Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0760/10
Data do Acordão:03/02/2011
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PIMENTA DO VALE
Descritores:PRESCRIÇÃO
IRS
LEI GERAL TRIBUTÁRIA
CITAÇÃO
EXECUTADO
INTERRUPÇÃO DE PRAZO
Sumário:I – Nos termos do nº 1 do artº 48º da LGT, vigente à data da constituição da dívida tributária (IRS de 2000), o prazo de prescrição, de oito anos, conta-se a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário, ou seja, no caso de IRS de 2000, a partir de 2001.
II – A citação do executado interrompe o decurso do prazo prescricional, revestindo, todavia, um efeito meramente suspensivo no caso de paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à autuação da execução, de harmonia com o disposto no nº 2 do artº 49º da LGT, antes da entrada em vigor da Lei nº 53-A/2006, de 29 de Dezembro, que o revogou.
Nº Convencional:JSTA000P12664
Nº do Documento:SA2201103020760
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam nesta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
I – A…, melhor identificado nos autos, não se conformando com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, que julgou improcedente a oposição por si deduzida à execução fiscal n.º 3050200501052497, instaurada pelo Serviço de Finanças de Coimbra 2, para cobrança de dívida de IRS, relativo ao ano de 2000, dela interpôs o presente recurso, formulando as seguintes conclusões:
1. Vem o presente recurso da douta decisão que julgou improcedente a oposição à execução fiscal.
2. Como consta do probatório em data indeterminada de Janeiro de 2005, mas situada entre os dias 2 e 30 (sempre inclusive) desse mês, através de Ilustre Mandatário, o Opoente dirigiu requerimento à Administração Tributária, Serviço de Finanças de Coimbra 2, para que lhe fosse emitida certidão dos fundamentos de facto e de direito na base da liquidação referida nos pontos 7.- 8., pedido que expediu pelo seguro do Correio e a que coube o registo RR988272986PT, pelo que, como vem sendo jurisprudência pacifica e reiterada da Secção do Contencioso Tributário do STA, deveria o M.° Juiz realizar ou ordenar todas as diligências que considerasse úteis ao apuramento da verdade (vide, por todos, Acs. de 2/7/97, in rec. n° 21.502 e de 5/4/00, in rec. n° 24.713), nomeada e concretamente a notificação do Serviço de Finanças de Coimbra 2, no sentido deste informar qual a data de entrada daquele requerimento e bem assim a notificação dos CTT no sentido de ser informada a data da entrega do registo postal identificado (não sendo suficiente a simples busca do percurso daquele pela consulta no sítio dos CTT, porquanto, como é público tal informação apenas está disponível durante um certo lapso de tempo), já que no processo judicial tributário vigora, como princípio estruturante, o princípio do inquisitório (art° 99º da LGT, e art° 13° do CPPT).
3. Ao não ordenar oficiosamente tais diligências o M.° Juiz violou o disposto nas referidas normas legais.
4. A dívida em causa encontra-se prescrita, face ao regime legal aplicável.
Termos em que e nos mais de direito deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado e, consequentemente, ser revogada a douta sentença recorrida, proferindo-se douto acórdão que julgue a oposição provida, com todas as legais consequências.
A Fazenda Pública não contra-alegou.
O Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que deve ser declarada a prescrição da obrigação tributária e extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, ficando prejudicado o conhecimento da outra questão suscitada (violação do princípio do inquisitório).
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
2 – A sentença recorrida fixou a seguinte matéria de facto:
1. A Administração Tributária detectou que o Oponente, A…, relativamente aos seus rendimentos do ano de 2000, havia formulado e apresentado oportunamente declaração de rendimentos para efeitos de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares na qual não discriminava rendimentos [na quantia de €99759,58, derivados da alienação de duas concretas fracções de prédio em propriedade horizontal] que nesse ano auferira, relevantes para aquele efeito, como rendimentos da categoria G desse tributo.
2. Assim, em Dezembro de 2003 a Administração Tributária notificou o Oponente, convidando-o a apresentar declaração de substituição na qual tais rendimentos fossem expressos, sob pena de proceder ela à fixação do rendimento colectável relativamente àquele exercício.
3. Como o Oponente não procedeu à formulação daquela declaração, a Administração Tributária instaurou procedimento de fixação do rendimento colectável do Oponente e mulher, referente ao ano 2000, a que deu o n° 118/2004, no Serviço de Finanças de Coimbra 2.
4. Notificado em Novembro de 2004 para se pronunciar, no âmbito da sua audição, sobre o projecto de fixação daquele rendimento, o Oponente não exerceria esse direito.
5. Esta última notificação era instruída com projecto de fixação do seu rendimento tributável de 2000, de 3 de Novembro de 2004, contendo os fundamentos de facto e de direito entendidos relevantes e aplicáveis — o qual, constante de fls.86-87, aqui se dá por reproduzido, por razões de economia—, designadamente: o concreto facto gerador do rendimento omitido na declaração originária, a venda de duas concretas fracções de um prédio em Coimbra, naquele exercício, seu valor de aquisição, correcções de desvalorização, seu valor de alienação e rendimento líquido a fixar a esse propósito; indicação da origem legal da obrigação de declaração desses rendimentos e indicação das normas para sua tributação em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares e paralela indicação da omissão de apresentação de declaração de substituição, pelo Oponente.
6. Após tanto e nessa sequência, foi emitido a 15 de Novembro de 2004 despacho de conversão, em definitivo, do projecto de decisão aludido e sumariado no ponto anterior, para cujo conhecimento pelo Oponente foi expedido via postal sob registo oficio desse mesmo dia, que seguiria no dia 17 seguinte.
