Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0443/13.0BEPRT
Data do Acordão:06/17/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:NEVES LEITÃO
Descritores:IVA
DEDUÇÃO
REEMBOLSO
PRAZO
ERRO MATERIAL
ERRO DE DIREITO
Sumário:I - A lei distingue prazos para o exercício do direito à dedução de IVA ou de reembolso de imposto entregue em excesso:
- como regra quatro anos, contados a partir do nascimento do direito à dedução ou do pagamento em excesso (art.98º nº2 CIVA)
- no caso de correcção de erros materiais ou de cálculo dois anos, contados a partir do nascimento do direito à dedução, sendo facultativa quando resultar imposto a favor do sujeito passivo e obrigatória quando resultar imposto a favor do Estado (art.78º n º6 CIVA)
II - São erros materiais ou manifestos, designadamente os que resultam do funcionamento anómalo dos sistemas informáticos da administração tributária bem como as situações inequívocas de erro de cálculo, de escrita, e inexatidão ou lapso (art.95º-A CPPT)
III - Não constitui erro material ou de cálculo, antes erro na interpretação e aplicação do regime jurídico, a desconsideração pelo sujeito passivo de operações relativas a instrumentos financeiros derivados realizadas com contrapartes estabelecidas ou domiciliadas fora da União Europeia que conferiam direito a dedução, dela resultando alteração da percentagem de dedução (pro rata) de 12% para 19% (arts. 20º nº1 al.b) v) e 23º nº 4 CIVA)
IV - Em consequência, é aplicável o prazo de 4 anos para o exercício do direito à dedução ou ao reembolso do imposto entregue em excesso.
Nº Convencional:JSTA000P26059
Nº do Documento:SA2202006170443/13
Data de Entrada:06/14/2019
Recorrente:AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:BANCO A……………………, S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: 1. RELATÓRIO
1.1. A Fazenda Pública interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto em 26 fevereiro 2019 que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por Banco A……………., SA contra decisão de indeferimento do pedido de revisão de autoliquidação de IVA (dezembro de 2005), em consequência anulando o despacho impugnado

