Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:02505/17.5BELSB
Data do Acordão:04/05/2019
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:COSTA REIS
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P24442
Nº do Documento:SA12019040502505/17
Data de Entrada:03/25/2019
Recorrente:A............
Recorrido 1:INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA:

I. RELATÓRIO

A………… intentou, no TAC de Lisboa, contra o Instituto da Segurança Social, I.P., providência cautelar pedindo a suspensão de eficácia de acto que ordenou o encerramento do lar de idosos de que era proprietário.
Alegou não só que se verificavam os pressupostos de que dependia a concessão daquela medida como essa suspensão era necessária para acautelar a residência, a sobrevivência e subsistência dos respectivos utentes.
O TAC, com fundamento no facto da acção de que estes autos dependem ter sido instaurada intempestivamente, julgou extinta a instância cautelar.

E o TCA Sul, para onde o Autor apelou, confirmou essa decisão.

É desse Acórdão que o Requerente recorre (artigo 150.º do CPTA).

II. MATÉRIA DE FACTO
Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

III. O DIREITO
1. As decisões proferidas pelos TCA em segundo grau de jurisdição não são, por via de regra, susceptíveis de recurso ordinário. Regra que sofre a excepção prevista no art.º 150.º/1 do CPTA onde se lê que daquelas decisões pode haver, «excepcionalmente», recurso de revista para o STA «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». O que significa que este recurso foi previsto como «válvula de segurança do sistema» para funcionar em situações excepcionais em que haja necessidade, pelas apontadas razões, de reponderar as decisões do TCA em segundo grau de jurisdição.
Deste modo, a pretensão manifestada pelo Recorrente só poderá ser acolhida se da análise dos termos em que o recurso vem interposto resultar que a questão nele colocada, pela sua relevância jurídica ou social, se reveste de importância fundamental ou que a sua admissão é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
Vejamos, pois, se tais requisitos se verificam in casu socorrendo-nos da matéria de facto seleccionada no Acórdão recorrido.

2. Resulta da M.F. que o Requerente abriu um lar residencial para idosos de forma ilegal uma vez que não possuía licença de funcionamento nem autorização provisória de funcionamento e funcionava com deficiências graves nas instalações, salubridade, segurança, higiene e conforto, o que colocava em causa o bem estar dos idosos acolhidos. Por essa razão o Conselho Directivo do Requerido deliberou, 31.08.2017, ordenar o encerramento imediato desse estabelecimento.
Inconformado, instaurou procedimento cautelar pedindo a suspensão de eficácia daquela ordem de encerramento.

TAC de Lisboa julgou extinta a instância cautelar pelas seguintes razões:

assim, que, nos casos em que o direito de acção (principal a intentar, nos termos do n.º 1 do artigo 113.º do CPTA) caduque, também a correlativa providência cautelar que haja sido decretada deverá caducar e o respectivo processo cautelar ser extinto, por o mesmo não deter já pertinência para assegurar a utilidade da decisão que ali venha a ser proferida.
.......
o Requerente vem, essencialmente, sindicar que a decisão suspendenda enferma de (i) vício de violação do artigo 35.º do Decreto-Lei n.º 64/2007, de 14.03, por erro nos seus pressupostos, (ii) vício de falta de fundamentação e (iii) vício de violação do direito de audiência prévia, mais sustentando, relativamente a estes dois últimos, que a sua constatação seria geradora de nulidade.
........
...... tendo o Requerente sido notificado da decisão ora suspendenda em 27.09.2017, o prazo para a propositura da competente acção principal terminava em 04.01.2018, nos termos dos artigos 58.º, n.ºs 1, alínea b), e 2, 59.º, n.º 2, e 69.º, n.º 2, todos do CPTA, conjugadamente com a alínea e) do artigo 279.º do CC, pelo que, no momento em que o Requerente intentou a acção principal de que os presentes autos cautelares dependem (25.01.2018, cf. facto 8. firmado supra), o respectivo direito para o fazer já havia caducado.
Assim, e considerando que, nos termos e com os fundamentos que supra se expenderam, a acção principal intentada pelo Requerente ..... se encontra votada ao insucesso, por caducidade do respectivo direito, nos termos conjugados dos artigos 89.º, n.º 4, alínea k), 58.º, n.º 1, alínea b), e 69.º, n.º 2, todos do CPTA, inelutável se torna concluir pela observância do circunstancialismo consignado na alínea a) do n.º 1 do artigo 123.º do CPTA e, consequentemente, pela extinção da respectiva instância, o que se julga de seguida, resultando, naturalmente, prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas pelas partes.
Julgamento que o TCA confirmou com o seguinte discurso fundamentador:
....... os vícios de falta de fundamentação e de preterição da audiência prévia que são apontados pelo ora Recorrente ao acto suspendendo determinam a anulabilidade do acto administrativo, e não a sua nulidade, ao contrário do que por si vem invocado .....
Nos termos do artigo 58.º do CPTA, a impugnação de actos anuláveis encontra-se adstrita a um prazo de três meses.
Tal prazo de três meses corresponde a 90 dias, é contínuo, suspendendo-se apenas durante as férias judiciais. Na verdade, o referido prazo de 90 dias para a propositura da acção principal (conforme Revisão de 2015) deve ser subsumido à previsão do artigo 138.º, n.º 4 do CPC, ex vi artigo1.º do CPTA. Esta circunstância exclui a disciplina estabelecida no artigo 279.º do CC, sendo-lhe, como tal aplicável as regras da continuidade do prazo e da sua suspensão durante as férias judiciais (n.º 1) e da transferência do termo do prazo pata o primeiro dia útil seguinte ....
O Requerente, no âmbito da presente providência, pretende a suspensão da eficácia da deliberação de 31.08.2017, do Conselho Directivo do Instituto da Segurança Social, a qual lhe foi notificada em 27.09.2017 - cfr. itens 5 e 6 do probatório.
A acção principal foi intentada em 25.01.2018 (cfr. item 8 do probatório)
Por conseguinte, o prazo para propositura da respectiva acção principal expirou em 08.01.2018, em conformidade com o disposto nos artigos 58º, n.º 1 al. b), 59º, n.º 2 e 69º, n.º 2, todos do CPTA.
Assim, ao contrário do sustentado pelo Recorrente, o prazo não se estendeu até à data por si invocada, tanto mais que a exequibilidade, imediata ou não, do acto impugnado em nada contende com o decurso do prazo.
Portanto, quando o processo cautelar tenha sido intentado como preliminar do processo, como sucedeu no caso sub judice, o decurso do prazo, sem que este último tenha sido intentado atempadamente, conduz à extinção do processo cautelar. ......
Concluímos do exposto que, no momento em que o Requerente intentou a acção principal de que os presentes autos cautelares dependem, o respectivo direito para o fazer valer já havia caducado, extinguindo-se assim o procedimento em apreço - cfr. artigo 123.º, n.º 1, al. a) do CPTA.
Termos em que, improcedendo todas as conclusões da alegação do Recorrente, é de negar provimento ao presente recurso jurisdicional e confirmar a sentença recorrida.”

3. O Autor não se conforma com esse julgamento pelo que pede a admissão desta revista para a qual formula, entre outras, as seguintes conclusões:
I. Não pode o Recorrente aceitar a Decisão de improcedência da Acção Principal, uma vez que, nada na lei refere que o prazo de três meses para instaurar a Acção Principal de que os Autos Cautelares dependem se inicia a contar da notificação do acto ocorrido aos 27/09/2017.
J. Na realidade, o acto administrativo que os Autos Cautelares visam suspender a sua eficácia embora tenha sido notificado aos 27/09/2017, só se tornaria efectivo 30 dias depois, conforme a sua própria notificação, ou seja, o acto administrativo só se tornou exequível aos 27/10/2017.
K. Tendo sido essa data que o Recorrente tomou em consideração para cumprir o prazo de 3 meses para instaurar a Acção Principal. Cumprindo assim o ónus que sobre si impende.
L. Assim, nos termos do disposto no artigo 58º. do CPTA, o prazo de três meses foi cumprido, pois só após a eficácia do acto administrativo é que o mesmo se torna estável no ordenamento jurídico, só dessa data em diante é possível o mesmo produzir os seus efeitos na esfera jurídica do Requerente.
M. Por outro lado, o Recorrente invocou também a nulidade do acto administrativo.
N. Sendo que “… as providências cautelares relativas a actos nulos, tal como as respectivas acções, não estão sujeitas a prazo ...”, porque “... os actos nulos podem ser impugnados a todo o tempo - art. 134.º, nº 2, do Código de Procedimento Administrativo -, não existe qualquer prazo expresso para intentar as providências cautelares nesta hipótese e, pelo contrário, podem ser intentadas já depois de interposta a acção principal - art. 114.º, nº 1, aI. c). do CPTA…”.

4. Como se acaba de ver o que está em causa é saber qual o prazo de impugnação de um acto administrativo. As instâncias, de forma unânime e com convergente fundamentação, consideraram que, sendo a mesma dirigida contra acto anuláveis e não sendo promovida pelo M.P., esse prazo era de três meses. E, porque assim e porque o Requerente desrespeitara esse prazo, a medida cautelar aqui requerida encontrava-se extinta por caducidade do respectivo direito, na medida em que encontrando-se a mesma na dependência da acção principal, a extinção desta determinava a extinção do processo cautelar.
O Recorrente contesta esse entendimento argumentando de duas distintas formas; por um lado, alegando que o acto impugnado era nulo e que, por isso, a sua impugnação podia ser feita a todo o tempo, por outro, que o mencionado prazo tinha início no momento em que o acto começava a produzir os seus efeitos e não no momento da sua notificação.
Todavia, esses argumentos foram convincentemente desmontados pelo Acórdão recorrido pelo que não se justifica a admissão do recurso para uma melhor interpretação e aplicação do direito. Sendo que, por outro lado, não está em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental.

DECISÃO
Termos em que os Juízes que compõem este Tribunal acordam em não admitir a revista.
Custas pelo Recorrente.
Porto, 5 de Abril de 2019. – Costa Reis (relator) – Madeira dos Santos – São Pedro.