Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01019/09
Data do Acordão:12/09/2009
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:CADUCIDADE DE LIQUIDAÇÃO
PRAZO
CONTAGEM DE PRAZO
Sumário:A expressão “termo do prazo fixado para a sua conclusão” constante do n.º 5 do artigo 45.º da Lei Geral Tributária (na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho) deve ser interpretada como referente ao prazo - limite de 6 meses estabelecido no n.º 2 do artigo 36.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária, contando-se a partir da data em que este prazo de seis meses se perfizer o prazo especial de caducidade de seis meses previsto no n.º 5 do artigo 45.º da Lei Geral Tributária.
Nº Convencional:JSTA00066175
Nº do Documento:SA22009120901019
Data de Entrada:10/19/2009
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A...
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TT1 INST LISBOA PER SALTUM.
Decisão:PROVIDO.
Área Temática 1:DIR PROC FISC GRAC - LIQUIDAÇÃO.
Legislação Nacional:LGT98 ART45 N5 NA REDACÇÃO DA L 15/2001 DE 2001/06/05.
RGU COMPLEMENTAR DO PROCEDIMENTO DE INSPECÇÃO TRIBUTÁRIA APROVADO PELO DL 413/98 DE 1998/12/31 ART36 N2 ART61.
CCIV66 ART9 N1.
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA SOBRE A PRESCRIÇÃO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA NOTAS PRÁTICAS PAG17.
DIOGO LEITE DE CAMPOS E OUTROS LEI GERAL TRIBUTÁRIA COMENTADA E ANOTADA 3ED PAG209.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório -
1 –A Fazenda Pública recorre para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, de 9 de Junho de 2009, que julgando procedente a impugnação judicial deduzida por A…, Lda, com os sinais dos autos, contra liquidação adicional de IRC relativa ao exercício de 1998 no montante de € 47.500,45 determinou a sua anulação, para o que apresentou as conclusões seguintes:
I – A douta sentença, ora recorrida, julgou procedente a impugnação à margem referenciada com as consequências aí sufragadas, e consequentemente, determinou a anulação da liquidação adicional de IRC n.º 8310002173 referente ao exercício de 1998.
II – Destarte, salvo o devido respeito, somos da opinião que o douto Tribunal “ad quo” esteou a sua fundamentação na errónea interpretação do n.º 5 do Art.º 45.º da LGT e n.º 2 do Art. 36.º do RCPIT, e concomitantemente, na errada análise e contagem do prazo de caducidade, em manifesta violação do disposto no Art.º 61.º do RCPIT.
III – Efectivamente, a disciplina da caducidade do direito à liquidação dos impostos em geral, prevista no Art.º 45.º da Lei Geral Tributária (LGT), com entrada em vigor em 1.1.10996 (cfr. art.º 6.º do Dec.-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro) tem sido sujeita a diversas alterações, importando por isso, desde logo, determinar qual a redacção vigente ao tempo em que tal prazo de caducidade se iniciou, como lei vigente aplicável, no âmbito do princípio “tempus regit actum”.
IV – Neste pendor, e por virtude do aditamento do n.º 5 do Art.º 45.º da LGT, a caducidade do direito à liquidação poderá ocorrer por uma dupla via: ou pelo decurso do prazo geral contido na norma do seu n.º 1 (4 anos); ou o prazo, em regra mais curto, de 6 meses, a contar do termo do prazo fixado para a conclusão da inspecção tributária.
V – A alteração introduzida Lei n.º 15/01, de 5 de Junho que aditou o n.º 5 do Art. 45.º da LGT, dispunha que “Instaurado o procedimento de inspecção tributária, o direito de liquidar os tributos incluídos no âmbito da inspecção caduca no prazo de seis meses após o termo do prazo fixado para a sua conclusão, sem prejuízo das prorrogações previstas na lei reguladora daquele procedimento, a não ser que antes ocorra a caducidade prevista no prazo geral fixado no n.º 1”.
VI – Acerca do regime de transição, preceituava o disposto no Art.º 11º da mencionada lei que “Relativamente a processos pendentes, os prazos definidos (…) no n.º 5 do artigo 45º da Lei Geral Tributária, são contados a partir da entrada em vigor da presente lei”, sendo que, a Lei nº 15/01 teve o seu início de vigência 30 dias após a sua publicação, logo, no dia 15.7.2001, nos termos do disposto no Art.º 12º.
VII – Ora, o disposto no n.º 5 do Art. 45.º da LGT, prescrevia que “o direito de liquidar os tributos incluídos no âmbito da inspecção caduca no prazo de seis meses após o termo do prazo fixado para a sua conclusão”, importando relevar se a liquidação foi efectuada dentro ou para além do prazo de seis meses contado do prazo também de seis meses fixado para a conclusão do procedimento inspectivo, não relevando aqui o regime transitório definido no art. 11.º da Lei n.º 15/2001.
VIII – Efectivamente, de acordo com a redacção original dos artigos 45.º e 46.º da LGT, para a determinação do “dies a quo” do prazo de caducidade do direito à liquidação, bem como da sua dimensão, era irrelevante a ocorrência de qualquer acção de inspecção, esta só valia como causa suspensiva desse prazo, o qual se suspendia com a notificação ao contribuinte do início da acção de inspecção (a este propósito veja-se o Acórdão do TCAN referente ao Proc. n.º 00040/03 datado de 24.01.2008).
IX – Ora, a Lei nº 15/01, de 05/06 a que já se aludiu, veio introduzir alterações aos artigos 45.º e 46.º da LGT, sendo que no que respeita ao Art.º 45º, na redacção que lhe foi dada pelo Art.º 8.º da referida Lei n.º 15/01, que lhe aditou o n.º 5, passou a estatuir que, a caducidade opera decorridos que sejam seis meses após o termo do prazo fixado para a sua conclusão, termo este que é também de seis meses contados da notificação do seu início – cfr. art. 36.º, n.º 2, do RCPIT.
X – Ora, na situação sub iudicio, o imposto em causa é IRC, referente ao exercício de 1998 e a liquidação foi efectuada em 28.02.2002 e notificada em 15.03.2002, pelo que, nessa data, não estavam decorridos os quatro anos que a lei estabelece como limite.
XI – Na verdade, no Art. 45.º, n.º 5, da LGT, o único prazo que aí está fixado, é o de caducidade, uma vez que o prazo para a conclusão da inspecção se mostra fixado no art.º 36.º, n.º 2, do RCPIT e não foi alterado por esta Lei n.º 15/01 (veja-se nesse sentido o Acórdão do STA, proferido no Rec. 0965/04, de 04/05/2005).
XII – No que contende, ao procedimento inspectivo, in casu tendo-se iniciado em 09.05.2001, o prazo para a sua conclusão, de seis meses, terminava em 09.11.2001, pelo que contados seis meses a partir desta data para efeitos de notificação da liquidação chegamos 09.05.2002, tendo a notificação da liquidação sido efectuada em 15.03.2002, foi efectuada dentro do prazo de caducidade.
XIII – Pelo que, salvo o devido respeito, somos da opinião que o douto Tribunal “ad quo”, esteou a sua fundamentação na errónea interpretação do n.º 5 do Art. 45.º da LGT e n.º 2 do Art. 36.º do RCPIT.
XIV – A douta sentença “ad quo”, relevou para efeitos de contagem do prazo estatuído no disposto no n.º 5 do Art.º 45.º da LGT, como data de conclusão da inspecção a data de 03.09.2001, todavia, a data relevada pelo douto tribunal “ad quo”, consubstancia tão somente a conclusão dos actos de inspecção, a que alude o disposto no n.º 1 do Art. 61.º do RCPIT, mediante a emissão de nota de diligência emitida pelo funcionário incumbido do procedimento, destarte, não consubstancia o fim do procedimento.
XV – Efectivamente, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 2 do Art.º 61 do RCPIT, prescreve que o relatório final, deve ser notificado ao contribuinte por carta registada com aviso de recepção, nos 10 dias posteriores, ao exercício do direito de audição.
XVI – Ora, in casu, a conclusão do procedimento inspectivo deu-se com a notificação em 08.10.2001, das conclusões do relatório de inspecção tributária, e não como relevou o douto Tribunal “ad quo”, com a notificação da nota de diligência, cujo fim contende única e exclusivamente com o fim dos actos de inspecção, ocorrido em 03.09.2001.
XVII – Neste pendor, tendo a conclusão do procedimento inspectivo ocorrido em 08.10.2001, e aplicando-se o prazo de 6 meses para efeitos de notificação da liquidação, estatuído no disposto no n.º 5 do Art. 45.º da LGT, o prazo de caducidade do direito à liquidação precludia em 09.04.2002, pelo que, tendo sido notificada da liquidação de IRC respeitante ao exercício de 1998 em 15.03.2002, encontra-se plenamente dentro do prazo de caducidade.
XVIII – Pelo exposto, e o douto Tribunal “ad quo”, esteou a sua fundamentação na errónea interpretação e contagem do prazo de caducidade, em manifesta violação do disposto no Art.º 61.º do RCPIT.
Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a sentença ser revogada e substituída por acórdão que declare a Impugnação improcedente, com as devidas consequências legais. PORÉM V. EX.AS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA.
2 – Contra-alegou o recorrido nos termos de fls. 216 a 218 dos autos, defendendo a manutenção do decidido na sentença recorrida.
3 – O Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer nos seguintes termos:
A questão objecto do presente recurso prende-se com a caducidade do direito à liquidação, nomeadamente com a aplicação do disposto no art. 45.º n.º 5 da Lei Geral Tributária, na redacção dada pela Lei n.º 15/2001 de 5 de Junho.
Concretamente a questão posta pela recorrente consiste em saber, para os efeitos da referida redacção do artº 45.º, n.º 5 da Lei Geral Tributária, quando é que ocorre a conclusão do procedimento inspectivo.
Alega a entidade recorrente que no caso o procedimento inspectivo se iniciou em 09.05.2001, pelo que o prazo para a sua conclusão, de seis meses, terminava em 9.11.2001.
Assim sendo, atento o disposto na referida redacção do artº 45º, nº 5 da Lei Geral Tributária a data limite para notificação da liquidação seria 09.05.2002, pelo que não se verificaria a invocada caducidade.
Afigura-se-nos que lhe assiste razão.
Dispõe o n.º 5 do referido art.º 45.º da Lei Geral Tributária, na redacção da Lei 15/01, que «instaurado o procedimento de inspecção tributária, o direito de liquidar os tributos incluídos no âmbito da inspecção caduca no prazo de seis meses após o termo do prazo fixado para a sua conclusão, sem prejuízo das prorrogações previstas na lei reguladora daquele procedimento, a não ser que antes dessa ocorra a caducidade prevista no prazo geral fixado no n.º 1»
Ora o prazo fixado para a conclusão do procedimento inspectivo, era, nos termos do art. 36º n.º 2 do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária de seis meses a contar da notificação do seu início, que no caso ocorreu em 09.05.2001 – vide autos apensos a fls. 11.
Circunstância essa em que não atentou a decisão recorrida pois uma coisa é a data da conclusão da inspecção (Considerada na sentença recorrida) e outra, bem diversa, é a data em que ocorre o termo do prazo fixado para a sua conclusão – data a que se reporta a redacção do art.º 45.º, n.º 5 em causa.
Trata-se de realidades diferentes, com repercussão no prazo de caducidade do direito à liquidação, que, tal como alega a recorrente, não se verifica.
Termos em que somos de parecer que o presente recurso deve ser julgado procedente revogando-se o julgado recorrido.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
- Fundamentação -
4 – Questão a decidir
É a de saber se ocorreu a caducidade do direito à liquidação do imposto (IRC relativo ao exercício 1998), o que pressupõe a interpretação do n.º 5 do artigo 45.º da Lei Geral Tributária (na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho).
5 – Matéria de facto
Na sentença do objecto do presente recurso foram dados como provados os seguintes factos:
A) Na sequência da Ordem de Serviço n.ºs 46929, 46930 e 46931, de 2-2-2000, a impugnante foi objecto de uma acção inspectiva externa, de âmbito geral, relativa aos exercícios de 1997, 1998 e 1999, efectuada pelos Serviços de Inspecção Tributária (SIT) da 1.ª Direcção de finanças de Lisboa, e que teve o seu início em 9-5-2001, tendo a final sido elaborado o Relatório de Inspecção Tributária, com as correcções à matéria colectável efectuadas (cfr. relatório e anexos, a fls. 11 a 50 do PAT apenso);
B) O Relatório de Inspecção Tributária mencionado em A) que antecede regista como termo de conclusão da mesma a data de 3-9-2001 (cfr. fls. 14 e 16 do PAT apenso);
C) A impugnante foi notificada das conclusões resultantes da acção de inspecção tributária através do ofício nº 23166, da 1.ª Direcção de Finanças de Lisboa, expedido em 8-10-2001 (cfr. fls. 50 a 53 do PAT apenso);
D) Na sequência de correcções técnicas à matéria tributável declarada, a Administração Tributária emitiu, além do mais, a liquidação adicional nº 8310002173, no montante de € 47.500,45, relativa ao IRC do exercício de 1998, com data de pagamento voluntário até 17-4-2002, a qual constitui o objecto da presente impugnação (cfr. documento de cobrança, a fls. 123 dos autos);
E) A liquidação adicional identificada na alínea antecedente foi emitida em 28-2-2002, e foi notificada à impugnante em 15-3-2002 (cfr. print do detalhe da nota de cobrança, a fls. 10 do PAT apenso);
F) A presente impugnação judicial foi apresentada em 16-7-2002 (cfr. fls. 2 e 158 dos autos).
