Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:02415/15.0BEBRG
Data do Acordão:04/05/2019
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:MADEIRA DOS SANTOS
Descritores:APRECIAÇÃO PRELIMINAR
LOTEAMENTO
INFORMAÇÃO PRÉVIA
DECLARAÇÃO DE NULIDADE
Sumário:É de admitir a revista do acórdão confirmativo da sentença que, no seu essencial, julgou improcedente a acção dos autos - onde os autores impugnaram o acto que, por violação das prescrições de um loteamento, declarou nulo o anterior deferimento de um pedido de informação prévia - se a matéria de facto coligida pelas instâncias torna duvidosa a ideia, a que elas chegaram por interpretação, de que o terreno alvo da sobredita informação integrava deveras o loteamento.
Nº Convencional:JSTA000P24440
Nº do Documento:SA12019040502415/15
Data de Entrada:03/20/2019
Recorrente:A................ LDA E OUTROS
Recorrido 1:MUNICÍPIO DE BARCELOS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em apreciação preliminar, no Supremo Tribunal Administrativo:
A………………………, Ld.ª, e o Dr. B………………., identificado nos autos, interpuseram a presente revista do acórdão do TCA Norte confirmativo da sentença TAF de Braga que julgou improcedente - excepto no tocante ao pedido indemnizatório, que foi reconhecido em parte - a acção administrativa que os recorrentes deduziram contra o Município de Barcelos e onde primariamente pretendem a anulação do acto, do Presidente da respectiva Câmara Municipal, que declarou nula, por ofensa das regras de um loteamento, a pronúncia que deferira o pedido de informação acerca da possibilidade de se edificar um posto de abastecimento de combustíveis num determinado terreno.

Os recorrentes pugnam pelo recebimento da revista por ela incidir sobre questões relevantes e erroneamente decididas.

O município contra-alegou, defendendo a inadmissibilidade da revista.

Cumpre decidir.

Em princípio, as decisões proferidas em 2.ª instância pelos TCA's não são susceptíveis de recurso para o STA. Mas, excepcionalmente, tais decisões podem ser objecto de recurso de revista em duas hipóteses: quando estiver em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, assuma uma importância fundamental; ou quando a admissão da revista for claramente necessária para uma melhor aplicação do direito («vide» o art. 150º, n.º 1, do CPTA).

A acção dos autos visa primacialmente obter a anulação do acto do Presidente da CM Barcelos que declarou nulo - por ofensa das prescrições de um loteamento vigente «in situ» - o deferimento de um pedido de informação prévia tendente à edificação de um posto de abastecimento de combustíveis.

O fundamental ataque dos autores ao acto consistiu na alegação de que o terreno em causa não integra o loteamento. Subsidiariamente, eles também disseram que o loteamento caducara.

As instâncias julgaram a acção improcedente - salvo quanto a um restrito segmento do pedido indemnizatório também formulado - por entenderem que a parcela de terreno onde se erigiria o posto integrara deveras o loteamento, cuja disciplina, ainda hoje actuante, não contemplava a finalidade a que tendia a informação prévia.

Na presente revista, os recorrentes insistem na ilegalidade do acto impugnado porque o terreno é alheio ao loteamento e, mesmo que assim não fosse, este já caducou.

O cerne do problema consiste em saber se a dita operação de loteamento abrangeu, ou não, a parcela objecto da informação prévia. Normalmente, este género de assuntos não se presta a dúvidas - porque recebe definições precisas dos actos Iicenciadores e dos respectivos alvarás. Mas, «in casu», não é assim, devido ao modo labiríntico como se desenrolou o processo de loteamento.

A matéria de facto coligida pelas instâncias contém uma minuciosa descrição dos trâmites que se sucederam na câmara municipal a propósito do loteamento. E os recorrentes pretendem que o STA reinterprete juridicamente tudo isso, porque a solução do aresto não será a exacta.

Ora, tal tarefa é exercitável pelo tribunal de revista porque - ressalvados os assuntos conexos com a vontade real dos declarantes - a interpretação do teor de documentos é uma questão de direito.

Nessa massa de factos provados, avultam os seguintes:

Em 1981, o antigo «dominus» de um certo terreno apresentou na CM Barcelos um projecto de loteamento dessa área. Após vicissitudes diversas, o mesmo interessado, em 6/1/1986, introduziu no processo um «aditamento» em que excluía os «quatro lotes» previstos para nascente - já que eles, por abrangerem também o terreno de um vizinho, necessitavam de um projecto separado. Esse aditamento foi aprovado pela CM Barcelos em 18/7/1986. Em 22/9/1986, o presidente da câmara emitiu o alvará n.º 62/86, relativo à 1.ª fase do loteamento e respeitante a quatro lotes (J a N). E, em 12/2/1990, esse presidente emitiu o alvará n.º 3/90, reportado à 2.ª fase do loteamento e constitutivo de nove lotes (A a I). Por outro lado, os serviços camarários informaram e certificaram que, para além da área loteada, havia no terreno uma «parcela sobrante», com 973 m2, a qual aparentemente corresponde à parte que o aludido aditamento excluíra da operação urbanística de divisão em lotes.

Todo este circunstancialismo - donde sobressai o «aditamento» que excluiu os «quatro lotes», bem como as diversas referências camarárias a um «terreno», «área» ou «parcela sobrante» - adensa dúvidas sobre a bondade do acto impugnado e o acerto do acórdão do TCA. Exige-se, pois, uma nova abordagem da matéria e uma reanálise geral do assunto, para garantia de uma exacta e segura aplicação do direito.

Nestes termos, acordam em admitir a revista.

Sem custas.

Porto, 5 de Abril de 2019. – Madeira dos Santos (relator) – Costa Reis – São Pedro.