Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0186/14
Data do Acordão:03/12/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO DELGADO
Descritores:INCOMPETÊNCIA EM RAZÃO DA HIERARQUIA
RECURSO PARA O SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO
OBJECTO DO RECURSO
MATÉRIA DE FACTO
Sumário:I - A Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, nos recursos interpostos directamente das decisões dos TT de 1ª Instância, apenas tem competência para conhecer de matéria de direito (cfr. artºs 12º, nº 5, 26º, al. b) e 38º, al. a) do ETAF, na actual redacção e 280º, nº 1 do CPPT).
II - Se nas conclusões das alegações de recurso se manifestar divergência por insuficiência, excesso ou erro, quanto à matéria de facto provada na decisão recorrida, quer porque se entenda que os factos levados ao probatório não estão provados, quer porque se considere que foram esquecidos factos tidos por relevantes, quer porque se defenda que a prova produzida foi insuficiente, quer ainda porque se divirja nas ilações de facto que se devam retirar dos mesmos, o recurso não versa exclusivamente matéria de direito, sendo competente para dele conhecer o Tribunal Central Administrativo e não o Supremo Tribunal Administrativo.
Nº Convencional:JSTA000P17220
Nº do Documento:SA2201403120186
Data de Entrada:02/13/2014
Recorrente:MASSA INSOLVENTE DE A..., S.A.
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – Massa Insolvente de A……………., S.A., com os demais sinais dos autos, recorreu para Tribunal Central Administrativo Sul da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal de 19-09-2013, que julgou improcedente a reclamação deduzida contra o despacho do Chefe do serviço de Finanças do Funchal que no âmbito de processo de execução fiscal nº 2810201101172891 autorizou o pagamento com sub rogação da quantia e acréscimos pela sociedade B…………, detentora de 97% da executada.

Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:
«1. Inconformada com a decisão que julgou improcedente a reclamação do despacho proferido pela Chefe do Serviço de Finanças do Funchal 1 que autorizou o pagamento da dívida fiscal da A………. pela B……………, com sub-rogação desta nos direitos da Administração Tributária, veio a ora Apelante interpor o presente recurso.
2. Considera a Apelante que a decisão do Tribunal a quo se encontra viciado por um erro na apreciação da matéria de direito.
3. Resulta da conjugação do artigo 81°, nºs 1 e 4 do CIRE que os administradores ou responsáveis legais do devedor - na acepção do 6.º, n.º 2 do CIRE - deixam de ter, por efeito da declaração de insolvência, qualquer poder de administração sobre aquele, estando impedidos de praticar quaisquer actos de que derivem efeitos patrimoniais. Tal poder de administração e de prática de actos cabe exclusivamente ao administrador da insolvência.
4. A declaração de insolvência da A………. retirou à B………, S.A. todos os poderes de influência desta sobre os destinos patrimoniais aquela, transferindo-os para a esfera jurídica do Sr. Dr. C………….., o Administrador da Insolvência nomeado para o exercício de tais funções.
5. Não existe, desde a declaração de insolvência, qualquer situação de influência dominante da B………. sobre a ora Apelante, pelo que não pode operar a presunção realizada pelo Tribunal, já que falta a relação de domínio que faria presumir um interesse legítimo no pagamento da dívida fiscal da Apelante e na sub-rogação da B………. nos direitos da Administração Tributária.
6. Não resultam dos autos quaisquer elementos que demonstrem a manutenção de uma suposta relação de domínio da B……….. sobre a ora Apelante.
7. O não pagamento da dívida fiscal pela Apelante não tem, pelo menos desde a declaração de insolvência da Apelante e em virtude desta, qualquer repercussão (positiva ou negativa) na esfera jurídica da B……………., já que todos os créditos - incluindo os da Administração Tributária - têm de ser reclamados no processo de insolvência da ora Apelante.
8. Não se verifica na esfera jurídica da B……….. qualquer interesse que a legitime ao pagamento da dívida fiscal da ora Apelante e à sub-rogação nos direitos da Administração Tributária.
9. A ratio da norma ínsita no artigo 88°, nº 1 do CIRE é obrigar todos os credores a ir ao processo de insolvência, enquanto processo de execução universal, para reclamar os seus créditos, independentemente da sua natureza.
10. Não podem ser praticados quaisquer actos na pendência das execuções - incluindo de execuções fiscais - que desonerem os credores do insolvente de reclamar créditos no próprio processo de insolvência.
11. Permitir o pagamento e a sub-rogação da B………… nos direitos da Administração Tributária na pendência do processo de execução tem como consequência que esta última seja paga fora do processo de insolvência, criando uma situação de desigualdade injustificada perante os restantes credores da ora Apelante.
12. O artigo 91.º, n.º 2, do CPPT só pode ser interpretado de forma restritiva, admitindo a sub-rogação apenas nos casos de suspensão previstos no artigo 169.º do CPPT, e excluindo aquela no caso de a suspensão do processo da execução fiscal ocorrer em virtude de uma declaração de insolvência. Outra interpretação defraudaria os fins da norma resultante do artigo 88.º, n.º 1, do CIRE e criaria situações de desigualdade entre o credor pago no processo de execução fiscal - não submetido ao concurso e graduação de créditos com consideração dos restantes credores - e os credores que reclamam os seus créditos em sede do processo de insolvência.
13. Se os créditos da Administração Tributária são comuns e a dívida conserva as garantias e privilégios de cobrança exercidos pela Administração Tributária mesmo quando há sub-rogação da B……….. nos direitos daquela, então o crédito da B……….. sobre a Apelante que resulta dessa sub-rogação vai ser também um crédito comum.
14. Se os créditos resultantes da sub-rogação da B……….. nos direitos da Administração Tributária mantêm a sua natureza de créditos comuns, surge evidente que há uma subversão da graduação de créditos na insolvência, porquanto a B……………., como sociedade especialmente relacionada com a insolvente, nos termos dos artigos 48.º, alínea a) e 49.º, n.º 2, alínea b), do CIRE, deveria ver os seus créditos graduados em último lugar como créditos subordinados, nos termos do artigo 66°, n.º 1, do CIRE. No entanto, um dos seus créditos - o resultante da sub-rogação - é graduado como crédito comum, passando ilegitimamente à frente de outros credores.
15. Verifica-se uma situação de fraude à lei perpetrada pela B……………, a qual tem um interesse ilegítimo no pagamento e na sub-rogação em sede fiscal, não podendo ser admitido pelo Direito.
16. O pagamento da dívida fiscal da ora Apelante pela B………… e a sub-rogação desta última nos direitos da Administração Tributária são inadmissíveis.»

2 – A recorrida “B…………………, SA, veio apresentar as suas contra alegações, concluindo da seguinte forma:
«I. O presente recurso vem interposto pela Recorrente da douta sentença que, julgando improcedente a reclamação de actos do órgão de execução fiscal, apresentada pela Recorrida, manteve o despacho proferido pela Chefe do Serviço de Finanças do Funchal- 1.
II. O Tribunal a quo considerou e bem que “não padece o ato reclamado de ilegalidade por falta de autorização do devedor à sub-rogação ou por falta de prova de interesse legítimo”.
Ora:
III. De facto, no seu interesse e do grupo económico, a B……….. entendeu dever pagar a dívida tributária da A……….., de modo a tentar atenuar o impacto que uma dívida perante o Fisco sempre tem, perante a imagem e reputação comercial do grupo.
IV. Na verdade, no caso em apreço, não se poderá considerar que a relação entre estas duas sociedades era inexistente, com o argumento de que o Administrador de Insolvência é que “controlava” a A…………..
V. Aliás, nem se admitiria que a decisão que decreta a insolvência e que não tinha transitado em julgado - à data do pagamento - tivesse como consequência directa a extinção de uma relação entre duas sociedades comerciais.
VI. Ademais, importa esclarecer que no número 3 do artigo 6.º do Código das Sociedades Comerciais, estatui-se que não se considera contrária ao fim da sociedade a prestação de garantias reais ou pessoais a dívidas de outras entidades se existir justificado interesse próprio da sociedade garante se se tratar de sociedade em relação de domínio ou de grupo.
VII. Ou seja, são situações alternativas e NÃO cumulativas, conforme a Recorrente parece fazer crer.
VIII. Ora, a B……………. demonstrou o seu interesse próprio nas soluções que apresentou, nomeadamente, através da tentativa de recuperação do valor económico do grupo em que se encontra inserida, o que influenciava, naturalmente nela própria.
IX. Com efeito, a desvalorização da A………. acarretaria um impacto negativo directo no património da B………….., diminuindo o valor empresarial que esta podia ter junto dos mercados financeiros.
X. A B……………., para além da lógica da estratégia empresarial, tinha, neste sentido, um interesse próprio e lícito na satisfação deste crédito, o que, parece- nos, é facilmente compreensível.
XI. E, deste modo, cumpre-se quer com o previsto no artigo 6.º do Código das Sociedades Comerciais (“justificado interesse próprio da sociedade”), quer com o previsto no artigo 41° da Lei Geral Tributária (“interesse legítimo”).
XII. Em suma, a accionista B……………, no exercício da sua autonomia de vontade, a qual não deverá ser julgada pela Recorrente, prestou-se - por iniciativa própria - a assegurar o cumprimento das obrigações fiscais da A………., com vista à recuperação da “vida” da sua subsidiária (beneficium cedendarum actionum), evitando, deste modo, a desvalorização desta participação financeira.
Por outro lado,
XIII. Não admite a contra-interessada que a Recorrente alegue existir uma “fraude à lei, na medida em que há uma violação das normas da qualificação dos créditos em sede de insolvência, decorrente de uma conduta da B…………..”.
XIV. De facto, no caso sub judice, trata-se de uma transmissão do crédito da AT e não da criação ex-novo de um crédito na titularidade do sub-rogado.
XV. Efectivamente, à semelhança do instituto civil de sub-rogação previsto nos artigos 589.º e seguintes do Código Civil, verifica-se aqui uma “substituição do credor na titularidade do direito a uma prestação fungível pelo terceiro que cumpre em lugar do devedor” (cfr. Antunes Varela in “Das obrigações em Geral”, Vol. II, fls. 336), tendo a B………. assumido a titularidade do crédito que a AT detinha sobre a A………………
