Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:040201A
Data do Acordão:01/30/2007
Tribunal:2 SUBSECÇÃO DO CA
Relator:PIRES ESTEVES
Descritores:EXECUÇÃO DE SENTENÇA.
ACTO CONSEQUENTE.
ACTO CONEXO.
CASO JULGADO.
ACTO NULO.
Sumário: I - A sentença anulatória de um acto administrativo tem um efeito constitutivo, que, em regra, consiste na invalidação do acto impugnado, fazendo-o desaparecer do mundo jurídico desde o seu nascimento. Tem, também, um outro efeito, próprio de toda e qualquer sentença de um tribunal, seja qual for a natureza deste, que advém da força do caso julgado, apelidado de efeito conformativo (também designado de preclusivo ou inibitório), que exclui, no mínimo, a possibilidade de a Administração reproduzir o acto com os mesmos vícios individualizados e condenados pelo juiz administrativo. Ainda, um outro efeito, existe que é o da reconstituição da situação hipotética actual (também chamado efeito repristinatório, efeito reconstitutivo ou reconstrutivo da sentença). Segundo este princípio, a Administração tem o dever de reconstituir a situação que existiria se não tivesse sido praticado o acto ilegal ou se o acto tivesse sido praticado sem a ilegalidade. Finalmente, por a Administração não querer, não saber ou não poder, proceder à reconstituição da situação que era definida pelo julgado anulatório, nada mais restando ao administrado, ao abrigo do quadro normativo definido (art°173° n°1 do CPTA), do que ir novamente ao tribunal solicitar a execução do julgado. São os designados efeitos ultraconstitutivos da sentença de anulação, que se manifestam hoje no processo de execução de julgados, pelo qual os interessados podem obter a especificação do conteúdo dos actos e operações a adoptar pela Administração e o prazo para a sua prática (art°179° n°1 do CPTA), a declaração de nulidade dos actos desconformes com a sentença e a anulação dos que mantenham, sem fundamento válido, a situação ilegal.
II - Pode definir-se como acto consequente aquele cuja prática e conteúdo depende da existência de um acto anterior que lhe serve de causa, base ou pressuposto.
Porém, este conceito de acto consequente é demasiado abrangente e generalizante para ferir de nulidade todos os actos que de uma forma lógica, cronológica ou formalmente tenham uma ligação com o acto judicialmente anulado. Se assim fosse, desde que tivesse sido anulado todo e qualquer acto prévio, antecedente, pressuposto ou pré-relacional, tal anulação acarretaria a nulidade do acto consequente.
III - Assim, o conceito de acto consequente utilizado no artº133º nº2 al. i) do CPA terá que ser mais restrito, o seu conteúdo mais redutor, o seu campo de aplicação mais estreito, não sendo coincidente com o conceito normalmente tido de acto consequente.
IV – O acto consequente, para efeitos do artº133º nº2 al.i) do CPA, para além de uma relação cronológica, lógica e sequencial, terá que ter uma relação mais íntima com o acto de que é consequência, tem que haver um nexo de dependência necessária.
V - Para estes efeitos, acto consequente tem de entender-se como um acto conexo. Na verdade, o conceito de actos consequentes transcende etimologicamente o conceito de actos conexos, tendo uma amplitude muito maior e que o torna inadequado para o disposto naquele preceito.
VI - Acto conexo será aquele que tem com o acto anterior uma relação que seria susceptível de determinar necessariamente a invalidade do segundo, se acaso este tivesse sido praticado, nos termos em que efectivamente o foi, num momento em já tivesse sido decretada a anulação do primeiro.
VII - A invalidade do acto conexo resulta, pois, de uma causa autónoma em relação àquela que determinou a queda do acto que o precedeu, que diz respeito aos seus próprios requisitos de validade e que se concretiza num vício próprio, atinente a um dos seus elementos estruturais: procedimento, sujeito, objecto, conteúdo.
VIII - Um acto conexo será, pois, nulo se a definição jurídica contida no acto anulado tiver constituído o fundamento da emissão desse acto, em termos de se poder afirmar que representou um elemento essencial da sua emissão, no sentido do art°133° do CPA, ao nível do sujeito, do objecto, dos pressupostos, do conteúdo...- elemento que não existiria se, no momento em que o acto conexo foi praticado, o acto precedente já tivesse sido anulado - e que a anulação veio remover com efeitos retroactivos - fornecia um elemento essencial ao acto conexo.
IX – Em matéria administrativa, o caso julgado (material) consiste na indiscutibilidade da afirmação sobre a legalidade do acto contida na sentença administrativa, a qual é assim vinculativa para qualquer tribunal ou autoridade pública e para os próprios particulares que sempre a têm de aceitar como um dado imodificável.
X - A obrigatoriedade reconhecida ao caso julgado material reside essencialmente na necessidade de assegurar estabilidade às relações jurídicas, não permitindo que litígios, com o mesmo objecto e entre as mesmas partes, se repitam indefinidamente, em prejuízo da paz jurídica imposta pelo interesse público.
Nº Convencional:JSTA00063913
Nº do Documento:SA120070130040201A
Data de Entrada:04/19/1996
Recorrente:A...
Recorrido 1:SE DOS ASSUNTOS FISCAIS
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:EXECUÇÃO DE JULGADO.
Objecto:AC STAPLENO PROC40201 DE 2003/04/30.
Decisão:ESPECIFICAÇÃO ACTOS E OPERA
Área Temática 1:DIR ADM CONT - MEIO PROC ACESSÓRIO / EXECUÇÃO DE JULGADO.
Legislação Nacional:CPTA02 ART163 N1 ART158 N1 ART173 N1 ART175 N3 ART179 N2.
DL 43/84 DE 1984/02/03 ART16 ART34.
DL 41/84 DE 1984/02/03 ART34 ART35 ART36.
CPA91 ART121 ART133 N2 ART126.
CPC96 ART681 N1 ART497 ART498.
CONST ART202 N1 ART205 N2 ART212 N3.
ETAF02 ART1 N1.
EA72 ART36.
DL 353-A/89 DE 1989/10/16 ART39 N2 ART45.
DL 187/90 DE 1990/06/07 ART9.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC1149/05 DE 2006/03/29.; AC STA PROC41772 DE 1998/05/26.
Referência a Doutrina:VIEIRA DE ANDRADE A ACEITAÇÃO DO ACTO ADMINISTRATIVO IN BFDC VOLUME COMEMORATIVO 2003 PAG908 PAG 914.
VIEIRA DE ANDRADE A JUSTIÇA ADMINISTRATIVA LIÇÕES PAG226 PAG232.
FREITAS DO AMARAL A EXECUÇÃO DAS SENTENÇAS DO TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS 2ED PAG84.
ESTEVES DE OLIVEIRA E OUTROS CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO ANOTADO 2ED PAG650 PAG607.
PROSPER WEIL LES CONSÉQUENCES DE L´ANNULATION D´UN ACTE ADMINISTRATIF POUR EXCÈS DE POUVOIR PAG177.
VIEIRA DE ANDRADE ACTOS CONSEQUENTES E EXECUÇÃO DE SENTENÇA ANULATÓRIA IN REVISTA JURÍDICA NA UNIVERSIDADE MODERNA PAG36 PAG40.
AROSO DE ALMEIDA ANULAÇÃO DE ACTOS ADMINISTRATIVOS E RELAÇÕES JURÍDICAS EMERGENTES PAG312 PAG331 PAG318.
ALBERTO XAVIER O PROCESSO ADMINISTRATIVO GRACIOSO PAG232.
MARCELLO CAETANO MANUAL DE DIREITO ADMINISTRATIVO 10ED PAG777.
RODRIGUES BASTOS NOTAS AO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL VOL1 PAG281.
MANUEL DE ANDRADE NOÇÕES ELEMENTARES DE PROCESSO CIVIL VOL1 PAG281.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:
A..., Técnico Jurista Assessor da Direcção-Geral dos Impostos (DGCI), residente na Alameda das Linhas de Torres, 256-4° Dt°, 1750-152 Lisboa, veio requerer, ao abrigo do disposto nos arts. 24º nº1 al. d) do ETAF e 3° nº3 e 176º nº1 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e Fiscais (CPTA) e 5° n°4 da Lei n°15/2002 de 22/2, a execução dos Acs. do STA (1ª Secção) de 23/6/1994 (rec. n°33 956) e do STA (TP) de 30/4/2003 (rec.n°40 201), pedindo a declaração de inexistência de causa legítima de inexecução, a declaração de nulidade dos actos desconformes com as sentenças, nomeadamente, a aposentação do requerente e o acto da Subdirectora Geral da DGCI de 1/8/2003 e a determinação do cumprimento por parte da DGCI do despacho do Sr. SEAF de 9/12/2003.
