Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01682/13
Data do Acordão:04/02/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO DELGADO
Descritores:INCOMPETÊNCIA EM RAZÃO DA HIERARQUIA
Sumário:I - A Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, nos recursos interpostos directamente das decisões dos TT de 1ª Instância, apenas tem competência para conhecer de matéria de direito (cfr. artºs 12º, nº 5, 26º, al. b) e 38º, al. a) do ETAF, na actual redacção e 280º, nº 1 do CPPT).
II - Se nas conclusões das alegações de recurso se manifestar divergência por insuficiência, excesso ou erro, quanto à matéria de facto provada na decisão recorrida, quer porque se entenda que os factos levados ao probatório não estão provados, quer porque se considere que foram esquecidos factos tidos por relevantes, quer porque se defenda que a prova produzida foi insuficiente, quer ainda porque se divirja nas ilações de facto que se devam retirar dos mesmos, o recurso não versa exclusivamente matéria de direito, sendo competente para dele conhecer o Tribunal Central Administrativo e não o Supremo Tribunal Administrativo.
Nº Convencional:JSTA000P17313
Nº do Documento:SA22014040201682
Data de Entrada:11/01/2013
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A............
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo


1 – O representante da Fazenda Publica, veio recorrer para o Tribunal Central Administrativo Norte da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro que julgou procedente a reclamação deduzida por A…………, melhor identificado nos autos, contra o despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Oliveira de Azeméis que lhe indeferiu o pedido de reconhecimento da prescrição da dívida de IVA e respectivos juros compensatórios referente ano de 1999, no montante global de € 153.944,03.

Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:
«A. Vem o presente recurso interposto da sentença que julgou procedente a reclamação judicial da decisão do órgão de execução fiscal, declarando a prescrição da dívida exequenda.
B. Ressalvado o respeito devido, não pode conformar-se a Fazenda Pública com o que foi decidido, pelas razões que de imediato se passam a expender.
C. Para julgar procedente a presente reclamação de actos do órgão de execução fiscal, o Mm.o Juiz a quo alicerçou a sua decisão, dando como factos provados “(...) E) O Reclamante foi citado por carta registada com aviso de recepção assinado em 19/02/2004 (...) H) Em 01/02/2005 foi emitido mandado de penhora (...) I) Em 15/11/2006 foi comunicado pelo TAF de Viseu o recebimento da petição inicial identificada em F) (...) J) Entre as datas identificadas em H) e I) não foram praticados actos na execução fiscal (...) K) Em 25/02/2004 o Reclamante apresentou reclamação graciosa (...) L) Entre 26/02/2004, data de autuação e 02/06/2006, data da elaboração do projecto de decisão! não foram praticados actos no processo de reclamação graciosa (...) M) Por despacho de 05/07/2007 foi indeferida a reclamação graciosa (...) P) Na sequência do indeferimento da reclamação graciosa, em 20/08/2007 o reclamante apresentou recurso hierárquico para o Director-Geral dos Impostos (...) Q) Em 12/05/2009 foi proferida decisão de deferimento parcial do recurso determinante da anulação parcial (...) T) Em data não identificada foi proferido despacho ordenando a suspensão do processo na sequência da anulação parcial das liquidações e até á resolução do processo identificado em F) (...)“.
D. Tendo considerado que “ (...) não há que avaliar dos efeitos decorrentes das paragens dos processos de execução, reclamação graciosa e recurso hierárquico para efeitos de suspensão da contagem do prazo prescricional. Já que para além do efeito instantâneo de destruição do prazo em curso, com início de nova contagem do prazo prescricional, e eventual reinício de contagem do mesmo após as paragens dos processos, não se verificam quaisquer efeitos permanentes ou duradouros determinantes da suspensão da contagem na pendência daqueles. A citação do Reclamante ocorreu em 19/02/2004 (...) verificando-se naquela data a primeira interrupção do prazo prescricional. Apresentada Reclamação Graciosa em 25/02/2004 verificou-se nova interrupção do prazo prescricional, sem alteração do período decorrido desde 01/01/2000, por força dos efeitos decorrentes da primeira das interrupções. Finalmente, com a apresentação de recurso hierárquico em 20/08/2007, ocorreu outro facto que hipoteticamente teria a virtualidade de interromper o decurso do prazo prescricional, não fora ele ter ocorrido já na violência do artigo 49.º n.º 3 da LGT conferida pela Lei 53-4/2006. É que enquanto para os dois primeiros ocorridos antes de 01/01/2007 é reconhecida a virtualidade interruptiva de qualquer um deles, de acordo com a nova redacção a interrupção só se tem por verificada uma vez com o facto que se verificar em primeiro lugar. Não conferindo assim a lei qualquer eficácia interruptiva à apresentação do recurso hierárquico em 20/08/2007 uma vez que, antes de ela ocorrer, tinham já ocorrido, na vigência da redacção anterior do artigo 49.º da LGT, outras duas com idêntico efeito. (...) A apresentação do recurso hierárquico em 20/08/2007 não produziu efeito interruptivo da contagem do prazo prescricional por forca da alteração do n.º 3 do artigo 49.° da LGT conferida pela Lei 53-4/2006, uma vez que após 01/01/2007 a interrupção só se verifica uma vez com o primeiro dos factos que se tiver verificado. A apresentação do recurso hierárquico em 20/08/2007 não produziu efeito suspensivo da contagem do prazo prescricional por forca do aditamento do n.º 4 do artigo 49.º LGT efectuada pela Lei 53-A/2006, uma vez que a cobrança da dívida não se encontrava legalmente suspensa nos termos previstos nos artigos 212.º e 169.º do CPPT, por inexistência de garantia ou penhora garante da totalidade da dívida exequenda e acrescidos. Iniciada a contagem do prazo prescricional em 01/01/2000, e retomada a sua contagem em 02/02/2006, na sequência de paragem do processo de execução por período superior a um ano por causa não imputável ao Reclamante, o prazo de 8 anos decorreu integralmente até ao dia 14/01/2010, mostrando-se consequentemente prescrita a dívida tributária. (sublinhado nosso)”.
E. Antes de mais, nada foi dado como provado quanto à (in)suficiência da garantia consubstanciada na hipoteca legal, sendo que no segmento da decisão da sentença propriamente dito já aplica o direito pressupondo como facto provado a insuficiência daquela garantia, o que, salvo melhor entendimento, conduz à nulidade sentença por omissão de pronúncia, nos termos da alínea b.) do n.º 1 do artigo 668° e do n.º 2 do artigo 660°, ambos do CPC ex vi alínea e) do artigo 2.º do CPPT.
F. Por outro lado, e salvo melhor entendimento, a Fazenda Pública considera que, reportando-se a dívida em causa a Imposto sobre o Valor Acrescentado e Juros Compensatórios do ano de 1999, o prazo de prescrição aplicável é o de oito anos, previsto no n.º 1 do artigo 48.º da LGT, contando-se a partir do inicio do ano civil seguinte ao da exigibilidade da dívida, ou seja, 01/01/2000.
G. Tendo o executado sido citado pessoalmente em 19/02/2004, mas tendo havido paragem do processo de execução fiscal por mais de um ano, por facto não imputável ao executado, o potencial facto interruptivo da prescrição converteu-se em facto suspensivo, passando a somar-se ao tempo decorrido até à autuação o tempo decorrido após a paragem do ano por facto não imputável ao contribuinte, conforme resulta dos n.º 1 e 2 do artigo 49.º da LGT, na redacção da Lei n.º 100/99, de 26/07.
H. Igual raciocínio é aplicável ao potencial facto interruptivo da prescrição consubstanciado na apresentação de reclamação graciosa em 25/02/2004, pois por também ter havido paragem do respectivo processo por mais de um ano, por facto não imputável ao executado, aquele facto converteu-se em facto suspensivo, passando a somar-se ao tempo decorrido até à autuação o tempo decorrido após a paragem do ano por facto não imputável ao contribuinte.
I. Diferentemente do que sucedeu com o facto interruptivo da prescrição concretizado na interposição de recurso hierárquico em 20/08/2007, porquanto, à luz do n.º 3 do artigo 49.º da LGT, na redacção introduzida pela Lei n.º 53-A/2006, de 29/12, o respectivo efeito interruptivo instantâneo implicou a eliminação do tempo decorrido até à sua verificação, iniciando-se o prazo a partir daí, e o seu efeito duradouro obsta ao decurso da prescrição até ao trânsito em julgado da decisão que pôs termo ao processo, ou seja, 11/05/2009, nos termos do n.º 1 dos artigos 326.º e 327.º do CC ex vi alínea d) do artigo 2.º da LGT, pelo que o já mencionado prazo de prescrição de oito anos ainda não se completou.
J. Assim, constituindo tal recurso hierárquico facto interruptivo do prazo de prescrição, previsto no n.º 1 do artigo 49.º da LGT, e sendo o primeiro (e único) facto interruptivo a ocorrer na vigência da Lei n.º 53-A/2006, que alterou o n.º 3 do artigo 49.º da LGT, que apenas admite que a interrupção tenha lugar uma única vez, daí decorre que o prazo só se iniciaria após a sua decisão, que ocorreu em 11/05/2009, pelo que a prescrição ainda não ocorreu, diferentemente do que decidiu o M.mo Juiz a quo.
K. Neste sentido a contrario vide o Acórdão da 2ª. Secção do Tribunal Central Administrativo Norte de 17/05/2012, no processo n.º 00918/11.5BEAVR, bem como os Acórdãos da 2ª. Secção do STA de 12/08/2009, 24/03/201 0, 29/09/2010 e 25/05/2011, nos processos n.º 0748/09, 01187/09, 0498/10 e 0465/11, respectivamente.
L. E conforme as conclusões deste último aresto, “I - A redacção actual do n.º 3 do artigo 49.º da LGT, estabelecendo expressamente que a interrupção se opera uma única vez, aplica-se apenas aos factos interruptivo verificados após o início da vigência do diploma que introduziu a alteração da norma. “, logo, tendo apenas ocorrido um facto interruptivo após 01/01/2007 - a interposição de recurso hierárquico em 20/08/2007 - não se lhe pode deixar de reconhecer os respectivos efeitos interruptivos instantâneos e duradouros, pelo que, reitera-se, a dívida em cobrança coerciva não está prescrita.
M. Assim sendo, e salvo melhor opinião, a douta sentença incorreu em erro de julgamento ao fazer uma aplicação errada da lei e do direito aos factos relatados nos autos, tornando-a nula, nos termos das alíneas d) e e), do n.º 1 do artigo 668.º conjugado com o n.º 2 do artigo 668.º conjugado com o nº 2 do artigo 660.º e o n.º 1 do artigo 661.º todos do CPC, bem como com a parte final do artigo 125.º do CPPT ex vi n.º 1 do artigo 211.º do CPPT.
N. Pelo que deve a douta sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que determine a reclamação de actos do órgão de execução fiscal totalmente improcedente, por não provada a prescrição da dívida exequenda, com a consequente condenação do ora Recorrido nas respectivas custas processuais.»

2 – O recorrido apresentou as suas contra alegações, concluindo nos seguintes termos:
A)— As causas de interrupção da prescrição que ocorram antes da alteração ao n.º 3 do artigo 49° da LGT, introduzida pela Lei n.º 53-A/2006, ou seja, antes de 01/01/2007, produzem os efeitos que a lei vigente no momento da sua vigência associava à sua ocorrência.
B) — Ou seja, eliminam o período de tempo anterior à sua ocorrência e obstam ao decurso do prazo de prescrição, se o processo estiver parado por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte.
C) - No caso concreto verifica-se que a execução esteve parada por facto não imputável ao reclamante por mais de um ano, bem como o processo de reclamação graciosa.
D) - O processo de execução fiscal nunca esteve suspenso em virtude da prestação de garantia, ainda que o reclamante tenha constituído hipoteca voluntária sobre um imóvel, a qual foi considerada insuficiente, o que determinou a não suspensão da execução fiscal por falta de garantia idónea.
E) - O processo executivo esteve parado entre 02/02/2005 e 01/02/2006, ou seja, por mais de um ano por motivo não imputado ao reclamante, o que determinou a transformação do efeito interruptivo em suspensivo, logo há que somar o período de tempo decorrido até à interrupção da execução, com a citação, em 19-02-2005, ao prazo posterior a 01/02/2006, para se concluir pelo decurso do prazo prescricional de 8 anos.
F) — A paragem decorrente da instauração da reclamação graciosa não admite qualquer alteração relevante na contagem do prazo, uma vez que este facto interruptivo ocorreu apenas 5 dias após a citação (1° facto interruptivo), quer um quer outro converteram-se em efeito suspensivo pela paragem da execução e da reclamação graciosa por período superior a um ano.
G) - A apresentação do recurso hierárquico ocorreu em 20/08/2007, ou seja, depois da entrada em vigor da alteração ao n.º 3 do artigo 49° da LGT, pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, pelo que esta “nova” causa de interrupção da contagem do prazo de prescrição não opera autonomamente, como invoca a recorrente.
H) - Tem sido entendimento da jurisprudência que ocorrendo sucessivas causas de interrupção, antes da entrada em vigor da actual redacção do n.º 3 do artigo 49° da LGT, todas elas devem ser consideradas autonomamente.
I) - Todavia, no caso dos autos, a situação é diferente, porque o recurso hierárquico foi apresentado depois da entrada em vigor da actual redacção do nº 3 do artigo 49° da LGT, determinando a nova redacção da Lei, que a interrupção só tem lugar uma única vez e com o facto que ocorrer em primeiro lugar.
J) - No caso concreto, o facto que ocorrido em primeiro lugar foi sem dúvida, a citação, logo o recurso hierárquico não é susceptível de interromper o prazo prescricional em curso, como defendido pela ERFP.
L) - Recurso hierárquico que também, não é susceptível de gerar qualquer efeito suspensivo da contagem do prazo de prescrição, porque o processo de execução fiscal nunca esteve suspenso, contrariamente ao alegado pela ERFP, na verdade a garantia prestada foi considerada insuficiente, nunca tendo do sido considerada idónea pelo OEF, o que implicou a não suspensão do processo de execução fiscal, que por sua vez obsta à suspensão do prazo de prescrição nos termos do n.º 4 do artigo 49º da LGT.
M) - Conclui-se, deste modo, que a douta sentença recorrida não merece censura na apreciação dos factos determinantes para a contagem do prazo da prescrição da obrigação tributária, nem na interpretação e aplicação das regras de direito aplicáveis no caso em apreço, nomeadamente o disposto no art.º 49° da LGT.

3 – O recurso foi interposto na TCA Norte, que por acórdão exarado a fls. 218 e seguintes dos autos, veio declarar-se incompetente em razão da hierarquia, para conhecer do presente recurso que tem por fundamento, exclusivamente matéria de direito, cabendo tal competência à Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo.

4 - O Exmº Procurador Geral Adjunto emitiu parecer, sustentando que a competência para conhecer do presente recurso será do Tribunal Central Administrativo Norte e não deste Tribunal porquanto a entidade recorrente nas conclusões das suas alegações, nomeadamente na alínea E), questiona a matéria de facto, manifestando divergência quanto à factualidade levada ao probatório.
Subsidiariamente e para o caso de assim não se entender, sustenta que o recurso deve ser julgado improcedente, com a consequente manutenção do julgado.

4 – Com dispensa de vistos, dada a natureza urgente do processo, cumpre apreciar e decidir.

5- Em sede factual apurou-se em primeira instância a seguinte matéria de facto:

A) Em 22/09/2003 a Administração Fiscal efectuou a liquidação adicional n° 03278677 relativa a IVA do 1999 no montante de € 121 958,83 de acordo com a efectuação de operações sem liquidação de imposto pelo aqui Reclamante A…………, de acordo com o artigo 82° do CIVA (Apenso ao processo 392/04.2 BEVIS);
B) Na mesma data foram efectuadas doze liquidações adicionais respeitantes aos juros devidos pelo retardamento das liquidações mensais dos períodos 99/91 a 99/12 no montante global de € 31 985,20 de acordo com os artigos 89° do CIVA e 35° da LGT (Apenso ao processo 392/04.2 BEVIS);
C) As liquidações foram remetidas ao Oponente por cartas registadas com aviso de recepção assinados por aquele em 31/10/2003 (Apenso ao processo 392/04.2 BEVIS);
D) Por falta de pagamento voluntário até 30/11/2003 e para cobrança coerciva da quantia exequenda de € 153 944,03 relativa às liquidações identificadas em A) e B) e acrescidos em 07/02/2004 foi instaurado no Serviço de Finanças de Oliveira de Azeméis 3 o processo de execução fiscal nº 3751200401002074, (fls. 3 dos Autos);
E) O Reclamante foi citado por carta registada com aviso de recepção assinado em 19/02/2004 (fls. 21 e 21 verso dos Autos);
F) Tendo apresentado Oposição à execução em 12/03/2004 e que correu termos neste Tribunal sob o nº 392/04.2 BEVIS (fls. 1 do Processo 392/04.2 BEVIS apenso);
G) Em 17/03/2004 o Serviço de Finanças notificou o Reclamante para proceder ao reforço da garantia, por insuficiência da Hipoteca legal constituída, € 229 497,70 (fls. 31 a 32 dos Autos);
H) Em 01/02/2005 foi emitido mandado de penhora (fls. 38 a 39 dos Autos);
I) Em 15/11/2006 foi comunicado pelo TAF de Viseu o da petição inicial identificada em F) (fls. 40 a 42 dos Autos);
J) Entre as datas identificadas em H) e I) não na execução fiscal (fls. 39 a 40 dos Autos);
K) Em 25/02/2004 o Reclamante apresentou reclamação graciosa das liquidações identificadas em A) e B) dando origem ao processo nº 3751- 04/400012.9 (fls. 1 a 102 dos Autos de reclamação apensos);
L) Entre 26/02/2004, data da autuação e 02/08/2006, data da elaboração do projecto de decisão, não foram praticados actos no processo de reclamação graciosa (fls. 103 a 104 dos Autos de reclamação graciosa)
M) Por despacho de 05/07/2007 foi indeferida a reclamação graciosa (fls. 115 dos autos de reclamação apensos);
N) O reclamante, na pessoa do seu mandatário, foi notificado por carta registada com aviso de recepção assinado em 20/07/2007 (fls. 117 a 119 dos Autos de reclamação apensos);
O) Em 16/08/2007 foi determinada a notificação do reclamante para prestação de garantia pelo montante de € 185 907,34 (fls. 48 dos Autos);
P) Na sequência do indeferimento da reclamação graciosa, em 20/08/2007 o reclamante apresentou recurso hierárquico para o Director-Geral de Impostos dando origem ao processo nº 3/2007 (fls. 1 a 67 dos Autos de recurso hierárquico apensos);
Q) Em 12/05/2009 foi proferida decisão de deferimento parcial do recurso determinante da anulação parcial da liquidação identificada em A) pelo montante de € 68 137,74 e dos correspondentes juros compensatórios das liquidações identificadas em B) (fls. 75 a 91 dos Autos de recurso hierárquico apensos);
R) O reclamante, na pessoa do seu mandatário, foi notificado por carta registada com aviso de recepção assinado em 25/05/2009 (fls. 92 a 94 dos Autos de recurso hierárquico apensos);
S) Por oficio datado de 21/05/2009 e recebido em 26/05/2009 foi comunicada ao Serviço de Finanças de Oliveira de Azeméis a decisão de provimento parcial do recurso hierárquico e ordenada a anulação manual das liquidações identificadas em A) e B) pelos montantes de € 68 137,74 (LA) e € 17 982,72 (JC) (fls. 95 dos Autos de recurso hierárquico apensos e 51 a 68 dos Autos);
T) Em data não identificada foi proferido despacho ordenando a suspensão do processo na sequência da anulação parcial das liquidações e até à resolução do processo identificado em F) (fls. 49 dos Autos);
U) Na sequência de decisão transitada em julgado no sentido da improcedência da Oposição apresentada, os autos foram devolvidos ao Serviço de Finanças por ofício datado de 22/10/2012 (fls. 130 a 160 do Processo 392/04.2 BEVIS apenso);
V) Recebidos os Autos de Oposição 26/10/2012 foi ordenado o prosseguimento da execução e na mesma data notificado o aqui Reclamante para proceder ao pagamento da quantia exequenda (fls. 72 a 73 dos Autos);
W) Notificado por carta registada com aviso de recepção assinado em 02/11/2012, o Reclamante apresentou em 08/11/2012 requerimento requerendo o reconhecimento da prescrição da dívida exequenda (fls. 74 a 84 dos Autos);
X) Na sequência de informação, por despacho proferido em 13/11/2012 foi indeferido pelo Chefe do Serviço de Finanças o reconhecimento da prescrição da dívida exequenda (fls. 88 e 88 verso dos Autos);
Y) Notificado em 19/11/2012, o Reclamante apresentou reclamação em 30/11/2012 (fls. 89 e 93 dos Autos).

6. Em face do teor das conclusões da alegação do recurso, da posição assumida pelo Tribunal Central Administrativo Norte e do parecer do Exmº Procurador-Geral Adjunto, a questão que aqui deve ser prioritariamente colocada é a de saber da competência em razão da hierarquia do Supremo Tribunal Administrativo.
A competência em razão da hierarquia integra pressuposto processual relativo ao Tribunal, constituindo requisito de interesse e ordem pública, devendo, por isso mesmo, o seu conhecimento preceder o de qualquer outra matéria – cf. artigos 16º n.º 1 e 2 do CPPT e 13º do CPTA.

Ora, de harmonia com o disposto nos artigos 26º al. b) e 38º al. a) do novo ETAF e 280º n.º 1 do CPPT-, à Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo compete apenas conhecer dos recursos interpostos de decisões dos tribunais tributários de 1ª Instância, com exclusivo fundamento em matéria de direito,
Sendo que aos Tribunais Centrais Administrativos compete, por sua vez conhecer dos recursos de decisões dos tribunais tributários de 1ª Instância, com excepção dos referidos na alínea b) do n.º 1, do citado art. 26.º do referido Estatuto.
A jurisprudência deste Supremo Tribunal tem vindo a entender que na delimitação da competência do Supremo Tribunal Administrativo em relação à do Tribunal Central Administrativo deve entender-se que o recurso não tem por fundamento exclusivamente matéria de direito sempre que nas conclusões das respectivas alegações o recorrente pede a alteração da matéria fáctica fixada na decisão recorrida ou invoca, como fundamento da sua pretensão, factos que não têm suporte na decisão recorrida, desde que estes, em abstracto, não sejam indiferentes para serem ponderados no julgamento da causa - vide neste sentido Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 20.05.2009, recurso 18/09, de 03.10.2007, recurso 373/07, de 31.01.2007 , recurso 1027/06 e de 17.01.2007, recurso 962/06, todos in www.dgsi.pt.
O recurso não tem assim exclusivamente por fundamento matéria de direito se nas respectivas conclusões se questionar a questão factual, manifestando-se divergência, por insuficiência, excesso ou erro, quanto à matéria de facto provada na decisão recorrida, quer porque se entenda que os factos levados ao probatório não estão provados, quer porque se considere que foram esquecidos factos tidos por relevantes, quer porque se defenda que a prova produzida foi insuficiente, quer ainda porque se divirja nas ilações de facto que se devam retirar dos mesmos.

No caso subjudice, o Exmº Relator no Tribunal Central Administrativo Norte para declarar aquele Tribunal incompetente, em razão da hierarquia, concluiu de modo essencial, e além do mais, que o recurso só tem fundamento em matéria de direito.
Ora, salvo o devido respeito, entende-se que o recorrente, ao invés, questiona a factualidade tida por provada na sentença sob recurso.
Na verdade, como bem refere o Ministério Público neste Supremo Tribunal Administrativo, o recorrente manifesta clara discordância com o decidido no que respeita aos juízos de apreciação da prova efectuados pelo Tribunal recorrido, assumindo divergência nas ilações de facto retiradas do probatório, invocando, expressamente, na alínea e) das suas conclusões de recurso que «Antes de mais, nada foi dado como provado quanto à (in)suficiência da garantia consubstanciada na hipoteca legal, sendo que no segmento da decisão da sentença propriamente dito já aplica o direito pressupondo como facto provado a insuficiência daquela garantia, o que, salvo melhor entendimento, conduz à nulidade sentença por omissão de pronúncia, nos termos da alínea b.) do n.º 1 do artigo 668° e do n.º 2 do artigo 660°, ambos do CPC ex vi alínea e) do artigo 2.º do CPPT.»
Trata-se de conclusão em que o recorrente põe em causa a apreciação da matéria de facto efectuada pela decisão recorrida quando ali se afirma que a hipoteca legal constituída é considerada insuficiente para a garantia da totalidade exequenda, e se concluiu que «não ocorrem causas suspensivas da contagem do prazo prescricional porquanto em momento algum a oposição, a reclamação graciosa e o recurso hierárquico apresentados foram acompanhados de prestação de garantia ou de penhora suficiente para suster o avanço da execução, conforme decorre da conjugação dos artigos 49° da LGT e 169° e 212° do CPPT» - cf. sentença a fls. 164.

Verifica-se, assim divergência com o decidido em sede de matéria de facto invocando-se no recurso erro de julgamento quanto à apreciação da matéria de facto, pretendendo desta forma o recorrente daí retirar apoio para a sua fundamentação de direito.

Ocorre, pois, a incompetência deste Supremo Tribunal Administrativo já que versando o recurso, também, matéria de facto, será competente para dele conhecer o Tribunal Central Administrativo Norte – arts. 280º, nº 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário e 26º alínea b) e 38º alínea a) do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais.
Existindo no processo decisões divergentes sobre questão de competência, prevalece a decisão do tribunal de hierarquia superior – nos termos do n.º 2 do artigo 5.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais.
III- DECISÃO
Termos em que, face ao exposto, se decide julgar a Secção de Contencioso Tributário do STA incompetente, em razão da hierarquia, para conhecer do presente recurso jurisdicional, declarando-se competente para o efeito o Tribunal Central Administrativo Norte (Secção do Contencioso Tributário).
Sem custas.

Lisboa, 2 de Abril de 2014. - Pedro Delgado (relator) - Isabel Marques da Silva - Dulce Neto.