Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:02665/22.3BELSB
Data do Acordão:05/04/2023
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:TERESA DE SOUSA
Descritores:APRECIAÇÃO PRELIMINAR
INSTITUTO
REGISTOS E NOTARIADO
INTIMAÇÃO PARA PROTECÇÃO DE DIREITOS LIBERDADES E GARANTIAS
PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
PRINCÍPIO DA IGUALDADE
Sumário:Não se justifica admitir revista se questões submetidas à apreciação do acórdão recorrido aparentam ter sido decididas correctamente, com recurso a uma fundamentação plausível, no juízo sumário e perfunctório que esta apreciação preliminar comporta, pelo que não se justifica postergar a regra da excepcionalidade da revista, uma vez que as questões não assumem especial relevância jurídica, nem se afigura necessária a revista para uma melhor aplicação do direito.
Nº Convencional:JSTA000P30968
Nº do Documento:SA12023050402665/22
Data de Entrada:04/18/2023
Recorrente:INSTITUTO DOS REGISTOS E NOTARIADO
Recorrido 1:AA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
Formação de Apreciação Preliminar

Acordam no Supremo Tribunal Administrativo

1. Relatório
Instituto dos Registos e Notariado, IP (doravante IRN) interpõe o presente recurso de revista nos termos do disposto no art. 150º, nº 1 do CPTA, do acórdão do TCA Sul de 26.01.2023 [rectificado pelo acórdão de 22.02.2023, quanto a um lapso de escrita], o qual negou provimento ao recurso que interpusera da sentença proferida pelo TAC de Lisboa que na acção administrativa urgente de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias instaurada por AA, na qual requer a condenação daquela entidade à prática imediata do acto devido que decida do pedido de nacionalidade da autora, ou, subsidiariamente que aquela Entidade seja condenada a deferir o pedido de urgência formulado quanto ao seu processo de nacionalidade, sendo este último pedido deferido.

Em contra-alegações a A. defende que o recurso deve ser rejeitado ou improceder.

2. Os Factos
Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

3. O Direito
O art. 150º, nº 1 do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo “quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de uma importância fundamental” ou “quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”.
Como resulta do próprio texto legal, e a jurisprudência deste STA tem repetidamente sublinhado, trata-se de um recurso excepcional, como, aliás, o legislador sublinhou na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, considerando o preceito como uma “válvula de segurança do sistema”, que só deve ter lugar, naqueles precisos termos.

Na presente revista o Recorrente invoca que se deve entender que estamos perante uma excepção de impropriedade do meio processual utilizado, em violação do disposto nos arts. 89º, nºs 1, 2 e 4 do CPTA, 576º, nºs 1 e 2, 577º e 578º do CPC, estes ex vi do art. 1º do CPTA.
Invoca ainda que o acórdão recorrido (com antes a sentença) violou os princípios da universalidade, da igualdade e da imparcialidade, consagrados nos arts. 12º e 13º da CRP e 6º, 8º e 9º do CPA, bem como o princípio da separação de poderes, consagrados nos arts. 111º da CRP e 3º, nº 1 do CPTA.
A argumentação do Recorrente não convence.

O TAC de Lisboa por sentença de 18.10.2022 julgou improcedente a excepção inominada de impropriedade do meio processual e parcialmente procedente a intimação deduzida e, em consequência, intimou o IRN a deferir o pedido de urgência formulado pela requerente, nos termos do art. 41º do RPN, iniciando a respectiva tramitação e diligenciando pela sua decisão, com prioridade sobre os demais, sem prejuízo de outros pedidos anteriores cuja urgência haja sido deferida.

Na apelação que interpôs para o TCA Sul, o IRN invocou, no que agora interessa, que a sentença não cumpriu a obrigação de estabelecer interesses de ponderação na forma processual, sancionando uma flagrante violação dos princípios constitucionais da igualdade e proporcionalidade, previstos no art. 266º da CRP, uma vez que os mesmos factos, devem ser de igual forma tratados e ponderados no pressuposto da urgência exigido no art. 109º do CPTA.
O acórdão recorrido após transcrever a fundamentação da sentença (nomeadamente o preceituado no art. 41º do Regulamento da Nacionalidade Portuguesa) teceu as pertinentes considerações sobre o art. 266º da CRP que institui como princípio fundamental da Administração Pública a prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, impondo-se aos órgãos e agentes administrativos que actuem, no exercício das suas funções, com respeito pelos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa-fé (cfr. nºs 1 e 2 do referido art. 266º). Imposição igualmente constante nos artigos 6º, 7º, 8º e 10º do CPA.
Considerou, nomeadamente, o acórdão que: “Reconheceu-se na sentença que o pedido da autora não tinha sido objeto de qualquer análise, tramitação ou instrução por parte da entidade requerida. E atendendo às razões de urgência ali expostas, cumpria dar resposta positiva ao pedido de tramitação urgente do pedido da aqui recorrida.
O raciocínio explanado é evidente.
Estamos perante uma requerente de 86 anos de idade e com problemas de saúde que se agravam. Logo, é de elementar bom senso atribuir carácter urgente à apreciação do seu pedido.
Nessa medida, a opção tomada revela-se adequada, pois é a medida apropriada ao objetivo de garantir a atempada tutela do direito da requerente, é necessária, por não se prefigurar outra medida que, nas apontadas circunstâncias, permitisse alcançar o desiderato pretendido, e não se afigura excessiva, em função da ponderação dos interesses em presença.
Improcede, pois, a invocada violação do princípio da proporcionalidade.
Quanto à invocada violação do princípio da igualdade, previsto no art. 6º do CPA (a cuja caracterização procedeu), concluiu o acórdão que, “No caso, a entidade recorrente omite por completo qualquer densificação quanto a esta suposta violação, o que não permite disputar que esta potencial diferenciação de tratamento esteja ancorada em justificação razoável.
Conclui-se, pois, não se verificar violação dos princípios da proporcionalidade e da igualdade”.
Assim, o TCA julgou o recurso improcedente, confirmando a sentença recorrida.

Na presente revista o Recorrente pretende discutir a excepção da inidoneidade do meio processual.
No entanto, essa questão não foi objecto do recurso de apelação, pelo que o decidido em primeira instância quanto à não verificação de tal excepção se mostra transitado em julgado (cfr. art. 628º do CPC).
Vem invocada, ex novo, na presente revista a violação dos princípios da universalidade, da imparcialidade e da separação de poderes.
No entanto, a violação de tais princípios não é de conhecimento oficioso (sendo que na abordagem que fez ao art. 266º, nºs 1 e 2 da CRP e art. 6º do CPA já foi apreciada a alegada violação do princípio da imparcialidade), pelo que não tendo a violação de lei, em que se consubstanciaria o desrespeito pelos princípios da universalidade e da separação de poderes, sido objecto de apreciação pelo acórdão recorrido, não pode ser suscitada nesta sede de revista que, como qualquer outro recurso, tem por objecto a decisão recorrida.
Quanto às questões submetidas à apreciação do acórdão recorrido aparentemente este terá decidido bem, com recurso a uma fundamentação plausível, no juízo sumário e perfunctório que esta apreciação preliminar comporta, pelo que não deve ser admitido o recurso, por não se justificar postergar a regra da excepcionalidade da revista, uma vez que a questão não assume especial relevância jurídica, nem se afigura necessária para uma melhor aplicação do direito.

4. Decisão
Pelo exposto, acordam em não admitir a revista.
Sem custas (art. 4º, nº 2, al. b) do RCP).

Lisboa, 4 de Maio de 2023. – Teresa de Sousa (relatora) – José Veloso - Fonseca da Paz.