Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:093/21.7BELSB
Data do Acordão:09/09/2021
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:TERESA DE SOUSA
Descritores:APRECIAÇÃO PRELIMINAR
REVISTA
PEDIDO
PROTECÇÃO INTERNACIONAL
Sumário:Não é de admitir revista se o acórdão recorrido parece ter tratado as questões acertadamente, de forma amplamente fundamentada, plausível e coerente, nomeadamente quanto à aplicação do art. 17º, nº 1 da Lei nº 27/2008.
Nº Convencional:JSTA000P28129
Nº do Documento:SA120210909093/21
Data de Entrada:08/03/2021
Recorrente:A........
Recorrido 1:MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar

Acordam no Supremo Tribunal Administrativo

1. Relatório
A……….., cidadã angolana (vinda do Brasil), intentou no TAC de Lisboa, contra o Ministério da Administração Interna, a presente acção administrativa de impugnação do despacho do Director Nacional do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), de 15.12.2020, que considerou inadmissível o pedido de protecção internacional formulado pelo ora Recorrente, bem como o pedido de Asilo ou de Autorização de Residência por Razões Humanitárias, tendo o TAC de Lisboa julgado a acção improcedente por sentença de 24.02.2021.
Vem agora recorrer de revista, nos termos do art. 150º, nº 1 do CPTA, do acórdão do TCA Sul de 02.06.2021, que negando provimento ao recurso por si interposto, manteve a sentença do TAC de Lisboa, fundamentando a revista em erro de julgamento do acórdão recorrido, estando em causa questão com relevância jurídica e social de importância fundamental e com vista a uma melhor aplicação do direito.

Não foram apresentadas contra-alegações.

2. Os Factos
Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

3. O Direito
O art. 150º, nº 1 do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo “quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de uma importância fundamental” ou “quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”.
Como resulta do próprio texto legal, e a jurisprudência deste STA tem repetidamente sublinhado, trata-se de um recurso excepcional, como, aliás, o legislador sublinhou na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, considerando o preceito como uma “válvula de segurança do sistema”, que só deve ter lugar, naqueles precisos termos.

A aqui Recorrente impugnou o acto do Director do SEF que considerara inadmissível a concessão do seu pedido de asilo e da autorização de residência por protecção subsidiária.
Na presente revista defende que o acórdão recorrido incorreu em erros de julgamento na apreciação do recurso jurisdicional, a saber: i) não considerar que a Autora devia ter sido ouvida em declarações nos autos, diligência indeferida pelo despacho proferido no TAC em 24.02.2020 (imediatamente antes da sentença); ii) ao não entender ter havido preterição de audiência prévia; iii) erro nos pressupostos; iv) violação dos princípios fundamentais do Estado de Direito Democrático plasmados nos arts. 8º, 13º, 20º e 267º, nº 5 da CRP e no art. 41º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

Diremos desde já que a argumentação da Recorrente não convence, sendo certo que a tónica das suas conclusões é posta na falta de audiência prévia.

O TAC de Lisboa por sentença de 24.02.2020, julgou a acção improcedente e absolveu a Entidade Demandada do pedido.
Em despacho antecedente à sentença, e da mesma data, indeferiu o pedido de prestação de declarações pela aqui Recorrente por entender estarem já adquiridos todos os elementos de prova necessários à decisão.

O acórdão recorrido considerou que a diligência requerida (tomada de declarações à Requerente) não era necessária por as declarações que prestara no processo administrativo eram credíveis [em 4 e 14 de Dezembro de 2020] “ou seja, tal despacho não violou os princípios do benefício da dúvida, da mediação e da oralidade, nem a tutela jurisdicional efectiva”.
Refere o acórdão, face ao então alegado nas conclusões V e VI do recurso que “a sentença recorrida não põe em causa que o filho da autora nasceu em Portugal, mas apenas que tal nascimento já tivesse ocorrido aquando da prestação dos esclarecimentos em 14.12.2020. Relativamente à alegação de que o filho da autora tem problemas graves de saúde, os quais sobrevieram após a prolação da sentença recorrida, trata-se de alegação completamente conclusiva, pois não é alegada qualquer factualidade de onde se possa inferir qual o concreto problema de saúde que alegadamente o afecta e a sua gravidade, além de não ter sido junto qualquer documento relativo a esta matéria [estando em causa dados relativos à saúde do filho da autora, e como referido pelo Departamento Jurídico do Conselho Português para os Refugiados, Doc. 1, junto com a alegação de recurso, terá de ser a autora a solicitar tal informação junto das entidades competentes], prelo que esta invocação não pode ser atendida nestes autos.
Acresce que, mesmo que, por hipótese, se pudesse atender a tal invocação, a mesma, ao que tudo indica, não permitiria concluir que a autora poderia beneficiar do estatuto de protecção internacional.” [citando a jurisprudência do Tribunal de Justiça de 18.12.2014, proc. nº C-542/13, tendo por objecto a interpretação dos arts. 2º, al. e), 3º, 15º, 18º, 28º e 29º da Directiva 2004/83/CE do Conselho de 29 de Abril de 2004, a qual estabelece normas mínimas relativas às condições a preencher por nacionais de países terceiros ou apátridas para poderem beneficiar do estatuto de refugiado ou de pessoa que, por outros motivos, necessite de protecção internacional, bem como relativas ao respectivo estatuto e ao conteúdo da protecção concedida].
De todo o modo, e caso a autora entenda que o estado de saúde do seu filho é fundamental para a dedução de pedido de protecção internacional, poderá oportunamente (isto é, logo que obtidos os competentes elementos de prova) formular um pedido subsequente, nos termos do art. 33º, n.º 1, da Lei nº 27/2008, de 30/6, na redacção da Lei 26/2014, de 5/5 (…)”.
Quanto ao vício de falta de audiência prévia – por falta de ponderação no acto impugnado dos esclarecimentos descritos no ponto 11 dos factos provados o acórdão limitou-se, e bem, a remeter para o que a tal respeito se dissera em 1ª instância: “(…) a Requerente argumentou que exerceu o seu direito de audiência prévia e que a decisão proferida pelo Diretor Nacional Interino do SEF deveria ter tido em consideração as declarações, esclarecimentos e correções da Requerente (…).
(…)
Tal como resulta expressamente nos pontos 5, 12 e 14 da informação n.º 2462/GAR/20 (cfr. ponto 12 da matéria de facto fixada), os esclarecimentos e correções posteriormente aditados pela Requerente (cfr. ponto 11 da matéria de facto fixada) foram tomados em consideração para efeitos de decisão.
Tal como o foram, de resto, as declarações prestadas em sede de entrevista – cfr. os pontos 7 e 12 do probatório”, pelo que o vício invocado foi julgado não verificado.
No mais o acórdão recorrido entendeu que a factualidade em que a autora assenta o seu pedido não é subsumível ao disposto no art. 3º, nº 2 da Lei nº 27/2008, tendo presente os conceitos constantes do art. 2º, nºs 1, al. n), pontos i), ii), iii), iv) e v), e 2 da referida Lei. Como também a sua situação não se subsumia à previsão do art. 7º da Lei nº 27/2008, para ter direito à protecção subsidiária.
Quanto à violação dos princípios constitucionais supra elencados considerou o acórdão que tal alegação carecia de densificação das razões que sustentam essa violação.

Ora, a solução das instâncias é coincidente e o acórdão recorrido parece ter tratado as questões acertadamente, de forma amplamente fundamentada, plausível e coerente, [nomeadamente quanto à aplicação do art. 17º, nº 1 da Lei nº 27/2008, conforme parece resultar do probatório nos termos acima indicados].
Assim, não se justifica admitir a revista, nem afastar a regra da excepcionalidade da revista, por não estarmos perante questão jurídica de relevância ou dificuldade superior ao normal, nem ser necessária uma melhor aplicação do direito.

Nestes termos, acordam em não admitir a revista.
Sem custas por isenção objectiva (art. 84º da Lei nº 27/2008, de 30/6).

Nos termos e para os efeitos do art. 15º-A do DL nº 10-A/2020, de 13/3, a relatora atesta que os Exmos Juízes Adjuntos - Conselheiros Carlos Carvalho e José Veloso -, têm voto de conformidade.

Lisboa, 9 de Setembro de 2021
Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa