Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01471/17
Data do Acordão:06/20/2018
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:TERESA DE SOUSA
Descritores:ACIDENTE DE VIAÇÃO
RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL
ILICITUDE
CULPA
NEXO DE CAUSALIDADE
Sumário:I – Nos termos do disposto nos arts. 13º, 16º, al. b) e 18º, nº 1, al. a) da Lei nº 159/99 recai sobre os municípios deveres de gestão das vias rodoviárias sob sua jurisdição, nomeadamente o dever de assegurar a vigilância, fiscalização, conservação e sinalização das mesmas.
II – Sendo exigida, face às circunstâncias de facto verificadas, a sinalização temporária de posição e os dispositivos complementares, previstos nos artigos 87º, nº 1 e 93º do RST, que existia, mas prevendo o art. 87º, nº 2 que a materialização desta sinalização se faça com recurso aos sinais de obrigação previstos no capítulo II do Regulamento e aos dispositivos complementares previstos no art. 93º, na proximidade imediata do lugar onde começa o obstáculo devia estar colocado o sinal D3b de obrigação de contornar o obstáculo pelo lado indicado na seta inscrita no sinal – Quadro XXV (no caso lado esquerdo) – cfr. arts. 27º e 28º do Regulamento.
III – Se este sinal devia estar colocado a delimitar o obstáculo e inexistia, é como tal ilícita a omissão desta sinalização por parte do município.
IV – À responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas públicas, incluindo as autarquias locais, no domínio dos actos de gestão pública, é aplicável a presunção de responsabilidade prevista no art. 493º, nº 1 do CC, e, no caso, a omissão culposa do réu deve declarar-se em função desta presunção (cfr. art. 10º, nº 2 da Lei nº 67/2007).
V – O art. 563º do CC, consagrou a teoria da causalidade adequada na sua formulação negativa, segundo a qual “o facto que actuou como condição do dano só deixará de ser considerado como causa adequada se, dada a sua natureza geral, se mostrar de todo indiferente para a verificação do dano, tendo-o provocado só por virtude das circunstâncias excepcionais”.
Nº Convencional:JSTA000P23443
Nº do Documento:SA12018062001471
Data de Entrada:02/01/2018
Recorrente:MUNICÍPIO DE PAÇOS DE FERREIRA
Recorrido 1:A...
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo

1. Relatório
A…………….. instaurou contra o Município de Paços de Ferreira, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, acção Administrativa Comum pedindo a condenação deste no pagamento de 16.000 Euros, acrescido dos respectivos juros, a título de ressarcimento de todos os prejuízos sofridos, em consequência directa e necessária de acidente de viação de que foi vítima.

O TAF de Penafiel julgou a acção totalmente improcedente mas, em recurso, o TCA Norte revogou esta decisão e condenou o Município de Paços de Ferreira a pagar a indemnização que viesse a ser apurada em sede própria.

O Município de Paços de Ferreira, não se conformando, com o acórdão proferido, pelo TCA Norte, veio deste recorrer para a Secção do Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal Administrativo.
Nas alegações que apresentou formula conclusões do seguinte teor:
«(…)
A) - O douto acórdão em crise, é manifestamente omisso de fundamentação quanto à aplicação, no caso concreto, da sinalização de aproximação, quer de pré-sinalização, de sinalização avançada ou ainda de sinalização intermédia, uma vez que, com o devido respeito, a sinalização a colocar, no caso concreto, apenas consistiria na colocação de sinalização temporária de posição e dispositivos complementares.
B) — A Ré/recorrente, em face da natureza do obstáculo e das circunstâncias concretas da via pública, sinalizou devidamente e minimamente o obstáculo através da colocação do dispositivo complementar ET e fitas vermelhas e brancas refletoras sendo que o obstáculo era perfeitamente visível, pelo respetivo condutor da viatura acidentada, a cerca de 200 metros, dai que, para além da licitude da sua conduta, inexiste culpa na produção do acidente que se deverá à conduta do lesado.
