art° 38°, n° 3 da Lei n° 34/2013 e do art° 57°, nº 2 da Portaria nº 273/2013;
16. Assim, o segmento decisório respeitante à ilegalidade do art° 22° do Caderno de Encargos é ininteligível;
17. O que constitui nulidade nos termos do art° 615°, n° 1, al. c), do CPC, nulidade que expressamente se argui para os devidos efeitos;
18. A redacção do Acórdão suscita, pois, a seguinte dúvida que se pretende que seja esclarecida por V. Exªs: como é que, sendo a proibição da subcontratação abrangida pelo art° 38°, n° 3 da Lei n° 34/2013 e pelo art° 57°, n° 2 da Portaria n° 273/2013, como é que estas proibições podem ser consideradas compatíveis com a norma do art° 22° do Caderno de Encargos que permite a subcontratação nos contratos de prestação de serviços de segurança privada celebrados ao abrigo do acordo quadro?»
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ESPAP - ENTIDADE DE SERVIÇOS PARTILHADOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, I.P., recorrida nos autos, veio pronunciar-se no sentido do não conhecimento da arguição de nulidade e, sem conceder, e caso assim se não entenda, no sentido do indeferimento da mesma.
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Cumpre decidir:
De acordo com o disposto no art° 615°, n° 1, aI. c) é nula a sentença quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
Porém, os esclarecimentos pretendidos pela recorrente mais não são do que os argumentos que tem vindo a enumerar desde a petição inicial, e que não obtiveram provimento em todas as instâncias, designadamente, no acórdão proferido por este Supremo Tribunal.
Acresce que, a figura jurídica da arguição de nulidade invocada, não serve para as partes pedirem esclarecimentos, mas sim, para os termos enumerados na invocada aI. c), do art° 615° do CPC, ou seja, quando se verificar uma oposição entre os fundamentos e a decisão ou alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível, o que não ocorre no caso presente.
Com efeito, a dúvida ora colocada pela recorrente tem por base a mera interpretação que a mesma continua a fazer das disposições em causa e das normas do CE, interpretação esta, que não teve acolhimento no acórdão proferido nos autos.
Consignou-se a este propósito no Acórdão proferido:
«(iii) Da ilegalidade do artigo 22º do Caderno de Encargos
Alega a Recorrente que o art. 22º do CE, que se refere à cessão e subcontratação nos contratos celebrados ao abrigo do acordo-quadro, viola o art. 38º, nº 3 da Lei nº 34/2013, de 16.05 e o artº 57º, nº 2 da Portaria n° 273/2013, de 20.08.
E na sua perspectiva esta violação surge da interpretação que a própria faz da norma prevista no nº 3 do artº 38 da Lei nº 34/2013 de 16.05, no sentido da mesma impedir que no Caderno de Encargos possa constar a possibilidade de cessão da posição contratual e da subcontratação [artºs 317º e 318º do CCP].
Ora, o art. 22° do CE estabelece que «Os cocontratantes podem ceder ou subcontratar nos contratos celebrados ao abrigo do Acordo Quadro mediante autorização prévia e por escrito das entidades adquirentes e nos termos do CCP». A remissão aqui prevista remete para os art°s 316º ss., do CCP.
Por sua vez, o citado art. 38°, nº 3, da Lei nº 34/2013, prescreve que «3 - Os contratos de prestação de serviços das empresas de segurança privada são celebrados diretamente com o beneficiário dos serviços prestados, revestem a forma escrita e contêm os elementos previstos no nº 1, bem como o preço e as condições de prestação dos mesmos.»
Temos, pois, que o art° 38°, nº 3, da Lei na 34/2013, exige que o contrato, in casu, para prestação de serviços de vigilância e de segurança, seja celebrado directamente com a entidade que beneficia dos serviços prestados.
Daí que, a argumentação da recorrente não prevaleça, uma vez que, o que o nº 3 do artº 38º da Lei nº 34/2013 verdadeiramente impõe é que a celebração do contrato seja feita directamente com o beneficiário dos serviços prestados, situação diferente da proibição da cessão da posição contratual ou da subcontratação, que a existirem, têm de ser conformes e cumprir os demais requisitos previstos nas normas do CCP, designadamente, possuírem os requisitos de habilitação e preenchimento dos pressupostos da capacidade económica e financeira, em cumprimento com os contractos públicos, seja no âmbito do CCP, seja no âmbito da Diretiva Geral da Contratação Pública (Diretiva 2014/24) ou na Diretiva Concessões (Diretiva 23/2014, ou ainda na Diretiva dos Sectores Especiais (Diretiva 2014/25).
Assim, é evidente que o art° 22° do CE, não viola a referida disposição legal, pois quem vai celebrar o contrato de prestação de serviços é a entidade adjudicante e uma das adjudicatárias do acordo-quadro - cfr. alínea J) da matéria de facto supra.
Igualmente o art. 57°, n° 2, da Portaria nº 273/2013, de 20.08., dispõe que «2 - Sem prejuízo da aplicação do regime geral em matéria de proteção de dados previsto na Lei n° 67/98, de 26 de outubro, é vedado às entidades referidas no número anterior, para o exercício da sua atividade, subcontratar outras entidades, ainda que titulares de Alvará ou Licença C, para a gestão de sinais de alarme, de videovigilância, ou tratamento de dados pessoais de clientes com os quais tenham contrato de prestação de serviços».
No mais, acompanha-se o consignado no acórdão recorrido:
«Em relação a uma outra componente dos serviços objeto do procedimento, em que é exigida a titularidade do alvará C, estatui o art. 57°. nº 2, da Portaria nº 273/2013, supra transcrito, que é vedado «subcontratar outras entidades, ainda que titulares de Alvará ou Licença C, para a gestão de sinais de alarme, de videovigilância, ou tratamento de dados pessoais de clientes com os quais tenham contrato de prestação de serviços», pelo que o seu âmbito está delimitado e restrito à questão da subcontratação da «gestão de sinais de alarme, de videovigilância, ou tratamento de dados pessoais de clientes com os quais tenham contrato de prestação de serviços», o que também não compromete o disposto no art. 22. º do CE, e a remissão genérica para o disposto no CCP, pois esta não pode significar a permissão de uma aplicação patológica da mesma, contrária ao disposto no citado art. 57°, nº 2, pois que, enquanto norma especial, identifica alguns aspetos em que a subcontratação não é admissível.
Assim, e acompanhando o decido pelo tribunal a quo, «o regime procedimental que consta do CCP, em matéria de cessão de posição contratual e subcontratação, tem de acolher esta contingência, em função da concreta situação que estiver a ser apreciada. A circunstância de existirem limites ou restrições à subcontratação não implica que uma cláusula contratual que se limita a remeter para o CCP o regime aplicável seja, por si só, ilegal. Esta subcontratação - na situação concreta da mencionada Portaria - é admissível nos estritos termos que resultam das disposições citadas.»
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Atento o exposto, é manifesto que não se verifica nenhuma ambiguidade ou obscuridade, nem tão pouco a contradição entre os fundamentos e a decisão, mas apenas uma discordância da recorrente quanto à interpretação das normas legais supra mencionadas ao caso concreto.
Face ao exposto, acordam os juízes que compõem este Supremo Tribunal Administrativo em indeferir a arguição de nulidade suscitada pela reclamante.
Custas pela reclamante.

Lisboa, 13 de Janeiro de 2022. – Maria do Céu Dias Rosa das Neves (relatora) – Cláudio Ramos Monteiro – José Francisco Fonseca da Paz.