XVI. Os demais credores conheciam a existência daquele crédito comum, pelo que a alteração da figura do credor em nada modifica as legitimas expectativas que aqueles pudessem ter de serem ressarcidos dos seus montantes em dívida.
XVII. Ou seja, não estamos aqui perante um crédito que era subordinado no passado e que, por força da sub-rogação, passou a ser comum, para efeitos da graduação dos créditos.
XVIII. Não! O crédito sempre foi comum, tendo apenas havido uma alteração do titular do mesmo, não devendo, em consequência, os demais credores serem beneficiados do pagamento que a B………….. efectuou.
XIX. Explica Casalta Nabais que: “Deste ponto de vista, não há dúvida que o substituto retém e paga um imposto alheio, decorrendo daí para o legislador a imposição constitucional de, pelo menos, estabelecer a favor do substituto o direito de regresso face ao contribuinte, direito este que, bem se compreende, não pode ser reduzido ao decorrente do instituto do enriquecimento sem causa e que, entre nós, bem pode ser concretizado através do alargamento aos substitutos fiscais, para efeito de realização, do seu direito de regresso sobre os contribuintes substituídos, do instituto da sub-rogação nos direitos da Fazenda Pública, como o nosso sistema o prevê para os pagadores voluntários de impostos alheios” - cfr. Casalta Nabais, in “O dever fundamental de pagar imposto. Contributo para a compreensão constitucional do estado fiscal contemporâneo”, Coimbra, 1998, fls. 489 e 490. (nosso negrito e sublinhado)
XX. Ora, de facto, sustentar a ilegalidade da presente sub-rogação para favorecer a comunidade dos credores significaria um enriquecimento injustificado para estes e, sobretudo, um empobrecimento inaceitável para a credora B……………….
Ademais:
XXI. Assume especial relevância explicar que a referida transmissão da dívida não foi efectuada com o intuito de se prejudicar os restantes credores da A…………..
XXII. Na verdade, não se poderá imputar à PH nenhuma conduta iníqua, consubstanciada em abuso de controlo ou noutra preterição de deveres a que a mesma se encontra vinculada, pelo que o crédito que a PH detém, actualmente, sobre a A……………., ainda que não se atenda à sub-rogação, deveria ser considerado como sendo um crédito comum.
XXIII. Neste sentido, e conforme facilmente se evidencia, a decisão proferida pelo douto Tribunal a quo não deverá ser revogado com base no argumento da graduação dos créditos no âmbito da insolvência, porquanto este crédito comum não prejudica de forma alguma os direitos e interesses dos demais credores da reclamante.
Por fim:
XXIV. Em relação ao argumento de que o processo executivo fiscal se encontrava suspenso, atendendo à insolvência, e, como tal, a AT não deveria ter admitido a sub-rogação, sempre se dirá que, uma vez mais, a Recorrente padece de razão.
XXV. Com efeito, missão do crédito para outra pessoa não interfere com a marcha normal do processo de insolvência, não tendo sido efectuadas quaisquer diligências contra a devedora A……………….
XXVI. Ademais, a transmissão do crédito não provoca a anulação da suspensão do processo executivo, pelo que o mesmo continuará suspenso, para todos os efeitos legais, não se desvirtuando, deste modo, o previsto no artigo 180.º do CPPT e 80.º do CIRE.
XXVII. Não se poderá, deste modo, alegar que os credores da A…………….. ficarão prejudicados com esta sub-rogação, efectuada após a insolvência, porquanto o valor do crédito é o mesmo e, por outro lado, o processo executivo encontra-se suspenso.
XXVIII. Atento tudo quanto se expôs, deve o recurso interposto ser julgado improcedente, mantendo-se na íntegra a douta sentença recorrida.

3 – O recurso foi interposto no TCA Sul, este por acórdão exarado a fls. 367 e segts dos autos, veio declarar-se incompetente em razão da hierarquia, para conhecer do presente recurso que tem por fundamento, exclusivamente matéria de direito e declarou competente para esse efeito, a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo.

4 – Notificadas as partes do douto acórdão, veio a recorrente reafirmar a posição assumida em sede de requerimento e7ou alegações de recurso, designadamente no que se refere à circunstância de ser o Tribunal Central Administrativo Sul hierarquicamente competente para proceder ao seu julgamento( cf. fls. 364).
5 – O Exmº Procurador Geral Adjunto emitiu o parecer, no sentido do não provimento do recurso e de confirmação do decidido, corrigindo apenas o lapso constante de fls. 233 na referência feita ao art. 42.º que dever ser 41.º da L.G.T.

6 – Com dispensa de vistos, dada a natureza urgente do processo, cumpre apreciar e decidir.

7- Em sede factual apurou-se a seguinte matéria de facto:
1. A “A………….. S.A.” é uma sociedade com sede na Avenida …………, …………, ………., n.º ……….., sala ………., no Funchal, que tem por objeto “a prestação de apoio, expansão e modernização de empresas industriais, comerciais e de serviços no âmbito internacional a atividade de promoção, marketing e prospeção de mercados, o comércio, por grosso ou a retalho, a importação e exportação, a prestação de serviços de natureza contabilística e económica, a promoção, organização e exploração comercial de espetáculos de qualquer natureza, a gestão da sua carteira de títulos, a compra de imóveis para revenda, bem como a aquisição e venda e qualquer outra forma de exploração de marcas registadas, patentes e direitos de autor” [cfr. doc. de fls. 5 e 6 a 10 do processo de execução apenso].
2. A A……. S.A.” é detida em 97,54% do seu capital social pela B……………., SA”. [cfr. doc. de fls. 137 a 152 dos autos e do de fls. 123 a 139 do processo de execução apenso].
3. Em 30/12/2011 foi instaurado o processo de execução fiscal n.º2810201101172891 contra a “A…………….. S.A.”, encontrando-se a correr pela quantia de € 566.119,92, relativa a IRC de 2008 e acrescidos [cfr. doc. de fls. 1 do processo de execução apenso].
4. Por sentença proferida pelo Tribunal Judicial do Funchal, 3.° Juízo Cível, no processo n.º 2134/12.OTBFUN, datada de 13/07/2012, foi declarada a insolvência de “A……………. S.A.” [cfr. doc. de fls. 16 a 35 dos autos,].
5. O processo de execução fiscal referido em 2. foi suspenso, tendo a Fazenda Pública reclamado os seus créditos no processo de insolvência referido no número anterior, em sequência de citação para o efeito [conforme consta dos doc. de fls. 36 a 87 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
6. No âmbito do processo de execução fiscal, a sociedade comercial “B…………….., SA.” requereu que lhe fosse autorizado o pagamento com sub-rogação da quantia em divida no processo de execução fiscal referido em 2., “nos termos do artigo 91.º n.°2 do CPPT e do artigo 41.” n.º 2 da LGT”, conforme doc. de fls. 134 e 135 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e do qual consta, designadamente, o seguinte:
“(….) 1 - A ora Requerente é detentora de 97,54% do capital social da sociedade executada “A…………….., S.A (NIPC …………..), detendo, assim, uma posição de domínio total sobre esta, de acordo com o previsto no Código das Sociedades Comerciais (CSC).