c) - O douto acórdão em crise, adita novos factos, em contradição com a factualidade constante do probatório dos autos (aceite no douto acórdão em crise) e dá por provados factos alheios aos então provados tais como, “dia de chuva intensa” quando era um dia de “chuvisco que não impedia a visibilidade”, “num dos buracos” quando apenas existia “um obstáculo (buraco)”, o que é feito sem qualquer fundamento justificativo, o que constitui nulidade do douto acórdão em crise, pelo que deve ser declarado nulo e substituído por outro que atenda à factualidade dada como provada nos autos.
C) - O pequeno obstáculo existente junto à berma da faixa de rodagem encontrava-se minimamente e devidamente sinalizado com a colocação de sinalização temporária de posição mais precisamente com o dispositivo complementar AT e fitas vermelhas e brancas, ambos refletores, a delimitar e a ladear o obstáctulo.
D) - O pequeno obstáculo em causa junto à berma da faixa de rodagem, decorrente do facto de estar situado num arruamento em reta, bem iluminado, sem qualquer veículo estacionado a obstruir a visibilidade e estar minimamente sinalizado era perfeitamente visível, inclusive ao condutor do veículo acidentado, a uma distância de 200 metros, dai que, a inexistência de colocação do sinal de posição D3b, a delimitar o obstáculo não foi a causa do acidente mas sim a conduta do lesado que contribuiu para a produção ou agravamento do acidente, devido a eventual inexperiência, distração ou por velocidade excessiva logo a culpa, pela produção do acidente, deve ser imputada ao lesado.
E) — Existe contradição entre os factos provados e a decisão em crise pelo que o douto acórdão em crise deverá ser declarado nulo, consequentemente deverá ser substituído por outro que, fazendo justiça, absolva a Ré/Recorrente do pedido.
F) — Existe manifesto erro de aplicação da lei substantiva porquanto não atende ao caso concreto quanto ao tipo de sinalização temporária que era exigível colocar e que seria a sinalização de posição/obrigação D3b e dispositivo complementar ET do RST, sendo que a legislação referenciada no douto acórdão, em crise, tem uma análise meramente abstrata sem que exista a sua subsunção ao caso concreto e ao modo e condições de como deveria ser colocada.
G) — O douto acórdão, em crise, quanto à verificação das condições de inversão da culpa e exclusão da ilicitude está em contradição com vários acórdãos já transitados em conforme explicitado supra, pelo que deverá o presente acórdão ser objeto de análise, tendo por base a situação concreta dos autos, proferindo-se douta decisão que sustente a boa aplicação do direito ao caso concreto.
H — Em face das circunstâncias do acidente e da dinâmica da sua ocorrência tem-se que inexiste nexo de causalidade entre os factos e os respetivos danos provocados.
TERMOS EM QUE, E NO MAIS DE DIREITO QUE VOSSAS EXCELÊNCIAS DOUTAMENTE SUPRIRÃO, DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE E, EM CONSEQUÊNCIA, FAZENDO-SE JUSTIÇA, SE REQUER QUE,
§- DO PEDIDO
I
Justificado na nulidade do douto acórdão, em crise, por óbvia falta de fundamentação quanto à alteração dos factos dados como provados e por erro na aplicação da matéria de direito substantivo, ao caso concreto, bem como por se encontrar em contradição com vários acórdãos, já transitados em julgado, quanto à exclusão da ilicitude, inversão da culpa por presunção em detrimento da culpa efetiva, com culpa efetiva do lesado na produção do acidente, e por inexistência de nexo de causalidade entre os factos e os danos, que o douto acórdão em crise, seja revogado e seja substituído por outro que, atendendo ao alegado e ao concluído supra, e ao probatório e respetiva motivação dos autos, repondo a justiça que a situação exige, absolva a Ré/Recorrente do pedido.
II
Consequentemente, que o Recorrido seja condenado em custas e demais encargos com o processo.»

O Recorrido apresentou as suas contra-alegações com as seguintes conclusões:
«I. O Recorrente Município enquadrou a admissibilidade do recurso interposto como sendo extraordinário (revista), nos termos do art. 671° e seguintes do Código de Processo Civil (doravante C.P.C), bem como, dos artigos 140.º, n.º1 e 2, 141°, n.º 3, 142.º, n.º 1, 143.º, n.º1, 144.º e do artigo 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (doravante CPTA), contudo, conforme facilmente se constata, não existe alçada para o tribunal que se recorre, inexistindo desde logo o requisito da recorribilidade do valor da acção.
II. Mais acresce que os recursos de revista apenas podem ser admitidos Casos excecionais excepcionalidade essa prevista no art. 150.º do CPTA, e no art. 629°, n.º 2, alínea d) do CPC e art. 672.º, n.º 1 alínea c) do mesmo CPC, não se invocando qualquer excecionalidade no recurso apresentado pela recorrente Município, mais referindo o artigo 150.º, n.º 4 do CPTA, refere expressamente que:
“O ERRO NA APRECIAÇÃO DAS PROVAS E NA FIXAÇÃO DOS FACTOS MATERIAIS NÃO PODE SER OBJETO DE REVISTA SALVO HAVENDO OFENSA DE UMA DISPOSIÇÃO EXPRESSA DE LEI QUE EXIGA CERTA ESPÉCIE DE PROVA PARA A EXISTÊNCIA OU DO FACTO OU QUE FIXE A FORÇA DE DETERMINADO MEIO DE PROVA.”
III. Da análise do recurso apresentado pelo Recorrente Município facilmente se constata que se trata de um mero recurso ordinário, não concordando o Recorrente MUNICÍPIO DE PAÇOS DE FERREIRA com a apreciação da nova, contudo A REVISTA EXCECIONAL PRESSUPÕE A VERIFICAÇÃO DOS REQUISITOS GERAIS DE RECURSO DESIGNADAMENTE DO VALOR DA AÇÃO, não invocando o Recorrente MUNICÍPIO DE PAÇOS DE FERREIRA quaisquer contradições entre acórdãos dos tribunais centrais administrativos bem como do Supremo Tribunal Administrativo com o Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte, pelo que o recurso jamais poderá ser admitido.
IV. Sobre o Recorrente Município impende uma presunção de culpa, in vigilando sobre os bens adstritos ao seu domínio jurídico.
V. Tatuadas em conta todas as circunstâncias conhecidas do agente e as mais que um homem normal poderia conhecer, a omissão de atuação do Recorrente Município, consistente em não ter reparado a via e em não a lei sinalizado devidamente a depressão na via (buraco), existindo um nexo causalidade entre tal omissão (ausência de sinalização de aproximação), como adequada à produção de acidente se o buraco tivesse sido devidamente sinalizado.
VI. Resulta provado que, o condutor do veículo BN, ao deparar-se do um separador vermelho, desviou o seu veículo para a esquerda, vindo a embater num outro veículo, comportamento normal de quem não visualizou qualquer obstáculo.
VII. É, pois, indubitável, a configuração de nexo de causalidade entre a atuação omissiva do Recorrente Município, o acidente e os danos neste originado.
VIII. Nenhuma prova existe nos autos que qualquer condutor conseguisse visualizar, em face das condições existentes [e noite) desde os semáforos até ao local da existência da separador (local do sinistro), aliás, as regras da experiência dizem-nos precisamente o contrário, ou seja, das condições existentes (noite e chuva) a visibilidade dos condutores reduz-se significativamente motivo pelo qual se torna imperioso a colocação de sinalização prévia tendo uni vista alertar/avisar os condutores da existência de um obstáculo na via, não se podendo considerar que a responsabilidade da Recorrente Município é cumprida quando cumpre, minimamente, tal sinalização com a simples colocação, junto ao obstáculo, de um separador vermelho. Aliás, não tem dúvidas o Recorrido de que, caso não se tivesse colocado um separador vermelho junto à depressão na via certamente não teria ocorrido o sinistro com a gravidade que ocorreu, uma vez que não procederia ao desvio do veículo para a esquerda e embatido num outro veículo.
IX. Torna-se desde já impercetível o caricato para o Recorrido o alegado pelo Recorrente na motivação de que “... a chuva não impedia a visibilidade...”, contudo, transcreve um conjunto de legislação referente à sinalização das vias, onde se perceciona que as vias públicas devem ser convenientemente sinalizadas nos pontos em que o trânsito ou o estacionamento estejam vedados ou sujeitos a restrições, onde existem obstáculos, curvas encobertas ou passagens de nível e bem assim, cruzamentos, entroncamentos ou outras circunstâncias que imponham aos condutores precauções especiais», e, «não basta colocar sinais no local, mas há que colocá-los de forma bem visível e a uma distância que permita aos utentes da via tomar as precauções necessárias para obedecendo-lhes, evitar os acidentes» (cf art. 1.º do Regulamento do Código da Estrada).
X. Assim a falta de sinalização, pelo Recorrente Município, da existência de um obstáculo — depressão na via - por onde circulava o veículo sinistrado constituem omissões ilícitas, que se presumem culposas, nos termos do art.° 493°, n° 1 do Código Civil, existindo nexo de causalidade, se as omissões do Recorrente Município constituíram, em concreto, no plano naturalístico e constituem, em abstrato, segundo as regras de experiência comum, causa adequada para a produção dos danos sofridos pelo veículo do aqui Recorrido.
XI. Concluindo-se assim facilmente que existe um nexo causal entre as apontadas omissões do Recorrente Município e a produção do acidente dos autos, que seria devido exclusivamente à omissão do Recorrente Município.
XII. Desde logo, não resulta da matéria levada ao probatório que o condutor do veículo seguisse em violação das normas estradais, que circulava com excesso de velocidade atento a via em que circulava, e as condições da mesma, sendo que, o condutor do BN, e a própria conduta do mesmo e a dinâmica do sinistro demonstram que o mesmo se depara com o obstáculo sem um prévio conhecimento do mesmo, efetuando uma manobra brusca tentando evitar o impacto com o separador vermelho que, diga-se, encontra-se colocada na hemi-faixa de rodagem por onde circulava o veículo BN sem qualquer sinalização\prévia, ali o Recorrente Município nunca negou sequer em causa a inexistência de sinalização prévia, referindo apenas ter cumprido minimamente as regras de sinalização, contudo, quando está em causa a vida das pessoas, não poderemos alegar que se cumpre o minimamente exigido, o que torna inadmissível tal invocação.
XIII. Verifica-se, pois, também o requisito do nexo de causalidade adequada entre o facto ilícito (omissão de sinalização) e o dano, devendo o recurso apresentado ser julgado improcedente, mantendo-se o douto acórdão proferido
TERMOS EM QUE, mantendo o douto acórdão proferido pelo TCAN fará V. Exa. a ACOSTUMADA JUSTIÇA!»

Este Supremo Tribunal Administrativo, na sua formação preliminar, prevista no art. 150º, nº 5 do CPTA, acordou em admitir o recurso de revista.

O Exmo Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer, no sentido do provimento do recurso, a fls. 761 a 764 dos autos.

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.


2. Os Factos
No acórdão recorrido foi fixada a seguinte matéria de facto:
A) No dia 04 de Março de 2009, pelas 19 horas e 50 minutos, na Estrada Regional (ER) 209, mais concretamente na Rua ……….., na freguesia de Carvalhosa, concelho de Paços de Ferreira, ocorreu um embate entre o veículo ligeiro de passageiros, de matrícula ….BN…., conduzido por B……….., e o veículo ligeiro de mercadorias, de matrícula ….VX, conduzido por C………...
B) A propriedade dos veículos ….BN…. e ….VX encontrava-se registada em nome de A……….. e “D………, Lda.”, respectivamente.
C) A via mencionada no ponto antecedente é municipal.
D) A Rua ……….., no local do acidente, configura uma recta de, pelo menos, 200 metros desde os semáforos existentes antes do local do acidente, atento o sentido Carvalhosa-Figueiró, até ao local do embate.
E) Entre os semáforos existentes antes do local do acidente, atento o sentido Carvalhosa-Figueiró, à data do embate, não se encontravam quaisquer carros estacionados do lado direito da faixa de rodagem, sentido Carvalhosa-Figueiró.
F) No dia e hora da ocorrência do acidente havia chuvisco que não impedia a visibilidade e era noite (19:50 h).
G) A faixa de rodagem onde seguia o veículo ….BN…, tem uma largura de 7,30 metros, estando dividida por uma linha longitudinal branca descontínua, pintada no pavimento.
H) O piso, à data do acidente, era alcatrão, em bom estado de conservação, sem óleo ou areia na altura do acidente.
I) O piso encontrava-se molhado, por força da chuva que caía nesse dia.
J) Na referida data, hora e local, o B………… conduzia o …BN…, no sentido Carvalhosa-Figueiró, pela hemi-faixa direita de rodagem atento o seu sentido de marcha.
K) A anteceder o local onde ocorreu o sinistro, e a cerca de 200 metros, atento o sentido de marcha Carvalhosa-Figueiró, existiam e existem sinais luminosos (semáforos), a regular o trânsito que se faça na supra mencionada ER209 em qualquer dos dois sentidos (Cruzamento).
L) O condutor do …BN…, antes de chegar ao local do acidente, e porque se lhe deparou o sinal vermelho, no referenciado cruzamento, imobilizou o veículo automóvel (…BN…) para, de seguida, e após o surgimento do sinal verde, iniciar novamente a sua marcha.
M) Após reiniciar a marcha, a cerca de 200 metros do semáforo, existia um buraco na hemi-faixa de rodagem direita da ER 209, hemi-faixa esta por onde circulava o veículo BN, atento o sentido Carvalhosa-Figueiró, com um separador vermelho junto ao mencionado buraco e a ladear o mesmo.
N) Ao deparar-se com o separador vermelho, o condutor do …BN… desviou o veículo para a esquerda, virando, de seguida, para a direita, tendo, nesse preciso momento, vindo a embater no veículo ligeiro de mercadorias com a matrícula …VX, que circulava em sentido contrário (hemi-faixa direita de rodagem atento o sentido de marcha Figueiró-Carvalhosa), fazendo um peão e vindo a embater num muro situado do lado direito, atento o sentido do condutor do BN.
O) O referido buraco, com cerca de 50 cm de extensão existente na hemi-faixa de rodagem direita, atento o sentido Carvalhosa-Figueiró, não se encontrava levantado acima do nível do solo da estrada (15 cm de profundidade).
P) Na data e hora da ocorrência do acidente, a sinalizar o obstáculo existia junto ao mencionado buraco e a ladear o mesmo, um objecto (separador) em plástico em forma retangular, de cor vermelha, apoiados em quatro estacas de ferro, sendo que o buraco e o separador vermelho ocupavam 1/3 da hemi-faixa direita, atento o sentido do Autor.
Q) Para além da sinalização mencionada no ponto antecedente, existia apenas antes do local do embate, atento o sentido do Autor, sinal de proibição de velocidade superior a 50 km, aproximação de cruzamento e proibição de ultrapassagem.
R) O veículo …BN…, no momento do embate no veículo ….VX, encontrava-se a contornar o referenciado separador vermelho existente na hemi-faixa de rodagem por onde circulava, sendo que o embate se efetivou na hemi-faixa esquerda de rodagem, atento o sentido de marcha do …BN… (Carvalhosa-Figueiró).
S) O buraco na via, para além do separador vermelho, estava sinalizado com fita reflectora vermelha e branca colocada, pelo menos, num ferro.
T) A via tinha candeeiros públicos situados do lado esquerdo, atento o sentido do autor, que iluminavam a faixa de rodagem desde os semáforos até ao local do acidente.
U) Ao condutor do veículo BN era possível avistar a faixa de rodagem numa extensão de 200 metros desde o semáforo até ao local do acidente.
V) Em consequência do acidente, o veículo do Autor sofreu danos ao nível da parte diante, lateral e traseira, desconhecendo-se o valor da reparação.
X) O Autor vendeu o veículo …BN… no estado em que se encontrava por € 1.000,00, desconhecendo-se o valor do salvado.
Y) O veículo automóvel …BN…, à data do acidente, era da marca Mercedes, modelo SLK 200, com a cilindrada de 2000, com 136 cavalos.
Z) O sinistro ocorreu dentro duma localidade.

3. O Direito
O Município de Paços de Ferreira interpõe a presente revista invocando que o acórdão recorrido, ao julgar parcialmente procedente a acção que visa efectivar a responsabilidade civil extracontratual do Réu, ao abrigo da Lei nº 67/2007, de 31/12, incorreu em erro de julgamento e nulidades.

3.1 Das nulidades do acórdão recorrido
Alega o recorrente que o acórdão recorrido padece de nulidade por que: i) “…é manifestamente omisso de fundamentação quanto à aplicação, no caso concreto, da sinalização de aproximação, quer de pré-sinalização, de sinalização avançada ou ainda de sinalização intermédia” (conclusão A); ii)…adita novos factos, em contradição com a factualidade constante do probatório dos autos (aceite no douto acórdão em crise) e dá por provados factos alheios aos então provados tais como, “dia de chuva intensa” quando era um dia de “chuvisco que não impedia a visibilidade”, “num dos buracos” quando apenas existia “um obstáculo (buraco)”, o que é feito sem qualquer fundamento justificativo, o que constitui nulidade, que deve ser declarada” (conclusão C); iii)existe contradição entre os factos provados e a decisão”.

As nulidades de sentença estão actualmente previstas no art. 615º do NCPC (art. 668º, nº 1 do CPC61), prevendo o seu nº 1 que “É nula a sentença quando:
(…)
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
(…)”.
O Recorrente invoca nulidades de sentença sem que indique as concretas alíneas do preceito citado, geradoras de nulidade, que considera verificadas.
Na alínea i) supra indicada estará a imputar ao acórdão recorrido omissão de pronúncia (art. 615º, nº 1, al. d) do CPC).
Esta nulidade da decisão ocorre quando o juiz deixe de dar cumprimento ao disposto no art. 608º, nº 1 do CPC, nos termos do qual, o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação.
Ora, no acórdão recorrido foram conhecidas todas as questões suscitadas no recurso. Por um lado, as atinentes à matéria de facto dada como assente em primeira instância, que considerou correctamente fixada, mantendo os factos provados, julgando improcedente o erro de julgamento imputado à sentença de primeira instância. Por outro lado, quanto à questão de direito, estando em causa a responsabilidade civil extracontratual de um ente público [no regime da Lei nº 67/2007], conheceu dos respectivos pressupostos, e, considerando-os verificados, julgou a acção parcialmente procedente.
Não incorreu, pois, o acórdão recorrido na nulidade por omissão de pronúncia prevista na alínea d) do nº 1 do art. 615º do CPC.
Alega na alínea ii) supra o Recorrente que o acórdão recorrido terá aditado novos factos em contradição com a factualidade provada e teria dado por provados factos alheios aos constantes do probatório, no que teria incorrido em nulidade de decisão.
Não diz o Recorrente qual a nulidade em que o acórdão teria incorrido ao proceder deste modo.
Certamente não estamos perante a nulidade prevista na alínea b) do nº 1 do art. 615º do CPC, uma vez que o acórdão recorrido contém devidamente especificados os fundamentos de facto (e de direito), tendo mantido o probatório nos termos em que foi fixado na primeira instância.
Também não se verifica, com o alegado, a previsão da primeira parte da alínea c) do nº 1 do preceito citado. Quanto à segunda parte deste preceito, não se vê igualmente que ocorra “alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível”.
Com efeito, os factos referidos pelo Recorrente, e constantes da fundamentação de direito do acórdão recorrido, podem consubstanciar um erro sobre a matéria de facto provada, mas não tornam de forma alguma ininteligível a decisão, apenas podendo configurar um erro de julgamento, improcedendo a nulidade arguida.
Finalmente, na alínea iii) alega o Recorrente que existe contradição entre os factos e a decisão, o que consubstanciaria a previsão da al. c) do nº 1 do art. 615º do CPC.
A nulidade prevista nesta alínea c) pressupõe a existência de um vício no raciocínio expresso na decisão, resultando de os fundamentos expressos apontarem num determinado sentido, e, a decisão que é proferida ser em sentido oposto àqueles fundamentos. Ou seja, a fundamentação adoptada conduziria logicamente a uma decisão final oposta, ou pelo menos divergente, da que é tomada.
Ora, tal vício lógico não se verifica no acórdão recorrido.
Com efeito, os factos provados podem logicamente conduzir à solução encontrada, residindo a questão na interpretação jurídica desses factos, na qual o acórdão pode ter incorrido em erro de julgamento, mas não na nulidade arguida.
Termos em que, improcedem as nulidades imputadas ao acórdão recorrido, sendo certo, igualmente, que a eventual contradição entre a fundamentação de direito do acórdão recorrido e anteriores acórdãos já transitados em julgado não é susceptível de configurar qualquer uma das nulidades de sentença previstas no art. 615º, nº 1 do CPC.

3.2 Quanto ao mérito
O recurso interposto tem por pressuposto a aplicação do regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas públicas, no domínio dos actos de gestão pública, previsto na Lei nº 67/2007, de 31/12, respectivos arts. 1º, 3º, 7º, nº 1, 9º e 10º e no art. 483º e seguintes do CC (cfr. igualmente os arts. 13º, 16º, al. b) e 18º, nº 1, al. a) da Lei nº 159/99, de 14/9 quanto às competências das autarquias locais em vigor à data dos factos).
Segundo estes preceitos, e como decorre da regra geral do art. 483º, nº 1 do CC, para que se verifique a obrigação de indemnizar é necessário que se verifiquem, cumulativamente, os seguintes requisitos: o facto ilícito, a culpa, o dano e o nexo de causalidade adequada entre o facto e o dano.
O Recorrente defende que o acórdão recorrido incorreu em erro de julgamento ao ter caracterizado como ilícita a conduta do R. Município por falta de sinalização do obstáculo (buraco) quando só havia necessidade de colocar a sinalização temporária de posição, prevista nos artigos 82º, 87º e e 93º do Regulamento de Sinalização do Trânsito (doravante RST), aprovado pelo Decreto Regulamentar nº 22-A/98, de 1/10. Mais defende que a presunção de culpa não deve ser assacada ao recorrente, pois não se revê na culpa efectiva, por existir culpa do lesado na produção do acidente ao não ter tomado as devidas precauções que a situação exigia, inexistindo nexo de causalidade entre os factos e os danos.

O acórdão recorrido considerou que o Réu Município omitiu o dever de garantir a segurança nas vias sob sua jurisdição, “designadamente apondo a competente e adequada sinalização em situações suscetíveis de gerar perigo para os respetivos utentes, constitui uma omissão ilícita geradora de responsabilidade civil, que se presume culposa, nos termos do artº 493/1 do Código Civil”. Considerou, igualmente, que existe nexo de causalidade entre as “apontadas omissões do Réu Município e a produção do acidente dos autos, que seria devido exclusivamente à omissão deste”.

Os pressupostos ilicitude e culpa, no que respeita à omissão de sinalização no local em que ocorreu o acidente rodoviário, foram apreciados de forma convergente pela primeira instância e pelo acórdão recorrido.
Com efeito, o TAF de Penafiel, depois de ter referido o art. 5º, nº 1 do Código da Estrada e várias disposições do Regulamento de Sinalização de Trânsito (RST), aprovado pelo Decreto Regulamentar nº 22-A/98, de 1/10, considerou que «(…), o Réu Município de Paços de Ferreira, através dos seus funcionários, tinha a obrigação de providenciar pela sinalização do buraco existente na hemi-faixa de rodagem direita, atento o sentido do veículo BN.
Sucede que apenas existia um separador vermelho e uma fita branca, inexistindo qualquer sinalização de aproximação como impõe os normativos referenciados, quando o Réu teve possibilidade de conhecer atempadamente aquela situação, o que leva a concluir que o Réu não cumpriu o seu dever de sinalização adequada ao local.». Pelo que conclui que: «(…), a verificação da omissão de sinalização de aproximação face ao dever que é imposto pelos normativos que se referenciam é suficiente para a consideração da ilicitude da conduta, presumindo-se a culpa dos serviços, nos termos do artº 10º, nº 2 da lei nº 67/2007, que o Réu não logrou afastar».
Igualmente o acórdão recorrido concluiu pela verificação dos pressupostos da ilicitude e da culpa dizendo: «(…), a falta de sinalização, pelo Réu Município, da existência de um obstáculo – depressão na via – por onde circulava o veículo sinistrado constitui omissão ilícita, que se presume culposa, nos termos do já falado artº 493º/1.»

E, o decidido pelas instâncias quanto à verificação destes pressupostos da responsabilidade civil extracontratual não merece censura, conforme o que passamos a explanar.

Segundo o art. 9º da Lei nº 67/2007, “1 - Consideram-se ilícitas as ações ou omissões dos titulares de órgãos, funcionários e agentes que violem disposições ou princípios constitucionais, legais ou regulamentares ou infrinjam regras de ordem técnica ou deveres objetivos de cuidado e de que resulte a ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos”.
Nos termos do disposto nos arts. 13º, 16º, al. b) e 18º, nº 1, al. a) da Lei nº 159/99 recai sobre os municípios deveres de gestão das vias rodoviárias sob sua jurisdição, nomeadamente o dever de assegurar a vigilância, fiscalização, conservação e sinalização das mesmas.
Do Código da Estrada (CE) decorre também essa obrigação de sinalizar ao dispor no art. 5º, nº 1, o seguinte:
Nos locais que possam oferecer perigo para o trânsito ou em que este deva estar sujeito a restrições especiais e ainda quando seja necessário dar indicações úteis aos utilizadores devem ser utilizados os respectivos sinais de trânsito”. E igual obrigação resulta do art. 1º, nº 1 RST, aprovado pelo Decreto Regulamentar nº 22-A/98, de 1/10 [respeitando a este diploma todos os preceitos a seguir citados sem indicação de qualquer outro].
No que se refere a “Sinalização temporária”, destinada, nomeadamente, a prevenir os utentes da existência de obras ou obstáculos ocasionais na via pública prevê o RST, no art. 77º e seguintes:
Artigo 77º
1 – A sinalização temporária destina-se a prevenir os utentes da existência de obras ou obstáculos ocasionais na via pública e a transmitir as obrigações, restrições ou proibições especiais que temporariamente lhes são impostas.
2 – A sinalização temporária deve ser efectuada com recurso a sinais verticais e luminosos, bem como a marcas rodoviárias e a dispositivos complementares, nos termos dos artigos seguintes.
(…).
Artigo 78º
Domínio de aplicação
1 – As obras e obstáculos ocasionais na via pública devem ser convenientemente sinalizados, tendo em vista prevenir os utentes das condições especiais de circulação impostas na zona regulada pela sinalização temporária.
2 – A sinalização temporária deve ser retirada imediatamente após a conclusão da obra ou a remoção do obstáculo ocasional, restituindo-se a via às normais condições de circulação”.
Os tipos e regras de sinalização temporária estão previstas no art. 82º e seguintes do RST, compreendendo sinalização de aproximação, de posição e final.
Nos termos do art. 83º, sempre que existam obras e obstáculos ocasionais na via pública, a zona onde estes se situam deve ser antecedida pela colocação de sinalização de aproximação que compreende a pré-sinalização, a sinalização avançada e a sinalização intermédia (cfr. arts. 84º a 86º).
No caso dos autos, atendendo à natureza e extensão do obstáculo ocasional em causa, não estaremos perante a previsão dos arts. 84º e 85º do RST, sendo que antes do local do embate, atento o sentido do Autor, existia sinal de proibição de velocidade superior a 50 km, aproximação de cruzamento e proibição de ultrapassagem (al. Q) dos FP), não existindo necessidade de outra sinalização intermédia, precedendo a sinalização de posição (cfr. art. 86º do RST).
Era, portanto, exigida a sinalização temporária de posição e os dispositivos complementares, previstos nos artigos 87º, nº 1 e 93º do RST, que existia.
Mas o art. 87º, nº 2 prevê que a materialização desta sinalização se faça com recurso aos sinais de obrigação previstos no capítulo II do Regulamento e aos dispositivos complementares previstos no art. 93º. O que quer dizer que na proximidade imediata do lugar onde começa o obstáculo devia estar colocado o sinal D3b de obrigação de contornar o obstáculo pelo lado indicado na seta inscrita no sinal – Quadro XXV (no caso lado esquerdo) – cfr. arts. 27º e 28º do Regulamento.
Ora, o próprio Recorrente admite que este sinal devia estar colocado a delimitar o obstáculo e inexistia, sendo como tal ilícita a omissão desta sinalização.
À responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas públicas, incluindo as autarquias locais, no domínio dos actos de gestão pública, é aplicável a presunção de responsabilidade prevista no art. 493º, nº 1 do CC (neste sentido, v.g., o ac. deste STA de 14.10.09, Proc. 0155/09 e a restante jurisprudência nele indicado). E, no caso, a omissão culposa do réu deve declarar-se em função desta presunção (cfr. art. 10º, nº 2 da Lei nº 67/2007).
Com efeito, verifica-se que está demonstrada a culpa do réu Município, já que devia ter havido uma determinada actuação e não houve, pelo que a omissão é ilícita, e, nada afastando a imputação de tal omissão ao réu, estamos perante uma ilicitude culposa.
Efectivamente, ela só poderia ser afastada se viesse provado qualquer facto que excluísse o dever de sinalização, ou que demonstrasse que este não tinha podido ser cumprido. Ou de que tinham sido cumpridas as exigíveis diligências de sinalização, ou que a sinalização desaparecera por razões não imputáveis ao Réu, de forma que não podia ter sido evitada a omissão, face às circunstâncias apuradas e tendo em conta a diligência de um bom pai de família (cfr. art. 487º, nº 2 do CC).
Assim, são de considerar assentes o facto ilícito, consubstanciado na falta de sinalização e a culpa, que advém da imputação do facto ao Réu.

A divergência das instâncias está na verificação do nexo de causalidade, considerando a primeira instância que este não se verificava e o TCA em sentido contrário, ao concluir que a conduta omissiva do réu tinha aptidão para produzir o resultado, não sendo na ordem natural das coisas indiferente à produção do dano, sendo efectiva condição do resultado.

Tem vindo a ser entendido por este Supremo Tribunal e também pelo Supremo Tribunal de Justiça que o art. 563º do CC, consagrou a teoria da causalidade adequada na sua formulação negativa, correspondente ao ensinamento de Ennecerus-Lehmann segundo a qual “o facto que actuou como condição do dano só deixará de ser considerado como causa adequada se, dada a sua natureza geral, se mostrar de todo indiferente (…) para a verificação do dano, tendo-o provocado só por virtude das circunstâncias excepcionais, anormais, extraordinárias ou anómalas que intercederam no caso concreto” (cfr. Almeida Costa, “Direito das Obrigações”, 10ª ed., pág. 890/1 e, v.g., Acs. deste STA de 21.02.2008, Proc. 1001/07, de 07.02.2012, Proc. 827/10, de 14.10.2009, Proc. 0155/09, e de 13.03.2012, Proc. 0477/11).


Entendeu o TAF de Penafiel que não existia nexo de causalidade entre o facto ilícito, consistente na falta de sinalização exigida, e os danos sofridos pelo autor em virtude do embate, pelos seguintes motivos:
«Quanto ao nexo causal decorre do probatório que a Rua ………., no local do acidente, configurava uma recta de, pelo menos, 200 metros desde os semáforos existentes antes do local do acidente, atento o sentido Carvalhosa-Figueiró, até ao local do embate; entre os semáforos existentes antes do local do acidente, atento o sentido Carvalhosa-Figueiró, à data do embate, não se encontravam quaisquer carros estacionados do lado direito da faixa de rodagem, sentido Carvalhosa-Figueiró, no dia e hora da ocorrência do acidente havia chuviscos que não impedia a visibilidade; o piso, à data do acidente, era alcatrão, em bom estado de conservação, sem óleo ou areia na altura do acidente; na data e hora da ocorrência do acidente, a sinalizar o obstáculo existia junto ao mencionado buraco e a ladear o mesmo, um objecto (separador) em plástico em forma retangular, de cor vermelha, apoiados em quatro estacas de ferro, sendo que o buraco e o separador vermelho ocupavam 1/3 da hemi-faixa direita, atento o sentido do autor; para além da sinalização mencionada no ponto antecedente, existia antes do local do embate, atento o sentido do Autor, sinal de proibição de velocidade superior a 50km, aproximação de cruzamento e proibição de ultrapassagem, o veículo …BN…., no momento do embate no veículo …..VX, encontrava-se a contornar o referenciado separador vermelho existente na hemi-faixa de rodagem por onde circulava, sendo que o embate se efectivou na hemi-faixa esquerda de rodagem, atento o sentido de marcha do ….BN…. (Carvalhosa-Figueiró); o buraco na via, para além do separador vermelho, estava sinalizado com fita refletora vermelha e branca colocada, pelo menos, num ferro; a via tinha candeeiros públicos situados do Iado esquerdo, atento o sentido do autor, que iluminavam a faixa de rodagem desde os semáforos até ao local do acidente; ao condutor do veículo BN era possível avistar a faixa de rodagem numa extensão de 200 metros desde o semáforo até ao local do acidente.
Nos termos do artº 19.º CE, considera-se visibilidade reduzida ou insuficiente sempre que o condutor não possa avistar a faixa de rodagem em toda a sua largura numa extensão de, pelo menos, 50 metros.
Se ao condutor do veículo BN era possível avistar a faixa de rodagem numa extensão de 200 metros desde o semáforo até ao local do acidente, como vimos, isso significa que a visibilidade não era reduzida nem insuficiente e o separador era visível a uma distância superior a 50 m, o que permitia ao condutor parar e deixar passar os veículos que circulavam em sentido contrário.
Por conseguinte, não estamos perante o surgimento inopinado de um obstáculo, como alega o autor, visível apenas a 2 ou 3 metros, pois um obstáculo inopinado é aquele que surge de forma súbita e inesperada, o que não é o caso dos autos. Nem essa alegação é razoável, tendo em conta que as luzes de cruzamento (médios) cujo uso se impunha por ser noite permitia ao condutor ver, pelo menos, 30 metros: cf art.º 60, n. 1, b) do CE.
Se o autor não podia circular a mais de 50 Km (atendendo aos sinais de limitação de velocidade existentes no local, mas mesmo que assim não fosse, em a velocidade imposta por circular dentro duma localidade), circulava numa estrada com configuração de recta de, pelo menos, 200 metros, numa via iluminada desde a semáforo até ao local do acidente (200 metros), tinha de circular com as luzes de cruzamento (médios), o separador vermelho e a fita são notoriamente dotadas de visibilidade, o Tribunal tem de concluir que estas circunstâncias permitiam ao condutor do BN ver o separador do qual se desviou, parar no espaço visível à sua frente e permitir a passagem dos veículos que circulavam em sentido contrário, o que não sucedeu. Assim, o embate não se ficou a dever à falta de sinalização de aproximação, pois se estes se destinavam a tornar visível os obstáculos ocasionais para os condutores regularem a sua velocidade à sua existência, então se o Tribunal conclui que mesmo sem esta sinalização, o separador e respectivas fitas eram visíveis naquelas circunstâncias e permitiam ao condutor do BN ver o obstáculo, parar no espaço visível a sua frente e permitir a passagem dos veículos que circulavam em sentido contrário, isso significa que não existia nexo causal entre a falta de sinalização de aproximação e os danos sofridos pelo Autor em virtude do embate. Assim, o condutor do veículo do Autor deu causa ao acidente por não circular com os cuidados que no caso se exigiam, falhando o requisito do nexo de causalidade entre a conduta ilícita do Município e o acidente.»

Já o acórdão recorrido tendo considerado que: «(…), as regras da experiência comum, das quais o Tribunal a quo não se socorreu, diz-nos que, a existência de um buraco na via (depressão da via), sem qualquer sinalização de aproximação, num dia de chuva intensa, sendo noite, representa uma situação potenciadora de elevadissimos riscos para a segurança do trânsito que exige cuidados especiais para minorar os riscos para os utentes.»
Que: «(…) o condutor do veículo BN após ter iniciado a sua marcha, ao deparar-se com um separador vermelho junto ao buraco e a ladear o mesmo, vira para a esquerda e, de seguida para a direita, tendo nesse preciso momento vindo a embater num veículo ligeiro de mercadorias. (…) o facto motivador do comportamento estradal do condutor do BN deve-se unicamente à existência de um separador vermelho colocado num dos buracos da hemi-faixa de rodagem (…) separador vermelho esse e buraco esse que não estavam devidamente sinalizados, nem existia qualquer sinalização prévia a alertar para a existência do obstáculo (separador)»
«A própria conduta do condutor do BN, ora Recorrente e a dinâmica do sinistro demonstram que o mesmo se depara com o obstáculo sem um prévio conhecimento do mesmo, efectuando uma manobra brusca, tentando evitar o impacto com o separador vermelho que, repete-se, se encontra colocado na hemi-faixa de rodagem por onde circulava o veículo BN sem qualquer sinalização prévia (…).
Não resulta, pois, dos factos provados que o condutor do veículo BN tenha visto o separador vermelho na sua hemi-faixa de rodagem quando iniciou a sua marcha a tempo de adequar a sua condução a esse obstáculo, sendo que é do conhecimento geral, que a existência de um mero separador vermelho no meio da hemi-faixa de rodagem, num dia chuvoso, já noite, não é facilmente perceptível à distância. Dos factos provados resulta antes que o condutor do veículo BN foi surpreendido com um separador vermelho; portanto a materialidade apurada, por si só, não permite concluir, como fez o Tribunal a quo, que o acidente ocorreu sendo possível ao condutor do veículo BN avistar tal obstáculo, concluindo, ainda que, o facto de estar a chover e ser noite não reduz a visibilidade do condutor do mencionado veículo.», entendeu estar verificado o nexo de causalidade, censurando o entendimento da primeira instância.

Face às passagens do acórdão recorrido acima transcritas, afigura-se-nos que este se serviu de factos que não constam da matéria de facto provada, tais como: “(…) existência de um buraco na via (…) sem qualquer sinalização de aproximação, num dia de chuva intensa [cfr. fls. 34, §4º do acórdão]; “(…) o condutor do veículo BN após ter iniciado a sua marcha, ao deparar-se com um separador vermelho junto ao buraco e a ladear o mesmo (…), vindo a embater num veículo ligeiro de mercadorias (…) o facto motivador (…) deve-se (…) à existência de um separador vermelho colocado num dos buracos (…) que não estavam devidamente sinalizados, nem existia qualquer sinalização prévia a alertar para a existência do obstáculo (…)” [cf. fls. 35, §5º do acórdão]; “(…) não resulta (…) que o condutor do veículo circulasse com excesso de velocidade atenta a via em que seguia e as condições da mesma (…)” [cfr. fls. 37, §3º do acórdão]; “A própria conduta do condutor e a dinâmica do sinistro demonstram que o mesmo se depara com o obstáculo sem um prévio conhecimento do mesmo [fls. 37, §5º do acórdão].
Por outro lado, desconsiderou outros que se encontram provados e que assumem especial relevância no caso, mormente, as condições de visibilidade no local e à hora do acidente, sendo este erro de julgamento, sobre a factualidade que determinou que se considerasse verificado o nexo de causalidade, pelo que este entendimento não se pode manter.
Ora, os factos provados e as ilações sobre as causas do acidente, face àqueles, foram, a nosso ver, devidamente ponderadas na sentença de primeira instância, nos termos acima transcritos, deles decorrendo o juízo formulado de que não existe nexo de causalidade adequada, entre a falta de sinalização (o facto ilícito) e o acidente (e os danos dele resultantes).

Pelo exposto, acordam em conceder provimento ao recurso, revogar o acórdão recorrido, mantendo-se a decisão de primeira instância.
Custas pelo Recorrido no TCA e neste STA.

Lisboa, 20 de Junho de 2018. – Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa (relatora) – José Francisco Fonseca da Paz – Maria do Céu Dias Rosa das Neves.