1.2. A recorrente apresentou alegações que sintetizou com a formulação das seguintes conclusões:
A. Nos autos em referência, a douta sentença recorrida, formulou um juízo errado na apreciação da questão “Da inaplicabilidade do disposto no art. 78.º, n.º 6 do CIVA e aplicabilidade do disposto no art. 98.º, n.º 1 do CIVA”, aplicando erradamente o normativo do art. 98.º n.º 1 do CIVA, quando deveria admitir que “A correcção de erros materiais ou de cálculo no registo a que se referem os artigos 44.º a 51.º e 65.º, nas declarações mencionadas no artigo 41.º (…) é facultativa quando resultar imposto a favor do sujeito passivo, mas só pode ser efectuada no prazo de dois anos, que, no caso do exercício do direito à dedução, é contado a partir do nascimento do respectivo direito nos termos do n.º 1 do artigo 22.º, sendo obrigatório quando resulte imposto a favor do Estado.”
B. A questão controvertida nos autos reconduz-se a determinar qual o prazo aplicável à revisão do acto tributário de autoliquidação do IVA do ano de 2005 que envolve um cálculo do pro rata, ou seja, se é de aplicar o prazo de dois anos previsto no art. 78.º, n.º 6 do CIVA, precisamente para situações de correcção de erros materiais ou de cálculo ou se será de aplicar o prazo de quatro anos previsto no art. 98.º, n.º 2 do CIVA, para correcções que envolvam apenas errada interpretação do direito.
Vejamos:
C. No decurso da sua actividade, a impugnante efectuava a título principal operações isentas de IVA que não conferiam o direito à dedução e, realizava ainda operações sujeitas que conferiam o direito à dedução e, operações sujeitas mas isentas, que conferiam, igualmente, direito à dedução.
D. Em 09.09.2008 efectuou um pedido de revisão oficiosa, nos termos dos n.º(s) 1 e 2 do artigo 78.º da LGT, onde solicitou a revisão do acto tributário de autoliquidação de IVA referente ao período de Dezembro de 2005.
E. A questão suscitada no âmbito do procedimento de revisão oficiosa contendia com a problemática em torno do cálculo do pro rata, inicialmente apurado um valor de 12% e, após uma análise global à situação contabilística constatou-se que não tinham sido consideradas a totalidade das operações nos termos do n.º 4 do artigo 23.º do CIVA.
F. Desta nova realidade resultou um pro rata para o exercício de 2005 de 19%, dando origem a imposto a regularizar a favor da impugnante de € 102 946,40.
G. Da análise aos argumentos invocados pela impugnante no procedimento de revisão oficiosa, resulta que, aquela constatou que não exerceu o direito à dedução relativamente à totalidade do IVA incorrido nos custos comuns às diversas áreas de actividade desenvolvidas e que, tendo procedido às devidas correcções, pretendia exercer o direito à dedução.
H. Embora o regime de revisão oficiosa do IVA e o direito à dedução do IVA sejam regulados no mesmo preceito legal (art. 98.º do CIVA), mantêm, juridicamente, a sua independência, o que significa que a revisão oficiosa da autoliquidação do IVA não pode efectuar-se em prejuízo dos pressupostos do direito à dedução, sob pena de as normas reguladoras do direito à dedução ficarem desprovidas de qualquer efectividade.
I. Verificando-se, desde logo, a existência de regras próprias como as contidas no artigo 22.º do CIVA e, que a dedução do imposto não pode ser efectuada em qualquer momento, à escolha do sujeito passivo, sendo o alcance útil das normas referidas, que indicam os momentos adequados para a dedução, precisamente o de excluir que esta se possa fazer em momentos diferentes, quando tal não esteja especialmente previsto.
J. Por outro lado, o n.º 2 do art. 98.º do CIVA, ao estabelecer que o direito à dedução só poderá ser exercido até ao limite de quatro anos após o nascimento desse direito, apenas fixa um limite máximo de carácter geral a partir do qual o direito à dedução já não pode ser exercido, não podendo esse limite ser excedido, mesmo nos casos em que a dedução possa efectuar-se em momentos diferentes dos indicados no citado art. 22.º do CIVA.
K. Na situação em preço, na sequência de uma análise à contabilidade, a impugnante constatou não ter exercido o seu direito à dedução relativamente à totalidade do IVA incorrido nos custos comuns às diversas áreas de actividade desenvolvidas, pelo que, tendo procedido à revisão do cálculo da percentagem de dedução inicialmente apurada para o ano de 2005, por não ter incluído no numerador operações que, de acordo com os art.s 19.º e 20.º do CIVA, conferiam direito à dedução, procedeu às devidas correcções e alterou o pro rata definitivo de 12% para 19%, pretendendo, assim, exercer o correspondente direito à dedução.
L. Nestes casos, impõe expressamente o n.º 4 do art. 23.º do CIVA a inclusão no numerador da fracção, para efeitos de cálculo do pro rata, o montante anual, imposto excluído, das operações que dão lugar à dedução nos termos do n.º 1 do art. 20.º e, no denominador, o montante anual, imposto excluído, de todas as operações efectuadas pelo sujeito passivo decorrentes de uma actividade económica prevista na al. a do n.º 1 do art. 2.º do CIVA.
M. Na situação dos autos, verifica-se que, não tendo o requerente do pedido de revisão oficiosa exercido o direito à dedução na declaração relativa ao período de tributação da recepção ou emissão das facturas ou documentos equivalentes (art. 22.º, n.º 2) ou na declaração do último período do ano a que respeita (art. 23.º, n.º 6), terá que concluir-se que se trata de um erro de cálculo, situação que se subsume à norma do art. 78.º, n.º 6 do CIVA e não à do art. 98.º, n.º 2 do mesmo diploma.
N. A regra geral da dedução do IVA na declaração periódica do período em que o imposto se torna exigível, deve, assim, ser compatibilizada com o disposto no n.º 6 do art. 78.º do CIVA, norma que prevê um prazo especial do exercício do direito à dedução, pelo que, não será aplicável à correcção pretendida pela impugnante o prazo previsto no n.º 2 do art. 98.º do CIVA.
O. Pelo que, estando em causa a regularização de imposto resultante de correcções de erros de cálculo praticados na declaração periódica apresentada para o período de Dezembro de 2005, deverá considera-se precludido o prazo de dois anos, legalmente previsto no n.º 6 do art. 78.º do CIVA, tendo sido correcta a decisão de indeferimento do pedido de revisão por parte da Direcção de Serviços do IVA.
P. Devendo manter-se o despacho proferido em 2012.11.14, pelo Subdirector Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) onde é indeferido o pedido de revisão oficiosa.
Q. Assim sendo, a Fazenda Pública não concorda com o sentido decisório do tribunal a quo e entende que a sentença evidencia errada interpretação e aplicação da lei tributária.
R. Ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento por fazer uma incorrecta interpretação e aplicação do disposto no n.º 6 do art. 78.º do CIVA.
S. Em conclusão, o prazo para formular o pedido de revisão com base em erro material ou de cálculo, e não de direito, é de dois anos nos termos do art. 78.º, n.º 6 do CIVA e não de quatro anos nos termos do art. 98.º do CIVA como pretendeu a impugnante e foi decidido na sentença sob recurso, uma vez que da matéria sob apreciação colhe-se que o fundamento do pedido de correcção da autoliquidação do IVA assenta no errado cálculo do pro rata do ano de 2005 detectado após o prazo de dois anos.
Termos em que,
Deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional e, em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida, com as legais consequências.

