Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0935/16
Data do Acordão:10/12/2016
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO DELGADO
Descritores:PRESCRIÇÃO
SUSPENSÃO DA PRESCRIÇÃO
CADUCIDADE DE GARANTIA
Sumário:I - O art. 183.º-A, aditado ao CPPT pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, passou a permitir aos interessados obter a declaração de caducidade da garantia prestada pelo contribuinte ou constituída pela Administração Tributária, sem perder o efeito suspensivo da execução, se a reclamação graciosa em que fosse discutida a legalidade da liquidação não fosse decidida no prazo de um ano ou a impugnação judicial em que fosse discutida essa legalidade não estivesse decidida, em 1.ª instância, no prazo de dois anos (ulteriormente alterado para três anos pela Lei n.º 30-B/2002, de 30 de Dezembro, que aprovou o Orçamento do Estado para 2003), a contar da sua apresentação, prazos que eram acrescidos de seis meses caso houvesse lugar à produção de prova pericial.
II - Caducada a garantia o processo de execução fiscal continuava suspenso, mesmo sem garantia, até ao momento em que estaria se a garantia se mantivesse, ou seja, até à decisão do pleito.
III - Da norma contida no nº 3 do art. 49º da LGT, conjugada com a norma legal que define o regime da suspensão da execução fiscal (art. 169º do CPPT), resulta que o efeito suspensivo da execução fiscal não é consequência directa e imediata da instauração da reclamação, impugnação ou recurso, nem é consequência directa e imediata da prestação de garantia; o que determina o efeito suspensivo da execução – e, por consequência, o efeito suspensivo da prescrição – é a instauração de reclamação, impugnação ou recurso, quando acompanhada ou seguida da constituição ou prestação de garantia idónea, da autorização da sua dispensa, ou da penhora de bens que garantam o pagamento integral da quantia exequenda e do acrescido.
Nº Convencional:JSTA00069845
Nº do Documento:SA2201610120935
Data de Entrada:07/20/2016
Recorrente:A......., S.A,
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF SINTRA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL.
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART183-A N2 N3 ART235 ART169 N1.
L 15/2001 DE 2001/06/05.
L 53-A/2006.
LGT98 ART49 N3.
CONST76 ART18 N2.
Jurisprudência Nacional:AC STAPLENO PROC0660/14 DE 2015/01/21.; AC STA PROC01479/12 DE 2013/02/06.; AC STA PROC0364/12 DE 2012/04/26.; AC STA PROC1332/13 DE 2013/09/18.
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO 6ED VOLIII PAG342
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – A ………, S.A, melhor identificada nos autos vem recorrer para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou improcedente a reclamação por ela deduzida contra o despacho do chefe de Finanças de Oeiras, proferido no âmbito do processo de execução fiscal nº 3522200201882791, o qual indeferiu o pedido de reconhecimento da prescrição referente a dívidas de IRC do exercício de 1997.

Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

«A. O presente recurso é interposto da douta sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, no âmbito do processo de reclamação da decisão do órgão de execução fiscal n.º 3641/1S.8BESNT.
B. A reclamação teve como objecto a decisão de indeferimento do pedido de reconhecimento de prescrição da dívida tributária respeitante a IRC, do ano de 1997, proferida pelo Exmo. Chefe do Serviço de Finanças de Oeiras — 3 — Algés, cuja cobrança coerciva se pretende efectuar à Recorrente ao abrigo do processo de execução fiscal n.º 35222002001882791.
C. O Mmo Juiz a quo decidiu pela improcedência da reclamação, seguindo o entendimento vertido nos Acórdãos de 23.01.2013 e 26.02.2014, processos n.º 01500/12 e 01718/13, respetivamente, do douto Supremo Tribunal Administrativo, julgando “ainda que tenha sido declarada a caducidade da garantia nos processos mantêm-se suspensos ao abrigo do artigo 169.º do CPPT, e até decisão de pleito. O facto de o despacho que reconhece a caducidade da garantia considerar que os pressupostos para esse reconhecimento já se encontravam preenchidos em momento anterior não revela no que à contagem do prazo prescricional concerne.".
D. Concluindo, “Assim, tendo presente que a suspensão da execução fiscal se prolongou de 27.03.2003 até ao dia 15.05.2014, e que a contagem do prazo prescricional teve o seu início no dia 28.11.2002 (data da citação) é evidente que na presente data ainda não decorreu o prazo de 8 anos previsto no artigo 48.º n.º 1 da LGT, razão pela qual se deve julgar improcedente a reclamação.".
E. Acontece que, a sentença, ora em apreciação, encontra-se viciada por erro na aplicação do Direito aos factos assentes, nomeadamente pela violação das normas jurídicas dos artigos 304.º do Código Civil, 48.º, 49.º e 52.º todos da LGT e 169.º do CPPT, que deveriam ter sido interpretadas e aplicadas no sentido da procedência da reclamação.
F. O pedido de reconhecimento de prescrição da dívida tributária respeita a IRC, do ano de 1997.
G. Com efeito, o IRC é um imposto periódico, uma vez que assenta num facto tributário de carácter duradouro (cfr. entre outros, acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, processo n.º 02970/09, de 27.09.2011).
H. A importância da distinção entre impostos periódicos e de obrigação única, prende-se essencialmente com questões relacionadas com a caducidade do direito à liquidação (cfr. artigo 45º da LGT) e da prescrição das dívidas tributárias (cfr. artigo 48º da LGT).
I. No caso concreto, estando em apreciação a revogação da decisão recorrida que improcedeu a reclamação apresentada contra a decisão de indeferimento do pedido de reconhecimento da prescrição da dívida tributária de IRC do ano de 1997, cuja cobrança coerciva se pretende efectuar à Recorrente, através do processo de execução fiscal n.º 35222002001882791, há que atender ao disposto nos artigos 48.º e 49.º da LGT.
J. Prevê o artigo 48.º, n.º 1 da LGT, na sua redacção actual, aplicável ao caso concreto, que “As dívidas tributárias prescrevem, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos contados, nas impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário (...)." (negritos nossos).
K. E, prevê o artigo 49.º do mesmo diploma, na redacção do Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro, que aqui nos interessa, “1 - A reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo interrompem a prescrição. 2 - A paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito previsto no número anterior, somando- se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação. 3 - O prazo de prescrição legal suspende-se por motivo de paragem do processo de execução fiscal em virtude de pagamento ou prestação legalmente autorizada, ou de reclamação, impugnação ou recurso.” (negritos nossos).
L. Ora, tendo em conta o imposto periódico de IRC, do ano de 1997, de acordo com o artigo 48º nº 1 da LGT, o facto tributário verifica-se a 01.01.1998.
M. Contudo, uma vez que a Recorrente apresentou impugnação judicial contra a liquidação deste imposto a 02.12.2002, conforme facto assente pelo Tribunal o quo (n.º 3), de acordo com n.º 1 do artigo 49.º da LGT, dá-se por interrompida a prescrição nessa data.
N. Sucede que, de acordo com os factos assentes pelo Tribunal o quo mais concretamente ao vertido no n.º 11, entre 02.12.2003 e 01.02.2007 o processo de impugnação esteve sem tramitação por razões não imputáveis à Recorrente.
O. Assim, de acordo com o n.º 2 do artigo 49.º da LGT, a interrupção da prescrição gerada pela impugnação da liquidação de IRC do ano de 1997, uma vez que aquele processo esteve parado por período superior a um ano por facto não imputável à Recorrente, transforma-se em suspensão do prazo de prescrição, fazendo “cessar o efeito previsto no número anterior [nº 1], somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação” (cfr. artigo 49.º n.º 2 da LGT).
P. Há que ter ainda em conta, para efeitos de prescrição da prestação tributária em causa, que o processo de execução fiscal em referência ficou suspenso em 27.03.2003, por efeito da prestação de garantia, nos termos do artigo 169.º do CPPT, de acordo com despacho proferido pelo Exmo. Chefe do Serviço de Finanças de Oeiras - 3 - Algés, e que em 05.03.2014 foi proferido despacho no processo de impugnação no sentido de caducidade de garantia com efeitos a partir de 31.12.2006 (cfr. factos assentes pelo Tribunal a quo n.º 4 a 8).
Q. Nestes termos, o Mmo Juiz o quo deveria ter tido em conta o período ocorrido entre o dia 01.01.1998 e o dia 02.12.2002, aquele como sendo a data da ocorrência do facto tributário e este como a data da apresentação da impugnação judicial, que perfaz 1.796 dias, e o período entre o dia 01.01.2007 — data em que foi determinada a caducidade da garantia prestada no âmbito do PEF n.º 35222002001882791, aqui em causa, e o dia 30.01.2010, face ao disposto no artigo 49º, n.º 3 da LGT, perfazendo 1.126 dias - data em que, somados aqueles dois períodos, perfaz os oitos anos do prazo prescricional, ou seja, 2.922 dias (contando com mais dois dias, atendendo que dois dos anos dentro dos 8 são bissextos).
R. Caso assim não se entenda, o que por mera hipótese de raciocínio académico se admite, podemos considerar como data de prescrição da dívida tributária de IRC do ano de 1997, 31.01.2011, considerando a entrada em vigor da LGT no dia 01.01.1999, diploma que se aplica ao caso sub judice, da seguinte forma: 01.01.1999 data de início da contagem do prazo de prescrição da dívida aqui em causa e 01.01.2007 data em que foi determinada a caducidade da garantia prestada, tendo decorrido 1.431 dias, desta data até 31.01.2011 acrescem 1.491 dias, perfazendo nesta data em que se perfaz os oito anos do prazo prescricional.
S. Ainda assim, caso não se entenda, o que por mera hipótese de raciocínio académico se admite, podemos considerar como data de prescrição da dívida tributária de IRC em causa 04.09.2014. Isto é, início do prazo de prescrição o dia 28.11.2002 (citação suspendendo-se em 27.03.2003, data de suspensão do processo de execução fiscal face à prestação da garantia e impugnação judicial desde 02.12.2002, perfazendo 119 dias. Acresce o período entre 01.01.2007, data da caducidade da garantia e consequente prosseguimento do processo de execução fiscal a 04.09.2014, que decorreriam mais 2.803 dias. Somados estes dois períodos, perfaz nesta data oitos anos respeitantes ao prazo de prescrição das dívidas tributárias.
T. Seja como for, entende a Recorrente que, independentemente da forma de contagem do prazo prescricional acima apresentado, é manifesto que a dívida tributária relativa a IRC do ano de 1997, cujo pagamento se pretende obter da Recorrente através do processo de execução fiscal n.º 35222002001882791, já prescreveu.
U. Acresce que, não podemos de todo ainda acompanhar o entendimento do Mmo Juiz a quo segundo o qual “ainda que tenha sido declarada a caducidade da garantia os processos mantêm-se suspensos ao abrigo do artigo 169.º do CPPT, e até à decisão do pleito”.
V. Porquanto, prevê o n.º 1 do artigo 169.º do CPPT que “A execução fica suspensa até à decisão do pleito em caso de reclamação graciosa, a impugnação judicial ou recurso judicial que tenham por objecto a legalidade da dívida exequenda bem como durante os procedimentos de resolução de diferendos no quadro da Convenção de Arbitragem n.º 90/436/CEE, de 23 de Julho, relativa à eliminação da dupla tributação em caso de correcção de lucros entre empresas associadas de diferentes Estados membros, desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195.º ou prestada nos termos do artigo 199.º ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido, o que será informado no processo pelo funcionário competente. “.
W. No mesmo sentido vai o artigo 52.º da LGT, sob a epígrafe “Garantia da cobrança da prestação tributária”.
X. Assim sendo, a posição assumida pelo Mmo Juiz a quo — a caducidade da garantia operada e reconhecida judicialmente a 31.12.2006, não tem relevância prática no que toca ao prazo de prescrição em discussão nos presentes autos— é de manifesta violação do disposto no artigo 169.º do CPPT.
Y. Isto porque, a suspensão do processo de execução fiscal apenas se verifica enquanto perdurar, no caso em apreço, a impugnação judicial associada e complementada com a prestação da garantia que a norma exige para o efeito.
Z. Por outras palavras, caso não se verifique um dos pressupostos legais da suspensão da execução (pagamento em prestações autorizado, reclamação graciosa, impugnação judicial, ou recurso que ponham em causa a legalidade da dívida, ou se oposição à execução que questione a sua exigibilidade, e constituição de garantia idónea) também não se verificará a suspensão do prazo de prescrição.
AA. Na verdade, só esta interpretação permite que se assegurem os princípios basilares do instituto da prescrição, nomeadamente, o da segurança e certeza jurídica. Ademais, se assim não fosse o instituto da prescrição, o credor tributário teria direito à cobrança da dívida tributária por tempo indeterminado.»

2 – Não foram apresentadas contra alegações.

3 – O Exmº Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal Administrativo emitiu parecer fundamentado parecer no sentido do não provimento do recurso

4 - Com dispensa de vistos, cumpre decidir.

5 – No Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra foram dados como provados e com interesse para a decisão os seguintes factos:
1 - Em 2002-11-18 foi instaurado contra a ora Reclamante o Processo de Execução Fiscal n.º 3522200201882791, por dívida de IRC do ano de 1997;
2 - Em 2002-11-28 foi a executada citada para a execução fiscal;
3 - Em 2002-12-02 foi pela ora Reclamante interposta Impugnação Judicial relativamente à liquidação de IRC cujo não pagamento subjaz aos presentes autos de execução e que tramitou pelo TAF de Sintra com o n.º 169/02 — 23 25;
4 - Em 2002-12-26 veio a ora Reclamante solicitar a indicação do montante do cálculo de garantia a prestar, para suspensão do PEF ao abrigo do artigo 169.° do CPPT;
5 - Em 2003-01-09 foi fixado o valor de € 332.072,04 para suspensão dos autos através da prestação de garantia;
6 - Em 2003-01-24 deu entrada no Serviço de Finanças de Oeiras 3, requerimento nomeando à penhora, para suspensão dos autos de execução, o Prédio Urbano Sito na Freguesia de ........, correspondente ao artigo n.º 1779;
7 - Em 2003-03-27, foram efectuados as penhoras de 2 Imóveis e a respectiva suspensão do PEF;
8 - Em 2014-03-05, foi proferido despacho no referido processo de impugnação declarando a caducidade da garantia, aí se referindo que: “Estando os efeitos revogatórios do preceito cingidos ao futuro, e verificando-se que em 31 de Dezembro de 2006 já se encontravam preenchidos os legais pressupostos para o reconhecimento da caducidade das penhoras, não resta senão proceder, conforme requerida, à sua declaração”;
9 - Em 2014-04-29 foi proferida sentença no processo de impugnação n.º 169/02 — 2J 2S, tendo a mesma sido julgada improcedente, decisão que transitou em julgado em 2014-05-15;
10 - Por despacho de 15-06-2015 o Chefe do Serviço de Finanças de Oeiras 3 indeferiu pedido de extinção dos autos executivos formulado pela ora Reclamante, por considerar não se verificar a prescrição da dívida exequenda, despacho e informação sobre o qual recaiu que aqui se dão por reproduzidos;
11 - Entre 02-12-2003 e 01-02-2007 (data da apresentação de requerimento para reconhecimento da caducidade da garantia) o processo de impugnação identificado em 3. esteve sem tramitação, por razão não imputável à aí Impugnante.

6- Do mérito do recurso
6.1 Da questão a decidir
Da análise do segmento decisório da sentença e dos fundamentos invocados pelo recorrente para pedir a sua alteração, podemos concluir que o objecto do recurso consiste em saber se padece de erro de julgamento sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que indeferiu a reclamação apresentada contra o despacho do chefe do Serviço de Finanças de Oeiras - 3 que não reconheceu a prescrição das dívidas exequendas no âmbito do processo de execução fiscal nº 3522200201882791.
No caso em apreço está em causa dívida de IRC referente ao exercício de 1997.
No segmento em que apreciou a prescrição considerou o Tribunal recorrido ser aplicável o regime da prescrição previsto na LGT.
Prosseguindo considerou a decisão sindicada que a citação da executada em 2002-11-28 interrompeu a contagem do prazo prescricional, prazo este que voltou a sofrer o efeito interruptivo decorrente da dedução de impugnação judicial em 02.12.2002.
Considerou ainda o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que em 27.03.2003 foi suspensa a execução fiscal na sequência das penhoras efectuadas (artigo 169.° do CPPT), suspensão essa que se manteve até ao dia 15.05.2014 (data do trânsito em julgado da sentença que julgou improcedente a impugnação).
E que, pese embora tenha sido declarada a caducidade da garantia os processos mantêm-se suspensos ao abrigo do artº 169º do CPPT até à decisão do pleito.
Neste contexto concluiu a sentença recorrida que, tendo presente que a suspensão da execução fiscal se prolongou de 27.03.2003 até ao dia 15.05.2014, e que a contagem do prazo prescricional teve o seu início no dia 28.11.2002 (data da citação) não decorreu ainda o prazo de prescrição de 8 anos previsto no artigo 48.º n.º 1 da LGT.

Não conformado com o assim decidido alega o Recorrente que a sentença recorrida, ao manter o acto reclamado, que não reconheceu a prescrição da dívida tributária, referente a IRC do ano de 1997, violou os artigos 169° do CPPT e 48°, 49° e 52° da LGT.
Sustenta em síntese que a caducidade da garantia, declarada com efeitos a partir de 31-12-2006, por inércia da AT, fez cessar a suspensão da execução e, do mesmo passo, a suspensão da prescrição, pelo que a dívida estava prescrita, ao contrário do que foi decidido.
Argumenta a recorrente que a posição assumida sentença recorrida de que a caducidade da garantia, operada e reconhecida judicialmente a 31.12.2006, não tem relevância prática no que toca ao prazo de prescrição em discussão nos presentes autos, viola o disposto no artigo 169.º do CPPT.
Isto porque, em sua tese, a suspensão do processo de execução fiscal apenas se verifica enquanto perdurar, no caso em apreço, a impugnação judicial associada e complementada com a prestação da garantia que a norma exige para o efeito.

6.2 Carece no entanto a recorrente de razão legal.
Vejamos.
No caso vertente resulta do probatório (ponto 8) que por despacho de 05.03.2014, de que se encontra junta cópia a fls. 50/51 dos presentes autos, a Mmª Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra declarou a caducidade das garantias (penhoras) prestadas em 2003 para suspensão da execução em causa, com base no disposto nos arts. 183º A, ns. 2 e 3 e 235º do CPPT, na redacção anterior à Lei nº 53-A/2006, considerando que em 31.12.2006 já se encontravam preenchidos os pressupostos legais para o reconhecimento da caducidade de tais penhoras (que à data, por força da remissão do nº 1 do artº 235º do CPPT, na redacção da Lei 15/2001, eram os previstos no artº 183º-A do mesmo diploma legal, com as necessárias adaptações).
Ora o art. 183.º-A, aditado ao CPPT pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, passou a permitir aos interessados obter a declaração de caducidade da garantia prestada pelo contribuinte ou constituída pela Administração Tributária, sem perder o efeito suspensivo da execução, se a reclamação graciosa em que fosse discutida a legalidade da liquidação não fosse decidida no prazo de um ano ou a impugnação judicial em que fosse discutida essa legalidade não estivesse decidida, em 1.ª instância, no prazo de dois anos (ulteriormente alterado para três anos pela Lei n.º 30-B/2002, de 30 de Dezembro, que aprovou o Orçamento do Estado para 2003), a contar da sua apresentação, prazos que eram acrescidos de seis meses caso houvesse lugar à produção de prova pericial.
Como refere LOPES DE SOUSA, em anotação ao referido preceito, nas situações “(…) em que os processos demorassem mais do que o previsto neste artigo, o processo de execução fiscal continuaria suspenso, mesmo sem garantia (Sublinhado nosso.), até ao momento em que estaria se a garantia se mantivesse, que é, como se refere no art. 169.º, n.º 1, do CPPT, o da «decisão do pleito»” (JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário, 6ª ed., Áreas Editora, 2011, volume III, anotação 3 ao art. 183.º-A, pág. 342.).
Também neste sentido, e sobre as normas em questão, a jurisprudência desta secção vinha afirmando que, caducada a garantia o processo de execução fiscal continuava suspenso, mesmo sem garantia, até ao momento em que estaria se a garantia se mantivesse, ou seja, até à decisão do pleito, não sendo devida qualquer outra garantia para obter o referido efeito suspensivo. (Cf. neste sentido Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 06.02.2013, recurso 1479/12 e de 26.04.2012, recurso 364/12, e de 18.09.2013, recurso 1332/13, in www.dgsi.pt.)
Não pode pois proceder a argumentação da recorrente no sentido de que a suspensão do processo de execução fiscal apenas se verifica enquanto perdurar, no caso em apreço, a impugnação judicial associada e complementada com a prestação da garantia que a norma exige para o efeito.
Aliás, salvo o devido respeito, e se bem entendemos a sua alegação, a recorrente parte do pressuposto errado de que o prazo prescricional estava suspenso em função da prestação da garantia.