Resultam dos autos os seguintes factos:
1 - A... foi técnico jurista da Direcção Geral das Contribuições e Impostos;
2 - Por aviso publicado no DR, 2ª Série, n°127, de 3/6/1987, foi aberto concurso interno para técnico jurista Assessor da Direcção Geral das Contribuições e Impostos (fls. 13, aqui dada por reproduzida);
3 - O requerente A... foi opositor a tal concurso, tendo sido admitido, graduado e aprovado no mesmo;
4 - Por despacho de 13/12/1994 do Sr. Director-Geral das Contribuições e Impostos, a concorrente Anabela Gonçalves de Carvalho Rodrigues e o ora requerente foram nomeados Técnicos Juristas Assessores do Quadro da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, ficando colocados nos Serviços Centrais, em execução dos acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 5/7/1994 e de 23/6/1994 (fls. 14, aqui dada por reproduzida);
5 - O despacho acabado de referir foi rectificado em 12/4/95, passando a ter o seguinte teor:
“...Em execução do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 23/6/1994, em que foi recorrente A... e recorrida a Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, é nomeado técnico jurista assessor do Quadro da DGCI, com efeitos a 6/3/91, ficando colocado nos Serviços Centrais” (fls. 15);
6 - Esta rectificação foi publicada no DR, 2ª Série, n°97, de 26/4/1995;
7 - Em 12/4/1995, ao recorrente foi enviado pela DGCI o ofício n°1656, com o seguinte teor:
“Tenho a honra de informar V. Exa., que foi de novo enviado para publicação no Diário da República, um extracto com a sua nomeação como Técnico Jurista Assessor do Quadro da DGCI, com base na execução do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo” (fls. 32 do PA);
8 - Em 7/6/1995, o recorrente dirigiu ao Sr. Director-Geral das Contribuições e Impostos o requerimento de fls. 26 do PA, aqui dado por reproduzido e de que se destaca: “... 6-Em execução do acórdão do STA de 23/6/1994 foi indicado para exercer funções nessa Direcção-Geral. 7-Uma vez que o despacho de nomeação nada invoca, o signatário deseja ser esclarecido sobre as condições remuneratórias a que tem direito. 8 Pelo que, tendo em vista as consequências do Acórdão já atrás referido e o facto de o concurso em que foi aprovado ter sido aberto em 1987, requer a V. Ex.ª que lhe seja atribuído, a partir de 6/3/1991, o escalão 5 do índice 790, de acordo com o nº4 do art°39° do DL. nº184/89, de 2/6, em virtude de em 30 de Setembro de 1989 ter 4 diuturnidades”;
9 - A Técnica Superior Jurista da DGCI em 9/6/1995, sobre o requerimento referido em 8 emitiu o parecer n°114-AJ/95 (fls. 23 a 25 do PA, aqui dadas por reproduzidas) e de que se destaca: “...6-Se o signatário detinha em 30 de Setembro de 1989, quatro diuturnidades (embora não tenhamos qualquer elemento que nos permita verificar esta questão), nos termos do mapa II Anexo ao DL n°187/90, de 7/6, o signatário teria direito a ser integrado no escalão 5 ao qual corresponde o índice 790. 7-Os efeitos desta integração produzem-se a 3 de Junho de 1991, estando, naturalmente, dependente da aceitação da nomeação ”;
10 - O Sr. Subdirector Geral das Contribuições e Impostos, sobre aquele parecer referido em 9, proferiu, em 12/6/95, o seguinte despacho: “Concordo, informe-se” (fls. 23 do PA);
11 - Em 23/6/1995, o requerente dirigiu ao Sr. Director-Geral das Contribuições e Impostos o requerimento de fls. 27 do PA, aqui dada por reproduzida e de que se destaca: “...3-Só que, certamente por mero lapso nos nºs 4 e 7 do referido parecer, vem referida a data de 3/6/1991, quando, de facto, deveria ser 6/3/1991, conforme consta do despacho do Sr. Director-Geral das Contribuições e Impostos, publicado no DR, 2ª Série, n°97, de 26/4/95 (pág. 97). 4-Nestes termos, o signatário requer a V. Ex. “ que tal lapso seja devidamente corrigido, a fim de se evitarem quaisquer tipos de dúvidas que, eventualmente, se venham a colocar aos Serviços de Pessoal e de Processamento e Abonos da DGCI”;
12 - Em 24/7/95, foi emitido o seguinte parecer: “O prazo previsto no art°11° do DL. nº427/89, decorreu sem que o interessado tenha requerido qualquer dilação. Nem a apresentação de um pedido de esclarecimentos pode ser equiparado a pedido de prorrogação. Assim, extinguiu-se, com o decurso do prazo, o direito do interessado à ocupação do lugar para que foi nomeado. Nestes termos, afigura-se-me de indeferir o pedido formulado na parte final da carta de 6/7/1995” (fls. 19 do PA, aqui dada por reproduzida);
13 - Sobre este parecer recaiu, em 26/7/1995, o seguinte despacho do Sr. DGCI: “Concordo. Indefiro” (fls. 19 do PA);
14 - O Sr. DGCI, em 1/7/1994, praticou o despacho nº27/94, com o seguinte teor: “Cumprido que foi o disposto no n°5 do art°1° do DL n° 323/89, de 26/9, designo como meu substituto legal para as minhas faltas e impedimentos no que concerne às competências que me são próprias o Sr. Subdirector Geral .... Este despacho produz efeitos desde a data da sua assinatura, ficando por este meio ratificados todos os actos proferidos pelo Subdirector Geral ... após o dia 16 de Março de 1994” (fls. 71);
15 - O requerente A..., em 6/7/95, dirigiu ao Sr. DGCI a exposição de fls. 22 do PA, aqui dada por reproduzida e de que se destaca: “...4-Assim e para os devidos efeitos legais, o signatário declara, neste momento, a sua aceitação do lugar para que foi nomeado e, desde já, requer a V. Ex.ª. que lhe seja fixada data e local para tomar posse do mesmo”;
16 - Em 3/8/1995, o recorrente interpôs recurso hierárquico do despacho do Sr. Subdirector das C e I de 26/7/95 para o Sr. Ministro das Finanças, pedindo a revogação de tal despacho e considerar-se aceite o lugar pelo interessado (fls. 17 e 18 do PA, aqui dadas por reproduzidas):
17 - A Sr.ª Técnica Superior Jurista, em 7/9/1995, emitiu o parecer de fls. 12 a 16 do PA, aqui dadas por reproduzidas, no sentido de que deve ser negado provimento ao recurso hierárquico;
18 - Sobre tal recurso, os Serviços Jurídicos e do Contencioso da DGCI emitiram o parecer de fls. 1 a 11 do PA, aqui dadas por reproduzidas, onde se formularam as seguintes conclusões:
“a) - O acto de nomeação está sujeito a publicação no Diário da República;
b) - A publicação no Diário da República é o meio idóneo para levar o acto ao conhecimento dos interessados;
c) - No caso vertente, o acto de nomeação foi objecto de publicação no Diário da República e do envio do mesmo para o apontado fim foi dado conhecimento ao recorrente;
d) - Do despacho de nomeação deve constar a referência às normas legais que permitem a nomeação e a informação sobre a existência de cabimento orçamental;
e) - O DL n° 427/89, de 7/12, tomou a via do direito à ocupação do lugar dependente do prazo normal de 20 dias, susceptível de prorrogação; f) - No período normal de 20 dias para a aceitação da nomeação, consagrado no art°11º do DL n° 427/89, de 7/12, o recorrente não se apresentou à entidade com competência para intervir no termo de aceitação nem solicitou a prorrogação daquele prazo;
g) - O direito que lhe assistia de ocupação do lugar para que fora nomeado extinguiu-se pelo mero decurso do apontado período de 20 dias;
h) - Na decorrência do que é de indeferir o presente recurso hierárquico”; 19 - Em 11/2/1996, o Sr. SEAF proferiu o seguinte despacho: “Indefiro pelas razões invocadas no parecer infra da DSJC” (fls. 1 do PA).
20 - O requerente A... tomou conhecimento do despacho de 12/4/95 que rectificou a sua nomeação, pelo menos, em 7/6/95, data em que solicitou ao Sr. DGCI esclarecimentos sobre as condições remuneratórias que não constavam, como alegava, em tal despacho.
21 - Pelo acórdão de 9/X/2001 da 1ª Secção do STA (fls. 180 a 193), confirmado posteriormente por acórdão de 30/4/2003 do TP do STA (fls. 248 a 260) foi anulado contenciosamente o despacho de 11/2/1996 do Sr. SEAF.
22 - Face ao pedido de execução de julgado formulado por A... o Sr. Coordenador do Gabinete Jurídico e do Contencioso do Ministério das Finanças em 22/10/2003 emitiu o parecer n°109/2003 (fls. 82 a 87), aqui dado por reproduzido:
“1.O Dr. A... vem requerer a Vossa Excelência a execução dos acórdãos proferidos pelo Supremo Tribunal Administrativo (STA), em 23/6/1994 e 30/4/2003, já transitados em julgado;
2….
