Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01121/13.5BEALM
Data do Acordão:09/16/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ARAGÃO SEIA
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P26314
Nº do Documento:SA22020091601121/13
Data de Entrada:07/13/2020
Recorrente:A............
Recorrido 1:CÂMARA MUNICIPAL DE SESIMBRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:


A…………… recorre do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul, datado de 28 de Novembro de 2019, o qual revogou a sentença proferida no Tribunal de 1ª instância, julgando improcedente a oposição à execução deduzida pelo ora recorrente.

Alegou, tendo concluído:
1ª - O recorrente Município de Sesimbra, no recurso que interpôs da sentença proferida pelo Tribunal de 1ª instância não suscitou qualquer questão relativa à matéria de facto dada como provada nem impugnou a decisão sobre tal matéria, quando o poderia fazer com fundamento no art.º 640º do CPC.
Em consequência desse facto, a matéria de facto dada como provada na sentença proferida na 1ª instância encontra-se definitivamente fixada por ter transitado em julgado.
2ª – Como resulta da lei, o âmbito do recurso encontra-se delimitado pelas conclusões extraídas da motivação do recorrente, não podendo o tribunal ad quem conhecer de matéria nelas não inserida, ressalvados os casos de conhecimento oficioso.
3ª – O douto acórdão sob recurso conheceu de matéria de facto que não foi suscitada pelo recorrente Município de Sesimbra, nas conclusões do recurso por ele interposto, com violação do disposto nos art.ºs 608º n.º 2, 635º n.º 4 e 639º todos do CPC.
4ª – Limitando-se o âmbito do recurso a matéria de direito o Tribunal Central Administrativo Sul é incompetente, em razão da hierarquia, para conhecer do recurso em causa, pelo que o acórdão proferido deve ser anulado e declarado ineficaz em relação às partes.
5ª – No que respeita à falta de “liquidação” da taxa urbanística municipal, está provado nos autos que o Município de Sesimbra notificou a Comissão de Administração da ……. n.º…… - ……., por ofício de 08/05/2006, que no dia 25/04/2006 foi deliberado pela Assembleia Municipal de Sesimbra fixar em €2.538.682,00 o valor da taxa de urbanização.
6ª – Tal deliberação da Assembleia Municipal de Sesimbra não constitui qualquer operação de liquidação de tal quantia por a mesma não conter os pressupostos legais exigidos para tal operação.
Contudo,
7ª – Ainda que, por hipótese, se aceite tal valor como liquidação, em sentido tributário, a verdade é que o sujeito passivo dessa taxa ou era a Comissão Administrativa da ….. como se defende no douto acórdão sob recurso ou era cada um dos proprietários da …….
Se o sujeito passivo da taxa urbanística em causa, era a Comissão de Administração da ……, era esta que tinha a obrigação de cobrar dos proprietários dos lotes a respetiva taxa e entregá-la ao Município, aceitando-se que a sua liquidação ocorreu na data em que foi deliberado pela Assembleia Municipal fixar tal taxa em €2.538.862,00 (05/04/2006).
Se o sujeito passivo dessa taxa era cada um dos proprietários estes não foram notificados pelo Município da liquidação da referida taxa nos quatro anos que se seguiram à data de 05/04/2006, pelo que ocorreu a caducidade da liquidação, o que efetivamente aconteceu com o oponente.
Aliás,
8ª – Seguindo a linha de raciocínio desenvolvida no douto acórdão sob recurso no sentido de que os proprietários eram representados pela Comissão de Administração da ….., era a esta que competia proceder à cobrança a cada um deles, na proporção do número de lotes de que eram titulares, da correspondente taxa, pelo que o oponente é parte ilegítima neste processo, o que se invoca.
Termos em que deverá ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência:
a) Deverá ser julgado incompetente, em razão da hierarquia, o Tribunal Central Administrativo Sul, para conhecer do recurso que para ele foi interposto pelo Município de Sesimbra, revogando-se o acórdão agora sob recurso;
b) Deverá ser mantida, embora com diferentes fundamentos, a douta sentença proferida pelo tribunal de 1ª instância.

Contra-alegou a recorrida, formulando conclusões em que pugna pela não admissibilidade do recurso ao abrigo do disposto no artigo 285º do CPPT e pelo seu não provimento.

Dá-se por reproduzido, para todos os legais efeitos, o probatório fixado no acórdão recorrido (fls. 271 a 288 dos autos)

Cumpre decidir da admissibilidade do recurso.

Dos pressupostos legais do recurso de revista.

O presente recurso foi admitido como recurso de revista excepcional, havendo, agora, que proceder à apreciação preliminar sumária da verificação in casu dos respectivos pressupostos da sua admissibilidade, ex vi do n.º 6 do artigo 285.º do CPPT.

Dispõe o artigo 285.º do CPPT, sob a epígrafe “Recurso de Revista”:
1 - Das decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo, quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
2 - A revista só pode ter como fundamento a violação de lei substantiva ou processual.
3 - Aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, o tribunal de revista aplica definitivamente o regime jurídico que julgue adequado.
4- O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objeto de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova.
5- Na revista de decisão de atribuição ou recusa de providência cautelar, o Supremo Tribunal Administrativo, quando não confirme a decisão recorrida, substitui-a por acórdão que decide a questão controvertida, aplicando os critérios de atribuição das providências cautelares por referência à matéria de facto fixada nas instâncias.
6- A decisão quanto à questão de saber se, no caso concreto, se preenchem os pressupostos do n.º 1 compete ao Supremo Tribunal Administrativo, devendo ser objeto de apreciação preliminar sumária, a cargo de uma formação constituída por três juízes de entre os mais antigos da Secção de Contencioso Tributário

Decorre expressa e inequivocamente do n.º 1 do transcrito artigo a excepcionalidade do recurso de revista em apreço, sendo a sua admissibilidade condicionada não por critérios quantitativos mas por um critério qualitativo – o de que em causa esteja a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito – devendo este recurso funcionar como uma válvula de segurança do sistema e não como uma instância generalizada de recurso.
E, na interpretação dos conceitos a que o legislador recorre na definição do critério qualitativo de admissibilidade deste recurso, constitui jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal Administrativo - cfr., por todos, o Acórdão deste STA de 2 de abril de 2014, rec. n.º 1853/13 -, que «(…) o preenchimento do conceito indeterminado de relevância jurídica fundamental verificar-se-á, designadamente, quando a questão a apreciar seja de elevada complexidade ou, pelo menos, de complexidade jurídica superior ao comum, seja por força da dificuldade das operações exegéticas a efectuar, de um enquadramento normativo especialmente intricado ou da necessidade de concatenação de diversos regimes legais e institutos jurídicos, ou quando o tratamento da matéria tem suscitado dúvidas sérias quer ao nível da jurisprudência quer ao nível da doutrina. Já relevância social fundamental verificar-se-á quando a situação apresente contornos indiciadores de que a solução pode constituir uma orientação para a apreciação de outros casos, ou quando esteja em causa questão que revele especial capacidade de repercussão social, em que a utilidade da decisão extravasa os limites do caso concreto das partes envolvidas no litígio. Por outro lado, a clara necessidade da admissão da revista para melhor aplicação do direito há-de resultar da possibilidade de repetição num número indeterminado de casos futuros e consequente necessidade de garantir a uniformização do direito em matérias importantes tratadas pelas instâncias de forma pouco consistente ou contraditória - nomeadamente por se verificar a divisão de correntes jurisprudenciais ou doutrinais e se ter gerado incerteza e instabilidade na sua resolução a impor a intervenção do órgão de cúpula da justiça administrativa e tributária como condição para dissipar dúvidas – ou por as instâncias terem tratado a matéria de forma ostensivamente errada ou juridicamente insustentável, sendo objectivamente útil a intervenção do STA na qualidade de órgão de regulação do sistema.».

Vejamos, pois.
Como claramente resulta da norma acima citada, o recurso de revista é um recurso excepcional, sujeito ao preenchimento de rigorosos requisitos, relativamente aos quais o recorrente deve na sua alegação de recurso demonstrar o seu preenchimento.
Lidas atentamente as alegações e conclusões do seu recurso, em momento algum o recorrente tenta ou demonstra querer alegar matéria de facto ou de direito que permita concluir pelo preenchimento de tais requisitos.
Não cabe ao Supremo tribunal substituir-se ao recorrente na demonstração, ainda que perfunctória, de tais requisitos, pelo que, tanto basta para que o recurso não possa ser admitido.
No entanto, sempre se dirá, que o recorrente nem sequer ensaia uma argumentação incisiva no tocante ao decidido pelo TCA Sul, bastando-se, no essencial, com a repetição de argumentos e fundamentos já esgrimidos nas peças processuais que foram produzidas nos autos, o que não basta, naturalmente para o preenchimento de tais requisitos.
Assim, o recurso não é admissível.

Termos em que, face ao exposto, acorda-se em não admitir o presente recurso de revista, por não se mostrarem preenchidos, nem sequer alegados, os respectivos pressupostos legais.
Custas do incidente pelo recorrente.
D.n.

Lisboa, 16 de Setembro de 2020. – Aragão Seia (relator) – Isabel Marques da Silva – Francisco Rothes.