7. Já nos serviços centrais da Administração Tributária veio depois a ser elaborada em 23 de Novembro de 2004, fazendo parte do lote 90517, a liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares de 2000 do Oponente, com base no rendimento colectável fixado, a que coube o n° 5004274575, do que resultou dever o Oponente de imposto, àquele título, €13.282,17.
8. Este montante de dívida de imposto, após compensação com o valor da dívida de imposto pago na sequência da declaração e liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares originárias — a compensação elaborada a 26 desse mês —, cifra-se em €12.991,52, a que acrescem os juros compensatórios também liquidados, no valor de €2.620,53.
9. Em 20 de Dezembro de 2004 ao Oponente seria dado conhecimento da nota de demonstração da liquidação referida no ponto anterior, depois de já lhe haver sido enviada via postal, a 26 de Novembro de 2004, altura em que paralelamente lhe havia sido enviada, outrossim, a nota de demonstração da compensação, bem como a de cobrança — estas duas separadamente em relação àquela.
10. Em data indeterminada de Janeiro de 2005, mas situada entre os dias 02 e 30 (sempre inclusive) desse mês, através de Ilustre Mandatário, o Oponente dirigiu requerimento à Administração Tributária, Serviço de Finanças de Coimbra 2, para que lhe fosse emitida certidão dos fundamentos de facto e de direito na base da liquidação referida nos pontos 7-8., pedido que expediu pelo seguro do Correio e a que coube o registo RR988272986PT.
11. A Administração Tributária nunca lhe emitiu certidão como a requerida, referida no ponto anterior.
12. Após o termo, a 19 de Janeiro de 2005, do prazo fixado para o pagamento voluntário da dívida de imposto supra-referida, bem como dos juros compensatórios também liquidados, referidos nos pontos 7-8., em 28 de Junho de 2005 seriam instaurados os autos principais, com o n° 3050200501052497, para cobrança daquelas quantias e respectivos juros de mora.
13. Tendo sido expedida via postal, a 13 de Julho de 2005, a citação do Oponente para os termos da execução, este veio a apresentar a petição na origem dos presentes autos a 23 de Agosto seguinte.
Considerou ainda a sentença recorrida que, de entre os factos alegados e com interesse para a decisão da causa, não resultou provado:
14. Que na sequência do descrito no ponto 10. da matéria de facto provada a Administração Tributária haja recebido o requerimento aí mencionado.
3 – São duas as questões suscitadas com o presente recurso, a saber: prescrição da dívida exequenda e violação do princípio do contraditório (cfr. artºs 99º da LGT e 13º do CPPT).
Comecemos pela apreciação da primeira das referidas questões, que, muito embora não tenha sido tratada na sentença recorrida, a qual se limitou a conhecer dos fundamentos da oposição à execução fiscal que tinham sido alegados, o certo é que a mesma é de conhecimento oficioso e prejudicial.
Sendo assim, vejamos se acaso se encontra prescrita a obrigação tributária em causa nos autos.
Desde logo, importa referir que esta diz respeito a IRS relativo ao ano de 2000.
Sendo assim, o regime de prescrição aqui aplicável é o previsto na LGT, na redacção da Lei nº 100/99 de 26/7, uma vez que o regime consagrado na Lei nº 53-A/06 de 29/12 só entrou em vigor em 1/1/07.
Dispõe o artº 48º, nº 1 deste diploma legal que “as dívidas tributárias prescrevem, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos contados, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário…”.
Por sua vez, estabelece o seu artº 49º, nº 1 que “a citação, a reclamação, o recurso hierárquico a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo interrompem a prescrição”.
E, no seu nº 2, acrescenta que “a paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito previsto no número anterior,
somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação”.
Posto isto e como vimos, está aqui em causa a cobrança de IRS relativo ao ano de 2000.
Sendo assim, o prazo de prescrição começou a correr em 1/1/2001.
Entretanto, no dia 13/7/05, o oponente foi citado para os termos da execução (vide nº 13 do probatório e fls. 1 do processo apenso).
Este processo esteve, porém, parado por facto não imputável ao oponente desde a referida data até 28/2/07 (vide fls. 4 do referido processo).
Deste modo, cessou o efeito interruptivo decorrente daquela citação, que degenerou em suspensivo, pelo que há que somar neste caso, o tempo que decorreu após esse período (13/7/06) ao que tiver decorrido até à data da autuação.
A revogação do artº 49°, nº 2 LGT (operada pelo artº 90° da Lei nº 53-A/2006 de 29/12) é inaplicável, porque o período superior a um ano de paragem do PEF já tinha decorrido antes do início da vigência da norma revogatória (artº 91° da referida Lei nº 53-A/2006).
E então temos que, desde 1/1/01 até 28/6/05, data da autuação da execução, decorreram 4 anos 5 meses e 27 dias e, a partir de 13/7/06 até à presente data, decorreram 4 anos 6 meses e 27.
Pelo que, a dívida exequenda se encontra, assim, prescrita, uma vez que, nesta data, vai já decorrido o prazo de oito anos a que alude o predito artº 48º, nº 1 da LGT.
4 – Nestes termos, acorda-se em conceder provimento ao presente recurso, revogar a sentença recorrida, julgar prescrita a dívida exequenda e, em consequência, extinta a execução, ficando, assim, prejudicada a apreciação da segunda questão também suscitada.
Sem custas.
Lisboa, 2 de Março de 2011. – Pimenta do Vale (relator) – António Calhau – Casimiro Gonçalves.