1.3. A recorrida apresentou contra-alegações que sintetizou com a formulação das seguintes conclusões:
a. No apuramento do pro rata que efetuou no decurso do ano de 2005, o Recorrido qualificou, por erro, determinadas operações como operações que não conferiam direito à dedução do IVA suportado (e declarou-as em conformidade com tal qualificação) quando deveria tê-las qualificado como operações que conferiam tal direito, pelo que não estamos perante um erro material ou de cálculo, no sentido que é atribuído pelo artigo 249.° do Código Civil (aplicável ex vi artigos 2.°, alínea d) e 11.°, número 2 da Lei Geral Tributária), e que respeita aos lapsos na expressão da vontade da entidade emitente do ato (no caso da autoliquidação, o próprio contribuinte), significando antes uma alteração dos critérios de seleção das verbas a constar no denominador/numerador da fração relevante que, em consequência, implicaram uma alteração da percentagem dela resultante e, portanto, influenciaram diretamente os pressupostos da tributação, razão pela qual não é aplicável o disposto no artigo 78.° do Código do IVA, como aliás sustenta o Ofício-Circulado n.º 030082, da Direção de Serviços do NA, de 17 de novembro de 2005;
b. O erro cometido pela sociedade incorporada pelo Recorrido não foi assim um mero erro material ou de cálculo, que afetou as declarações efetuadas mas não o seu estado no que ao direito à dedução de IVA respeita; foi antes um erro quanto aos pressupostos da tributação, traduzido numa representação inexata quanto às circunstâncias de facto que relevavam no seu estado para efeitos do direito à dedução de IVA;
c. A posição assumida pela Autoridade Tributária na decisão contestada e pela Fazenda Pública em sede de Contestação e nos presentes autos de Recurso é contrária à orientação genérica constante do Ofício-Circulado n.º 30082/2005, de 17 de novembro, em violação do disposto no artigo 68.º-A da Lei Geral Tributária, que determina que a Autoridade Tributária está vinculada às orientações genéricas constantes de circulares, regulamentos ou instrumentos de idêntica natureza que emana;
d. Verificando-se que, na situação em análise - questão de erro no apuramento do pro rata - que a jurisprudência existente sobre o tema tem reiteradamente concluído no sentido de que não se está perante um erro de cálculo ou de escrita, mas sim de um erro de direito, pelo que é admissível o pedido de revisão nos termos do artigo 98.°, números 1 e 2 do Código do IVA, não sendo, assim, aplicável o disposto no artigo 78.°, número 6 do mesmo Código, deveria a Recorrente, em estrito cumprimento do estabelecido no Decreto-Lei n.º 81/2018, de 15 de outubro, ter-se abstido de apresentar as presentes Alegações de Recurso;
e. Tratando-se, no caso sub judice, de um verdadeiro e próprio erro nos pressupostos da tributação (i.e., erro incorrido na qualificação de operações para efeitos de direito à dedução do imposto suportado a montante), o sujeito passivo tem o prazo de quatro anos previsto no artigo 98.°, número 1 do Código do IVA, por remissão para o artigo 78.° da Lei Geral Tributária, para solicitar a revisão da autoliquidação do imposto, o que lhe permitirá recuperar o IVA indevidamente liquidado;
f. O Pedido de Revisão nos casos de autoliquidação não está condicionado nem quanto à natureza da entidade de que parte a sua iniciativa, nem quanto aos seus fundamentos, desde que se cumpram os prazos máximos previstos no artigo 78.º da Lei Geral Tributária;
g. Independentemente da questão de se tratar, ou não, de um "erro de cálculo do imposto" (e, conforme antes o Recorrido demonstrou, no caso em análise não se trata), dever-se-á considerar que, sempre que tenha ocorrido o pagamento de IVA em montante superior ao devido - e independentemente de quem deu origem à liquidação errónea -, a sua revisão oficiosa é admissível ao abrigo do disposto no artigo 78.° da Lei Geral Tributária;
h. A Autoridade Tributária está genericamente obrigada a atuar em conformidade com a lei, nos termos do número 2 do artigo 266.° da Constituição da República Portuguesa e do artigo 55.° da Lei Geral Tributária, devendo proceder às correções que se mostrem devidas face aos erros praticados pelos contribuintes na autoliquidação, quer esses erros lhe sejam favoráveis ou desfavoráveis. Assim, mesmo admitindo-se como válido o enquadramento da situação em apreço no número 6 do artigo 78.° Código do IVA (artigo 71.° à data dos factos), o que só a benefício de raciocínio se concede, tal aplicação sempre constituiria uma inadmissível sobreposição do formalismo à materialidade das operações, em estrita violação do dever antes referido;
i. Constata-se, assim, que a sentença recorrida, ao anular a decisão que recaiu sobre o Pedido de Revisão apresentado pelo Recorrido, analisou corretamente os factos que lhe foram submetidos, julgando corretamente a causa e aplicando as normas de Direito de forma adequada, não merecendo qualquer censura, não tendo as conclusões da Recorrente a virtualidade de obrigar a decisão diversa, pelo que a sentença recorrida deverá ser mantida.