2- Nesta conformidade, a existência de uma relação de domínio ou grupo faz presumir a existência de um justificado interesse próprio, neste caso, em solver as dívidas tributárias existentes,
3 - Na realidade, a sub-rogação da presente dívida fiscal não é contrária ao fim da sociedade Requerente, porquanto esta mostra-se objetivamente apta para satisfazer este pagamento, enquanto sociedade-mãe (...)“.
7. No âmbito do processo de execução referido em 2., foi elaborada informação constante de fls. 147 e 148 do processo, apenso aos autos, a qual se dá por integralmente reproduzida e da qual consta, designadamente, o seguinte:
“(...) Factos relevantes para a apreciação do pedido:
Encontrava-se em divida no processo executivo n.º 2810201101172891 a importância de (566.119,82 que incluía a quantia exequenda de €518 121,40, €42068,87 de juros de mora e €5929,65 de custas. Prova-se através dos documentos apresentados que a requerente é detentora de 97,54% do capital da executada A………….. SA NIF ……………. detendo assim uma posição de domínio total sobre esta de acordo com o previsto no Código das Sociedades Comerciais
Enquadramento legal:
O pedido tem enquadramento nos artigos 41° da Lei Geral Tributária e arts 91° e 92° do Código de Procedimento e de Processo Tributário (...).
Concluindo:
Em 2013-02-15 foi autorizado o prévio pagamento pela requerente na qualidade de terceiro.
8. Sobre a Informação referida no n.º anterior recaiu despacho da Chefe de Finanças do Serviço de Finanças do Funchal, com o seguinte conteúdo:
“Vista a informação antecedente com a qual concordo, autorizo que a B………… SA NIF …………… fique sub-rogada nos direitos da administração Tributária ou seja os previstos no art.º 92 n.º 1 do código de procedimento e nos termos dos artº 91 n.º 1 e 2 do mesmo Código e 41 n.º 2 da Lei Geral Tributária” [cfr. doc. de fls. 148 do processo de execução apenso].
9. O despacho referido no n.º anterior foi notificado à executada “A………………., SA., por oficio n.º 2264 de 13/03/2013, em 15/03/2013 [cfr. doc. de fls. 151 e 152 do processo de execução apenso].
10. Tendo sido emitida a respetiva guia, a “B………………, S.A”, procedeu ao pagamento da quantia de €566.119,92, em divida, em 18/02/2013 [cfr. doc. de fls. 157 dos autos].
11. A presente reclamação deu entrada no Serviço de Finanças do Funchal 1 em 25/03/2013. [cfr. doc. de fls. 2 dos autos].

8. Em face do teor das conclusões da alegação do recurso e da posição assumida pelo Tribunal Central Administrativo Sul, a questão que aqui deve ser prioritariamente colocada é a de saber da competência em razão da hierarquia do Supremo Tribunal Administrativo.
A competência em razão da hierarquia integra pressuposto processual relativo ao Tribunal, constituindo requisito de interesse e ordem pública, devendo, por isso mesmo, o seu conhecimento preceder o de qualquer outra matéria – cf. artigos 16º n.º 1 e 2 do CPPT e 13º do CPTA.

Ora, de harmonia com o disposto nos artigos 26º al. b) e 38º al. a) do novo ETAF e 280º n.º 1 do CPPT-, à Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo compete apenas conhecer dos recursos interpostos de decisões dos tribunais tributários de 1ª Instância, com exclusivo fundamento em matéria de direito,
Sendo que aos Tribunais Centrais Administrativos compete, por sua vez conhecer dos recursos de decisões dos tribunais tributários de 1ª Instância, com excepção dos referidos na alínea b) do n.º 1, do citado art. 26.º do referido Estatuto.

A jurisprudência deste Supremo Tribunal tem vindo a entender que na delimitação da competência do Supremo Tribunal Administrativo em relação à do Tribunal Central Administrativo deve entender-se que o recurso não tem por fundamento exclusivamente matéria de direito sempre que nas conclusões das respectivas alegações o recorrente pede a alteração da matéria fáctica fixada na decisão recorrida ou invoca, como fundamento da sua pretensão, factos que não têm suporte na decisão recorrida, desde que estes, em abstracto, não sejam indiferentes para serem ponderados no julgamento da causa - vide neste sentido Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 20.05.2009, recurso 18/09, de 03.10.2007, recurso 373/07, de 31.01.2007 , recurso 1027/06 e de 17.01.2007, recurso 962/06, todos in www.dgsi.pt.
O recurso não tem assim exclusivamente por fundamento matéria de direito se nas respectivas conclusões se questionar a questão factual, manifestando-se divergência, por insuficiência, excesso ou erro, quanto à matéria de facto provada na decisão recorrida, quer porque se entenda que os factos levados ao probatório não estão provados, quer porque se considere que foram esquecidos factos tidos por relevantes, quer porque se defenda que a prova produzida foi insuficiente, quer ainda porque se divirja nas ilações de facto que se devam retirar dos mesmos.

No caso subjudice, o Exmº Relator no Tribunal Central Administrativo Sul para declarar aquele Tribunal incompetente, em razão da hierarquia, concluiu de modo essencial, e além do mais, que « a apreciação e decisão deste recurso jurisdicional passa, apenas, pela consideração e tratamento de conceitos jurídicos, de matéria jurídica ou de direito» e que a «Rte não aponta quaisquer factos ou circunstâncias que não hajam sido, na sentença, apreciados e valorados (….)»
Ora, salvo o devido respeito, entende-se que a recorrente, ao invés, manifesta discordância com o decidido no que respeita aos juízos de apreciação da prova efectuados pelo Tribunal recorrido, nomeadamente afirmando factos não contemplados no probatório da sentença, do qual pretendem extrair consequência jurídica relevante.
É o que se apura da conclusão 6ª de fls. 258 em que a recorrente afirma que «não resultam dos autos quaisquer elementos que demonstrem a manutenção de uma suposta relação de domínio da B…………… sobre a ora Apelante».

A recorrente invoca, pois, nas conclusões das suas alegações factos que contrariam a matéria de facto levada ao probatório.
Efectivamente saber se resultam dos autos elementos demonstrem a manutenção de uma suposta relação de domínio da B…………. sobre a A………… envolve a apreciação de matéria de facto, nomeadamente a aferição de elementos de facto que não constam dos autos, em concreto saber se na data em que a B...... decidiu proceder ao pagamento da dívida da A………….. – Fevereiro de 2013, havia ou não transitado a sentença que declarou a insolvência desta.
Como bem nota o Exmº Procurador-Geral Adjunto junto do Tribunal Central Administrativo Sul no parecer de fls. 353-357, dos autos não consta a data do trânsito em julgado da sentença que declarou a insolvência da A………… (fls. 16 a 35), elementos esses que se devem extrair do processo próprio, sendo que por, outro lado, a recorrida alega que no momento exacto que decidiu proceder ao pagamento da dívida da A…………….. – Fevereiro de 2013 – havia sido interposto recurso da decisão que decretou a insolvência desta, tendo a questão sido decidida apenas em Maio de 2013.
Verifica-se, assim, que as questões controvertidas não se resolvem mediante uma exclusiva actividade de aplicação e interpretação de normas jurídicas, antes pelo contrário implicam a necessidade de dirimir questões de facto não apuradas, por insuficiência da matéria de facto provada na decisão recorrida.
Ocorre, pois, a incompetência deste Supremo Tribunal Administrativo já que versando o recurso, também, matéria de facto, será competente para dele conhecer o Tribunal Central Administrativo Sul – arts. 280º, nº 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário e 26º alínea b) e 38º alínea a) do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais.
Existindo no processo decisões divergentes sobre questão de competência, prevalece a decisão do tribunal de hierarquia superior – nos termos do n.º 2 do artigo 5.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais.
III- DECISÃO
Termos em que, face ao exposto, se decide julgar a Secção de Contencioso Tributário do STA incompetente, em razão da hierarquia, para conhecer do presente recurso jurisdicional, declarando-se competente para o efeito o Tribunal Central Administrativo Sul (Secção do Contencioso Tributário).

Sem custas.

Lisboa, 12 de Março de 2014. - Pedro Delgado (relator) - Isabel Marques da Silva - Dulce Neto.