6 – Apreciando
6.1 Da caducidade do direito à liquidação do imposto
A sentença recorrida, a fls. 179 a 184 dos autos, julgou procedente a impugnação deduzida pela ora recorrente contra liquidação adicional de IRC respeitante ao exercício de 1998, anulando-a por ilegal, por ter entendido verificar-se a caducidade do direito à liquidação (cfr. fls. 184 dos autos).
A caducidade do direito à liquidação foi aferida pela sentença recorrida em face do que dispunha o n.º 5 do artigo 45.º da LGT, na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho (preceito este entretanto eliminado pela Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro), não contestando a recorrente a aplicação ao caso dos autos do referido preceito legal.
Interpretou-o, porém, a sentença, em sentido diverso daquele que lhe é atribuído pela recorrente Fazenda Pública.
Assim, enquanto a sentença recorrida considerou que o prazo de 6 meses a que se referia o n.º 5 do artigo 45.º da LGT se contava da data da conclusão da inspecção, fixada no probatório como sendo o dia 3-9-2001, pelo que a notificação da liquidação teria de ser efectuada até ao termo do prazo de 6 meses contados dessa data (cfr. sentença recorrida, a fls. 183 dos autos), alega a recorrente que os seis meses a que se refere aquele artigo se contam após o decurso do prazo de 6 meses fixado artigo 36.º n.º 2 do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (RCPIT), estes por sua vez contados da notificação do início da acção inspectiva (cfr. conclusões VII, IX, XI, XII das suas alegações de recurso supra transcritas) ou, sem conceder, que esse prazo se conta da notificação das conclusões do relatório de inspecção tributária, por ser este o acto que, nos termos do artigo 61.º do RCPIT, marca a conclusão do procedimento inspectivo (cfr. as conclusões XIV a XVIII das suas alegações).
O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal, no seu parecer junto aos autos, adere à primeira das interpretações sustentadas pela recorrente, defendendo, pois, o provimento do recurso.
Vejamos.
O teor do preceito cuja interpretação é questionada nos presentes autos era o seguinte: «Instaurado o procedimento de inspecção tributária, o direito de liquidar os tributos incluídos no âmbito da inspecção caduca no prazo de seis meses após o termo do prazo fixado para a sua conclusão, sem prejuízo das prorrogações previstas na lei reguladora daquele procedimento, a não ser que antes dessa ocorra a caducidade prevista no prazo geral fixado no n.º 1».
A norma transcrita não prima pela clareza, o que é sempre lamentável, mas mais ainda tratando-se de norma respeitante a instituto cujo fundamento específico se encontra na necessidade de certeza e segurança jurídicas (cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, A Prescrição da Obrigação Tributária: Notas Práticas, Lisboa, Áreas Editora, 2008, p. 17).
A falta de clareza da norma não dispensa, contudo, o intérprete de determinar o seu sentido e alcance, o que se fará partindo dos textos para reconstituir o pensamento legislativo (artigo 9.º n.º 1 do Código Civil), em obediência às regras de interpretação jurídica postuladas pelo legislador.
Importa, pois, determinar o que deve entender-se pela expressão «termo do prazo fixado para a sua conclusão», pois que é do “termo do prazo fixado para a sua conclusão que se contam os seis meses findos os quais caduca “o direito de liquidar os tributos incluídos no âmbito da inspecção”.
A referência que se encontra no preceito ao “termo do prazo fixado…”, em vez de se referir à data ou prazo em que a inspecção se concluiu ou terminou, poderá inculcar a ideia de que o legislador teria querido referir-se ao termo do prazo para conclusão do procedimento de inspecção tributária, que se encontra definido no n.º 2 do artigo 36.º do RCPIT.
Isto mesmo sustenta a recorrente Fazenda Pública e é esse o entendimento do Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal, podendo até este entendimento ser reforçado considerando que no preceito interpretando se alude expressamente ao procedimento de inspecção tributária, cuja regulamentação constitui o objecto específico daquele diploma, e a que o preceito interpretando alude aquando da ressalva “sem prejuízo das prorrogações previstas na lei reguladora daquele procedimento”.
Ao tempo da aprovação da Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, cujo artigo 8.º introduziu no artigo 45.º da LGT o seu número 5, o RCPIT era diploma já em vigor, sendo que a ressalva que dele consta quanto às “prorrogações previstas na lei reguladora daquele procedimento”, que têm sido entendidas – e parece-nos que bem – como referindo-se às possíveis prorrogações do prazo do procedimento de inspecção previstas no n.º 3 do artigo 36.º do RCPIT (assim, DIOGO LEITE DE CAMPOS/BENJAMIM SILVA RODRIGUES/JORGE LOPES DE SOUSA, Lei Geral Tributária Comentada e Anotada, 3.ª ed., Lisboa, Vislis, 2003, p. 209 – nota 17 ao artigo 45.º da LGT), constituem indício de que o legislador poderá ter tido igualmente em vista com a referência ao “termo do prazo para a sua conclusão” a aplicabilidade do disposto no n.º 2 do artigo 36.º do RCPIT.
Em favor deste entendimento, militam também os “lugares paralelos”, a ter em conta para uma interpretação sistemática do preceito interpretando, pois que no n.º 1 do artigo seguinte – artigo 45.º da LGT -, se encontra referência ao prazo de seis meses após notificação, que é precisamente o prazo a que alude no n.º 2 do artigo 36.º do RCPIT.
Estes argumentos são suficientes, parece-nos, para concluir no sentido de que o preceito deve ser interpretado tal como propugnado pela recorrida na primeira das interpretações defendidas, não obstante as dúvidas que subsistem acerca do bem fundado desta interpretação, já que, em bom rigor, o n.º 2 do artigo 36.º do RCPIT, se bem atendermos à sua letra, não fixa um prazo-regra de seis meses para o procedimento de inspecção, antes um limite-regra do prazo geral deste procedimento, a isto acrescendo que se o procedimento de inspecção durar efectivamente apenas 15 dias, um mês ou dois meses, é talvez pouco razoável que apenas atingido o limite do prazo de seis meses se inicie o prazo especial de caducidade previsto no n.º 5 do artigo 45.º da LGT.
Interpretado o n.º 5 do artigo 45.º da LGT, na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, no sentido de que o “termo do prazo fixado para a sua conclusão” é o prazo-limite de 6 meses estabelecido no n.º 2 do artigo 36.º do RCPIT e contando a partir daí o prazo especial de caducidade de seis meses fixado no n.º 5 do então vigente artigo 45.º, temos que, no caso dos autos, atendendo a que a acção inspectiva externa teve início em 9-5-2001 (cfr. a alínea A) do probatório), que o termo do prazo fixado para a sua conclusão ocorreu 6 meses depois, ou seja em 9-11-2001, e que só a partir desta última data se iniciou o decurso do prazo especial de caducidade de seis meses previsto no então nº 5 do artigo 45.º, perfazendo-se esse prazo no dia 9-4-2002, levados somos a concluir que em 15-3-2002, data em que foi notificada a liquidação adicional questionada (cfr. a alínea E) do probatório), o prazo de caducidade não se tinha completado ainda, pelo que não ocorre a excepção de caducidade do direito à liquidação.
A sentença que assim o não julgou não pode, pois, manter-se, havendo que conceder provimento o recurso.
- Decisão -
7 - Termos em que, face ao exposto, acordam o juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso, revogando a sentença recorrida e julgando não verificada a caducidade do direito à liquidação, devendo os autos baixarem ao tribunal recorrido para que este conheça das demais questões oportunamente suscitadas pelo impugnante na sua petição de impugnação e cujo conhecimento foi considerado prejudicado.
Custas pela recorrida, que contra-alegou, fixando-se a procuradoria em 1/6.
Lisboa, 9 de Dezembro de 2009. – Isabel Marques da Silva (relatora) – Lúcio Barbosa – António Calhau.