3.Deste modo, aqueles acórdãos impõem à Administração que, em execução de julgados, o requerente seja nomeado técnico jurista assessor da Direcção Geral dos Impostos (antiga DGCI), com efeitos a partir de 6/3/1991, remunerado pelo índice e escalão adequados à concreta situação em que ele, naquele momento, se encontrava inserido, acrescendo-se os suplementos que desde aquela data estivessem a ser pagos a funcionários nas mesmas condições do requerente, e reconstituindo-lhe a carreira em termos idênticos à dos outros concorrentes nomeados na sequência do mesmo concurso;
4.Esta actuação determina, desde já, o pagamento das diferenças salariais entre o que recebia do Estado como funcionário disponível e as que teria direito a auferir, se tivesse sido nomeado a partir de 6/3/1991, acrescidas de juros legais;
5.Assim se deverá proceder até 1/5/1993, data em que o requerente foi aposentado;
6.Chegados aqui, teremos de apontar a solução para a questão de saber se a aposentação ocorrida é ou não consequência do acto de indeferimento tácito contenciosamente anulado;
7.Em primeiro lugar, vejamos em que condições foi decretada a aposentação do requerente. O interessado, como disponível que era, encontrava-se sujeito ao regime do art°16° do DL nº 43/84, de 3/2, segundo o qual os funcionários, durante o primeiro ano de disponibilidade, podiam requerer a sua aposentação, independentemente da idade e da submissão a junta médica, recebendo, quando o fizessem, uma bonificação de 20% sobre o montante fixado para a pensão de aposentação. Quando os disponíveis se mantivessem nessa situação por um período superior a dois anos seguidos ou interpolados, e reunissem os requisitos constantes do art°34° do DL n° 41/84, seriam obrigatoriamente aposentados, sem direito a bonificação;
8.O requerente optou pela primeira alternativa;
9.A criação pela lei dos dois tipos de aposentação, a requerida voluntariamente e a que se verifica ope legis, ou obrigatoriamente, dificulta o estabelecimento da relação de consequência para os dois casos. Com efeito, a aposentação voluntariamente requerida não se apresenta como uma consequência necessária do acto anulado, precisamente porque ela não ocorreria sempre, só ocorrendo porque foi pedida. Não já assim no caso da aposentação ope legis porque, essa sim, de acordo com o regime legal aplicável, seria inelutável;
10.A aposentação voluntária naqueles termos não preenche, a nosso ver, o conceito de acto consequente como o define o Prof. Freitas do Amaral que é “o acto administrativo praticado ou dotado de certo conteúdo (pela Administração) em virtude da prática de um acto administrativo anterior” (Execução das Sentenças dos Tribunais Administrativos, 2ª ed., pág. 84). No caso concreto, a aposentação voluntária resulta de uma opção do requerente, escolhendo a solução que mais lhe convinha dentro do quadro legal aplicável;
11.Acontece porém que, recentemente, o Prof. Mário Aroso de Almeida, na sua tese de doutoramento sobre o tema “Anulação de Actos Administrativos e Relações jurídicas emergentes” vem defender quanto a esta matéria, um ponto de vista que, a ser seguido, permite estabelecer uma relação de consequência em qualquer dos casos de aposentação. Na verdade, defende ele na pág. 318 da sua tese o seguinte: “Em nossa opinião, essa conexão existirá quando se possa afirmar que entre os dois actos existe uma relação que seria susceptível de determinar necessariamente a invalidade do segundo, se acaso este tivesse sido praticado, nos termos em que efectivamente o foi, num momento em que já tivesse sido decretada a anulação do primeiro — o mesmo é dizer, quando se possa afirmar que o acto praticado em segundo lugar sempre teria sido inválido se tivesse sido emitido no quadro jurídico que foi repristinado pela anulação e que teria existido sem o acto que veio a ser anulado”;
12.Seguindo esta opinião, a aposentação voluntária seria sempre um acto consequente, uma vez que quadro jurídico criado pela anulação, o requerente, sendo nomeado, deixaria por isso de ser funcionário disponível, abrangido pelo art°16° do DL. n°43/84, donde não poderia pedir a aposentação ao abrigo desta disposição;
13.O caso do requerente é efectivamente, de uma profunda singularidade, daí que não tenhamos encontrado na base de dados jurídica qualquer decisão judicial sobre um caso idêntico. E daí também não podermos ver seguida para um caso idêntico a posição defendida pelo Prof. Mário Aroso;
14. Colocando-nos como é nosso dever funcional, do lado da posição da Administração, que mantém, no nosso ponto de vista, dúvidas sérias sobre a relação de consequência no caso que vimos abordando, julgamos que o estabelecimento (ou não estabelecimento) daquela relação de consequência entre a recusa de nomeação e a aposentação requerida deverá ser devolvida ao tribunal;
15.Mas perante o circunstancialismo que rodeou o litígio, suportando o requerente uma longa espera para o ver decidido, julgamos que a Administração para salvaguarda do bom nome e da boa fé do Estado deveria proceder do seguinte modo:
1) pagar imediatamente ao requerente as quantias referidas em 4 supra, acrescida de juros legais, e bem assim as diferenças entre a pensão de aposentação efectivamente recebida e a que auferiria se se tivesse aposentado em 1/5/1993 com a categoria que lhe cabia em consequência da reconstituição da sua carreira na DGCI, acrescidas de juros legais;
2) promover junto da Caixa Geral de Aposentações a alteração do montante de aposentação, transferindo para ela os respectivos descontos;
3) aguardar que o tribunal se pronuncie, em sede de processo para declaração de inexistência de causa legítima de inexecução, sobre a relação de consequência entre o acto que recusou a nomeação e a aposentação concedida ao abrigo do n°1 do art°16° do DL. nº 43/84, não invocando a Administração o recebimento dos montantes referidos em 15.1 supra, como quitação integral dos montantes que eventualmente venham a ser devidos e correlativa renúncia a estes em virtude do recebimento, desde já daqueles;
16.Os outros prejuízos que o requerente apresenta, e cujo ressarcimento pretende, deverão ser exigidos cm acção autónoma”.
23 - Sobre este parecer o Sr. SEAF proferiu, em 9/12/2003, o seguinte despacho: “Concordo” (fls-82);
24 - O requerente A... aceitou o lugar de Técnico Jurista Assessor em 22/7/2003, com efeitos a partir de 6/3/1991 (fls.53 do 2° vol. do PI);
25 - O requerente foi aposentado em 1 de Maio de 1993;
26 - A... exerceu funções com a categoria de Assessor, no ex-Gabinete de Gestão Financeira (Serviços Sociais do Ministério da Justiça), em regime de requisição autorizada por despacho de 22/3/1990 do Director-Geral da Administração Pública, no período compreendido entre 3/4/1990 a 2/4/1991, e estando posicionado no escalão 0 índice 530, desde 1989, e a partir de Janeiro de 1991 foi posicionado no escalão 1 índice 600 (fls. 103 a 105);
27 - A... era um excedente que ingressou no QEI do Ministério da Indústria e Comércio em 14/5/1987, por lista nominativa do pessoal excedentário do ICEP, publicada no DR, n°138, II Série de 11/8/1987, continuando a desempenhar funções nesta entidade, em regime de destacamento;
28 - Por despacho do Director Geral da Administração Pública de 30/12/1987, foi autorizada requisição de A... no Instituto para a Cooperação Económica do Ministério dos Negócios Estrangeiros e das Finanças, a qual cessou em 28/4/1989, apresentando-se o excedentário, de imediato, no QEI do ex-Ministério da Indústria e do Comércio;
29 - Em 3/4/1991, A... regressou à disponibilidade do QEI do Ministério do Comércio e Turismo;
30 - A... exercia à data da abertura do concurso para Técnico Jurista Assessor da Direcção Geral das Contribuições e Impostos, aberto por aviso publicado no DR, 2ª série, nº127, de 3/6/1987, as funções de Consultor Jurídico Principal no Instituto do Comércio Externo de Portugal — ICEP, correspondente à letra B do quadro do pessoal da Função Pública, tendo sido promovido a Consultor Jurídico Assessor (letra C) em 13/7/1987 (fls. 112 do PI-2º);
31 - A..., por requerimento datado de 29/4/1991, solicitou a sua aposentação ao abrigo do n°1 do art°16° do DL. n°43/84, de 3/2, conjugado como disposto no n°2 do art°34° do DL. n°41/84, de 3/2, tendo declarado prescindir do pedido subsidiário que havia feito em anterior requerimento, em que havia feito depender o início do processo de aposentação da sua não nomeação para o lugar de técnico jurista assessor da DGCI (fls. 112 do PI-2°);
32 - Da Nota Biográfica de A..., datada de 2/7/1987, constante de fls. 115 (PI-2°), aqui dada por reproduzida, consta, além do mais o seguinte:
“...Data de admissão na Função Pública: 17/7/1967, no Ex-Fundo de Formato de Exportação (FFE), actual Instituto do Comércio Externo de Portugal (ICEP). Data de integração no ICEP: 4/9/1983, por diploma de provimento visado pelo TC em 21/7/1983 e publicado no DR. 2ª. 203, de 3/9/1983.
Promoções:
- Equiparado a Técnico de 2ª classe na Delegação do Porto de 18/3/71 a 31/10/1972;
- Técnico de 3ª classe na Sede de 1/11/1972 a 19/3/1974;
- Técnico de 1ª classe de 20/3/1974 a 31/10/1974;
- Técnico Superior de 1ª Classe de 1/7/1979 a 31/12/1981;
- Consultor Jurídico Principal desde 1/1/1982;
Antiguidade reportada a 31/12/1986:
- Na categoria actual ………. 5 anos, 0 meses e 0 dias
- Na carreira ……………….. 5 anos, 0 meses e 0 dias
- Na Função Pública ………. 19 anos, 5 meses e 14 dias
…………………………… ”.
33 - A..., em 25/4/1991, elaborou o requerimento de fls.256, aqui dado por reproduzido, e entrado nos Serviços do então Ministério do Comércio e Turismo em 26/4/1991, e de que se destaca: “ ...Havendo receio de que o requerente possa não obter provimento no lugar vago na DGCI, por via administrativa e/ou judicial, vê-se o signatário, para não ver precludido o seu direito pelo decurso do prazo legal, obrigado a solicitar e requerer subsidiariamente e para a hipótese do seu requerimento de 6/3/91 dirigido ao Ex.mo Senhor Director Geral das Contribuições e Impostos não ser deferido e de vir a ser negado provimento aos recursos hierárquico e contencioso que a seu tempo intentará, se digne considerar o seu pedido de aposentação, ao abrigo do n°1 do art°16° do DL. n° 43/84 de 3/2, em conjugação com o n°2 do art°34°do DL. n°41/84, de 3/2... ”;
34 - Por requerimento feito pelo requerente em 29/4/1991, e que deu entrada nos Serviços do então Ministério do Comércio e Turismo na mesma data, constante de fls.257 e aqui dado por reproduzido, o mesmo refere, além do mais, que: “... tendo adquirido a qualidade de excedente nos termos do Despacho Conjunto A-140-87, de 25/6, dos Srs. Ministros das Finanças e da Indústria e Comércio, encontrando-se na situação de disponibilidade desde 4/4/91, vem em complemento e aditamento ao anterior requerimento de 26 de Abril de 1991, confirmar e requerer a V. Exa., o seu pedido de aposentação ao abrigo do disposto no n°1 do art°16° do DL. n°43/84 de 3/2, conjugado com o disposto no n°2 do art°34° do DL. n°41/84 de 3/2, pelo que declara prescindir do pedido subsidiário feito no atrás referido requerimento, em que fazia depender o início do processo de aposentação da sua não nomeação para o lugar de técnico jurista assessor da DGCI... ”.
Apurados estes factos, subsumamo-los, agora, ao quadro normativo aplicável.
Pretende o requerente A... que, anulado que foi o despacho de 11/2/1996 por acórdão deste tribunal de 9/X/2001, confirmado posteriormente por acórdão do TP de 30/4/2003, deve ser declarada a inexistência de causa legitima de inexecução, a nulidade dos actos desconformes com as sentenças, nomeadamente, a aposentação do requerente e o acto da Subdirectora geral da DGCI de 1/8/2003 e a determinação do cumprimento por parte da DGCI do despacho do Sr. SEAF de 9/12/2003.
Passemos a analisar o primeiro pedido formulado pelo requerente: o da declaração de inexistência de causa legítima de inexecução.
De acordo com a lei, só constituem causa legítima de inexecução a impossibilidade absoluta e o grave prejuízo para o interesse público na execução de sentença (art°163° n°1 do CPTA), sendo certo que não é invocável a inexistência de causa legítima de inexecução quando a execução de sentença consista no pagamento de uma quantia pecuniária (art° 175° n°3 do CPTA).
O requerente deseja, em síntese, que em execução de sentença, a sua carreira seja refeita e que lhe sejam pagos os montantes respeitantes às diferenças entre os vencimentos que lhe foram pagos e aqueles a que teria direito se não tivesse sido praticado o acto contenciosamente anulado, pedindo a declaração de nulidade não só do acto que o aposentou, bem como da ordem da Sra. Subdirectora Geral da DGCI, de 1/8/2003, determinando verbalmente que o requerente não mais comparecesse nos serviços da DGCI, onde não poderia continuar a exercer funções.
Passamos a analisar, por isso, o despacho de aposentação, para apurar qual a sua repercussão na impossibilidade ou na lesão do interesse público com a execução dos acórdãos anulatórios.
O requerente A..., por requerimento datado de 29/4/1991, solicitou a sua aposentação ao abrigo do n°1 do art°16° do DL. n°43/84, de 3/2, conjugado com disposto no nº2 do art°34° do DL. nº41/84, de 3/2.
Passamos a transcrever tais preceitos legais:
Art°16°
1-Durante o primeiro ano de disponibilidade podem os excedentes, desde que possuam o tempo mínimo de serviço para efeitos de aposentação, independentemente da idade e de submissão a junta médica, requerer a aposentação voluntária, sendo a respectiva pensão calculada nos termos do n°2 do artº34o do DL nº 41/84, de 3/2.
2-Os excedentes que reúnam os requisitos constantes do n°1 do artº34° do DL nº 41/84, de 3/2, e cumulativamente se encontrem na situação de disponibilidade há mais de 2 anos, seguidos ou interpolados, serão obrigatoriamente aposentados, sem direito a bonificação.
Artº 34º
1-Poderão aposentar-se, por sua iniciativa e independentemente de submissão a junta médica, os funcionários e agentes que:
a) Contem mais de 60 anos de idade e 20 anos de serviço;
b) Reúnam 30 anos de serviço, independentemente da respectiva idade.
2-Aos funcionários a agentes referidos nas alíneas a) e b) do nº 1 será atribuída uma pensão correspondente ao número de anos de serviço efectivamente prestado, acrescida de uma importância correspondente a 20% do seu quantitativo, benefício que só será aplicável até ao limite da pensão respeitante a 36 anos da serviço calculada em função do vencimento base e das diuturnidades a que o funcionário ou agente tiver direito
3-………………..
………………….
Prevê o artigo 16°, desde que se verifiquem os pressupostos referidos no art°34° n°1, supra transcritas duas modalidades de aposentação: uma voluntária, a pedido do excedentário, que pode ser solicitada no primeiro ano de disponibilidade (n°1) e outra obrigatória, imposta por lei para a hipótese de o excedentário estar dois anos na situação de disponibilidade há mais de dois anos (n°2).
No caso vertente, A... requereu voluntariamente a sua aposentação nos termos das disposições combinadas dos referidos arts. 34° n°1 e 16° n°1.
O requerente solicitou inicialmente a sua aposentação através do seu requerimento de 25/4/1991, onde refere “havendo receio de que o requerente possa não obter provimento no lugar vago na DGCI, por via administrativa e/ou judicial, vê-se o signatário, para não ver precludido o seu direito pelo decurso do prazo legal, obrigado a solicitar e requerer subsidiariamente e para a hipótese do seu requerimento de 6/3/91 dirigido ao Exmo. Senhor Director Geral das Contribuições e Impostos não ser deferido e de vir a ser negado provimento aos recursos hierárquico e contencioso que a seu tempo intentará, se digne considerar o seu pedido de aposentação, ao abrigo do nº1 do artº16º do DL. nº43/84 de 3/2, em conjugação com o n°2 do art°34°do DL. n°41/84, de 3/2...”;
De acordo com o teor deste requerimento, solicitou o exequente a sua aposentação para a hipótese de ser negado provimento aos recursos administrativo e contencioso que iria intentar, ou seja, o acto administrativo que determinaria a sua aposentação dependia da verificação de uma condição: o improvimento dos recursos que ia interpor.
Independentemente de averiguar se no caso dos autos era admissível tal condição (art°121° do CPA), o que é certo é que o autor de tal requerimento em 29/4/1991, veio através de novo requerimento, e em aditamento ao anterior, prescindir da condição inicialmente formulada, referindo que “encontrando-se na situação de disponibilidade desde 4/4/91, vem em complemento e aditamento ao anterior requerimento de 26 de Abril de 1991, confirmar e requerer a V. Exa., o seu pedido de aposentação ao abrigo do disposto no n°1 do art°16° do DL. n°43/84 de 3/2, conjugado com o disposto no n°2 do art°34° do DL. n°41/84 de 3/2, pelo que declara prescindir do pedido subsidiário feito no atrás referido requerimento, em que fazia depender o início do processo de aposentação da sua não nomeação para o lugar de técnico jurista assessor da DGCI…”.
Assim, através deste aditamento, o requerente veio, por um lado, aceitar “a sua situação de disponibilidade desde 4/4/91”, por outro, confirmar o seu pedido de aposentação, e, prescindindo, ainda, da condição inicialmente formulada, que era, em suma, o provimento nos recursos por si interpostos, quer de natureza administrativa quer de natureza contenciosa.
Com esta atitude expressa naquele aditamento, o ora requerente veio desistir do recurso que eventualmente pudesse interpor do desfecho de tais recursos, o que é legalmente admissível (art.681º nº1 do CPC; neste sentido: Vieira de Andrade, A Aceitação do Acto Administrativo, in BFDUC, Volume Comemorativo, 2003, págs. 908 e 914). Por esta razão, e em coerência com a sua nova posição, o requerente não impugnou o acto administrativo que o aposentou a partir de 1 de Maio de 1993, firmando-se na ordem jurídico-administrativa, como caso decidido.
É verdade que o acto de aposentação está inquinado com o vício de violação de lei por erro nos pressupostos (a situação de disponibilidade do requerente), todavia, ultrapassado o prazo legalmente admissível para a sua impugnação contenciosa, o mesmo consolidou-se na ordem jurídica, não podendo agora o requerente vir, neste meio processual, tirar proveito da sua potencial invalidade, coisa que não fez atempadamente.
Podemos, pois, concluir que os acórdãos exequendos ao anular o despacho de 11/2/1996 do Sr. SEAF. com efeitos a 6/3/91, e no que respeita à reconstituição da carreira do requerente só pode abranger o espaço temporal que medeia entre esta data (6/3/91) até 1 de Maio de 1993 (momento em que o mesmo foi aposentado a pedido do requerente), pois que a partir desta data existe um acto administrativo (o de aposentação do requerente) que já se consolidou na ordem jurídica.
Assim, há quanto a este último segmento temporal, e no que respeita à reconstituição da carreira funcional do requerente, uma causa legítima de inexecução do acórdão.
Na verdade, legalmente só constituem causa legítima de inexecução, e como acima ficou referido, a impossibilidade absoluta e o grave prejuízo para o interesse público na execução de sentença (art°163° n°1 do CPTA).
Todavia, não é invocável a inexistência de causa legítima de inexecução quando a execução de sentença consista no pagamento de uma quantia pecuniária (art°175° n°3 do CPTA).
Ora, apenas, como supra se apurou, existe impossibilidade de execução do acórdão no que respeita à reconstituição da carreira do requerente após a sua aposentação e devido à situação jurídica em que se encontrava. Quanto à reconstituição da carreira anteriormente a tal situação e ao pagamento dos diferenciais dos vencimentos auferidos e dos que deveria auferir em execução do acórdão, não há qualquer impossibilidade, nem há qualquer lesão do interesse público, pelo que neste segmento não se verifica qualquer causa legítima de inexecução.
Há, pois, que decidir pela inexistência de qualquer causa legítima que seja obstáculo à execução do acórdão anulatório, com excepção à reconstituição da carreira do requerente posteriormente à sua aposentação.
De seguida, o requerente pede a declaração de nulidade dos “actos desconformes com os mesmos acórdãos e dos actos que mantenham, sem fundamento válido, a situação ilegal em que o requerente se encontra, nomeadamente, o acto consequente consubstanciado na «aposentação» do requerente, bem como o acto praticado pela Subdirectora-geral da DGCI referido nos itens 44 e ss.”.
Embora, o requerente refira para serem declarados nulos todos os “actos desconformes com os mesmos acórdãos e dos actos que mantenham, sem fundamento válido, a situação ilegal em que o requerente se encontra”, apenas individualiza dois despachos: «o despacho que o aposentou» e «o acto praticado pela Subdirectora-geral da DGCI referido nos itens 44 e ss.».
Analisemos o despacho de aposentação.
O requerente A..., por requerimento datado de 29/4/1991, solicitou a sua aposentação ao abrigo do n°1 do art°16° do DL. n°43/84, de 3/2, conjugado com disposto no nº2 do art°34° do DL. nº41/84, de 3/2, tendo declarado prescindir do pedido subsidiário que havia feito em anterior requerimento, em que havia feito depender o início do processo de aposentação da sua não nomeação para o lugar de técnico jurista assessor da DGCI.
O DL. n°41/84 de 3/2 entre as medidas de descongestionamento da função pública, além da licença sem vencimento, previu o instituto da aposentação voluntária (arts. 34° a 36°), que permitia a aposentação, aos funcionários e agentes que, por sua iniciativa e independentemente de submissão a junta médica, contassem mais de 60 anos de idade e 20 anos de serviço (art°34° n°l al.a]) ou reunissem 30 anos e serviço, independentemente da respectiva idade (art°34° n°1 al.b]).
Por sua vez, o art°16º n°1 do DL. n°43/84 de 3/2 vem permitir que “durante o primeiro ano de disponibilidade, os excedentes da função pública que possuíssem o tempo mínimo de serviço para efeitos de aposentação, independentemente da idade e de submissão a junta médica, requeressem a aposentação voluntária, ... ”.
Da conjugação destes preceitos legais resulta que a aposentação, verificada que fossem certos requisitos, podia ser requerida em três situações: a) os funcionários ou agentes que tivessem mais de 60 anos de idade e 20 anos de serviço [art°34° n°1 al. a]; b) os que reunissem 30 anos de serviço, independentemente da respectiva idade [art°34° n°1 al. b]; c) os excedentes que requeressem a aposentação voluntária, durante o primeiro ano de disponibilidade, e possuíssem o tempo mínimo de serviço para efeitos de aposentação, independentemente da idade e de submissão a junta médica [art°16° n°1 do DL. n°43/84 de 3/2].
O requerente solicitou a sua aposentação através do seu requerimento de 25/4/1991, para a hipótese de ser negado provimento aos recursos administrativo e contencioso que iria interpor, ou seja, o acto administrativo que determinaria a sua aposentação dependia da verificação de uma condição: o improvimento dos recursos que ia interpor.
Porém, em 29/4/1991, veio através de novo requerimento, prescindir da condição inicialmente formulada, referindo que “encontrando-se na situação de disponibilidade desde 4/4/91, vem em complemento e aditamento ao anterior requerimento de 26 de Abril de 1991, confirmar e requerer a V. Exa., o seu pedido de aposentação ao abrigo do disposto no n°1 do art°16° do DL. n°43/84 de 3/2, conjugado com o disposto no n°2 do art°34° do DL. n°41/84 de 3/2, pelo que declara prescindir do pedido subsidiário feito no atrás referido requerimento, em que fazia depender o início do processo de aposentação da sua não nomeação para o lugar de técnico jurista assessor da DGCI…”.
Ora, estará o acto administrativo que determinou a aposentação do requerente ferido de nulidade?
Tudo depende da existência de desconformidade do mesmo com a h) e i) do artº133º nº2 do CPA e 179º n°2 do CPTA).
O acórdão exequendo anulou o despacho de 11/2/1996 do Sr. SEAF que indeferiu o recurso hierárquico, para si interposto pelo requerente A..., do despacho do Sr. DGCI de 26/7/95 que declarou extinto, pelo decurso do prazo, o direito à ocupação do lugar para que fora nomeado.
Tal significa que o requerente, e em conformidade também com o acórdão deste STA de 23/6/1994, e em execução dos mesmos, devia ser nomeado técnico jurista assessor da Direcção Geral dos Impostos (antiga DGCI), o que sucedeu, tendo o requerente aceite tal lugar só em 22/7/2003, com efeitos a partir de 6/3/1991.
Os tribunais são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo (art° 202° n°1 da CRP), sendo as suas decisões obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas e prevalecem sobre as de quaisquer outras autoridades (art°205° n°2 da CRP), competindo tribunais administrativos e fiscais o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais (artº 212° n° 3 da CRP).
Estes princípios constitucionais referidos vêm, depois, novamente consagrados e regulamentados quer no ETAF (art°1° n°1) ao referir que “os tribunais da jurisdição administrativa e fiscal são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo, nos litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais”, quer no CPTA (art°158° n°1) onde se consagra que “as decisões dos tribunais administrativos são obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas e prevalecem sobre as de quaisquer autoridades administrativas”.
Acrescente-se, ainda, que, e de acordo com o art°173° n°1 do CPTA, “sem prejuízo do eventual poder de praticar novo acto administrativo, no respeito pelos limites ditados pela autoridade do caso julgado, a anulação de um acto administrativo constitui a Administração no dever de reconstituir a situação que existiria se o acto anulado não tivesse sido praticado, bem como de dar cumprimento aos deveres que não tenha cumprido com fundamento no acto entretanto anulado, por referência à situação jurídica e de facto existente no momento em que deveria ter actuado”.
De acordo com todos estes normativos, podemos concluir, em primeiro lugar, que a sentença anulatória de um acto administrativo tem um efeito constitutivo, que, em regra, consiste na invalidação do acto impugnado, fazendo-o desaparecer do mundo jurídico desde o seu nascimento.
Além de este efeito, um outro existe, próprio de toda e qualquer sentença de um tribunal, seja qual for a natureza deste, que advém da força do caso julgado, apelidado de efeito conformativo (também designado de preclusivo ou inibitório), que exclui, “no mínimo, a possibilidade de a Administração reproduzir o acto com os mesmos vícios individualizados e condenados pelo juiz administrativo” (Vieira de Andrade, A Justiça Administrativa, pág. 227).
Durante muito tempo entendeu-se que seriam estes dois os únicos efeitos de uma sentença anulatória de um acto administrativo. Esta situação assentava sobretudo no princípio da separação dos poderes, segundo o qual, o poder judicial não podia impor à Administração a prática da certos e determinados actos.
Ultrapassada, porém, que foi a barreira resultante do princípio da separação dos poderes, e perante a inércia da Administração em extrair todas as consequências derivadas dum julgado e ínsitas no seu dever de executar uma sentença, que deixavam desprotegido qualquer particular apesar de a mesma sentença lhe ser favorável, entendeu-se que a decisão judicial anulatória consagrava também um outro efeito, o da reconstituição da situação hipotética actual (também chamado efeito repristinatório, efeito reconstitutivo ou reconstrutivo da sentença).
Segundo este princípio, a Administração tem o dever de reconstituir a situação que existiria se não tivesse sido praticado o acto ilegal ou se o acto tivesse sido praticado sem a ilegalidade.
Só que, a Administração, por não querer, não saber ou não poder, não procedia à reconstituição da situação que era definida pelo julgado anulatório, nada mais restando ao administrado, ao abrigo do quadro normativo definido (art° 173° n°1 do CPTA), do que ir novamente ao tribunal solicitar a execução do julgado.
São os designados efeitos ultraconstitutivos da sentença de anulação, que se manifestam hoje no processo de execução de julgados, pelo qual os interessados podem obter a especificação do conteúdo dos actos e operações a adoptar pela Administração e o prazo para a sua prática (art° 179° n°1 do CPTA), a declaração de nulidade dos actos desconformes com a sentença e a anulação dos que mantenham, sem fundamento válido, a situação ilegal (art° 179° n°2 do CPTA) (Sobre este assunto, ver Vieira de Andrade, A Justiça Administrativa -Lições -, pág.226 e ss.).
Delineados, em termos muito amplos e, consequentemente, de forma não exaustiva, os efeitos de uma sentença anulatória, há que regressar à situação concreta dos autos.
O requerente A... solicita a declaração de nulidade (artº133° n°2 al.i) do CPA) do acto administrativo que o aposentou.
Efectivamente, segundo este preceito legal “são nulos os actos consequentes de actos administrativos anteriormente anulados ou revogados, desde que não haja contra-interessados com interesse legítimo na manutenção do acto consequente”.
Há, assim, que apurar se o acto que aposentou o requerente é um acto consequente do acto anulado (indeferimento tácito do seu requerimento dirigido ao Sr. Director-Geral das Contribuições e Impostos, em 6/3/1991, onde solicitava a sua nomeação para uma das vagas existentes para técnico jurista Assessor da Direcção Geral das Contribuições e Impostos respeitantes ao concurso interno para técnico jurista Assessor da Direcção Geral das Contribuições e Impostos aberto por aviso publicado no DR, 2ª Série, n°127, de 3/6/1987).
Refira-se, desde já, que nem todos os actos consequentes de actos administrativos anteriormente anulados são nulos, pois que aquele preceito ressalva “os actos em que haja contra-interessados com interesse legítimo na sua manutenção”.
Mas o que deve entender-se por acto consequente? Este Supremo Tribunal tem entendido como “acto consequente aquele cuja prática e conteúdo depende da existência de um acto anterior que lhe serve de causa, base ou pressuposto” (Ac. do STA de 29/3/2006-rec. n°1149/05), aliás, na continuidade de há longo tempo, como se decidiu já no acórdão deste mesmo Supremo Tribunal de 28/11/1969 de que um acto administrativo só assume a natureza de acto consequente se a sua prática não for possível sem a prática de outro acto antecedente (in Acórdãos Doutrinais n°101, pág. 657).
Em nada diverge o conceito jurisprudencial daquele que a doutrina nos fornece, pois que o define como “o acto administrativo praticado ou dotado de certo conteúdo em virtude da prática de um acto administrativo anterior” (Freitas do Amaral, Execução de Sentenças dos Tribunais Administrativos, 2ª ed., pág.84; ver, ainda, Esteves de Oliveira, Pedro Gonçalves e Pacheco Amorim, in CPA, 2ª ed., pág. 650).
Porém, este conceito de acto consequente é demasiado abrangente e generalizante para ferir de nulidade todos os actos que de uma forma lógica, cronológica ou formalmente tenham uma ligação com o acto judicialmente anulado. Se assim fosse, desde que tivesse sido anulado todo e qualquer acto prévio, antecedente, pressuposto ou pré-relacional, tal anulação acarretaria a nulidade do acto consequente.
Assim, o conceito de acto consequente utilizado no artº 133º nº2 al. i) do CPA terá que ser mais restrito, o seu conteúdo mais redutor, o seu campo de aplicação mais estreito.
E desta necessidade se apercebeu este STA, entre outras situações, quando no seu acórdão de 7/7/1994 decidiu que “nem todos os actos consequentes, porém são necessariamente nulos; a Administração deve restringir-se ao estritamente necessário na reconstituição da situação hipotética, doutro modo, excedidos aqueles limites e sempre que com isso sejam afectados direitos entretanto adquiridos, viola o princípio da proporcionalidade” (rec. nº 30 612).
Mas este mesmo tribunal, veio, mais tarde, através do seu acórdão de 26/5/1998, precisar o conceito de acto consequente, ao sentenciar que “basta que um acto seja condicionado quanto ao seu conteúdo por outro anulado por decisão transitada para que o mesmo se possa considerar como consequente daquele outro, sendo o mesmo nulo [art. 133.º, n°1, al. i) do Cód. Proc. Adm.] “rec. n° 41 772).
Desta mesma necessidade de interpretar restritivamente o conceito de “acto consequente” fazia eco a doutrina.
Nas palavras de Prosper Weil “…o princípio da restitutio in integrum exige que todos «os actos-consequência» desapareçam, porque a anulação de uma decisão administrativa não deve deixar subsistir nenhum traço desta..., mas a teoria da anulação por via de consequência é muito menos simples do que se possa crer, porque esta expressão cobre hipóteses muito diferentes e que devem, por consequência, ser distinguidas…” (tradução nossa) (Les Conséquences de l’annulation d’un acte administratif pour excès de pouvoir, pág. 177 e ss.).
Apercebendo-se da necessidade desta interpretação restritiva, Freitas do Amaral afasta, em primeiro lugar, da categoria dos actos consequentes os actos não jurídicos, pois que por definição, as operações materiais realizadas em execução de um certo acto administrativo não são actos consequentes. Mas este mesmo autor defende, também, não serem actos consequentes aqueles actos em que nenhuma conexão se pode descobrir com os actos reputados consequentes, de tal modo que estes não detenham determinado de nenhum modo nem a prática daqueles nem a prática daqueles nem o conteúdo que lhes foi dado. Em terceiro lugar, “não pode caracterizar-se a conexão que há-de existir entre o acto antecedente e o acto consequente como devendo ser sempre uma relação de causalidade, em termos de se chegar à conclusão de que só é consequente de outro o acto de que este outro seja causa” (A Execução das Sentenças dos Tribunais Administrativos, pág. 80 e ss.).
Depois deste administrativista fazer estas reflexões sobre tal matéria, considera actos consequentes os actos administrativos praticados, ou dotados de certo conteúdo, em virtude da prática de um acto administrativo anterior ob. cit.,. pág. 84).
Também Vieira de Andrade, perante o teor do artº133º nº 2 al. i) do CPA defende que “o CPA vem tornar claro que o conceito de acto consequente há-de ser entendido como um conceito funcional-material e exclui, desta maneira, a generalização indiscriminada da nulidade com as suas consequências arrasadoras, inculcando positivamente o dever de ponderação dos interesses presentes nas situações da vida cuja reconstituição é determinada pela anulação um acto administrativo, … parecendo ser defensável o entendimento de que: a) serão nulos apenas os actos consequentes cuja manutenção seja incompatível com a reconstituição da situação hipotética exigida pela anulação; b) mesmo quando se trate de actos nulos por essa razão, os seus efeitos (putativos) poderão manter-se em face de direitos ou de interesses legítimos de contra-interessados” (Actos consequentes e execução de sentença anulatória, in Revista Jurídica da Universidade Moderna, pág. 36 e ss.).
Neste mesmo artigo doutrinal, o mesmo autor sintetiza mais o seu pensamento ao escrever que “a concepção tradicional de acto consequente tem de considerar-se hoje ultrapassada, quer em face da legislação sobre o procedimento administrativo, quer perante o novo entendimento da relação funcional pública, pois que, por sobre ser uma concepção dogmaticamente inadequada, conduzia muitas vezes a soluções injustificadas e iníquas, em homenagem a um puro conceptualismo. Desde logo, como vimos, o conceito de acto consequente, para efeitos de invalidade, não pode continuar a ser construído em termos puramente lógicos, através de nexos de causalidade ou de consequencialidade fáctica, como qualquer «acto praticado ou dotado de certo conteúdo em virtude da prática de um acto administrativo anterior». Actos «consequentemente inválidos», ou seja automaticamente inválidos (nulos ou, mais exactamente, anulados «por causa da anulação do acto precedente» serão apenas aqueles cujos efeitos não possam manter-se sem ofensa do caso julgado ou desconformidade com a sentença, concretamente, aqueles cujos efeitos têm necessariamente de ser destruídos para que se possa reconstituir a situação hipotética actual, na medida em que seja imposta pela sentença anulatória, em função dos respectivos fundamentos” (pág. 40; do mesmo autor veja-se, ainda, A Justiça Administrativa - 1998, pág.232 e ss.; DJAP, Vol. VII, A Validade do Acto Administrativo, pág.589 e 590).
Igualmente Mário Aroso de Almeida se apercebe deste mesmo problema sobre a precisão do conceito de acto consequente, escrevendo que “a anulação de um acto administrativo se pode e deve projectar no plano da validade dos actos que possam ter sido praticados em conexão juridicamente relevante com ele - que preferimos designar como actos conexos (com o acto anulado) -, desse modo evitando utilizar a fórmula actos consequentes tradicionalmente adoptada pela doutrina e jurisprudência portuguesas e que encontramos no art°133° n°2 al.i) do CPA...” (Anulação de actos administrativos e relações jurídicas emergentes, pág. 312).
Na verdade, o conceito de actos consequentes transcende etimologicamente o conceito de actos conexos, tendo uma amplitude muito maior e que o torna inadequado para o fim que pretende servir
Assim, para este autor “a validade de um acto jurídico possa depender do destino de outro acto jurídico anteriormente praticado quando entre eles exista uma conexão jurídica e não meramente fáctica ou puramente lógica... Em nossa opinião, essa conexão existirá quando se possa afirmar que entre os dois actos existe uma relação que seria susceptível de determinar necessariamente a invalidade do segundo, se acaso este tivesse sido praticado, nos termos em que efectivamente o foi, num momento em já tivesse sido decretada a anulação do primeiro…A invalidade do acto conexo resulta, pois, de uma causa autónoma em relação àquela que determinou a queda do acto que o precedeu, que diz respeito aos seus próprios requisitos de validade e que se concretiza num vício próprio, atinente a um dos seus elementos estruturais: procedimento, sujeito, objecto, conteúdo…” (ob. cit., pág. 318).
E mais adiante acrescenta que “um acto conexo será, pois, nulo se a definição jurídica contida no acto anulado tiver constituído o fundamento da emissão desse acto, em termos de se poder afirmar que representou um elemento essencial da sua emissão, no sentido do art°133° do CPA, ao nível do sujeito, do objecto, dos pressupostos, do conteúdo...- elemento que não existiria se, no momento em que o acto conexo foi praticado, o acto precedente já tivesse sido anulado - e que a anulação veio remover com efeitos retroactivos - fornecia um elemento essencial ao acto conexo (pág. 331).
Estariam nesta situação, em primeiro lugar, os actos de execução do acto anulado, no sentido em que correntemente são designados os actos emitidos “para pôr em prática a definição contida em actos jurídicos preexistentes; em segundo lugar, podemos incluir neste núcleo duro as relações de conexão que se estabelecem entre actos inseridos no mesmo procedimento - ou sub procedimentos inseridos em consequências procedimentais complexas - na medida em que a emissão de uns é preordenada à ulterior adopção de outros, que necessariamente assentam na emissão dos precedentes, que para eles constituem, assim, um elemento essencial; em terceiro lugar, podem-se ainda enquadrar no mesmo núcleo os actos em relação aos quais se possa afirmar, a propósito de outros dos seus elementos, que se o acto anterior já tivesse sido anulado no momento em que eles foram praticados, careceriam de um elemento essencial, pelo que nunca, nesse caso, poderiam ter sido praticados (Mário Aroso de Almeida, ob. cit., pág. 331 e ss.).
Em suma, face a todas estas posições jurisprudenciais e doutrinais, podemos concluir que o conceito de actos consequentes, para efeitos do disposto no artº133° n°2 al. i) do CPA, não é coincidente com o conceito normalmente tido de acto consequente, sendo mais restrito.
Assim, para além de uma relação cronológica, lógica e sequencial, terá que haver uma relação mais íntima entre os dois actos, tem que haver um nexo de dependência necessária (Aroso de Almeida, ob. cit., pág. 333), ou, nas palavras de Alberto Xavier, “haver um decisivo relevo do nexo de sucesso procedimental, para que quando um acto tenha de ser anulado, tenham de ser anulados também os termos subsequentes que dele dependam absolutamente” (O Processo Administrativo Gracioso, pág. 232).
Sustenta o requerente que “a aposentação, por se tratar de um acto consequente do acto de indeferimento do pedido de nomeação do requerente é nulo” (art°92° do requerimento inicial).
Vamos, assim, apurar se o acto de aposentação do requerente é um acto consequente (conexo) do acto de indeferimento do seu pedido de nomeação.
Nos termos do art° 28° n°1 do DL. n° 427/89 a relação jurídica de emprego dos funcionários e agentes cessa por morte destes, por aplicação de pena disciplinar expulsiva e por desligação do serviço para efeito de aposentação.
Assim, através da aposentação extingue-se a relação jurídica de serviço ou emprego público, em que, aliás, se filia, constituindo, ela própria, uma nova relação jurídica - a de aposentação - que substitui a primeira (Dicionário Jurídico da Administração Pública, vol. 1º, pág. 401).
A aposentação pode considerar-se normal e acidental. Estamos perante a primeira espécie quando reveste carácter de regra, tendendo para ela, em princípio, todo o subscritor da Caixa Geral de Aposentações, revestindo duas modalidades: a voluntária e a obrigatória, conforme a iniciativa pertence ao aposentado, nos casos em que a lei a faculte ou quando resulte de simples determinação da lei ou de imposição da autoridade competente. Sucede a aposentação acidental quando por motivos anormais cessa prematuramente a carreira do servidor, subdividindo-se em aposentação por incapacidade (podendo esta incapacidade resultar do serviço ou por dedicação causa pública ou não resultante do serviço) e aposentação compulsiva (resultante directamente de processo disciplinar ou resultante indirectamente de processo disciplinar) (art° 36° do Estatuto da Aposentação; cfr. DJAP, pág.401 e ss.).
Esta cessação da relação jurídica de emprego público opera-se através de acto administrativo praticado em tal sentido, momento a partir do qual o funcionário deixa de estar na actividade do serviço (Marcelo Caetano, Man. Dir. Adm., 10ª ed., pág. 777 e ss.).
Ora, é este acto que determinou a aposentação do requerente que o mesmo entende ser nulo por ser consequente do acto contenciosamente anulado.
Apurado acima o conceito de acto consequente para estes efeitos, cabe agora indagar qual a relação existente entre o acto de aposentação e o despacho de 11/2/1996 do Sr. SEAF que indeferiu o recurso hierárquico, para si interposto pelo requerente A..., do despacho do Sr. DGCI de 26/7/95 que declarou extinto, pelo decurso do prazo, o direito à ocupação do lugar para que fora nomeado.
Precise-se que da anulação contenciosa deste acto o requerente devia ser nomeado técnico jurista assessor da Direcção Geral dos Impostos (antiga DGCI), com efeitos a partir de 6/3/1991, remunerado pelo índice e escalão adequados à concreta situação em que ele, naquele momento, se encontrava inserido, acrescendo-se os suplementos que desde aquela data estivessem a ser pagos a funcionários nas mesmas condições do requerente, e reconstituindo-lhe a carreira em termos idênticos à dos outros concorrentes nomeados na sequência do mesmo concurso (como a própria administração reconhece).
Como o requerente refere “... tendo adquirido a qualidade de excedente nos termos do Despacho Conjunto A-140-87, de 25/6, dos Srs. Ministros das Finanças e da Indústria e Comércio, encontrando-se na situação de disponibilidade desde 4/4/91, vem em complemento e aditamento ao anterior requerimento de 26 de Abril de 1991, confirmar e requerer a V. Exa., o seu pedido de aposentação ao abrigo do disposto no nº1 do art°16° do DL. nº43/84 de 3/2, conjugado com o disposto no n°2 do art°34° do DL. n°41/84 de 3/2, pelo que declara prescindir do pedido subsidiário feito no atrás referido requerimento, em que fazia depender o início do processo de aposentação da sua não nomeação para o lugar de técnico jurista assessor da DGCI…” estava na situação de disponibilidade desde 4/4/91, quando por requerimento de 25/4/91 solicitou a sua aposentação, tendo em 29 do mesmo mês renunciado à condição que nele expressara (de fazer depender o início do processo de aposentação da sua não nomeação para o lugar de técnico jurista assessor da DGCI…)
O requerente solicitou a sua aposentação nos termos dos arts. 16º nº 1 do DL nº 43/84 e 34º nº 2 do DL nº 41/84.
Prevê o artigo 16°, desde que se verifiquem os pressupostos referidos no art°34° n°1, supra transcritas duas modalidades de aposentação: uma voluntária, a pedido do excedentário, que pode ser solicitada no primeiro ano de disponibilidade (n°1) e outra obrigatória, imposta por lei para a hipótese de o excedentário estar dois anos na situação de disponibilidade há mais de dois anos (n°2).
No caso vertente, A... requereu voluntariamente a sua aposentação nos termos das disposições combinadas dos referidos arts. 34° n°1 e 16° n°1, pelo que não se pode qualificar o acto que lhe concedeu a aposentação como acto consequente do acto que o manteve na situação de disponibilidade (o despacho de 11/2/1996 do Sr. SEAF que indeferiu o recurso hierárquico, para si interposto pelo requerente A..., do despacho do Sr. DGCI de 26/7/95 que declarou extinto, pelo decurso do prazo, o direito à ocupação do lugar para que fora nomeado). Na verdade, aquela decisão de aposentação só surgiu porque foi solicitada pelo ora requerente e não surgiu automaticamente, isto é, não foi imposta pela lei, mas tão só por esta permitida.
Situação diferente seria a prevista no nº 2 daquele artigo 16º, essa, sim, já imposta pela lei e como tal obrigatória.
O acto de aposentação do requerente embora tendo como pressuposto a situação de disponibilidade criada pelo despacho anulado, todavia, não reveste a natureza de acto conexo do mesmo, no sentido acima referido, ou seja, não há um nexo de dependência necessária entre um e o outro, pois que aquela aposentação do requerente só sucedeu porque o mesmo a requereu.
Aliás, a mesma foi requerida aceitando o excedentário a situação em que se encontrava, pois expressamente prescindiu de todo e qualquer efeito dos recursos interpostos.
Não se verifica, pois aqui, a hipótese da nulidade prevista no art° 133º n°2 al. i) do CPA.
Mas o requerente pede ainda a declaração de nulidade do acto da Sra. Subdirectora geral da DGCI de 1/8/2003 referido nos itens 44° e seguintes. Alega aqui, em suma, que “em 1/8/2003 a Sra. Subdirectora Geral da DGCI determinou verbalmente que o requerente não mais comparecesse nos serviços da DGCI, onde não poderia continuar a exercer funções”.
É este acto oral que o requerente pede ao tribunal para ser declarado nulo.
O fundamento para esta declaração de nulidade é indicada a fls.2 por tal acto ser desconforme com a sentença, para posteriormente alegar que lhe falta a fundamentação, não foi ouvido antes de ser praticado tal acto e não ter qualquer suporte válido (fls. 11).
Porém, nesta sede de execução de julgados apenas se pode conhecer se o acto cuja nulidade é pretendida pelo requerente viola, ou não, o caso julgado ou se o mesmo é consequência do acto anteriormente anulado contenciosamente.
Quanto à natureza de acto consequente, reproduzem-se todas as considerações atrás tecidas, quanto a esta matéria.
Apenas se acrescentará que não existe qualquer conexão directa e necessária, digamos que juridicamente “inevitável” entre o acto contenciosamente anulado (o despacho de 11/2/1996 do Sr. SEAF que indeferiu o recurso hierárquico, para si interposto pelo requerente A..., do despacho do Sr. DGCI de 26/7/95 que declarou extinto, pelo decurso do prazo, o direito à ocupação do lugar para que fora nomeado) e a ordem verbal da Sra. Subdirectora Geral da DGCI, de 1/8/2003, “para o requerente não comparecer mais nos serviços da DGCI, onde não poderia continuar a exercer funções”.
Na verdade, não refere o requerente qual a fundamentação de tal de proibição, se requereu a redução a escrito de tal fundamentação, para agora se poder avaliar da relação entre ambos os actos (artº126º do CPA; Esteves de Oliveira, Pedro Gonçalves e Pacheco de Amorim, in CPA Anotado, 2ª ed., pág. 607). Pode até estar na base da proibição de o requerente comparecer nos serviços o facto de o mesmo já estar aposentado naquela data a seu pedido (a ordem é de 1/8/2003 e a aposentação foi concedida em 1/5/1993).
Não se pode, pois, considerar o acto de proibição imputado à Sra. Subdirectora Geral da DGCI acto consequente do acto anulado, para os efeitos do art° 133 nº 2 al. i) do CPA.
Mas também não se pode acolher a tese do requerente de que o mesmo acto de proibição viola o caso julgado.
O caso julgado (material) consiste na indiscutibilidade da afirmação sobre a legalidade do acto contida na sentença administrativa, a qual é assim vinculativa para qualquer tribunal ou autoridade pública e para os próprios particulares que sempre a têm de aceitar como um dado imodificável (Rui de Machete, in DJAP-Vol. II, pág.302).
A obrigatoriedade reconhecida ao caso julgado material reside essencialmente na necessidade de assegurar estabilidade às relações jurídicas, não permitindo que litígios, com o mesmo objecto e entre as mesmas partes, se repitam indefinidamente, em prejuízo da paz jurídica imposta pelo interesse público (cfr. Rodrigues Bastos, in Notas ao CPC, vol.3°, pág. 252; Manuel Andrade, in Noções Elementares de Processo Civil, Vol. 1º, pág. 281).
Assim, e nos termos do art° 497° n°1 e 498° ambos do CPC, a excepção do caso julgado pressupõe a repetição da causa (com identidade de sujeitos, pedido e causa de pedir) depois de a primeira causa ter sido decidida por sentença que já não admite recurso ordinário.
Ora, o que foi decidido pelo Tribunal foi a anulação do despacho que declarou extinto, pelo decurso do prazo, o direito à ocupação do lugar para que fora nomeado), ou seja, devia ser nomeado técnico jurista assessor da Direcção Geral dos Impostos (antiga DGCI), com efeitos a partir de 6/3/1991, remunerado pelo índice e escalão adequados à concreta situação em que ele, naquele momento, se encontrava inserido, acrescendo-se os suplementos que desde aquela data estivessem a ser pagos a funcionários nas mesmas condições do requerente, e reconstituindo-lhe a carreira em termos idênticos à dos outros concorrentes nomeados na sequência do mesmo concurso.
Mas a ordem dada verbalmente ao requerente “para não mais comparecer nos serviços da DGCI, onde não poderia continuar a exercer funções” ofende o caso julgado (artº 133º nº 2 al. h) do CPA) ou está desconforme com o decidido (art°179° n° 2 do CPTA) para estar ferido de nulidade?
A resposta só pode ser negativa.
É que em nada colide aquela ordem com o acórdão transitado em julgado que se pronunciou apenas pela ilegalidade do acto que declarou extinto, pelo decurso do prazo, o direito à ocupação do lugar para que fora nomeado o requerente, sem se pronunciar sobre a extinção da relação jurídica de serviço ou emprego público através da aposentação.
É que não nos podemos esquecer que embora daquele acórdão resulte a sua nomeação como Técnico Jurista Assessor do Quadro da DGCI, com efeitos a 6/3/1991, o mesmo requerera a sua aposentação em 25/4/1991 (sem quaisquer reservas face ao aditamento apresentado no dia 29 seguinte) a qual lhe fora concedida em 1/5/1993, e a ordem para se retirar dos serviços é de 1/8/2003, portanto, quando a sua relação jurídica de emprego já tinha cessado.
Não há, pois, qualquer ofensa do caso julgado nem tal ordem está em desconforme com o decidido.
Inexiste, assim, qualquer fundamento legal para que também este acto seja agora declarado nulo por este tribunal.
Passemos, de seguida, quais os actos e as operações que devem ser praticados pela Administração em execução do acórdão anulatório.
A... exerceu funções com a categoria de Assessor, no ex-Gabinete de Gestão Financeira (Serviços Sociais do Ministério da Justiça), em regime de requisição autorizada por despacho de 22/3/1990 do Director-Geral da Administração Pública, no período compreendido entre 3/4/1990 a 2/4/1991, e estando posicionado no escalão 0 índice 530, desde 1989, e a partir de Janeiro de 1991 foi posicionado no escalão 1 índice 600 (ponto 26 da matéria de facto), tendo em 3/4/1991 regressado à disponibilidade do QEI do Ministério do Comércio e Turismo.
Porém, a partir de Janeiro de 1991 e por força da alínea d) do n°2 do art°38° do DL. n°353-A/89, de 16/10 o requerente foi posicionado no escalão 1 índice 600, tendo sido remunerado de acordo com este escalão até regressar à disponibilidade (3/4/1991).
Dado que o requerente foi oponente a concurso aberto em 1987 e estando a decorrer o mesmo aquando da entrada em vigor do DL. n°353-A/89, de 16/10, devia o mesmo ser integrado no escalão para que transitaram os então titulares das categorias a que se candidataram, com idênticas diuturnidades (artº39º nº 2 al. b) e 45°, ambos do DL. n°353-A/89, de 16/10).
Resulta da Nota Biográfica (fls. 115) que o requerente, em 30/9/1989, tinha quatro diuturnidades pelo que nos termos do Mapa Anexo II ao DL. n°187/90, de 7/6, devia ser integrado no escalão 5 ao qual correspondia o índice 790.
Só que o requerente devia exercer, por força do acórdão anulatório, as funções de Técnico Jurista Assessor a partir de 6/3/1991, e deste escalão só podia transitar para o imediatamente superior (6° escalão) depois da permanência de três anos no escalão imediatamente anterior (art°9° do DL. n°187/90, de 7/6), o que só sucederia em 6/3/1994, data em que o requerente já se encontrava na situação de aposentado.
Porém, tal mudança de escalão, do 5º para o 6°, nunca chegou a operar-se porque o requerente já estava aposentado desde 1/5/1993. Assim, o requerente quando foi aposentado devia auferir a remuneração correspondente ao índice 790, e era de acordo com este índice que devia ter sido calculado o montante da sua pensão de aposentação.
Em concordância com tudo o exposto, declara-se a inexistência de causa legítima de inexecução dos acórdãos anulatórios, com excepção da reconstituição da carreira do requerente após a sua aposentação, em julgar inexistentes as nulidades apontadas ao acto de aposentação do requerente e ao acto da Sra. Subdirectora geral da DGCI de 1/8/2003 e, em execução daqueles acórdãos anulatórios, deve, pois, a Administração tomar os seguintes procedimentos:
1 - Pagar ao requerente desde 6/3/1991 até 1/5/1993 (data da sua aposentação) o vencimento de acordo com o índice 790;
2 - A pensão de aposentação do requerente a partir da data em que lhe foi concedida deve ser calculada tendo em consideração aquele índice 790;
3 - Todos os subsídios a que o requerente tinha e tem direito devem ser calculados levando em conta o vencimento e pensão referidos em 1 e 2;
4 - Os montantes encontrados nos termos acabados de referir, tendo em atenção todas as alterações legais, devem ser harmonizados de acordo com as importâncias que o requerente já recebera a título das mesmas, devendo ser tomados em consideração os respectivos juros e efectuados os respectivos descontos;
5 - Fixa-se o prazo de 90 dias para o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais praticar as operações supra fixadas.
Custas pela entidade executada.
Lisboa, 30 de Janeiro de 2007. - Pires Esteves – (relator) – São Pedro – Fernanda Xavier.