Mas não é assim.
Como se esclarece no Acórdão do Pleno desta Secção de Contencioso Tributário de 21.01.2015, recurso 660/14, «da norma contida no nº 3 do art. 49º da LGT, conjugada com a norma legal que define o regime da suspensão da execução fiscal (art. 169º do CPPT), resulta, de forma clara e evidente, que o efeito suspensivo da execução fiscal não é consequência directa e imediata da instauração da reclamação, impugnação ou recurso, nem é consequência directa e imediata da prestação de garantia; o que determina o efeito suspensivo da execução – e, por consequência, o efeito suspensivo da prescrição – é a instauração de reclamação, impugnação ou recurso, quando acompanhada ou seguida da constituição ou prestação de garantia idónea, da autorização da sua dispensa, ou da penhora de bens que garantam o pagamento integral da quantia exequenda e do acrescido.
Assim sendo, penhorados bens suficientes para garantir a totalidade da obrigação tributária em cobrança coerciva e do acrescido, o processo executivo fica inevitavelmente suspenso até à decisão do pleito que tenha por objecto a discussão da legalidade dessa obrigação (no caso, até à decisão das respectivas impugnações judiciais), pois a cessação do efeito suspensivo não pode ocorrer sem que cesse o facto que o determinou.
E é durante esse período de paragem forçada do processo, ou melhor, de suspensão legal da execução, que o prazo de prescrição fica suspenso (Sublinhado nosso.)
A decisão recorrida, que se moveu nestes parâmetros, ao considerar que ocorreu suspensão do prazo prescricional de 27.03.2003 até ao dia 15.05.2014, em função da suspensão do processo de execução fiscal determinada pela pendência da impugnação judicial e da prestação da garantia, não merece censura.
Acresce referir, como bem nota o Exmº Procurador-Geral Adjunto, face aos alegados receios de perpetuidade do direito à cobrança da dívida tributária com a manutenção da suspensão da execução (e da suspensão da prescrição), apesar da caducidade da garantia que, no caso, tal não pode ocorrer uma vez que já está decidida a impugnação.
É certo que, em tese, como se deixou explicado no acórdão do Pleno desta Secção de 26/02/2014, no proc. nº 01426/13, citado pelo Ministério Público, «a manutenção do efeito suspensivo da prescrição (e da execução fiscal) até à decisão do pleito permite que, como alegado pela recorrente, as dívidas fiscais nunca prescrevam – bastando que, para tal, nunca fosse proferida qualquer decisão no âmbito do procedimento ou do processo no qual se discutisse a legalidade da dívida – o que significaria restringir, de forma desproporcionada, as garantias constitucionalmente protegidas dos contribuintes, justificadas por razões de certeza, segurança e paz jurídica (cf. artigo 18.º, n.º 2, da Lei Fundamental). O exemplo é, claro está, caricatural, porquanto não será expectável, nem admissível, que procedimentos ou processos tributários nunca venham a conhecer o seu termo.
Mas mesmo que assim fosse, a verdade é que nestas circunstâncias, também o credor tributário se veria indefinidamente na impossibilidade de cobrar o seu crédito, pois que a garantia prestada para suspender a execução na pendência do meio impugnatório da legalidade da dívida exequenda obsta ao prosseguimento daquela. E não há, parece-nos, nenhum direito constitucionalmente protegido a que as dívidas prescrevam, sobretudo quando não é por inércia do credor que não podem ser cobradas.» (fim de citação).

Neste contexto forçoso é concluir, com a decisão sindicada, que a obrigação tributária subjacente à dívida exequenda não está prescrita uma vez que a suspensão da execução fiscal se prolongou desde 27.03.2003 até ao dia 15.05.2014 e a citação da recorrente no processo de execução fiscal ocorrida em 28.11.2002, teve a virtualidade de interromper o prazo de prescrição.

Pelo exposto improcedem todos os fundamentos do recurso.

7. Decisão:

Nestes termos acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.

Custas pela recorrente.
Lisboa, 12 de Outubro de 2016. – Pedro Delgado (relator) – Fonseca Carvalho – Isabel Marques da Silva.