Nestes termos, e nos mais de Direito que Vossas Excelências suprirão, deverá o presente Recurso ser dado como improcedente, por não provado e, em consequência, manter-se válida na ordem jurídica a sentença proferida pelo Tribunal a quo, tudo com as legais consequências.

1.4.O Ministério Público emitiu parecer no sentido da negação de provimento ao recurso (processo electrónico p.270).

1.5. Após os vistos dos juízes conselheiros adjuntos cumpre apreciar e decidir em conferência.

2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. DE FACTO
A sentença recorrida julgou provados os seguintes factos:
A) A Impugnante apresentou, em 09/09/2008, pedido de revisão oficiosa da autoliquidação e pagamento do IVA efectuado em excesso na declaração periódica de IVA relativa ao período de Dezembro de 2005 no valor de € 102.946,40- Cf. fls. 23 e ss do PA apenso aos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, facto não controvertido.
B) Por despacho da Sr.ª Subdirectora Geral da DSIVA 14/11/2012 foi indeferido o pedido (teor integralmente transcrito na respectiva alínea da sentença recorrida; PA apenso fls.33 e sgs)
C) Em 19/11/2012, o Impugnante foi notificado do despacho mencionado na alínea antecedente - Cf. fls. 42 do PA apenso aos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, facto não controvertido.
D) A presente Impugnação deu entrada em 19/02/2013 - Cf. fls. 3 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, facto não controvertido.

2.2. DE DIREITO
2.2.1. Questão decidenda: prazo para o exercício do direito à dedução de IVA no caso de erro na aplicação do regime jurídico de operações financeiras realizadas pelo sujeito passivo

2.2.2. Apreciação jurídica
2.2.2.1. A administração tributária pode efectuar a revisão dos actos tributários de autoliquidação de IVA, or iniciativa própria ainda que sob impulso do sujeito passivo, com fundamento em erro imputável aos serviços, o qual abrange o erro na autoliquidação (art.78º nºs 1/2 LGT; art.98º nº1 CIVA)
Especificamente, a lei distingue prazos para o exercício do direito à dedução de IVA ou de reembolso de imposto entregue em excesso:
- como regra quatro anos, contados a partir do nascimento do direito à dedução ou do pagamento em excesso (art.98º nº2 CIVA)
- no caso de correcção de erros materiais ou de cálculo dois anos, contados a partir do nascimento do direito à dedução, sendo facultativa quando resultar imposto a favor do sujeito passivo e obrigatória quando resultar imposto a favor do Estado (art.78º n º6 CIVA):
Pronunciando-se sobre o conceito de erro material ou de cálculo afirma doutrina qualificada;
Trata a presente disposição dos erros materiais ou de cálculo no registo contabilístico previsto nos arts.44º a 51º e 65º, no preenchimento das declarações periódicas do art.40º e nas guias ou declarações mencionadas nas alíneas b) e c) do art.67º.
O art. 95º-A do CPPT estabelece que são erros materiais ou manifestos «designadamente os que resultam do funcionamento anómalo dos sistemas informáticos da administração tributária, bem como as situações inequívocas de erro de cálculo, de escrita, de inexatidão ou lapso»
Trata-se de um erro material quando, por lapso, se escreve um valor diferente do devido na declaração ou quando se lançou erradamente o valor do documento na contabilidade; falamos de erro de cálculo quando está apenas em causa as operações aritméticas de cálculo dedutível.
Em qualquer dos casos, o âmbito de aplicação desta disposição é limitado a estas circunstâncias, afastando-se, claramente, das situações em que um erro de direito origina consequentemente um imposto diferente (Código do IVA e RITI Notas e Comentários 2014 pp.446/447 Coordenação e Organização: Clotilde Celorico Palma e António Carlos dos Santos)

Jorge Lopes de Sousa afirma:
Incluem-se neste procedimento todo o tipo de lapsos materiais, que são situações em que o autor do ato deixou nele escrito algo que não correspondia à sua vontade, como por exemplo, errada indicação do nome do contribuinte ou do tributo em causa ou erro aritmético no cálculo do tributo. Neste conceito de lapsos materiais incluem-se ainda os derivados de deficiente funcionamento do sistema informático da administração tributária.
Mas, também, se incluem as situações de lapso não material, em que se abrangem os erros ou inexatidões intelectuais que ocorrem no processo de formação da vontade expressa no acto tributário. Se o autor do ato disse o que queria dizer, mas decidiu mal e for evidente que o erro deriva de deficiente perceção dos pressupostos em que assentou a decisão estar-se-á perante uma situação de lapso manifesto. Será do contexto em que o ato é praticado que se poderá inferir se há lapso (Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado 6ª edição 2011 Volume I art.95º-A CPPT anotação 3 p.757)

2.2.2.2. No caso concreto o pedido de reembolso do imposto entregue em excesso radicou em errónea desconsideração pelo Banco ……… Banco A……. Investimento SA (sociedade incorporada pelo impugnante) de operações relativas a instrumentos financeiros derivados realizadas com contrapartes estabelecidas ou domiciliadas fora da União Europeia que conferiam direito a dedução, dela resultando alteração da percentagem de dedução (pro rata) de 12% para 19% (arts.20º nºnº1 al.b) v) e 23º nº 4 CIVA)
Neste contexto foi alegado erro na interpretação e aplicação do regime jurídico das operações financeiras em causa, estando excluída a possibilidade de mero erro material ou de cálculo em registos contabilísticos ou declarações adstritas ao cumprimento de obrigações tributárias.
Assim sendo, perante a apresentação tempestiva em 9 setembro 2008 do pedido de revisão do acto tributário (conforme reconhecido pela administração tributária na informação sobre o pedido formulado-factos provados B) o direito à dedução foi exercido antes do decurso do prazo legal de 4 anos, considerando a autoliquidação e a entrega do imposto alegadamente em excesso com a declaração periódica de dezembro 2005 (factos provados A); art. 78º nº1 LGT; art.98º nº2 CIVA)
Como se afirma acertadamente na sentença recorrida, o tribunal não pode substituir-se à administração tributária na apreciação do mérito do pedido de revisão, sob pena de prática de acto de administração activa que exorbitaria a sua competência constitucional e legal; em execução de julgado compete à administração tributária a apreciação do mérito da pretensão manifestada pelo sujeito passivo no quadro do regime legal aplicável e no pressuposto de que o direito à dedução foi tempestivamente exercido.

3.DECISÃO
Acordam no Supremo Tribunal Administrativo - Secção de Contencioso Tributário em negar provimento ao recurso e, em consequência, confirmar na ordem jurídica a sentença recorrida.
Custas pela recorrente (art.527º nº2 CPC/ art.2 al.e) CPPT)

Lisboa, 17 de junho de 2020. - José Manuel de Carvalho Neves Leitão (relator) - Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes.