Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0448/14
Data do Acordão:11/15/2017
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANA PAULA LOBO
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P22525
Nº do Documento:SA2201711150448
Data de Entrada:04/11/2014
Recorrente:A............
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: RECURSO JURISDICIONAL
DECISÃO RECLAMADA - Decisão da Relatora
.05 de Julho de 2017.

Julgou findo o recurso por falta de oposição.
Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

A Representante da Fazenda Pública veio reclamar para a conferência do despacho supra referido, constante de fls. 291 a 293 que considerou findo o recurso, por falta de oposição, tendo apresentado as seguintes conclusões:

1. No douto despacho é afirmado que os dois acórdãos (o acórdão recorrido e o acórdão fundamento) convergem no mesmo entendimento cujo sentido é de que uma sociedade dissolvida na sequência de um processo falimentar continua a existir enquanto sujeito passivo de imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC até à data do encerramento da liquidação mantendo-se assim sujeita a tributação em sede de IRC e vinculada às disposições legais previstas no Código do IRC (CIRC) e às obrigações fiscais» (sublinhado nosso), e por isso, entendeu não se verificar qualquer oposição de acórdãos requerida pela ora recorrente.

2. Todavia, estamos perante o mesmo facto - uma sociedade dissolvida na sequência de processo falimentar e que não procedeu à entrega da declaração de rendimentos, tendo ambos os acórdãos decidido em sentido diverso relativamente à tributação em sede de IRC e à aplicação das disposições do CIRC. Numa situação, permite AT proceder a uma liquidação oficiosa nos termos da alínea b) do artigo 83º do CIRC, sem quaisquer limitações à sua tributação não obstante se tratar de sociedade dissolvida na sequência de processo falimentar - acórdão fundamento, e no caso dos autos, limita a circunstância de tributar em IRC apenas alguns dos factos tributários, excluindo da tributação o apuramento de mais-valias resultantes da venda de um imóvel nos termos do artigo 43.º do CIRC.

3. Ora, no acórdão recorrido não é referido expressamente que uma sociedade dissolvida na sequência de processo falimentar até à data do encerramento da liquidação está sujeita a tributação em sede de IRC e vinculada às disposições legais previstas no código do IRC (CIRC). Antes pelo contrário, o acórdão recorrido ao excecionar a aplicação do disposto no artigo 43º do ClRC em resultado da venda de um imóvel pertencente ao ativo imobilizado de uma sociedade dissolvida na sequência de processo falimentar está a excluir a tributação do facto tributário subjacente e está a decidir em sentido contrário ao disposto no CIRC.

4. A exceção utilizada para excluir a tributação do resultado da venda de imobilizado, apresentada no acórdão recorrido, não resulta das normas constantes no CIRC, e também não poderá resultar, por não ser de aplicar, aos benefícios fiscais previstos no artigo 258º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (ou até mesmo a ser de aplicar o Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência, no disposto no artigo 119°).

5. Por um lado, o acórdão fundamento, ao contrário do acórdão recorrido refere que: «(...) relativamente às sociedades em liquidação em processo de falência, não é o facto de se tratar de uma execução universal de bens e de se estar em presença de uma situação económica deficitária que impede que se possam verificar ganhos fortuitos e inesperados, vendas de bens por valores que podem não só solver todas as dívidas como gerar sobras, incrementos patrimoniais esses para os quais nenhuma razão subsiste para se furtarem a tributação em sede de IRC (sublinhado nosso), e nesse sentido, deu razão à AT, quando admitiu ser passível de tributar em IRC uma sociedade dissolvida na sequência de processo falimentar, ainda que, através de liquidação oficiosa baseada em valores presumidos nos termos da alínea b) do artigo 83º do CIRC, mandando baixar os autos, apenas por ter sido oferecida pela impugnante prova testemunhal e que não havia chegado o ser produzida devida à sentença proferida.

6. Por outro lado e em sentido contrário, o acórdão recorrido expressa que uma sociedade dissolvida na sequência de processo falimentar apenas encontra cabimento da sua tributação em sede de IRC, quando: «(...) para além das [condições] que derivam do exercício de uma actividade económica, como sejam os negócios jurídicos que se possam ter continuado a realizar seja por serem de execução duradoura que se protelou para além da declaração de falência, ou por terem resultado da confirmação de negócios do falido posteriores à declaração de falência, ou, até pelo que sobrou do produto da venda dos bens que integravam a massa insolvente depois de pagas as dívidas da massa e os créditos reconhecidos».

7. Não obstante não ser a questão principal dos dois acórdãos confrontados é uma questão essencial e que se encontra resolvida de forma diversa nos acórdãos, o acórdão recorrido, ao contrário do acórdão fundamento, não aplica as disposições do CIRC à sociedade dissolvida na sequência de processo falimentar.

8. O fundamento porque se invoca existir oposição de acórdãos subsiste.

9. Estamos perante o mesmo facto uma sociedade estar dissolvida na sequência de processo falimentar e que não procedeu à entrega da declaração de rendimentos, onde o mesmo Tribunal, decidiu em sentido diverso relativamente à tributação em sede de IRC e à aplicação das disposições do CIRC. Numa situação, permite à AT proceder a uma liquidação oficiosa, nos termos da alínea b) do artigo 83º do CIRC, sem pôr quaisquer limitações à sua tributação não obstante tratar-se de uma sociedade dissolvida na sequência de processo falimentar - acórdão fundamento, e numa outra situação, i.e. no caso dos autos, limita a circunstância de tributar IRC apenas alguns factos tributários excluindo da tributação o apuramento de mais-valias resultantes da venda de um imóvel nos termos do artigo 43° do CIRC,

10. Termos pelos quais se requer que seja deferida a presente reclamação, revogando-se o despacho ora reclamado.

Foi invocado como acórdão fundamento o ac. do Supremo Tribunal Administrativo proferido no proc. 01145/09, disponível em www.dgsi.pt.

O teor do despacho reclamado é o seguinte:
«(...) O recurso foi interposto indicando que:
«No acórdão recorrido foi perfilhado entendimento contrário ao preconizado no acórdão fundamento, no que concerne à questão de saber se:
A sociedade dissolvida na sequência de processo falimentar continua, ou não, a existir enquanto sujeito passivo de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) até à data do encerramento da liquidação, mantendo-se, assim, sujeita a tributação em sede de IRC e vinculada às disposições legais previstas no Código do IRC (CIRC) e às obrigações fiscais, nomeadamente declarativas.»
Quer no acórdão fundamento quer no acórdão recorrido, muito embora não fosse essa a principal questão a decidir, se pressupõe, em sentido convergente que:
A sociedade dissolvida na sequência de processo falimentar continua a existir enquanto sujeito passivo de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) até à data do encerramento da liquidação, mantendo-se, assim, sujeita a tributação em sede de IRC e vinculada às disposições legais previstas no Código do IRC (CIRC) e às obrigações fiscais.
As questões a decidir num e noutro acórdão eram diversas, como diversa era a situação fáctica, mas é manifestamente coincidente a posição dos dois acórdãos quanto à questão que a recorrente concretamente escolheu para suscitar a oposição de acórdãos.
Pelo exposto, nos termos do disposto no art.º 284.º, n.º 5 do Código de Processo e Procedimento Tributário, por se não verificar qualquer oposição de acórdãos, considero findo o recurso.»

Quer a entidade reclamada quer o Magistrado do Ministério Público claramente revelam nos autos o seu entendimento de não existir qualquer oposição de acórdãos que permita reanalisar o acórdão reclamado.
Apesar do laborioso esforço desenvolvido, repetidamente nos autos pela Representante da Fazenda Pública para inverter o sentido do acórdão recorrido, não lhe assiste razão.
Como se menciona no despacho reclamado há coincidência entre os acórdãos: recorrido e fundamento quanto a estar em causa, em ambos os processos, uma empresa em situação falimentar. No primeiro estiveram em causa a tributação em sede de mais-valias, no segundo as obrigações declarativas da empresa durante o período de vigência do processo falimentar.
Não se verifica oposição de acórdãos quando se não divisam concretas decisões sobre a mesma questão jurídica em sentido divergente. Como aqui ocorre. Nem essa oposição passa a existir com fundamento em deduções da amplitude que o acórdão fundamento possa vir a ter tido quanto à tributação da empresa em sede de IRC, depois de anulada a decisão recorrida.
Não há qualquer decisão em confronto, ainda que a do acórdão fundamento possa ter vindo a abrir caminho para uma tributação ampla que a Representante da Fazenda Pública entende adequada, mas se desconhece qual seja e, em todo o caso, não tem aplicação a estes autos.
A reclamação apresentada carece em absoluto de fundamento legal, pelo que será desatendida.


Deliberação
Termos em que acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo indeferir a reclamação e confirmar o despacho reclamado.
Custas pela recorrente.
(Processado e revisto com recurso a meios informáticos (art.º 131º nº 5 do Código de Processo Civil, ex vi artº 2º Código de Procedimento e Processo Tributário).

Lisboa, 15 de Novembro de 2017. – Ana Paula Lobo (relatora) – Casimiro Gonçalves – Ascensão Lopes.