Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0268/10
Data do Acordão:07/14/2010
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:JORGE DE SOUSA
Descritores:IRC
REGIME SIMPLIFICADO DE TRIBUTAÇÃO
Sumário:I - Tendo o contribuinte de IRC optado, na declaração de início de actividade, pela tributação segundo o regime geral, nos termos do art. 53.º, n.º 7, alínea a) e 8 do CIRC, na redacção dada pela Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro, a opção é válida por um período de três exercícios.
II - Assim, o facto de o contribuinte, no primeiro ano de actividade ter obtido proveitos inferiores a € 149.639,37, não permite à Administração Tributária efectuar a determinação da matéria colectável desse ano segundo o regime simplificado.
Nº Convencional:JSTA00066535
Nº do Documento:SA2201007140268
Data de Entrada:03/31/2010
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TAF LEIRIA PER SALTUM.
Decisão:PROVIDO.
Área Temática 1:DIR FISC - IRC.
Legislação Nacional:CIRC88 NA REDACÇÃO DO DL 198/2001 DE 2001/07/03 ART53 N1 N7 A N8.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1 – A…, LDA, impugnou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria uma liquidação de IRC, relativa ao ano de 2003.
Aquele Tribunal julgou improcedente a impugnação.
Inconformada, a Impugnante interpôs o presente recurso para este Supremo Tribunal Administrativo, apresentando alegações com as seguintes conclusões:
A) - A douta sentença recorrida fez errado julgamento da matéria de direito, mais concretamente quanto ao regime de determinação do lucro tributável, entendendo que é insusceptível fazer uma “opção expressa pelo regime geral” pelo período de três exercícios, no ano do início da actividade, sempre que nesse ano, por imperativo legal, o enquadramento seja o do regime geral.
B) - Em sede de IRC, a tributação segundo o regime simplificado é facultativa, nos termos do art.º 53º do CIRC.
C) - De acordo com tal disposição os sujeitos passivos são enquadrados nos dois anos seguintes ao do início de actividade no regime geral da contabilidade organizada, caso na declaração de início de actividade optem pelo regime geral, em conformidade com a alínea a) do n º 7 do artigo 53º do CIRC.
D) - Assim, o contribuinte que opte, na declaração de início de actividade, pelo apuramento do lucro tributável segundo o regime geral (contabilidade organizada), adopta um comportamento válido e vinculante para a administração tributária, e que é válida por um período de três exercícios (cfr. nº 7 e n.º 8 do referido artº 53º).
E) - E tal opção de tributação pelo regime geral é um comportamento que produz sempre efeitos, mesmo que, no ano de início da actividade, o sujeito passivo fique enquadrado, face ao valor estimado de vendas, por imposição legal no regime geral e nesse ano se verifique, a posteriori, aquando do apuramento do resultado do exercício que o total dos proveitos ficou aquém do montante mencionado no n.º 1 do art.º 53º do CIRC (€ 149.639,37).
F) - Termos em que, a douta sentença recorrida violou o disposto na alínea a) do n.º 7 e no n.º 8 do artigo 53º do CIRC, bem como o nº 2 do art.º 104º da CRP.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente, em virtude de ser relevante a opção feita na declaração de início de actividade quanto ao regime de tributação, e em consequência ser revogada a douta sentença recorrida e ordenada a baixa do processo para ser proferida nova sentença, na qual venham a ser apreciados os factos relativos à opção da recorrente pelo regime geral de determinação do lucro tributável.
Não foram apresentadas contra-alegações.
O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer nos seguintes termos:
O sujeito passivo formalizou a opção pelo regime geral de determinação do lucro tributável na sede própria: declaração de início de actividade em 26.02.2002 (art.53º nº 7 al. a) CIRC)
Ainda que os proveitos obtidos no exercício de 2003 tenham sido inferiores aos estimados, situando-se abaixo do limite legal de € 149 639,37,a sua sujeição ao regime geral subsiste:
a) por via da opção formulada na declaração de início de actividade (art.53º nº 2 in fine CIRC)
b) pela imperatividade da validade da opção por um período de três exercícios, findo qual caduca, excepto se o sujeito passivo manifestar a intenção de renovar a opção pela forma adequada (art. 53º nº 8 CIRC)
A interpretação propugnada ancora-se em jurisprudência consolidada do STA (acórdãos STA — SCT 22.04.2009 processo nº 1114/08; 1.03.2009 processo nº 831/08; 10.12.2008 processo nº 874/08; 18.06.2008 processo nº 205/08; 21.05.2008 processo nº 10/08)
CONCLUSÃO
O recurso merece provimento.
A sentença impugnada deve ser revogada e substituída por acórdão declaratório da
procedência da impugnação judicial, com as consequências legais.
As partes foram notificadas deste douto parecer e nada vieram dizer.
Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
2 – Na sentença recorrida deu-se como assente a seguinte matéria de facto:
a) Em 20/06/2002 a impugnante apresentou declaração de início de actividade, com início em 01/07/2002, estimando, para efeitos de enquadramento em sede IRC, proveitos no valor total anual de € 300.000,00 (fls. 37 a 40)
b) A impugnante no período de tributação de 2003-01-01 a 2003-12-31, apresentou declaração de rendimentos de IRC, modelo 22, cujo apuramento da matéria colectável foi efectuado pelas regras do regime simplificado (fls. 32 a 35);
c) No anexo B do referido modelo 22, é indicado como lucro tributável o valor total de € 78.496,30 (fls. 35);
d) De acordo com a declaração de rendimentos, modelo 22, apresentada pela impugnante, nos termos referidos nas alíneas b) e c), a administração tributária procedeu à liquidação do IRC, do ano de 2003 (fls. 9);
e) De acordo com a nota de liquidação de IRC do ano de 2003, notificada à impugnante, a data limite para pagamento do imposto liquidado seria em 22/11/2006 e o valor a pagar de € 14.030,06 (fls. 9);
f) A presente impugnação deu entrada na secretaria do TAF de Leiria no dia 06/12/2006 (cfr, carimbo aposto na petição inicial de fls. 2).
3 – A questão que é objecto do presente recurso jurisdicional é a de saber se a Recorrente deve ser tributada segundo o regime simplificado ou o regime geral de IRC, relativamente ao ano de 2003.
A Recorrente, quando apresentou a declaração de início de actividade, em 2002, indicou 300.000 € como valor estimado do volume anual de vendas.
Nesse ano, porém, o montante dos proveitos declarados pela Recorrente foi de 76.978,29 euros ( Embora este facto não tenha sido incluído no probatório, é dado como assente na sentença recorrida, a fls. 55. ), não atingindo, assim, o valor de 149 639,37 euros, referido no art. 53.º, n.º 1, do CIRC, na redacção dada pelo DL n.º 198/2001, de 3 de Julho.
A Administração Tributária, sem que a Recorrente tivesse efectuado opção explícita por tributação nos termos do regime simplificado, fixou a matéria tributável de 2003 de harmonia com as regras deste regime.
Na sentença recorrida, entendeu-se que a declaração de proveitos em montante inferior ao valor de 149,639,37 euros, determina o «automático enquadramento no regime simplificado, dado que não veio expressar a sua opção pelo regime geral».
4 – A Recorrente, nas suas alegações, afirma ter optado, na declaração de início de actividade, pela tributação em IRC segundo o regime geral de determinação do lucro tributável.
Através da cópia da referida declaração, que consta de fls. 37 a 40, cuja autenticidade se tem de considerar provada, em face da remissão que para tais folhas se faz na alínea a) do probatório, constata-se que, efectivamente, a Recorrente assinalou a sua opção pelo regime geral de determinação do lucro tributável de IRC (ponto 19, a 39). ( Trata-se, de resto, de documento que foi junto ao processo pela Excelentíssima Representante da Fazenda Pública, com a sua contestação. )
Assim, em face daquela remissão feita no probatório para fls. 39, que tem implícito o reconhecimento de que a referida declaração tem o teor que a sua cópia junta aos autos apresenta, tem de se dar como assente que na declaração de início de actividade foi formulada a opção pelo regime geral de determinação do lucro tributável.
De harmonia com o disposto na alínea a) do n.º 7 do art. 53.º do CIRC, na redacção dada pelo DL n.º 198/2001, de 3 de Julho, «a opção pela aplicação do regime geral de determinação do lucro tributável deve ser formalizada pelos sujeitos passivos: a) Na declaração de início de actividade».
E, por força do disposto no n.º 8 do mesmo art. 53.º, na redacção da Lei n.º 109-B/2001, de 27 de Dezembro, «a opção referida no número anterior é válida por um período de três exercícios, findo o qual caduca, excepto se o sujeito passivo manifestar a intenção de a renovar pela forma prevista na alínea b) do número anterior».
O facto de a Recorrente, no ano de 2002, ter obtido proveitos inferiores a € 149.639,37, não tem qualquer consequência no que concerne ao regime de tributação em IRC, pois, efectuada aquela opção, ela é válida por três anos, como resulta deste n.º 8 do art. 53.º.
De resto, mesmo que a Recorrente tivesse estimado, na declaração de início de actividade, proveitos inferiores a € 149.639,37, não havia qualquer obstáculo a que fosse tributada pelo regime geral, pois, como resulta da parte final do n.º 1 do referido art. 53.º, mesmo os contribuintes que estivessem condições de serem tributados pelo regime simplificado, podiam optar por afastar este regime.
Assim, tem de se concluir que foi ilegal a actuação da Administração Tributária ao determinar da matéria tributável de IRC da Recorrente no ano de 2003, segundo as regras do regime simplificado.
Termos em que acordam em
– conceder provimento ao recurso jurisdicional;
– revogar a sentença recorrida;
– julgar procedente a impugnação;
– anular o acto de liquidação impugnado, por vício de violação de lei.
Custas pela Fazenda Pública na 1.ª instância.
Sem custas neste Supremo Tribunal Administrativo, por a Fazenda Pública não ter contra-alegado [art. 2.º, n.º 1, alínea g), do CCJ].
Lisboa, 14 de Julho de 2010. – Jorge de Sousa (relator) – Jorge Lino – Pimenta do Vale.